Descrição: O presente trabalho visa auxiliar e esclarecer os clientes bancários que possuíam cadernetas de poupança nos chamados Planos Econômicos, especialmente com relação ao denominado Plano Verão (1989), cuja prescrição se aproxima.
Sumário: 1. Introdução. 2. Das teses referentes ao prazo prescricional do Plano Verão (1989). 3. Mecanismos de proteção do direito do poupadores – ação cautelar de exibição de documentos e ação cautelar de protesto para interrupção da prescrição. 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa auxiliar e esclarecer os clientes bancários que possuíam cadernetas de poupança nos chamados Planos Econômicos, especialmente com relação ao denominado Plano Verão (1989), cuja prescrição se aproxima.
Como se sabe, devido à crise inflacionária na década de 1980, foi instituído um pelo Governo em 16 de Janeiro de 1989, um plano econômico chamado de Plano Verão, o qual modificava o índice de rendimento da caderneta de poupança que gerando grandes desajustes em que as perdas chegaram a 20,37%.
Assim, para a propositura da ação de cobrança para reaver tais valores não creditadas nas respectivas contas, devem os correntistas instruí-la com os respectivos e imprescindíveis extratos da conta, os quais somente são conseguidos nas agências bancárias, mediante requerimento.
Entretanto, já é notória a dificuldade de se conseguir das agências bancárias os extratos bancários para propositura das ações de cobrança dos valores não creditados nas cadernetas de poupança, levando os poupadores a se socorrer do Judiciário através de ação de exibição de documentos para obter ordem judicial que determine ao banco a exibição judicial dos almejados extratos.
2. DAS TESES REFERENTES AO PRAZO PRESCRICIONAL DO PLANO VERÃO (1989)
Tema que tem levantado controvérsias a respeito do prazo prescricional para propositura das referidas ações de cobrança. Uma primeira tese foi levantada pela imprensa, através dos jornais eletrônicos e até mesmo a televisiva, informa que o prazo final seria 31/12/2008 [1], mas esse entendimento carece de base legal ao nosso ver, dispensando maiores comentários.
Outra tese a respeito do prazo prescricional e munida de amparo legal, verifica-se no recente artigo publicado por Bruno Januário Pereira (http://jus2.uol.com.br) expôs entendimento de que “os descumprimentos contratuais ocorreram no mês de fevereiro de 1989 (ocasião em que se aplicou o índice apurado em janeiro de 1989)” e que “a cobrança da diferença de correção monetária não depositada no mês de fevereiro de 1989, prescreve somente no mesmo dia do mês de fevereiro de 2009, porque, somente na mesma data é que se completa o prazo de 20 (vinte) anos (art. 177, do CC/1916, combinado com o art. 2.028 do CC/2002) – prescrição vintenária”.
Conforme entendimento acima exposto, o prazo final para propositura da ação de cobrança não seria em 31/12/2008, mas, sim, na data de aniversário da conta de caderneta de poupança, pois foi nessa data que o direito dos poupadores foi violado, dando início à contagem do prazo prescricional.
Por fim, uma terceira tese sobre o prazo prescricional é a adotada pelo Juiz de Direito MARCELO MAIRON RODRIGUES, da 2ª Vara Cível de Osório/RS no Processo nº 70010110112 e confirmada pela 17ª Câmara Cível do TJRS, por unanimidade, de relatoria do Desembargador ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA, tendo em vista a natureza do contrato de depósito, cabendo a propositura de ação de prestação de contas quando o poupador não possuir todos os extratos necessários.
Mencionado acórdão, foi proferido em ação de prestação de contas proposta por uma correntista em face do banco, onde este havia recorrido ao Tribunal aduzindo prescrição e que “os documentos necessários para a prestação de contas não mais pertencem ao mundo jurídico, uma vez que decorridos mais de 20 anos do depósito”.
A prescrição foi afastada pelo Tribunal sob o argumento de que somente com a resolução ou a extinção do contrato de depósito ter-se-ia termo inicial para fins de contagem do prazo prescricional, o que vale dizer que para aquelas contas de caderneta de poupança que existem desde os planos econômicos e ainda não foram extintas ou encerradas, o prazo prescricional ainda nem se iniciou.
