Da penhorabilidade do bem de família

Resumo: O presente artigo tem por objetivo externar a relevância jurídica da penhorabilidade sobre o bem de família legal (instituído pela Lei n° 8.009/90). Frente ao relevo do bem de família no ordenamento jurídico, notadamente o escopo protetivo do casal ou da entidade familiar traduzido na sua respectiva impenhorabilidade, demonstrar-se-á que os casos excepcionais de penhorabilidade previstos no próprio ordenamento legal têm preponderância jurídica aptas a legitimá-las. Assim, entre 02 (dois) objetos jurídicos de relevo – ou entre 02 (duas) proteções jurídicas confrontadas -, almejar-se-á demonstrar que a exceção prepondera sobre a regra, sem qualquer mácula a inquiná-la. Mais, intentar-se-á externar e/ou defender, no mesmo caminho sopesado, a possibilidade de ampliação desta excepcionalidade processual da penhora em ditos bens.


Palavras-chave: Penhorabilidade. Bem de Família. Exceção. Chancela legal e jurídica. Preponderância da excepcionalidade no ordenamento jurídico. Defesa da ampliação a outras hipóteses.


INTRODUÇÃO


Tendo como escopo o instituto legal do bem de família – Lei n° 8.009/1990 -, bem como a regra protetiva da impenhorabilidade dos bens que se encontrem nesta situação legal, delimitar-se-á o presente trabalho às hipóteses excepcionais legais de penhorabilidade dos mesmos – artigos 2°, 3° e 4° da Lei n° 8.009/1990. Mais especificamente, abordar-se-á a razão jurídica de referidas hipóteses legais excepcionais frente à relevância do instituto, que visa, eminentemente, proteger ao ente familiar (em todas as suas concepções técnicas). Para tanto, utilizar-se-á de uma interpretação sistemática integrada de normas, princípios e valores jurídicos – além de doutrina e jurisprudência -, e, de forma comparativa, demonstrar-se-á que a excepcionalidade da penhorabilidade daqueles bens tem razão e fundamento de existência, sem qualquer mácula a inquiná-la, devido ao relevo jurídico e importância maior frente à determinação da impenhorabilidade.  


Ainda dentro do mesmo método aqui externado, será defendido e proposto a ampliação legal de referida excepcionalidade de penhora, em casos não contemplados pelo Legislador, em prol da própria Ordem Jurídica.


DESENVOLVIMENTO


1. BREVE HISTÓRICO DO BEM DE FAMÍLIA


Com fulcro em profícua doutrina[1], pode-se afirmar que o instituto do bem de família teve origem no mundo jurídico na República do Texas (antes de sua incorporação aos EUA em 1845), por meio de Lei específica de 26/01/1839, que regulamentou o denominado “homestead”. Em linhas gerais, devido às circunstâncias daquela República (até então independente dos EUA) e daquele momento histórico (grande leva de imigrantes acorreu ao Texas após a sua separação do México visando desenvolver-se na promissora República), referido instituto almejou primordialmente a fixação do imigrante à terra (limitada esta a uma pequena cota), dando-lhe proteção de impenhorabilidade com fincas a um desenvolvimento digno e sustentável da respectiva família. Neste sentido, útil se torna transcrever a lição de Álvaro Villaça Azevedo: “Esse diploma legislativo teve em vista, principalmente, fixar o homem à terra, objetivando o desenvolvimento de uma civilização cujos cidadãos tivessem o mínimo necessário para uma vida decente e humana”.[2] Tão fecundo se mostrou este instituto do “homestead”, que logo se espalhou por toda a República dos Estados Unidos (de forma gradual e peculiar) – sendo que, em dias de hoje, em alguns Estados norte-americanos, o espírito desse instituo legal ainda permanece.


No Brasil, a idéia deste instituto fora encampada, primeiramente, e após alguns esboços e/ou vestígios semelhantes[3], pelo CC de 1916 (através dos artigos 70 a 73) com o rótulo mesmo de bem de família, com a característica de ser de natureza voluntária e/ou convencional (sendo necessário que o agente, dentro dos requisitos legais, tome a iniciativa de destinar o bem para o fim protetivo). Com o advento do CC de 2002, o bem de família voluntário passou a ser tratado nos artigos 1.711 a 1.722, com sensível reformulação (em que pese a essência voluntária protetiva ter permanecido).


O bem de família legal (que se dá de forma automática, independente da vontade do agente) – e que interessa mais de perto à análise do presente trabalho -, fora fruto de um momento conturbado na economia brasileira no final do Governo Sarney. Este período foi marcado por uma incipiente Democracia no Brasil (que acabava de sair de uma ditadura militar), com o cargo presidencial dando-se de forma insólita[4] e por uma grave crise econômica (que afeta mais diretamente a classe média).


