O benefício da flexibilização do direito do trabalho para a ordem econômica brasileira atual

Resumo: Este artigo discute a importância da flexibilização do Direito do Trabalho para a ordem econômica brasileira atual. As regras do Direito do Trabalho não acompanharam a evolução da sociedade, na qual novos fenômenos surgiram, instituindo uma realidade bem diferente daquela em que a maioria dessas regras foi criada. Isso demonstra uma necessidade de readequação a esse novo cenário, o que possibilita uma maior mobilidade e autonomia nos contratos de trabalho, mas sem deixar de preservar as conquistas que asseguram a dignidade da pessoa humana. *


Palavras-chave: Flexibilização; Trabalho; Ordem econômica


Tratando a flexibilização no Direito do Trabalho como um fenômeno de grande relevância que permite mais mobilidade às relações trabalhistas, este artigo busca demonstrar de que modo as questões implicadas nesse processo podem promover maior contratação, possíveis melhorias das condições trabalhistas e mantença das empresas, trazendo para discussão uma análise sobre a rigidez nas regras de trabalho num novo contexto social e econômico influenciado por fenômenos transformadores, como a globalização, robotização, terceirização etc., travando aí uma grande luta entre capital e mão-de-obra.


1. Dos fatos


Numa sociedade dinâmica e progressista, em constante evolução, frente às novas tecnologias e tendências do mundo contemporâneo, faz-se necessário uma revisão no modo de pensar a relação trabalhista e o desenvolvimento socioeconômico e político da sociedade, de modo a promover o bom desempenho da ordem econômica, conjugado ao bem-estar social e à constituição da dignidade da pessoa humana.


Na tentativa de proteger o trabalhador, o Estado atua de forma rígida, engessando as relações trabalhistas e, muitas das vezes, dificultando o surgimento de novos postos de trabalho. O Estado tem um papel constitucional de prover saúde, educação, lazer e cultura para os cidadãos, porém, ao cobrar das empresas uma postura mais paternalista para suprir sua decadência, suprime a autonomia tanto dos empregadores quanto dos empregados e faz com que essa relação torne-se onerosa e desequilibrada.


2. Flexibilização x Desregulamentação


“Flexibilizar” pode ser entendido no sentido de atenuar, equilibrar, ponderar, de forma a evitar a extinção das empresas e o aumento do desemprego, situações que trariam consigo a degradação das condições econômicas para a sociedade como um todo. A flexibilização do Direito do Trabalho, assim, busca respeitar os limites do sistema jurídico nacional, utilizando mecanismos previstos pela própria lei trabalhista, como, por exemplo: negociação coletiva, contratos individuais, convenções, súmulas, entendimento doutrinário; levando-se em conta que o maior objetivo da flexibilização é a mantença das relações de emprego e do pleno exercício das atividades empresarias e industriais.


Para Nascimento (2003, p. 67), a flexibilização “é o afastamento da rigidez de algumas leis para permitir, diante de situações que o exijam, maior dispositividade das partes para alterar ou reduzir os seus comandos”. Brito (2003), por sua vez, afirma que “a flexibilização do Direito do Trabalho é a alteração que ocorre das condições do trabalho tanto no plano coletivo quanto no plano individual, podendo ser benéfica ou maléfica para o trabalhador”, porém podendo trazer reflexos mais abrangentes se avaliada num contexto econômico e social mais amplo, primando pelo bem-estar social e econômico coletivo. A flexibilização do Direito do Trabalho, portanto, seria uma forma de mostrar a necessidade de um esforço conjunto em conciliar a ordem econômica, os princípios da justiça social e a valorização do trabalho.


De acordo com os estudos de Neures e Wilkin comentados por Jatobá e Andrade (1993), em artigo sobre a desregulamentação do mercado e das relações de trabalho no Brasil, as formas mais comuns de flexibilização de Direito do Trabalho tratam de medidas pelas quais as empresas seriam capacitadas para enfrentar a crescente competitividade da economia, podendo-se citar a flexibilidade salarial, que trata da adaptação dos salários às variações, aos choques econômicos e também ao desempenho das empresas. Dessa forma, a alteração no custo do trabalho deve levar em conta o salário propriamente dito e também os encargos sociais. A política salarial, somada aos encargos sociais que envolvem a folha de pagamento e o valor do salário mínimo, é um dos fatores que levam ao aumento do desemprego. Nesse caso, a flexibilização do emprego, buscando responder às mudanças estruturais dos postos de trabalho, funcionaria como um mecanismo para adequação do contingente de trabalhadores das empresas, levando em consideração o progresso tecnológico e as variações que ocorrem nesse contexto.


