Resumo: Este artigo traz uma breve análise do sistema carcerário vigente no Brasil e, conseqüentemente, da condição precária em que se encontram os presídios, os quais apresentam problemas como, por exemplo, superlotação e falta de higiene, sendo, portanto, um ambiente propício ao crime organizado e que pode tornar humanamente impossível a ressociabilização do individuo que está preso. Tendo isso em vista, o artigo também mostra, de forma exemplificativa, o que já vem sendo feito por alguns Estados da Federação, objetivando, dessa forma, apresentar a privatização das penitenciárias como uma solução possível e necessária.[1]
Palavras-Chave: Estado. Sistema. Sociedade. Preso. Privatização.
Sumário: 1. Introdução. 1.1. Objetivos. 1.2. Estrutura. 2. Sociedade como modo de produção e suas conseqüências. 3. A privatização como proposta de solução para a crise do sistema penitenciário. Conclusão. Referências.
1 INTRODUÇAO
O presente artigo traz como temática central o atual sistema penitenciário brasileiro e a necessidade urgente de soluções para os problemas que vêm se acumulando no decorrer dos tempos. Para tanto, foi realizada uma breve análise das condições carcerárias do país, assim como de experiências de alguns Estados, as quais surgem como possíveis soluções às dificuldades que se apresentam. Assim sendo, falar em privatização de presídios é inevitável.
1.1 OBJETIVOS
O objetivo de realizar tais reflexões é apontar a implementação da privatização dos presídios não apenas como uma possibilidade, mas como uma necessidade, uma saída para o caos que se estabeleceu na maioria das penitenciárias brasileiras.
O Estado poderia avaliar esta situação, e pelo menos fazer uma experiências em algumas instituições prisionais do Estado,pois acreditasse ser uma opção viável para reduzir a superlotação nas cadeias, provavelmente fugas e rebeliões poderão ser reduzidos, sabemos que esta discussão é bastante complexa, mas a necessidade urgente de se fazer algo, pois como o cárcere se encontra não tem como continuar.
1.2 ESTRUTURA
Inicialmente se falará em “sociedade como modo de produção”, dado que, dessa visão, surgem algumas conseqüências que irão refletir diretamente no assunto em questão. Após, são colocados alguns exemplos de privatização carcerária em andamento no país, como forma de mostrar, sugerir tal medida para a contenção dos problemas estabelecidos nos presídios geridos pelo Estado. Finalmente, faz-se uma sucinta, mas pontual consideração acerca da viabilidade e provável êxito que a privatização das penitenciárias alcançaria no Brasil, deixando, também, um espaço para a reflexão.
2 SOCIEDADE COMO MODO DE PRODUÇÃO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS
Do ponto de vista estrutural, a sociedade, como existe, é uma das estruturas possíveis, mas não a única. Como sistema social, remete-nos a pensar em uma organização inter-relacionada, onde cada unidade desempenha sua função social e se completa, ao mesmo tempo em que se difere das demais. Em outras palavras, “não há nada sobrando” (GUARESCHI, 2000, p. 28), uma sociedade é autônoma em si mesma. Embora o termo sistema social seja recorrente, um novo conceito para designar os diversos tipos de sociedade é também bastante empregado: modo de produção.
Como modo de produção, com o perdão da redundância, se pode entender que a sociedade passa, exatamente, a se estruturar a partir de sua produção. Isso implica dizer que ela está condicionada à maneira como as pessoas se organizam para sobreviver e representa um processo dinâmico, em constante transformação; segundo Guareschi, as pessoas, “[…] se por acaso são assim neste momento, houve um tempo em que não eram assim e haverá um tempo em que serão diferentes” (2000, p. 34). Dessa forma, surge a divisão social do trabalho e as classes sociais, que Konder (2000) aponta como sendo as primeiras causas do sofrimento e das privações humanas.