E é nesta circunstância histórica (calcada em sucessivas medidas e/ou planos urgentes e paliativos, quase todos catastróficos), muito mais por pressão momentânea de uma crise econômica sem precedentes (e talvez até por receio de um novo e indesejado período militar) que, fruto da Medida Provisória 143 de 08/03/1990, é criada a Lei n° 8.009 de 29/03/1990, já durante o também catastrófico Governo Collor. Daí se aferir, já de início, que o processo de criação da Lei n° 8.009/90 não se deu inteiramente isento de mácula (apesar da então recente CF de 05/10/88).


2. DA ESSÊNCIA DA LEI N° 8.009/90


Frisados tais elementos históricos e sociais potencialmente influenciadores, já da dicção do artigo 1° da Lei n° 8.009/90 extrai-se a essência protetiva “do casal ou da entidade familiar” [5], traduzida na impenhorabilidade do respectivo “imóvel residencial próprio”, que não responde assim, “por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam”. Vê-se assim, que o sujeito nuclear desta benesse é a família (seja a constituída pelo casamento, seja nas diversas formas técnicas em que a mesma é empregada)[6] proprietária e residente no imóvel. Vislumbra-se ainda, que o objeto apto (ou que recai) a tal proteção – de acordo com o parágrafo único do indicado artigo 1° da Lei n° 8.009/90 – constitui no imóvel “sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza”, além “de todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa” – ou seja, o objeto principal e todos aqueles que o gravitam e o caracterizam essencial. E isso por constituir tais bens, elementos essenciais à dignidade da família[7] e/ou à sua própria existência, além de atenderem a uma função social[8]; servindo os mesmos como abrigo e sustentáculo à referida instituição.


Inalienável assim – quer pelo momento histórico/social, quer pelas diretrizes da Constituição Federal de 1988 -, que o fulcro protetivo do bem de família encontra um limite – razão de ser, conforme apontar-se-á adiante, da preponderância jurídica das hipóteses excepcionais de penhorabilidade.


Registra-se ainda, que tamanho fora o intento de proteção ao cerne material da dignidade familiar, que o legislador optou para que referido instituto viesse a operar “ex lege”, independente de qualquer formalidade (como escritura pública ou registro) e/ou ato de vontade do agente (tal qual ocorre nos artigos 1.711 a 1.722 do CC/2002), desde que respeitados os requisitos previstos na respectiva Lei. O Estado assim, faz as vezes de verdadeiro guardião da família – numa evidente publicização do Direito Privado, como hodiernamente sói ocorrer.


Entretanto, a apontada proteção material da Lei n° 8.009/90 voltada para a família (casal ou entidade familiar), como já dito, encontra um limite à sua própria essência e/ou razão de ser, cuja transposição enseja licitamente à penhorabilidade de respectivos bens, ou seja, faz operar a excepcionalidade da constrição judicial nas hipóteses ali mesmo previstas. E este mesmo comando limitador (esta mesma razão de ser da Lei) torna defensável a ampliação das circunstâncias aptas à penhora destes bens.


3. DO RELEVO JURÍDICO DA PENHORA NO BEM DE FAMÍLIA


3.1. INTRÓITO


O tema proposto ganha importância tendo em vista a crise econômica mundial atual desencadeada nos EUA, onde várias famílias perderam suas casas ofertadas em garantia junto a Instituições Financeiras e/ou similares. Não se perdendo de vista que, muito provavelmente, tal circunstância danosa atingirá também o Brasil (levando-se em conta as especificidades concretas e negociais aqui presentes). Não se descurando das alterações no procedimento executivo desencadeadas pela Lei n° 11.382/2006, que, em linhas gerais, propiciou dar ênfase à efetividade na Execução (ampliando, conseqüentemente, os direitos do credor). E como já aventado dantes, o processo deste estudo far-se-á com base numa interpretação sistemática[9] e comparativa, pinçando e exteriorizando daí, a relevância jurídica do elemento processual da penhora frente à proteção do bem familiar em nosso ordenamento. Em síntese, as ordens jurídicas em confronto são de um lado a proteção material da família (ou a sua dignidade) e de outro o direito do credor em fazer valer seu crédito pela penhora. 