Nesse período a que se pode chamar de “era pós-industrial”, as transformações das sociedades atuais, em função da revolução tecnológica em curso nas últimas décadas, têm imensa repercussão dentro e fora das empresas. A globalização, a liberação e a mundialização da economia favoreceram a concorrência entre os Estados, submetendo-os à produção em maior escala, com melhor qualidade e menor custo. Com isso, aumenta também a preocupação com o desemprego que advém dessa nova performance. Conforme observam Süssekind et al (2002, p. 204):


“O objetivo primordial da flexibilização nas relações de trabalho foi o de propiciar a implementação de nova tecnologia ou novos métodos de trabalho e bem assim, o de evitar a extinção das empresas, com evidentes reflexos nas taxas de desemprego e agravamento das condições socioeconômicas”.


É preciso ressaltar que não se deve confundir a desregulamentação com a flexibilização, pois enquanto aquela retira a proteção do Estado, permitindo a total autonomia privada, esta pressupõe a intervenção do Estado atuando de forma branda, assegurando as normas básicas, sem as quais não se pode conceber a vida do empregado com dignidade. Há, porém, discordâncias em relação à flexibilização, como observa Martins (2004, p. 13):


“Para uns a flexibilização é o anjo, para outros o demônio. Para certas pessoas é a forma de salvar a pátria dos males do desemprego, para outras é uma forma de destruir tudo aquilo que o trabalhador conquistou em séculos de reivindicações, que apenas privilegiam os interesses do capital”.


Parte da doutrina entende que a flexibilização tem como objetivo lutar contra o desemprego, consequentemente reduzindo ou eliminando custos de produção, o que pode ser harmonicamente benéfico se se respeitar os direitos trabalhistas que asseguram a dignidade da pessoa humana. Por outro lado, para Rocha (1996, p. 369), “a globalização e a constituição de blocos regionais são fatores que devem levar à redução de direitos trabalhistas ou a liberação para que se vinculem às leis de mercado a fim de propiciar a competitividade e a atividade produtiva e lucrativa das empresas”. Assim, a flexibilização, em decorrência do impacto da globalização, pode permitir uma maior mobilidade às relações de trabalho pelas partes e menos pelo Estado, de modo que o Direito do Trabalho seja o regulador do processo econômico.


Mas, vale dizer que, quando se tem em vista o Estado democrático de direito e a dignidade da pessoa humana, não se pode admitir que o mundo seja movido unicamente pelas leis do mercado. É preciso considerar o empregado como parte importante nesse processo, valorizando sua mão-de-obra, reconhecendo suas necessidades básicas (como descanso remunerado, férias, jornada de trabalho, boas condições para trabalhar, segurança na execução de suas funções, salário justo etc.), sendo seu bem-estar fundamental para garantir o resultado esperado pela troca entre empregado e empregador. Dessa forma, a empresa estará oferecendo a oportunidade ao trabalhador de sentir-se útil, com seus direitos assegurados, o que o incentivará a produzir sempre mais e melhor.


O que faz, afinal, com que a flexibilização seja muito discutida mas pouco praticada é a tendência em confundi-la com a desregulamentação, que é a retirada de todas as normas de proteção do trabalhador. Conforme o entendimento das doutrinas existentes a respeito, a flexibilização é viável como uma maneira dinâmica e equilibrada de estipular condições de trabalho pelos instrumentos de negociação entre as partes interessadas, ampliando a implementação do ordenamento legal, possibilitando a adaptação das normas, admitindo derrogação das condições pré-ajustadas para adequá-las a situações conjunturais, momentâneas, circunstanciais.


3. Fatores que motivam a flexibilização do Direito do Trabalho


O direito trabalhista necessita de adaptação à nova realidade social, visto que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), à época de sua elaboração, retratava uma sociedade e uma história bem diferentes das de hoje, o que certamente atua sobre sua capacidade de equilibrar as relações de forma a permitir que haja uma combinação de tutela com a função ordenadora dos interesses recíprocos dos parceiros sociais, retratando e cuidando das peculiaridades de cada momento histórico.