Pede-se venia para transcrever a ementa e trecho do brilhante julgado, verbis:
“Apelação cível. prestação de contas. depósito bancário. prescrição. dever de prestar contas. Existente a relação contratual de depósito bancário, sem ter ocorrido sua rescisão ou extinção, não há falar em prescrição. Tendo, o correntista, o direito de pedir contas ao banco, apontando as razões pelas quais se justifica a necessidade da tutela jurisdicional, deve, a instituição bancária prestá-las. Precedentes jurisprudenciais. Apelo improvido. A operação financeira em questão é de depósito bancário, por meio do qual ‘o interessado ou depositante entrega somas em dinheiro ao banco, o qual, na qualidade de depositário, se obriga a devolver o valor correspondente ao depositante, na mesma espécie, tão logo for exigido, com ou sem acréscimo de juros e correção monetária, conforme ficar estipulado’ (“Contratos”, Arnaldo Rizzardo, 2ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2001, p. 1021). Decorre, portanto, a restituição da quantia depositada, da própria natureza do contrato bancário, subsistindo, ao depositante, o direito de reaver as importâncias, com todos os frutos e acréscimos enquanto não rescindido o negócio. Nessa senda, embora o transcurso de mais de 35 anos – contados da data da realização do depósito -, não há como reconhecer o implemento do prazo prescricional no caso em tela a fulminar a pretensão deduzida no feito. E isso porque não restou demonstrado, pelo demandado, a ocorrência de qualquer modificação na contratação havida, de sorte que somente com a resolução ou a extinção do contrato de depósito ter-se-ia termo inicial para fins de contagem do prazo prescricional. Não há falar, portanto, em prescrição do direito da autora à prestação de contas da quantia depositada, na medida em que não restou comprovada a resolução do contrato de depósito, quando, somente então, restaria estabelecido o marco inicial do transcurso do prazo prescricional. Neste sentido: “AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO. DEPÓSITO JUDICIAL EM ESTABELECIMENTO BANCÁRIO FEITO HÁ MAIS DE VINTE (20) ANOS. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. NATUREZA JURÍDICA DO DEPÓSITO BANCÁRIO. DEVER DE GUARDA. LUCROS. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO: Rejeitada em face a natureza jurídica do depósito bancário. Incontroversa e reconhecida pelo depositário a existência de depósito em nome de menor, em 1945, deve ele prestar contas de seu valor e rendimento em face ao dever de guarda e conservação que emana de sua atividade em prol da favorecida, pois que obteve lucros com sua utilização, mesmo lançado o dinheiro em conta simples, não comprovando, ainda, o estabelecimento financeiro, transferência a outro banco e/ou remessa ao Tesouro Federal, em face do abandono do depósito. Confirmação da sentença. Apelo do Banco do Brasil negado.” (APC Nº 595204520; REL. DES. OSVALDO STEFANELLO; 6ª CÂMARA CÍVEL, JULGADO EM 27.02.96)
“AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPÓSITO EM ESTABELECIMENTO BANCÁRIO FEITO HÁ MAIS DE VINTE ANOS. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. NATUREZA JURÍDICA DO DEPÓSITO BANCÁRIO. DEVER DE GUARDA. O dies a quo para a contagem da prescrição do direito de pleitear pela devolução dos valores depositados em estabelecimento bancário, está fixado na data em que os valores foram efetivamente devolvidos, marco inicial do transcurso prescricional. No caso em concreto, o banco não comprova a rescisão dos contratos de depósitos, não prescrevendo, então, o direito dos ora apelados. Daí não há se falar em prescrição do direito de devolução da quantia depositada. A prescrição só teria termo inicial a partir da extinção da relação contratual existente entre as partes” (APELAÇÃO CÍVEL N. 70 006 667 117, 18ª CÂMARA CÍVEL, REL. DES. MÁRIO ROCHA LOPES FILHO, JULGADA EM 25.09.03).
No mesmo sentido, tem se posicionado o STJ:
“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CÓD. DE PROC. CIVIL NÃO CARACTERIZADA – CONTRATO DE DEPÓSITO – JULGAMENTO ULTRA PETITA – PRESCRIÇÃO. … III – Inatacado fundamento suficiente à manutenção do acórdão, como a inexistência de prescrição, diante da relação contratual de depósito bancário, sem ocorrência de rescisão ou extinção, fica sem passagem o especial. Recurso não conhecido” (RESP N. 439.416-RS, 3ª TURMA, REL. MIN. CASTRO FILHO, JULGADO EM 04.03.2004, DJU 05.04.2004, P. 254).
Conforme a tese acima adotada no trecho colacionado do v. acórdão, o prazo prescricional somente se iniciará com a resolução ou extinção do contrato de depósito, celebrado entra o poupador e o banco.
Assim, sem adentrar no mérito das correntes relativas à prescrição acima expostas, uma providência é de rigor: caberá ao profissional do direito, principalmente ao advogado, usar de mecanismos a prevenir o direito de seus clientes, deixando desde já a sugestão da propositura da ação cautelar de protesto para a interrupção da prescrição.