Neste sentido, o primeiro apontamento geral que se faz acerca da penhorabilidade do bem de família, é que a mesma esta pautada no próprio princípio constitucional da legalidade[10], vez que o já apontado “caput” do artigo 1° da Lei n° 8.009/90 faz a ressalva (no que tange à regra da impenhorabilidade) “salvo nas hipóteses previstas nesta lei”. Pontua-se ainda que em todas as hipóteses legais da penhorabilidade do bem de família há os elementos basilares da boa-fé/eticidade/probidade como norteadores (excluindo da impenhorabilidade o bem, ora em respeito a créditos trabalhistas e previdenciários, ora em face de crédito de financiamento destinado ao próprio bem, ora diante de crédito alimentar, ora diante do repúdio à ilicitude, ora em evidente má-fé de quem intenta se escudar na Lei).


Não se podendo descurar ainda da importância do princípio da razoabilidade que também imprime sua influência, em linhas gerais, em todas as hipóteses excepcionais legais – assim, por exemplo, quando se afasta da impenhorabilidade bens tidos como supérfluos, não essenciais e/ou suntuosos. No que toca a esta razoabilidade, há que se ater que além do bem protegido pela impenhorabilidade dever ser de natureza necessária (daí a exclusão daqueles adrede indicados), também a dívida contraída (fonte da potencial penhora sobre o bem) há que ser razoável, ou seja, há que ser limitadamente necessária à família (sob pena, logicamente, de haver desvirtuamento do intento da Lei n° 8.009/90)[11]. Também a segurança jurídica nos negócios é fator primordial a influenciar grande parte das excepcionalidades da penhora. A quebra desta segurança e/ou desta confiança nos negócios jurídicos em geral (certamente provocada, em hipótese, por indiscriminadas possibilidades de proteção a bens) geraria tremenda instabilidade na economia, redundando em prejuízo da própria família que se pretende tutelar.


3.2. DA IMPORTÂNCIA DA PENHORA NO ORDENAMENTO JURÍDICO


Indisfarçável a importância da penhora[12] no ordenamento jurídico, vez constituir elemento indispensável no Processo de Execução e, via de conseqüência, para o próprio credor (vide artigo 612 do CPC). Isso porque é pela penhora que a parte credora individualiza e conserva o bem, e via imediata, garante a concretização de seu crédito ao final do feito, já que em regra o devedor responde com todos os seus bens para o cumprimento de sua obrigação (conforme artigo 591 do CPC). Tudo isso, tendo em vista que o objeto da Execução (quantia certa) é expropriar bens do devedor visando satisfazer o direito de crédito do credor (artigo 646 do CPC).


E com a entrada em vigor da Lei n° 11.382/2006 mais esta importância se avulta, vez que referido dispositivo veio tornar mais eficaz o Processo Executivo, eliminando certas possibilidades procrastinatórias do devedor, com visível interesse em aumentar e/ou reforçar as possibilidades de satisfação do crédito do credor. Ora, disso deflui que a penhora tem papel fundamental na economia, na medida em que o credor, quando busca o Judiciário para obtenção de seu crédito (pelas vias ordinárias ou diretamente pelas vias executivas) já se encontra em situação aflitiva em face à suposta inadimplência do devedor. E muitas das vezes este crédito não honrado é da própria sobrevivência do credor ou necessário para honrar outra dívida dele, ou mesmo para iniciar um negócio lucrativo com geração de empregos. Ao se reduzir o campo das possibilidades da penhora, estar-se-á reduzindo também as expectativas dele credor – e provavelmente, de todas as pessoas que gravitam em seu torno -; muitas das vezes em prol de um devedor de má-fé ou, no mínimo, inconseqüente frente às suas obrigações.


Sem contar que com o óbice (ou com a limitação) da efetivação da penhora, estar-se-á contribuindo além de uma maior inadimplência, também para uma insegurança e/ou falta de credibilidade nas relações negociais, tanto internas como externas (já que reduz-se as possibilidades de investimentos externos num país onde as garantias de um crédito são limitadas). Via reflexa, a própria ordem social estaria comprometida no caso de uma supressão mais agressiva do instituto da penhora no nosso ordenamento jurídico[13].


3.3. DA ANÁLISE INDIVIDUAL DAS EXCEÇÕES


3.3.1. Do “caput” do artigo 2° da Lei n° 8.009/90


A primeira hipótese excepcional admissível de penhora em bem de família vem prevista no “caput” do artigo 2° da Lei n° 8.009/90, ou seja, “veículos de transporte, obras de arte e adornos suntuosos”. Notório no caso o intuito de se excluir da proteção de impenhorabilidade os bens tidos como supérfluos e/ou que não são necessários à dignidade da família – fugindo assim, à razoabilidade a que objetiva a Lei n° 8.009/90. Guarda-se além disso, íntima relação com os já mencionados princípios da eticidade e boa-fé; não sendo justo que bens tidos como não essenciais à moralidade familiar sejam protegidos, em detrimento à garantia de crédito do credor (e potencial satisfação de seu lídimo direito). De se ater que referido dispositivo tem co-relação com o previsto no artigo 649, II (notadamente quanto à exceção ali prevista) do CPC[14].