Em uma época marcada por grandes mudanças sociais, econômicas e políticas, abre-se caminho para inovações, devendo estas conter preceitos mais gerais, a fim de proporcionar maior espaço para a negociação coletiva, em que os sindicatos possam negociar em prol dos trabalhadores com flexibilidade na aplicação, levando em conta as peculiaridades regionais, empresariais e profissionais. Em momentos de crise geral ou específica, a resposta que se oferece aos problemas não deve ser autoritária, burocrática e engessada, ao contrário, deve buscar uma solução descentralizada e fundada no diálogo social.


Com as mudanças trazidas pela globalização no mundo do trabalho, é preciso uma nova forma de pensar e agir dos interessados – Estado, sindicatos, empregados e empregadores– para alcançar um equilíbrio, de modo a promover a eficiência econômica com justiça social, assegurando o cumprimento dos princípios básicos do Direito do Trabalho e da dignidade da pessoa humana, conciliando-os com a necessidade de crescimento das empresas, que beneficia toda a sociedade, com aumento da oferta de emprego e renda.


Por outro lado, existe uma realidade que não pode deixar de ser considerada. Nas palavras de Rudiger (1999, p. 244-245):


“Há uma enfermidade na civilização atual: a frustração da finalidade primordial de felicidade humana em razão das incertezas, desconfianças, inseguranças que estão apoiadas na ideologia da sociedade industrial desenvolvida que tolhe o cidadão da libertação das políticas sobre a qual ele não tem controle eficaz algum. O pensamento individual é aquele absorvido pela comunicação e doutrinação em massa somado àqueles que orgulhosos se autodeterminam – formadores de opiniões – e que forjam a opinião pública e perpetuam no poder esferas políticas pouco interessadas em algo que vá além da própria pele”.


O processo de globalização demonstra que as relações de trabalho, de um modo geral, devem ser modernizadas para uma melhor harmonização regional, e mesmo internacional, entre as relações trabalhistas, econômicas e jurídicas, tendo em vista que os empresários e investidores estrangeiros são mais atraídos, dentre outros aspectos, por legislações mais flexíveis e com menos encargos trabalhistas. O que nos remete ao entendimento de que os conflitos entre o capital e o trabalho não encontram mais soluções por meio da tutela estatal, que, com o tempo, mostra-se incapaz de solucionar conflitos dessa natureza, já que reflete uma imposição e não uma necessidade das partes. Dessa forma, força os interessados a uma solução conjunta dos problemas que lhes afligem, ensejando que os envolvidos abram espaço para o diálogo e negociem condições favoráveis aos seus interesses sem a interferência estatal.


Com base na existência de teorias favoráveis e contra à flexibilização no Direito do Trabalho, observa-se que os tribunais brasileiros tratam de forma divergente o assunto frente aos conflitos provenientes das relações trabalhistas, produzindo decisões que demonstram não haver uma comum deliberação sobre o assunto.


Em decisão da 8ª Turma da Justiça de Trabalho de Minas Gerais, quanto à negociação coletiva e sua validade, em um caso que trata do tempo destinado para a uniformização do trabalhador, fundamenta-se: “A Constituição da República reconhece os instrumentos coletivos como mecanismos disciplinadores das relações trabalhistas, acolhendo a flexibilização das normas que regem o contrato laborativo e estimulando a negociação, consoante a redação do art. 7º, XXVI” (MINAS GERAIS, TRT, 01328-2007-108-03-00-0 – RO, Rel. Márcio Ribeiro do Valle, 2008). A decisão conclui que não há jornada extraordinária no período que o trabalhador destinou exclusivamente à uniformização.


Em outra decisão, da 1ª Turma da Justiça do Trabalho de Minas Gerais, no processo sobre jornada de trabalho e a compensação, tem-se que:


“A flexibilização do direito do trabalho não tem condão de derrogar cláusulas pétreas constitucionalmente instituídas, a merecer amparo e apreço representativo da categoria profissional, sob pena de expor o empregado premido pelo temor reverencial e subjugado pelo fantasma do desemprego, a abrir mão de prerrogativa inerente à qualidade de vida, em detrimento pessoal e da própria empresa que sofrerá no seu processo produtivo pelo desgaste físico da mão de obra” (MINAS GERAIS, TRT, 20195/99 – RO, Rel. Juíza Maria Lúcia Cardoso Magalhães, 2000).