A desigualdade social acompanha toda a trajetória histórica do Brasil e vem se agravando nos últimos tempos. Por fatores diversos, cresce a distância entre os grupos menos abastados e as demais classes. Uma parcela da população se desenvolve em meio às condições sociais que o sistema ou modo de produção, de alguma maneira, impõe, e nem sempre essas pessoas são dotadas dos direitos previstos na Constituição Brasileira[2]. Tais privações naturalmente despertam sentimentos de opressão e submissão. A prática de delitos acaba se tornando constante como forma de compensação das desigualdades sociais, levando à criminalidade e à segregação.
No que diz respeito ao sistema carcerário, do ponto de vista da organização social, o agravamento é ainda maior. De um lado, o Estado com a prisão, aparentemente, cumpre sua responsabilidade de restabelecer a ordem e a segurança, e a sociedade, por sua vez, fica resguardada dos seus direitos. Em outras palavras, o que se tem é a concepção de que a única resposta ao delito é a prisão. Sob este prisma, descartam-se os fatos que desencadearam tal ação: transgrediu a Lei, tem que ser preso; e tudo está resolvido. É como se o sistema carcerário desempenhasse, por si só, a função socializadora do apenado. Como resultado, o que se vê são instituições prisionais comportando um número excessivo de presos, fora da realidade da sua capacidade; segundo Bitencourt,
“se pode afirmar, sem exagero, que a prisão está em crise. Essa crise abrange também o objetivo ressocializador da pena privativa de liberdade, visto que grande parte das críticas e questionamentos que se faz à prisão refere-se à impossibilidade – absoluta ou relativa – de obter algum efeito positivo sobre o apenado.” (2006, p. 42)
A condição caótica em que se encontram os presídios no Brasil é um exemplo bastante claro: superlotação, maus tratos, falta de higiene, ócio, deficiência no atendimento médico e psicológico, alto índice de consumo de drogas, violência e corrupção. O ambiente propício para o crime organizado, as rebeliões e os descontroles de toda espécie. Assim, é possível afirmar que o sistema penitenciário brasileiro está no ápice da crise. Tal situação vai além dos exemplos acima citados. O desrespeito ao preso, segundo Coelho, “não atinge apenas seus direitos, agridem a sua própria condição de ser humano, rebaixando-os à situação de animais insignificantes” (1999, p. 22).
Não é cabível ao Estado e à sociedade pensar que o encarcerado, após período relativamente longo em regime sub humano de sobrevivência, retorne ao convívio ressocializado. Ao contrário, na maioria das vezes, torna-se reincidente e cada vez mais à margem do contexto social. Manter o sistema penitenciário nos moldes atuais é continuar alimentando a corrupção, o tráfico, a criminalidade dentro e fora dos presídios.
As questões são: como romper com essa crise que segue numa crescente e restabelecer uma política de segurança eficaz e integrada? Como atingir um modelo de execução penal ideal que coloque em prática diretrizes da política criminal de humanização, de controle do crime e de ressocialização efetiva do detento? Como fazer com que sejam, afinal de contas, observados os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana[3] e, por que não dizer, da humanidade das penas?
3 A PRIVATIZAÇÃO COMO PROPOSTA DE SOLUÇÃO PARA A CRISE DO SISTEMA PENITENCIÁRIO
Na tentativa de responder a essas questões, isto é, de procurar soluções para os problemas apresentados, muitas alternativas têm sido propostas. Uma das mais polêmicas para a contenção da insegurança e da criminalidade é a privatização do sistema penitenciário. Na prática, essa alternativa representa um grande desafio para o Estado, administração e autoridades. Descentralizar a prestação de serviços como alimentação, saúde e educação, atribuindo autonomia para gerir o resgate social dos apenados, significa um grande avanço na consolidação de um sistema comprometido com a preservação da dignidade e dos direitos humanos.