Neste aspecto, e quanto aos veículos de transporte, há que se fazer a ressalva daqueles “necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão” (vide artigo 649, V, do CPC), tais como táxis, barcos e/ou similares utilizados para pesca (desde que únicos e servindo à subsistência), carroças (tais como as usadas nas zonas rurais), etc., desde que, e por óbvio, atinjam ao escopo da Lei de manter a dignidade e/ou existência da família.


Há que se imprimir distinção – e em grande parte dos casos, cabendo ao Magistrado fazê-lo conforme prudente arbítrio – entre o que seja “equipamentos” (inseridos na impenhorabilidade do parágrafo único do artigo 1° da Lei n° 8.009/90) e “adornos” (passíveis de penhora conforme o “caput” do artigo 2° analisado)[15].


3.3.2. Do artigo 3° e incisos da Lei n° 8.009/90


O artigo 3° da Lei n° 8.009/90 contempla grande parte das hipóteses onde há a permissibilidade da penhora em bem de família – através da distribuição em sete incisos, de variados matizes e escopos. E a primeira hipótese de referido dispositivo (inciso I) ao permitir a penhora em bem de família quando em choque com “créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias” sofre clara influência do direito social laboral e previdenciário[16]. Visa-se afastar lesão a crédito trabalhista e previdenciário daquele trabalhador que laborou em prol da própria família a princípio beneficiada; não se olvidando que ele trabalhador também possui família a ser sustentada, e assim, em último caso, a Lei ainda almeja tutelar interesse da família (neste caso, a do trabalhador). Não se pode ainda afastar o intento de resguardo dos princípios gerais (sempre basilares) da boa-fé/eticidade e do repúdio ao enriquecimento ilícito. Em regra, o trabalhador encontra-se de boa-fé e com a justa expectativa de receber seu salário, em contraponto ao empregador que, por ter empregado, subentende não necessitar de qualquer benesse protetiva a bem seu. Vem daí também a incidência da razoabilidade e do próprio bom senso. No particular a esta hipótese é quase unânime a interpretação restritiva que se faz de que a Lei almejou aos trabalhadores da própria residência[17], em detrimento daqueles que laboraram na construção ou reforma do bem[18].


O segundo caso previsto neste artigo, apto à penhora em bem de família, diz respeito a “crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato”. Aí se torna patente o sobrelevo da boa-fé e probidade contratual advinda do artigo 422 do CC[19], bem assim, o repúdio ao enriquecimento ilícito. Não se pode chancelar a má-fé, inconseqüência ou ganância, daquele que obtém empréstimo para construção ou aquisição do imóvel residencial (mesmo que destinado à família), sob pena inclusive de quebra da confiança e segurança nas relações contratuais em geral – havendo, inclusive, interesse público à estabilidade e ordem nos negócios jurídicos[20]. Via reflexa a esta segurança negocial, a razão ainda desta excepcionalidade está em facilitar a própria aquisição da residência familiar, já que visa àquele agente de má-fé (exceção) em benefício daquele que honra com as suas obrigações (maioria), gerando assim confiança ao credor no disponibilizar financiamento a tal desiderato.


O inciso III do referido artigo 3° sobreleva a tutela do crédito de pensão alimentícia à tutela do bem de família pelo óbvio motivo de visar à sobrevivência daquele que necessita dos alimentos[21] (podendo-se traduzir na própria dignidade da pessoa humana). Talvez seja, das exceções à impenhorabilidade do bem de família, a mais patente – dado o seu alto grau social. O único apontamento que se faz nesta hipótese é acerca da dúvida quanto à extensão da “pensão alimentícia” abarcar também o credor vítima de ato ilícito[22] – aqui se defendendo, desde já, o posicionamento favorável a que tais credores também se beneficiem do dispositivo.


A contemplação seguinte – inserida no inciso IV do artigo 3° – permite a penhora em bem de família por dívida almejada advinda de “impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições” em função do próprio imóvel familiar. Abarca-se aí não só impostos (tais como o IPTU) e taxas públicas ordinárias, como também despesas condominiais hodiernas do imóvel a princípio tutelado. Tem-se nesta hipótese, diante do fato gerador ser o próprio imóvel familiar[23], o relevo público e imperativo contido nos tributos em geral. Além disso, mais diretamente no caso das despesas condominiais, há que se ter em mente que a dívida almejada em juízo reverteu em proveito deste mesmo bem imóvel familiar (em tese, o sustentáculo do imóvel corresponde às despesas condominiais). Sem descurar que a natureza da obrigação devida em comento é “propter rem” e/ou “ob rem”[24], gerando-se um vínculo direto ao titular do bem e em função dessa sua condição de proprietário.