No que tange às decisões que desprestigiam o acordo coletivo, observa-se que os próprios juristas e tribunais entendem que a representatividade muitas vezes leva em conta interesses próprios da entidade, deixando de defender o interesse da coletividade a qual representa.


Em artigo publicado no Valor Econômico em 14 de abril de 2009, João Caetano comenta:


“A depender do presidente do TST, ministro Milton de Moura França […] os conflitos trabalhistas gerados a partir da crise econômica sequer chegariam à Justiça do trabalho. “Sempre incentivei as partes a negociarem à exaustão, pois elas é que conhecem as peculiaridades de suas relações”, afirma. De acordo com o ministro, desde que o tema não envolva saúde, higiene e segurança do trabalho, há espaço para compatibilizar direitos. “As partes devem avaliar até onde podem chegar” (CAETANO, 2009).


Demonstradas as divergências doutrinárias e jurisprudenciais quanto à flexibilização no Direito do Trabalho, é possível destacar algumas regras que possuem um caráter meramente rígido. E pode-se perceber também que a permissão de acordo entre as partes na escolha, demonstrada a autonomia da vontade, sempre observando os princípios e direitos básicos do trabalhador, não traz nenhum prejuízo econômico para a parte “hipossuficiente”, podendo trazer grandes benefícios para a empresa e, consequentemente, refletir-se na esfera econômica como um todo.


Nesse sentido, vale citar o caso do aviso prévio, em que cabe exclusivamente ao trabalhador a escolha da redução de duas horas diárias ou redução dos sete dias para o seu cumprimento. Ficar essa opção a cargo da empresa não traz nenhuma redução nas verbas rescisórias a que o trabalhador tem direito. Outro exemplo seria o artigo 468 da CLT, que prevê a nulidade das condições do contrato de trabalho quando houver prejuízo para o trabalhador, ainda que indiretamente.


A compensação de horas, obedecida a jornada mensal legal permitida, para atender aumento ou redução da produção numa empresa, seja para evitar novas contratações, seja para evitar demissões, é de grande importância tanto para o trabalhador quanto para a empresa. Porém, existe uma certa rigidez quanto a isso na prática, considerando que nos dias em que trabalha mais, o trabalhador faz jus a horas extras.


4. A importância das empresas frente à nova realidade da sociedade atual e a rigidez das normas trabalhistas


Nas ultimas três décadas do século XX, o crescimento industrial dos países capitalistas, iniciado após a Segunda Guerra Mundial, entrou em evidência, ao gerar uma crise de valores em que a superprodução global contrasta com o declínio da margem de lucro do capital e conduz ao aumento do desemprego, ao empobrecimento de parte da população e à diminuição de demanda do consumo.


Frente a esses fatores, surge a necessidade de reestruturar a economia. A flexibilização do Direito do Trabalho surge, assim, como um benefício preponderante que reafirma a autonomia da vontade entre as partes para viabilizar a mantença do emprego e tornar a relação trabalhista vantajosa para ambas as partes, fazendo com que, nesse contexto, seja possível atender a requisitos básicos para a manutenção de qualquer relação socioeconomicamente viável e humana.


A importância das empresas é inegável para a ordem econômica , como observado pela própria Organização Internacional do Trabalho (OIT): “As empresas bem sucedidas estão no coração de qualquer estratégia para criar emprego e melhorar os níveis de vida”. Para Coelho (2006, p. 19),


“o conceito de empresa pode ser entendido como a atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, cuja marca essencial é a obtenção de lucros, com o oferecimento ao mercado de bens ou serviços, gerados estes mediante a organização dos fatores de produção (força de trabalho, matéria prima, capital e tecnologia)”.


A empresa é um importante agente de transformação da sociedade e vem assumindo atualmente novos papéis tendo como grande desafio superar a evidente contradição entre a sobrevivência e o crescimento, tendo ainda que cuidar da humanização do trabalho e do resgate da dignidade da pessoa humana.


A empresa é um dos mais importantes fenômenos econômicos e políticos da sociedade por ser responsável pela produção de bens e serviços, pela circulação de riquezas e pela geração de empregos, o que evidencia o caráter fundamental da flexibilização, que concorre para maior mobilidade e capacidade de acordo entre as partes. Nesse contexto, o Estado deveria cumprir seu papel, ao invés de superproteger o trabalhador, revisando toda a carga tributária e os encargos trabalhistas que acabam por engessar o crescimento das organizações, reduzindo as perspectivas que poderiam contribuir para maior valorização dos trabalhadores. Assim, segundo Pastores (apud CASTELO, 2000, p.36), “o Brasil sofre, dentre outros fatores, com grandes encargos sociais. A figura 1 mostra que para cada folha de salários que custe 100 unidades monetárias, as empresas gastam quase 92 unidades adicionais com encargos sociais. Ao se incluir o 13º salário, isso chega 102%”.