As primeiras propostas de privatização dos serviços penitenciários no Brasil são recentes. Temos até então a experiência de participação privada nos seguintes estabelecimentos prisionais: Penitenciária Industrial e Regional do Cariri, no Ceará, e na Penitenciária Industrial de Guarapuava (PIG), no Paraná. Ambas foram construídas com recursos dos Governos Federal e Estadual. Com relação à Penitenciária Industrial de Guarapuava, sabe-se que:
“A PIG também é pioneira na terceirização, pois é a primeira Unidade Penal do Brasil em que toda sua operacionalização é executada por uma empresa privada contratada pelo Estado, mediante processo licitatório. A empresa fornece toda infra-estrutura de pessoal (segurança, técnicos, administrativos e serviços gerais), material de expediente e de limpeza, alimentação, medicamentos, uniformes, material de higiene pessoal, roupa de cama, etc.”[4]
Segundo Zackseski, “um dos resultados considerados positivos deste ‘modelo’ é a ausência de registros de rebeliões” (1991, p.63). A mesma autora, entretanto, lembra-nos que,
“[…] estas penitenciárias ainda não estão operando com sua capacidade máxima, uma vez que é feita uma triagem de prisioneiros antes da transferência, sendo selecionados apenas aqueles que apresentarem bom comportamento. Ainda assim os presos que não se adaptarem e puderem representar algum tipo de problema para este “eficiente” modelo podem ser devolvidos, o que já aconteceu na Penitenciária do Cariri permanecendo lá somente aqueles que “têm vontade de trabalhar”.
Araujo Neto também questiona a visão lucrativa que poderá atrair empresas privadas para a gestão dos sistemas prisionais, cujos detentos apresentem comportamento social compatível com os modelos estabelecidos como aceitáveis, desprezando os considerados rebeldes.
“Um outro ponto importante se refere à dinâmica do processo de implementação das prisões privadas. Será que tais empresas desejam manter detentos “problemáticos”, que demandam um custo alto no incremento de sua vigilância? Obviamente preferem as empresas a fatia menos problemática e teoricamente “menos custosa” da população carcerária, contribuindo assim para o agravamento do processo de precarização dos estabelecimentos públicos.” (2002, p. 32)
Entretanto, em sua dissertação de mestrado, Moreira Neto afirma:
“O Sistema Penitenciário Paranaense não tem medido esforços em busca da viabilização do trabalho para o preso, bem como a educação formal e profissionalizante, a prática do esporte, o lazer e, na medida do possível, o contato com o que acontece no mundo exterior.
[…] há uma constante busca do sistema Penitenciário Paranaense em encontrar soluções e alternativas que visem melhorar as condições de dignidade e auto-estima do interno”. (2006, p. 26)
Percebe-se, pois, que como qualquer possibilidade de solução para um problema, a privatização dos presídios apresenta pontos questionáveis. Contudo, é a partir desses aspectos que as idéias vão se moldando, se adaptando, de forma a corresponderem de maneira satisfatória às expectativas de mudanças e melhorias.
4 CONCLUSÃO
Diante do exposto, o que se pode afirmar é que o modelo atual não conseguirá reverter o quadro de “absoluta falência em termos de medidas retributivas e preventivas” (NETO, 2002, p.38) que impera nos presídios. Está muito longe de serem atingidos os verdadeiros objetivos do Estado, ou seja, promover a segurança pública ou do próprio interno. O certo é que uma gestão pública modernizada e plenamente articulada com os demais segmentos da organização pública e privada é o caminho mais coerente a ser traçado.
Ainda conforme Araujo Neto,
“independentemente de uma reflexão aprofundada, no Brasil, qualquer um é capaz de concluir que o cárcere, do modo como ora se administra, não recupera o internado, ao revés, agride aquele que precisa de ajuda.” (2002, p. 39).
Enfim, mesmo não sendo a privatização, evidentemente, a única solução para todos os problemas de segurança pública, na prática, a exemplo do que ocorre nas Penitenciárias de Guarapuava, no Paraná, e de Cariri, no Ceará, os resultados poderão ser positivos na socialização dos detentos, se comparados com o que se observa nos demais presídios, comandados pelo poder público, os quais estão superlotados e sem qualquer incentivo à recuperação.
Informações Sobre o Autor
Luciane Torres
acadêmica do cursoDireito na Faculdade Atlântico Sul e Anhanguera Educacional em Rio Grande/RS