Em continuidade, o inciso V do dispositivo em comento permite a penhora de bem familiar na “execução de hipoteca sobre o imóvel, oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar”. Trata-se de hipótese que guarda íntima relação com a segurança nos negócios jurídicos em geral (em especial àqueles que envolvem financiamento com garantia hipotecária), com o princípio da obrigação e com a boa-fé/eticidade (logicamente do casal ou da entidade familiar que obtém empréstimo em contrapartida à garantia hipotecária) – notadamente em face à natureza de garantia real da hipoteca. Nesta circunstância, de se acrescer o entendimento de que, em função desta garantia ter sido oferecida pelo “casal” ou pela “entidade familiar”, o financiamento reverteu em proveito da própria família (no mais das vezes, em prol do imóvel hipotecado). Há que se fazer a ressalva de que a jurisprudência tem entendido interpretar referido dispositivo de forma restrita – diante da máxima “exceptiones sunt strictissimae interpretacionis” -, não dando ensejo à penhora em execução comum, tão somente na execução hipotecária propriamente dita[25]. Neste particular, há que se firmar entendimento radicalmente contrário, no sentido de ser permitir a penhora também em execuções comuns com garantia hipotecária[26].


A hipótese seguinte (inciso VI) guarda co-relação com expresso dispositivo constitucional[27], com evidente escopo de se rechaçar a má-fé e/ou o enriquecimento ilícito, ao permitir a penhora do bem fruto “de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens”. Tem inspiração ainda no repúdio à prática de ato ilícito contemplado no artigo 186 e “caput” do artigo 927, e pelo princípio da imputação civil dos danos advinda do artigo 391, todos do CC[28]. Patente também o combate a toda ação e/ou efeito de crime em nosso Ordenamento; daí a direta ligação com feito criminal, fonte da penhora em bem tido como de família – extraindo-se assim, numa interpretação gramatical/lógica, não ser possível que a penhora se dê em razão de ajuizamento autônomo de Ação na seara civil[29]. A sentença penal, neste sentido, tem efeitos civis[30].


A mais polêmica e conflitante das hipóteses de penhorabilidade em bem de família encartadas no artigo 3° da Lei n° 8.009/90 é a do seu último inciso (VII); contemplação, fruto do artigo 82 da Lei n° 8.245 de 18/10/91 (a rotulada Lei de Locação). Por esta disposição, permite-se a penhora em bem de família quando advinda de “obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”. No presente caso, há que se primeiro pontuar que a razão da excepcionalidade encontra guarida em expressa disposição de Lei especial posterior (a Lei de Locação) – por inspiração e resguardo aos direitos locatícios ali presentes. A hipótese guarda indisfarçável similitude com o já mencionado inciso V do artigo, vez que refere-se também a garantia especial concedida em obrigação (nesta circunstância em comento, fiança dada num contrato de locação). Daí porque parte dos mesmos elementos inspiradores na execução da hipoteca (segurança nos negócios jurídicos, princípio da obrigação e boa-fé/eticidade) também o são na concessão de fiança no contrato locatício.


A questão se polemiza, notadamente na jurisprudência, quando é analisada à luz do artigo 6° da CF[31] (fruto da EC 26/2000), tendo o STF se posicionado tanto a favor da constitucionalidade desta hipótese[32], quanto contra[33]. Inobstante, prevalece o entendimento (inclusive no próprio STF) acerca da constitucionalidade do dispositivo em análise – o que não prescinde de desejável emissão de Súmula Vinculante sobre o tema, corroborando referido pensamento majoritário. Por fim, de se destacar que para a validade da fiança (e logicamente, para se possibilitar a penhora excepcional em bem de família nesta hipótese) torna-se imprescindível a outorga uxória – matéria, inclusive, objeto da Súmula 332 do STJ[34].


3.3.3. Do “caput” do artigo 4° da Lei n° 8.009/90


A última admissão excepcional de penhora em bem de família extraída da Lei n° 8.009/90, advém do “caput” do artigo 4°, na hipótese do agente, sabedor de sua insolvência, adquirir “de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga”. Notória – e até expressa – a conotação de repúdio à má-fé, traduzida na fraude contra credores e/ou contra a execução, do agente devedor (que, dolosa e ardilosamente, intenta se beneficiar das benesses da Lei). Nesta circunstância, conforme respectivo § 1°, cabe apontar que o legislador preferiu conceder ao Magistrado, “na respectiva ação do credor”, um meio de reverter o ato fraudatório do devedor (nitidamente intentando resguardar os direitos de crédito, da forma mais célere e eficaz possível).


4. DA DEFESA DA AMPLIAÇÃO DA PENHORA NO BEM DE FAMÍLIA


Consoante os argumentos lançados, entende-se ser plenamente possível e justo ampliar-se as hipóteses de penhora sobre o bem de família. A título de exemplificação, conforme já dantes grifado, não se entende a razão de se excluir – pelo menos via doutrina – os créditos dos trabalhadores da construção e/ou reforma do imóvel, da possibilidade de penhora (tendo em vista o princípio isonômico). No mesmo caminho, no referente à possibilidade de penhora jungida a crédito de pensão alimentícia, tal deve ser estendida também àquele credor vítima de ato ilícito. Visando dissipar toda e qualquer dúvida interpretativa, caberia ao legislador contemplar expressamente tais hipóteses no corpo da Lei.


Outra circunstância defendida se aproxima da prevista no “caput” do artigo 4° da Lei n° 8.009/1990, e trata-se da situação em que o devedor (independentemente de má-fé) tenha como residência familiar imóvel de considerável vulto econômico[35] sem qualquer outro bem apto a garantir dívida de seu credor. Nesta circunstância – tal qual contemplado no § 1° do artigo 4° da Lei n° 8.009/1990 – conceder-se-ia poderes ao Órgão Julgador concernente a tutela específica e/ou de equivalência, seja para possibilitar a penhora de parte de referido bem (no caso de possibilidade física e jurídica para tanto), seja para determinar a venda em hasta pública do imóvel, reservando numerário suficiente ao devedor (casal ou entidade familiar) para que este pudesse adquirir outro imóvel de menor relevo econômico, mas em inteiras condições de proporcionar dignidade à família (com a ressalva de que este numerário reservado ficaria condicionado, exclusivamente, à compra de outro imóvel).


CONCLUSÃO


O tema em foco é de vital importância na atualidade, principalmente tendo em vista a crise econômica mundial, com potencial repercussão no Brasil (em maior ou menor grau). Paradoxalmente, ao invés de se refutar as hipóteses excepcionais previstas de penhorabilidade do bem de família, entende-se serem as mesmas perfeitamente legítimas ao se mensurar os bens jurídicos tutelados em questão. Mais que isso, conclui-se ser perfeitamente possível e legítima a ampliação legal destas hipóteses excepcionais – não se adotando assim, postura radical de completa revogação da Lei[36].


Para resguardo da família (no teor técnico), notadamente dos respectivos bens que a gravitam, e para a boa aplicação da Lei n° 8.009/1990, cabe em verdade uma mudança na atitude do Homem frente às suas relações com outrem; devendo sempre ser pautada por princípios de probidade, ética e boa-fé. E se tal mudança não advém de forma espontânea e natural, cabe à Lei (mais precisamente, às hipóteses excepcionais contemplativas da penhorabilidade) este papel, sempre para o bem do coletivo comparativamente a um bem individual.


 


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Notas:

[1] Sobre o assunto, numa forma mais completa, ver AZEVEDO, Álvaro Villaça. Bem de Família Internacional (Necessidade de Unificação). Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 89, Dezembro de 2000, vol. 782, p. 12-15.

[2] Ibid., p. 14.

[3] Sobre o tema, conferir NETO, João Hora. O Bem de Família, a Fiança Locatícia e o Direito à Moradia. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10149. Acessado em 04 de abril de 2009.

[4] José Sarney assume a presidência como vice do falecido Tancredo Neves, que por sua vez fora eleito de forma indireta

[5] De acordo com a CRFB/88, “Art.226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. […]. § 3° Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. §4° Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. […]”.

[6] Sobre o tema, conferir DE SOUSA, Aline Delias. A Família Informal: As Novas Espécies de Família não Fundadas no Casamento. Disponível em: http://www.ucpel.tche.br/direito/revista/vol6/13Aline.pdf. Acessado em 02 de abril de 2009.

[7] Cf. CRFB/88, “Art. 1°, III”.

[8] Ibid., “Art. 5°, XXIII”.