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Dentre esses países, apenas a França chega perto do Brasil. A Itália gasta 51%, a Bélgica, 45% e a Dinamarca, aproximadamente 12%; a Alemanha, 60%, a Inglaterra, 58,8% e a Holanda, 51% (CASTELO, 2000). A tributação no Brasil é muito alta, equivalente a de países desenvolvidos, considerando as alíquotas e as bases de cálculos dos tributos cobrados pelos entes tributantes. Ainda assim, faltam recursos para investimentos na infra-estrutura econômica e social, pois há grande controle dos gastos públicos e desvios de finalidade, nos três níveis de governo. E é por isso que cresce a arrecadação, cresce o gasto público, e a situação social do país continua precária, sem nem ao menos assegurar os direitos básicos e essenciais para a dignidade da pessoa humana.


Para alcançar a eficiência econômica, atingir seu objetivo e cumprir seu papel, a empresa tem que considerar os diferentes fatores que interferem na produção e seus preços. Qualquer bem pode ser produzido com diferentes combinações de vários fatores, é compreensível que haverá a substituição de uns pelos outros no intuito de minimizar os custos, permitir a concorrência e garantir o pagamento das despesas.


Numa pesquisa realizada em 2004, o SEBRAE demonstra que, efetivamente, duas importantes causas de extinção de empresas no país devem-se a problemas de políticas públicas e arcabouço legal, o que reforça a ideia de que o Estado, além de não cumprir seu papel elencado na Constituição Federal, de prover condições dignas para a sobrevivência de seus cidadãos, ainda não contribui para o crescimento das empresas, cuja atuação na manutenção da vida em sociedade é de reconhecida importância.


Nesse cenário, as empresas só demandarão trabalho quando lhes for rentável. As contratações são viáveis somente quando trazem mais receita do que custo. Acredita-se que esse entendimento poderia ser menos calculista se houvesse mais flexibilização no Direito do Trabalho para que as partes decidissem as regras que pudessem reger a relação, sempre assegurando os princípios básicos da dignidade dos trabalhadores[1]. A importância das empresas fica mais do que atestada, em face ao destaque dado ao clamor do país que precisava de uma nova legislação que trouxesse maior segurança ao empresário e à empresa, uma vez que ambos são a força motriz da economia nacional.


No contexto empresarial, muitos elementos são essenciais, como o lucro, o mercado, a concorrência, a competitividade , a produtividade, a tecnologia, o planejamento, os processos, a visão de marketing, a qualidade, o produto, a informação, a reengenharia, e acima de tudo, as pessoas, o ser humano, causa e fim de toda atividade empresarial. Diante de qualquer dificuldade, o primeiro elemento afetado é sempre o homem. Essa consequência pode ser significativamente amenizada se as organizações tiverem incentivos fiscais por parte do Estado, se os encargos sociais forem mais justos, se houver melhor capacitação profissional e se os trabalhadores forem efetivamente capazes de se ver como sujeitos de direitos e deveres. Cria-se, desse modo, a possibilidade de equilibrar as relações e, assim, contribuir para que as empresas desenvolvam um verdadeiro processo de participação transparente, envolvendo as pessoas e tendo nessa postura não só um discurso, mas uma atitude. Uma atitude no sentido de adotar sempre ações concretas para fortalecer as relações interpessoais, fazendo com que todos se sintam motivados e valorizados. Nesse sentido, ressalta-se a posição de Oliveira apud Fernandes (1994, p.12), para quem “a participação dos cidadãos é essencial para consolidar a democracia e uma sociedade civil dinâmica é o melhor instrumento de que dispomos para reverter o quadro de pobreza, violência e exclusão social que ameaça os fundamentos de nossa vida em comum”.


