Administração Pública é, em sentido formal, o conjunto de órgãos instituídos para consecução dos objetivos do Governo e, em sentido material, o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral. No que toca à acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços do próprio Estado ou por ele assumidos em benefício da coletividade e, numa visão global, é todo o aparelhamento do Estado preordenado à realização de seus serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas.
A CF/88, no caput do art. 37, dispõe sobre os princípios inerentes à Administração Pública: “Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência“.
Assevere-se que o dispositivo mencionado não se resume tão somente aos órgãos que integram a estrutura central do Estado, incluindo-se aqui os pertencentes aos três Poderes de Montesquieu, mas também açambarca os entes que integram a chamada Administração Indireta, quais sejam autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações governamentais ou estatais.
Ademais, note-se que existem outros princípios insertos na CF/88, tais como o da licitação, o da prescritibilidade dos ilícitos administrativos e o da responsabilidade das pessoas jurídicas, bem como aqueles que estão implicitamente previstos, como a supremacia do interesse público sobre o privado, da finalidade, da razoabilidade e da proporcionalidade.
Primeiramente cabe ressaltar aquele que, ao dispor da Administração Pública, o legislador fez questão de colocar como o primeiro a ser citado no texto constitucional, o Princípio da Legalidade. Mencionado no inc. II do art. 5º da Carta Magna, trata-se de dispositivo que trás em seu bojo a declaração de que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei“. Dessa forma, evidencia-se que o administrador só poderá atuar nos termos estabelecidos pela lei, ou seja, não possui a faculdade de agir por atos administrativos de qualquer espécie (decreto, portaria, resolução, instrução, circular, etc.).
Nesse diapasão, pode-se afirmar que a função precípua dos atos da Administração Pública é a realização das disposições legais, não lhe sendo possível, dessa forma, a inovação do ordenamento jurídico. Assim, inexiste qualquer possibilidade de ser juridicamente aceita a edição dos denominados decretos ou regulamentos “autônomos ou independentes”, haja vista que essas normas não passam de atos administrativos gerais e normativos baixados pelo chefe do Executivo, com o notório objetivo de disciplinar situações anteriormente não reguladas em lei. Destarte, como ensina José Eduardo Martins Cardozo (“Princípios Constitucionais da Administração Pública – de acordo com a Emenda Constitucional n.º 19/98”, in Alexandre Moraes, “Os 10 anos da Constituição Federal”, São Paulo: Atlas, 1999, p. 153), sua prática encontra óbice intransponível no modus constitucional pelo qual se fez consagrar o princípio da legalidade em nossa Lei Maior.
No que toca ao Princípio da Impessoalidade, afirma-se que é aquele que determina que os atos realizados ou delegados pela Administração Pública são sempre imputados ao ente ou órgão e não ao servidor. Neste entendimento comunga o jurista Celso Antônio Bandeira de Mello (“Curso de Direito Administrativo”, 7ª ed., São Paulo: Malheiros, p. 68): “no princípio da impessoalidade se traduz a idéia de que a Administração tem que tratar a todos os administrados sem discriminações, benéficas ou detrimentosas. Nem favoritismo nem perseguições são toleráveis. Simpatias ou animosidades pessoais, políticas ou ideológicas não podem interferir na atuação administrativa e muito menos interesses sectários, de facções ou grupos de qualquer espécie. O princípio em causa é senão o próprio princípio da igualdade ou isonomia”.
Quanto ao Princípio da Moralidade, também mencionado no art. 37 da CF/88, aduz-se que ao administrador público não basta cumprir os estritos termos da lei, ele tem que agir de forma a se encaixar dentro dos meandros da moralidade administrativa, ou seja, suas ações devem ser caracterizadas pela ética, acima de tudo, sob a pena de serem consideradas inválidas no âmbito jurídico.
O Princípio da Publicidade destaca-se por considerar o que é público como algo necessário de ser tratado com transparência para que a sociedade possa estar ciente das ações dos administradores. Assim, de acordo com tal princípio, o administrador deve dar publicidade a todos os seus atos, observando seu dever de publicá-los por meio de órgãos de imprensa escritos (ex. Diário Oficial) e não escritos (ex. televisão e rádio), seja em relação à existência, seja em relação ao próprio conteúdo de tais atos.
Já o Princípio da Eficiência tem por escopo racionalizar os atos atinentes à Administração Pública, observando-se os custos que a satisfação das necessidades públicas importam em relação ao grau de utilidade alcançado, ou seja, prima por melhores resultados com os meios escassos de que se dispõe e a menor custo.