[9] Com muita propriedade, citando a Juarez de Freitas, assim expõe Maria Cláudia Cachapuz: “A premissa básica é a de que todo estudo que se faça sobre o instituto do bem de família pressuponha uma compreensão da idéia de sistema ou, mais precisamente, de uma ‘interpretação sistemática’, como prefere o professor Juarez Freitas, a partir da composição de princípios, normas e valores”. (Bem de Família: uma Análise Contemporânea, Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 88, Dezembro de 1999, vol. 770, p. 27).

[10]  De acordo com a CRFB/88, “Art. 5° […]; II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; […]; LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; […]”.

[11] Dita ainda Maria Cláudia Cachapuz: “Trata-se, portanto, da aplicação de um parâmetro econômico aos conceitos decorrentes da Lei, entendendo-se que só se justifica a permanência da tutela patrimonial enquanto houver uma relação de ‘sustento’ às necessidades de moradia da família – seja em relação ao bem imóvel, seja em relação aos móveis que guarnecem a residência. A ‘essencialidade’ manifestada em decisões do STJ, por conseqüência, adquire outra conformação jurídica. O que se deve analisar para a manutenção, ou não, da impenhorabilidade do bem é a necessidade de sustento da família a partir de uma consideração sobre um ‘endividamento razoável’ assumido frente a terceiros”. (Bem de Família: uma Análise Contemporânea, Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 88, Dezembro de 1999, vol. 770, p. 27).

[12] Humberto Theodoro Júnior assim destaca: “[…]pode-se, enfim, reconhecer à penhora a tríplice função de: a) individualizar e apreender efetivamente os bens destinados ao fim da execução; b) conservar ditos bens, evitando sua deterioração ou desvio; e c) criar a preferência para o exeqüente, sem prejuízo das prelações de direito material estabelecidas anteriormente”. (Curso de Direito Processual Civil, volume II, Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 910).

[13] Neste aspecto, interessante a análise de Carlos Callage no seguinte sentido: “Não cabe ao Estado incentivar tal comportamento, suprimindo a eficácia coativa, sob pena de ferir a paz social e atingir o fundamento da dignidade humana (CF, art. 1°, III) estimulando um caloteiro em cada brasileiro. Finalmente, mas não por último, sendo o patrimônio a garantia única dos credores, a impenhorabilidade não pode causar anemia das múltiplas relações de crédito e débito que impulsionam uma sociedade que objetiva o desenvolvimento (CF, art. 3°, II). Repita-se que, com a impenhorabilidade geral do patrimônio pessoal criada pela Lei 8.009, resta mutilada a atividade econômica das pessoas físicas que a Constituição visa a proteger (CF, art. 170, parágrafo único)”. (Inconstitucionalidade da Lei 8.009, de 29 de Março de 1990, Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 79, Dezembro de 1990, vol. 662, p. 62).

[14] “Art. 649. São absolutamente impenhoráveis: […]; II – os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida; […]”.

[15] José Stábile Filho expõe: “Parece haver e realmente há, grave incoerência na lei. Quando estabelece a isenção para a residência, inclui ‘todos os equipamentos’ (art. 1°, § 1°), sem fazer distinção. Equipamento não é adorno. Assim, são impenhoráveis e estão a salvo de constrição, em execuções, os sofisticados aparelhos ou equipamentos de som e imagem, os transceptores, os instrumentos musicais, (piano, p. ex.) e todos os demais que compõem o acervo patrimonial da família, embora desnecessários ao resguardo do chamado asilo familiar, finalidade precípua do instituto, desde suas mais remotas origens”. (Bem de Família e Execução, Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 80, Julho de 1991, vol. 669, p. 71).

[16] Cf. CRFB/88, “Art. 7° e incisos” e “artigo 201 e incisos”.

[17] Assim, em nota de Theotônio Negrão e José Roberto F. Gouvêa: “Art. 3°: 1c. Partindo da premissa de que a exceção deste art. 3°-I deve ser interpretada restritivamente, por trabalhadores da própria residência entendem-se apenas os empregados domésticos, de modo que subsiste a impenhorabilidade diante de créditos ou contribuições previdenciárias de ‘empregados eventuais que trabalham na construção ou reforma do imóvel, sem vínculo empregatício, como o exercido pelo diarista, pedreiro, eletricista, pintor, vale dizer, trabalhadores em geral’ (STJ-1ª T., REsp 644.733, rel. p. o ac. Min. Luiz Fux, j. 20.10.05, negaram provimento, um voto vencido, DJU 28.11.05, p. 197)”. (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 39ª ed. atual. até 16 de janeiro de 2007, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 1311 e 1312).

[18] Critica-se tal interpretação, vez que, inspirado no princípio isonômico e nos demais elementos balizadores da penhora em prol de créditos dos trabalhadores da residência, não se vê motivo de exclusão daqueles trabalhadores da construção ou reforma da residência. Sendo mesmo, conforme ver-se-á adiante neste trabalho, argumento de defesa a ampliação legal expressa à penhora em bem de família.

[19]  “Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”

[20]  Válida é a lição de Maria Helena Diniz: “O princípio da probidade e o da boa-fé objetiva estão ligados não só à interpretação do contrato, pois, segundo eles, o sentido literal da linguagem não deverá prevalecer sobre a intenção inferida da declaração de vontade das partes, mas também ao interesse social de segurança das relações jurídicas, uma vez que as partes têm o dever de agir com honradez, denodo, lealdade, honestidade e confiança recíprocas, isto é, proceder de boa-fé tanto na tratativa negocial, formação e conclusão do contrato como em sua execução e extinção, impedindo que uma dificulte a ação da outra”. (Código Civil Anotado, 12ª ed. rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 405 e 406).

[21] Neste aspecto, J. M. Carvalho Santos doutrina: “Tal direito, por outro lado, apresenta-se com um caráter social, fundado no interesse que tem a sociedade pela conservação do indivíduo, o que acarreta, como conseqüência, serem havidas como de ordem pública as normas que regulam essa obrigação”. (Código Civil Brasileiro Interpretado, vol. VI, 9ª ed., Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1978, p. 159).

[22] Cf. Theotônio Negrão e José Roberto F. Gouvêa, nota Art. 3°: 1f da Lei n° 8.009/90. (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 39ª ed. atual. até 16 de janeiro de 2007, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 1312).

[23] Cf. CTN, “Art. 32”.

[24] Na feliz expressão de Paulo Carneiro Maia: “De nosso turno, preferimos enunciar que ‘propter rem’ é tipo de obrigação ambulatória, a cargo de uma pessoa, em função e na medida de proprietário de uma coisa ou titular de um direito real de uso e gozo sobre a mesma”. (Enciclopédia Saraiva do Direito, coordenação do Prof. R. Limongi França, vol. 55, São Paulo: Saraiva, 1977, p. 360).

[25] Cf. “Ap 1.0024.03.151413-6/001. 2° Câm. Cív. do TJMG. Julgado em 08/03/2005. RT. v. 837, p. 293. São Paulo: RT. julho, 2005”.

[26] Não é lícito frustrar a expectativa do credor que obteve uma garantia tão considerável e segura no ordenamento processual, notadamente quando oferecida pelo próprio casal ou pela entidade familiar. Os princípios da segurança nos negócios jurídicos e da boa-fé/eticidade não podem ceder espaço frente a injusta interpretação restrita. O foco interpretativo de tal dispositivo deve se dirigir à garantia hipotecária, independente dela advir de uma execução hipotecária em si ou de uma execução comum.

[27] “Art. 5° […]: […]; XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; […]”.

[28] “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187) causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. […]”. “Art. 391. Pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor”.

[29] Cf. Theotônio Negrão e José Roberto F. Gouvêa, nota Art. 3°: 3a da Lei n° 8.009/90. (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 39ª ed. atual. até 16 de janeiro de 2007, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 1312).

[30] Cf. CPC, “Art. 475-N, II”.

[31] “Art. 6° São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

[32] Cf. “RE 407.688, STF-Pleno, rel. Min. Cezar Peluso, j. 8.2.06, negaram provimento, três votos vencidos, DJU 6.10.06, p. 33”.

[33] Cf. “RE 352940-4, STF, rel. Min. Carlos Velloso, j. 25.4.2005”.

[34] “A anulação de fiança prestada sem outorga uxória implica a ineficácia total da garantia”.

[35]v.g.: mansão, residência com piscina e quadra de jogos, imóvel localizado em região nobre, etc”.

[36] Carlos Callage defende a inconstitucionalidade da Lei ao aduzir: “A impenhorabilidade geral do patrimônio pessoal, criado pela Lei 8.009, torna inócuo o princípio universal da sujeição do patrimônio às dívidas, acolhido pela Constituição brasileira (art. 5°, LXVIII, LIV) e atinge o próprio regime econômico básico adotado pela Carta, que pressupõe relações obrigacionais das mais diferentes espécies, suprimindo as garantias e a eficácia coativa do direito de crédito”. (Inconstitucionalidade da Lei 8.009, de 29 de Março de 1990, Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 79, Dezembro de 1990, vol. 662, p. 62/63).  


Informações Sobre o Autor

Fabrizio Rodrigues Ferreira

Advogado. Docente da Universidade do Estado de Minas Gerais. Pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Gama Filho


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