5. Considerações finais


Cumpre, por fim, entender que o Direito se intercala em todos os sentidos e se vincula a todas as questões sociais, econômicas, individuais, coletivas. Quando observado um desequilíbrio dessa natureza, com tantas obrigações para as empresas numa disputa de forças em que o “leão” é o Estado, com toda carga tributária e encargos sociais, e os anões são as empresas e os trabalhadores, percebe-se que é urgente uma reforma para que o Estado seja capaz de promover uma melhor construção da sociedade, criando condições para que todos sejam, efetivamente, sujeitos de direitos e possam lutar por seus interesses, cumprir seus deveres, ter acesso a uma vida digna, com alcance das condições básicas de cidadania. Isso só será possível a partir do momento em que houver maior participação do Estado na compreensão de que pode contribuir com redução na carga tributária. E, ainda, com o tratamento diferenciado para as pequenas e microempresas, permitindo que estas sobrevivam, atendendo a seus objetivos, capaz de oferecer melhores condições de trabalho para os profissionais envolvidos e, assim, construir uma cadeia colaborativa, capaz de se consolidar por si ao longo da história.


Nos textos constitucionais, a ordem econômica vem junto com o trabalho, como observado desde a Constituição de 1934, que traz um rol de direitos sociais, os quais aparecem dentro da ordem econômica e social. No entanto, na Constituição Federal de 1988, os direitos sociais aparecem no Titulo II e a Ordem econômica continua em seu capítulo próprio, agora com o título “Da Ordem Econômica e Financeira”, de forma que o trabalho é observado em vários dispositivos até chegar à ordem econômica.


Assim dispõe o artigo 170 da Constituição Federal de 1988: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social […]” (BRASIL, 2010, p.60). O trabalho sempre esteve junto com a ordem econômica, podendo-se afirmar que não se trata de um castigo, mas de um instrumento de dignificação, pois tudo o que nasce do trabalho é bom, justo e útil. Dessa forma, a riqueza e o capital são, tanto quanto o trabalho, providenciais, o que permite atribuir ao trabalho excelência e superioridade incontestáveis sobre a riqueza e o capital.


Em função dos princípios que regem a ordem econômica, observa-se que sua consecução torna-se possível a partir do momento em que as empresas alcançarem seus objetivos, possibilitando, assim, que estas possam cumprir seu importante papel de provedoras de emprego, serviços e produtos, contribuindo para a arrecadação de impostos e a circulação de riqueza – o que confirma que as empresas merecem especial atenção de todos os setores.


 


Referências:

BRASIL. Lei nº 11.101 de 9 de fevereiro de 2005 (Código Civil). Diário Oficial da União. Brasília, 9 de fevereiro de 2005.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição Federal do Brasil: promulgada em cinco de outubro de 1988. Brasília, Casa Civil, Subchefia de Assuntos Jurídicos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 15 mar. 2010.

CAETANO, João. Crise impõe novo desafio à justiça do trabalho no país. Jornal Valor Econômico. 14 abr. 2009. Disponível em: <http://www.valoronline.com.br/?impresso/legislacao_&_tributos/197/5516258>. Acesso em: 03 mai. 2010.

CASTELO, Jorge Pinheiro. O Direito do Trabalho do século novo. Revista Jurídica Consulex. n. 48. p.33-43. dez. 2000.

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JATOBÁ, Jorge; ANDRADE, Everaldo Gaspar Lopes. A desregulamentação do mercado e das relações de trabalho no Brasil: potencial e limitações. Brasília: IPEA, Agosto 1993.

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MINAS GERAIS. TRT. 1ª Turma. Relatora Juíza Maria Lúcia Cardoso Magalhães Processo: 20195/99 – RO, julgado aos 25 de agosto de 2000.

MINAS GERAIS. TRT. 8ª Turma. Relator Márcio Ribeiro do Valle. Processo: 01328-2007-108-03-00-0 – RO, julgado aos 23 de julho de 2008 e publicado aos 02 de agosto de 2008.

ROCHA, Euclides Alcides da. Desregulamentação do direito do trabalho. Repertório IOB de Jurisprudência. São Paulo, n. 21, p. 369, nov. 1996.

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SUSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 20. ed. São Paulo: Ed. LTr, 2002.

 

Notas:

* Artigo apresentado à Prof.ª Ana Carolina, da Pós-graduação em Direito do Trabalho da Faculdade Damásio de Jesus.

[1] Veja-se, nesse sentido, o que dispõe a Lei n. 11.101, sobre a “Recuperação Judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária” (BRASIL, 2005).


Informações Sobre o Autor

Sueli Alves de Oliveira

Bacharel em Direito pela Faculdade Estácio de Sá


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