3. MECANISMOS DE PROTEÇÃO DO DIREITO DO POUPADORES – AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS E AÇÃO CAUTELAR DE PROTESTO PARA INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
Já é notória a dificuldade de se conseguir das agências bancárias os extratos de caderneta de poupança para propositura das ações de cobrança dos valores não creditados por ocasião dos Planos Bresser (1987), Verão (1989), Collor I (1990) e Collor II (1991).
Um primeiro mecanismo de busca da efetividade da jurisdição à disposição dos poupadores é promover ação cautelar de exibição de documentos, com a finalidade de compelir o banco a entregar os almejados extratos, eis que os mesmos se fazem imprescindíveis para instruir os autos.
Acontece que, sabendo que a prescrição em relação ao Plano Verão se aproxima, é uma constante a dificuldade de as agências bancárias fornecerem amigavelmente e, mesmo com a ação de exibição em andamento, caso os extratos não sejam entregues aos clientes em tempo de propor a ação, a prestação jurisdicional ficará prejudicada.
Outro mecanismo para assegurar o direito dos poupadores é a propositura de ação cautelar de protesto interruptivo da prescrição, citando e intimando formalmente o banco demandado dos fatos e de sua responsabilidade civil, em especial para que se opere o efeito interruptivo previsto no art. 172, inciso II, do Código Civil de 1916 (aplicável ao caso em tela), para que, ainda depois de transcorrido o prazo fatal, possam promover a ação principal competente.
A prescrição pressupõe a inércia daquele que possui um direito ou legítimo interesse. Na lição de CÂMARA LEAL[2], “é a perda de uma ação ajuizável, em virtude da inércia de seu titular durante um certo lapso de tempo, na ausência de causas preclusivas de seu curso”.
Assim, o protesto, segundo o magistério de LUIZ GUILHERME MARINONI [3], “tem como principal efeito a condição de interromper a prescrição (art. 202, II, do CC), prestando, como se vê do dispositivo mencionado, também a ressalva do direito do interessado ou para simplesmente, manifestar sua intenção”. E o mesmo professor continua, ao ensinar que “os protestos se prestam à expressão da vontade do requerente, que afirma possuir um direito ou manifesta a intenção de exercitá-lo.
Sobre o cabimento da medida, para fins de interrupção da prescrição, já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo o seguinte:
“Não é qualquer protesto judicial, feito ao prescribente, que tem a virtude de interromper a prescrição. Essa interrupção deve resultar do propósito expresso do titular, manifestando a intenção de realizá-la, pelo que o protesto deve ser feito expressamente para esse fim. Não basta, pois, um protesto genérico, sem individualização do fim para que é feito, mas é mister que o titular declare, de modo explícito, que ele tem por fim interromper a prescrição.” [4]
Por fim, segundo tem decidido o Egrégio TJSP[5], não se aplica ao protesto judicial o disposto no art. 806 do Código de Processo Civil, de sorte que não é necessário propor a ação principal no prazo de 30 dias, contados da efetivação da medida.
Assim, fica a sugestão aos poupadores que ainda não possuam os extratos para a propositura da ação de cobrança ou de prestação de contas, que procurem um advogado de sua confiança e promovam a cautelar de protesto para a finalidade de assegurar os seus direitos.
4. CONCLUSÃO
Não obstante as várias teses a respeito da data da prescrição da ação para recebimento dos expurgos inflacionários referentes ao Planos Verão (1989), é de rigor que os poupadores e seus procuradores, com vista a evitar maiores discussões, ajuízem, o quanto antes, a ação cautelar de protesto para interrupção da prescrição, pedindo ao Juiz que, por decisão fundamentada, determine a citação e a intimação pessoal dos representantes legais do banco réu, para que tomem ciência formal dos termos da ação cautelar, através da qual os poupadores fazem o seu PROTESTO, especificamente sobre a interrupção do prazo prescricional da Ação de Cobrança e/ou Prestação de Contas dos expurgos inflacionários relativos ao PLANO VERÃO – 1989, da intenção expressa dos mesmos no tocante à conservação de direitos, demonstrando formalmente a intenção quanto à propositura da ação (cobrança ou prestação de contas), tão logo consigam os extratos, deixando assegurado a possibilidade de futura propositura da ação competente e receber os valores que lhes foram sonegados pelos bancos.
Informações Sobre o Autor
Rodrigo César Faquim
Advogado inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo, sob o n. 182.960 – Subseção de Tupã/SP. Pós-graduando em Direito Processual Civil pela Universidade do Sul de Santa Catarina, Instituto LFG e IBDP