Também é reconhecido o Princípio da Licitação como norteador da presteza do serviço público. Veja-se que licitação é um procedimento administrativo destinado a provocar propostas e a escolher proponentes de contratos de execução de obras, serviços, compras ou de alienações do Poder Público. Assim, este tem por dever buscar, entre os interessados em com ele contratar, a melhor alternativa disponível no mercado para satisfazer os interesses públicos, para que possa agir de forma idônea, ou adequada ao próprio dever de atuar de acordo com padrões exigidos pela probidade administrativa. Destaque-se ainda a necessidade de se assegurar a igualdade de oportunidades, sem privilegiar ou desfavorecer os administrados que pretendem com ela contratar.
Além do mais, o texto constitucional é taxativo ao descrever sobre o Princípio da Licitação em seu inc. XXI do art. 37: “ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações“.
Com relação ao Princípio da Prescritibilidade dos Ilícitos Administrativos, este se caracteriza pela incidência de prescrições administrativas ocasionadas pela inércia da Administração Pública. Note-se que há exceções, haja vista que pode haver ressarcimento ao erário eventualmente prejudicado.
O Princípio da Responsabilidade da Administração encontra amparo no §6º do art. 37 da CF/88, que dispõe: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadores de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa“. Assim, todo agente público que vier a causar um dano a alguém, trará para o Estado o dever jurídico de ressarcir esse dano, independente de culpa ou dolo. O dever de indenizar se configurará pela mera demonstração do nexo causal existente entre o fato ocorrido e o dano verificado.
Quanto ao Princípio da Participação, ressalte-se que foi inserto no texto constucional via de Emenda Constitucional nº 19/98 e se caracteriza por dispor sobre a participação do usuário na Adminitração Pública, seja direta ou indireta.
Como último princípio explícito na CF/88, cite-se o da Autonomia Gerencial, consubstanciado numa eventual relação contratual entre administradores de órgãos do poder público e o próprio poder público.
Quanto aos princípios implícitos na Carta Magna, o da Supremacia do Interesse Público Sobre o Privado deve ser o primeiro a ser mencionado. Como a própria denominação aponta, os interesses da Administração Pública são colocados em sobreposição aos interesses particulares no caso de eventual colisão entre eles.
Já o Princípio da Autotutela se caracteriza pelo poder da administração de anular os atos praticados em desrespeito à lei, bem como a prerrogativa administrativa de revogação de atos administrativos com base em juízo discricionário de conveniência e oportunidade.
No que toca ao Princípio da Finalidade, Celso Antônio Bandeira de. Mello (“Curso de Direito administrativo”, 7ª ed., São Paulo: Malheiros, p. 65), ensina que ele “impõe que o administrador, ao manejar as competências postas a seu encargo, atue com rigorosa obediência à finalidade de cada qual. Isto é, cumpre-lhe cingir-se não apenas à finalidade própria de todas as leis, que é o interesse público, mas também à finalidade específica obrigada na lei a que esteja dando execução“. Portanto, trata-se de princípio que impõe ao administrador a obrigação de praticar o ato administrativo com vistas à realização da finalidade perseguida pela lei.
O Princípio da Razoabilidade se caracteriza por determinar à Administração Pública, no exercício de faculdades, o dever de atuar em plena conformidade com critérios racionais, sensatos e coerentes, fundamentados nas concepções sociais dominantes. Trata-se de observação de condutas como instrumentos próprios para obtenção de interesses públicos maiores, desde que obedecendo critérios aceitáveis do ponto de vista racional, em sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosas das finalidades que presidam a outorga da competência exercida.
Numa mesma linha de raciocínio, o Princípio da Proporcionalidade ou da vedação a excessos vem destacar a idéia de que as conseqüências administrativas só podem ser validamente exercidas na extensão e intensidades proporcionais ao que realmente seja demandado para cumprimento da finalidade de interesse público a que estão atreladas. Desta forma, pode-se afirmar que os meios utilizados ao longo do exercício da atividade administrativa devem ser logicamente adequados aos fins que se pretendem alcançar, com base em padrões aceitos pela sociedade e no que determina o caso concreto.
Diante a síntese dos principais Princípios Constitucionais, o maior objetivo do legislador é o bem geral da nação, mediante uma sintonia entre Sociedade e Administração, e afim de alcançar uma estrutura satisfatória ao Estado brasileiro. Para isso, o sistema constitucional da Administração pública funciona como uma rede hierarquizada de princípios, regras e valores, que exige não mais o mero respeito à legalidade estrita, mas vincula a interpretação de todos atos administrativos ao respeito daqueles.
Assim, a função administrativa encontra-se subordinada às finalidades da Carta Magna e deve direcionar as tarefas administrativas no sentido de conferir uma maior concretude aos princípios e regras constitucionais, uma vez que estas não configuram como enunciados meramente retóricos, mas possuem plena juridicidade.
Informações Sobre o Autor
Tatiana de Oliveira Takeda
Advogada, assessora do Tribunal de Contas do Estado de Goiás – TCE, professora do curso de Direito da Universidade Católica de Goiás – UCG, especialista em Direito Civil e Processo Civil e mestranda em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento