Resumo: O artigo aborda a discussão sobre os limites do requisito objetivo de miserabilidade, imposto pela Lei Orgânica da Assistência Social, para a concessão do benefício de amparo assistencial ao idoso e ao portador de deficiência, notadamente após o julgamento da ADIN 1232-1 e do reconhecimento de repercussão geral no RE 567985.
Palavras-chave: Benefício de amparo assistencial ao idoso e ao portador de deficiência. LOAS. Conceito de miserabilidade. Divergência doutrinária e jurisprudencial. ADIN 1232-1. Recurso Extraordinário 567985.
Sumário: 1. Introdução; 2. O artigo 20, parágrafo terceiro da Lei 8.742/93; 3. A relativização do critério legal de miserabilidade; 4. Do julgamento da ADI 1.232-1/DF pelo Supremo Tribunal Federal; 5. Do julgamento do recurso Extraordinário nº 567985; 6.Conclusão.
1. Introdução:
O presente artigo busca tratar da divergência doutrinária e jurisprudencial envolvendo o requisito objetivo de miserabilidade utilizado pela Lei 8.742/93 em seu artigo 20, parágrafo terceiro.
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sustenta que referido requisito é objetivo e taxativo, não podendo ser afastado ou mitigado em nenhuma situação.
Já os beneficiários argumentam que esse requisito seria apenas um dos elementos possíveis para a aferição da miserabilidade, não excluindo outros elementos de prova que possam vir a ser colhidos pela Autarquia Federal ou pelo Poder Judiciário.
A despeito de o Supremo Tribunal Federal ter decidido pela constitucionalidade do referido dispositivo, a discussão sobre a sua extensão continua trazendo milhares de ações judiciais ao Judiciário, culminando no recente reconhecimento de repercussão geral da matéria, pela Colenda Suprema Corte, conforme será exposto no presente trabalho.
2. O artigo 20, parágrafo terceiro da Lei 8.742/93:
O artigo 20, parágrafo terceiro da Lei 8.742/93 preconiza que estará em situação de miserabilidade o idoso ou portador de deficiência cuja renda mensal per capita da família seja inferior a um quarto do salário mínimo.
Esse é, sem dúvida alguma, o requisito mais tormentoso e polêmico do benefício assistencial de prestação continuada, gerando infindáveis questionamentos judiciais e doutrinários acerca do tema, mesmo após decisão do Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado de constitucionalidade.
A problemática se refere, notadamente, aos limites do Poder Judiciário na interpretação de normas jurídicas, em especial aquelas que atingem diretamente os indivíduos considerados hipossuficientes, como ocorre em situações que envolvem a assistência social.
Isso porque os defensores mais ferrenhos da doutrina da separação dos poderes sustentam que ao Poder Judiciário caberia apenas a verificação acerca da presença dos requisitos objetivos previstos em Lei.
Se estiver ausente qualquer desses pressupostos, o benefício deveria ser indeferido, uma vez que, do contrário, o Poder Judiciário estaria usurpando função constitucional típica do Poder Legislativo, em clara violação ao cânone da separação dos poderes.
Essa tese vem sendo sustentada repetidas vezes pelo Instituto Nacional do Seguro Social, o qual invoca que caso reste demonstrado que a renda per capita familiar é superior a um quarto do salário mínimo vigente, o benefício deverá ser indeferido.
Outro ponto central da defesa do INSS reside no fato de que a Administração Pública, deve estrita observância ao princípio da legalidade, previsto no artigo 37 da Constituição Federal, não sendo possível mitigar a aludida norma legal para beneficiários cuja renda per capita ultrapassa o limite previsto no referido dispositivo legal, mesmo que estejam presentes circunstâncias peculiares que pudessem conduzir à alguma situação de pobreza.
A Autarquia Federal ainda invoca a necessidade de se cuidar do equilíbrio financeiro do sistema previdenciário e assistencial, que estaria em risco se mitigados pressupostos expressamente exigidos pela legislação.
Entretanto, a jurisprudência que prevalece nos tribunais é no sentido de relativizar o critério objetivo previsto no artigo 20, parágrafo terceiro da Lei 8.742/93.
3. A relativização do critério legal de miserabilidade:
Conforme exposto, a despeito de a Lei 8.742/93 estabelecer um parâmetro objetivo para fins de aferição da presença ou ausência de miserabilidade, a jurisprudência dominante vem afastando a aplicação irrestrita desse requisito, analisando outras circunstâncias sociais que eventualmente indiquem, no caso concreto, que o beneficiário não possui condições de prover o seu sustento.
Essa interpretação da legislação está fundamentada em princípios constitucionais que devem nortear a atuação estatal, no que concerne à Assistência Social.
O artigo 1º da Carta da República é claro ao estabelecer que o Brasil é um Estado Democrático de Direito e que tem como fundamento a dignidade da pessoa humana.
Aduz o aludido dispositivo:
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político.”
Em seu artigo 3º, a Constituição Federal preconiza que são objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a constituição de uma sociedade livre, justa e solidária, erradicar a pobreza, a marginalização, reduzir as desigualdades sociais e regionais, bem como promover o bem de todos.
Diz a norma constitucional:
“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;
II – garantir o desenvolvimento nacional;
III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”
Dessa forma, ao interpretar os requisitos que regem a concessão de benefícios assistenciais, o Poder Judiciário levaria em conta, além dos pressupostos de ordem objetiva, outras circunstâncias de ordem subjetiva trazidas ao processo, e que autorizem a conclusão de que aquela pessoa se encontra em um estado de miserabilidade, e que não pode ter o seu sustento amparado por si ou pessoa de sua família.
Portanto, o artigo 20, parágrafo terceiro da Lei Orgânica da Assistência Social estabeleceria, uma presunção de miserabilidade, vale dizer, aquele que se enquadre naquele quantum de renda per capita previsto no dispositivo teria presunção de que não possui condições de prover o seu sustento ou tê-lo provido por sua família.
Contudo, não lhe seria vedado demonstrar a sua miserabilidade por outros elementos constantes dos autos.
Esse é o entendimento da jurisprudência do Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região, conforme ementa a seguir transcrita:
“CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. CONCESSÃO. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº. 8.742/93. ABONO ANUAL INDEVIDO. BENEFÍCIO PERSONALÍSSIMO E INACUMULÁVEL. REVISÃO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1 – Comprovada a incapacidade para o trabalho através de laudo pericial e demonstrada a insuficiência de recursos para a própria manutenção ou de tê-la provida pela família, é de se conceder o benefício, nos termos do art. 203, V, da Constituição Federal, regulamentado pela Lei nº 8.742/93 e Decreto nº 6.214/07. 2 – O art. 20, §3º, da Lei n.º 8.742/93 ao prever o limite de ¼ do salário-mínimo, estabeleceu uma presunção da condição da miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos por outros meios de prova. 3 – Tendo em vista sua ratio legis, o disposto no art. 34 da Lei nº 10.741/03, segundo o qual “O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar “per capita” a que se refere a Loas”, aplica-se à hipótese dos autos, com fundamento nos arts. 4º e 5º da LICC, para alcançar todos os demais benefícios previdenciários de igual valor. 4 – Indevido o abono anual, pois o art. 201, §6º, da Constituição Federal que o disciplina, refere-se apenas aos aposentados e pensionistas. Ademais, o amparo assistencial não deriva de desempenho laborativo e nem o substitui. 5 – Benefício personalíssimo e inacumulável com qualquer outro da Previdência Social ou de regime diverso, salvo o da assistência médica. 6 – Nos termos dos arts. 21 da Lei nº 8.742/93 e 42 do Decreto nº 6.214/07, o benefício deve ser revisto a cada 2 (dois) anos, para a avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. 7 – Havendo requerimento administrativo, o benefício assistencial deve ser concedido a partir de tal data. No entanto, dada a ausência de impugnação da parte autora e, em observância ao princípio da non reformatio in pejus, deve ser mantido como dies a quo a data do ajuizamento da ação, nos termos da r. sentença monocrática, não havendo, portanto, que se falar em prescrição parcelar. 8 – Correção monetária das parcelas em atraso nos moldes do Provimento nº 64/05 da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região, da Lei nº 6.899/81 e das Súmulas no 148 do Colendo Superior Tribunal de Justiça e nº 8 deste Tribunal. 9 – Tendo o INSS sido citado já na vigência do atual Código Civil, os juros de mora são devidos à razão de 1% (um por cento) ao mês, contados a partir da citação, nos termos do art. 219 do Código de Processo Civil e art. 406 do Código Civil, c.c. o art. 161, §1º, do Código Tributário Nacional. 10 – Honorários advocatícios reduzidos para 10% (dez por cento) sobre a soma das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, de acordo com o entendimento desta Turma. 11 – Apelação parcialmente provida. Parecer do MPF acolhido. Tutela antecipada mantida. AC – APELAÇÃO CÍVEL – 1367067. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES.”
O Superior Tribunal de Justiça também tem decidido em semelhante sentido, preconizando ser possível que o beneficiário, seja ele idoso ou portador de deficiência, comprove a sua situação de miserabilidade por outros meios à disposição no ordenamento jurídico:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
AFERIÇÃO DA RENDA PER CAPITA POR OUTROS MEIOS QUE NÃO O CRITÉRIO DE 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. POSSIBILIDADE. COMPROVAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA N. 7/STJ.
1. É firme o entendimento desta Corte no sentido de que a condição de hipossuficiência para fins de obtenção de benefício assistencial pode ser aferida por outros meios de prova além da limitação legal relativa ao requisito econômico previsto na Lei nº 8.742/93.
2. Concluindo o Tribunal de origem, com fulcro nas provas produzidas, que a parte autora faz jus ao benefício assistencial porquanto demonstrada a situação de miserabilidade da entidade familiar, a inversão do julgado esbarra no enunciado nº 7 desta Corte.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1265039/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 20/09/2011, DJe 28/09/2011).
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL.
AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS.
VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 7/STJ. INCIDÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL. RECONHECIMENTO. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SOBRESTAMENTO. NÃO APLICAÇÃO.
1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.
2. “A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.” (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).
3. Assentando a Corte Regional estarem demonstrados os requisitos à concessão do benefício assistencial, verificar se a renda mensal da família supera ou não um quarto de um salário-mínimo encontra óbice no Enunciado n.º 7 da Súmula da Jurisprudência deste Tribunal.
4. O reconhecimento de repercussão geral pelo colendo Supremo Tribunal Federal, com fulcro no art. 543-B do CPC, não tem o condão de sobrestar o julgamento dos recursos especiais em tramitação nesta Corte.
5. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(AgRg no REsp 1267161/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 28/09/2011).
Contudo, a despeito da inclinação da jurisprudência para a admissão de outras formas de prova acerca da situação de miserabilidade, a questão ainda está longe de estar pacificada no âmbito judicial.
Isso porque o Instituto Nacional do Seguro Social continua a interpor recursos e reclamações constitucionais, levando a matéria novamente ao debate do Supremo Tribunal Federal, sustentando, além dos argumentos já expostos, a violação do quanto decidido na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF.
Em virtude da relevância do tema, a referida ADIN será tratado com maior detalhamento a seguir.
4. Do julgamento da ADI 1.232-1/DF pelo Supremo Tribunal Federal:
O Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão quando julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1.232-1/DF, cuja ementa é a seguinte:
“Ementa: Constitucional. Impugna dispositivo de lei federal que estabelece o critério para receber o benefício do inciso v do art. 203, da CF. Inexiste a restrição alegada em face ao próprio dispositivo constitucional que reporta à lei para fixar os critérios de garantia do benefício de salário mínimo à pessoa portadora de deficiência física e ao idoso. Esta lei traz hipótese objetiva de prestação assistencial do Estado. Ação julgada improcedente.”
Consoante se extrai da aludida ementa, o Supremo Tribunal Federal, quando o julgamento da referida ação direta de inconstitucionalidade, acabou por reafirmar que o artigo 203, inciso V da Constituição Federal é norma constitucional de eficácia limitada, que depende de regulamentação infraconstitucional para irradiar os seus efeitos.
Asseverou ainda que competiria à legislação ordinária estabelecer os requisitos e pressupostos para a concessão do benefício de amparo assistencial ao idoso e ao portador de deficiência, não havendo qualquer inconstitucionalidade no fato de a Lei 8.742 de 1993 ter escolhido o limite de um quarto do salário mínimo para fins de renda per capita.
Entretanto, a despeito de ação ter sido julgada improcedente e de tal decisão possuir efeitos vinculantes e erga omnes, já que se trata de controle concentrado de constitucionalidade, as instâncias inferiores do Poder Juiciário continuaram considerando que esse não seria o único meio de se provar a miserabilidade exigida para a concessão do benefício, consoante já exposto.
Por isso, o Instituto Nacional do Seguro ajuizou diversas reclamações e interpôs recursos extraordinários perante o Egrégio Supremo Tribunal Federal contra as decisões que se afastassem do entendimento exposto na referida ADIN.
O Supremo Tribunal Federal tem julgado procedentes as reclamações ajuizadas pela Autarquia Federal, conforme ementa a seguir transcrita:
“EMENTA: PREVIDÊNCIA SOCIAL. Benefício assistencial. Lei nº 8.742/93. Necessitado. Deficiente físico. Renda familiar mensal per capita. Valor superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo. Concessão da verba. Inadmissibilidade. Ofensa à autoridade da decisão proferida na ADI nº 1.232. Liminar deferida em reclamação. Agravo improvido. Ofende a autoridade do acórdão do Supremo na ADI nº 1.232, a decisão que concede benefício assistencial a necessitado, cuja renda mensal familiar per capita supere o limite estabelecido pelo § 3º do art. 20 da Lei federal nº 8.742/93. Rcl 4427 Mc-Agr / RS – Rio Grande Do Sul.
Ag.Reg.Na Medida Cautelar Na Reclamação
Relator(a): Min. CEZAR PELUSO
Julgamento: 06/06/2007. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.”
No mesmo sentido, o seguinte precedente da Suprema Corte acerca da matéria:
“ASSISTÊNCIA SOCIAL – INCISO V DO ARTIGO 203 DA CARTA FEDERAL – LEI Nº 8.742/93 – CONSTITUCIONALIDADE – PRECEDENTE DO PLENÁRIO. É constitucional a insuficiência tarifada do § 3º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 – visão da ilustrada maioria, proclamada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF.
(AI 467633 AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 26/04/2007, DJe-072 DIVULG 02-08-2007 PUBLIC 03-08-2007 DJ 03-08-2007 PP-00069 EMENT VOL-02283-06 PP-01148).
5. Do julgamento do recurso Extraordinário nº 567985:
Entretanto, o tema será novamente analisado pelo plenário do STF, já que houve o reconhecimento de repercussão geral no recurso extraordinário 567985, cuja ementa é a seguinte:
“REPERCUSSÃO GERAL – BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA – IDOSO – RENDA PER CAPITA FAMILIAR INFERIOR A MEIO SALÁRIO MÍNIMO – ARTIGO 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Admissão pelo Colegiado Maior.”
O referido recurso foi interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social, contra decisão da Turma Recursal do Mato Grosso, sob o argumento de que o critério de miserabilidade teria sido alterado de um quarto para meio salário mínimo, tendo em vista as Leis 9533/97 e 10689/2003.
O INSS sustentou violação ao artigo 203, inciso V da Constituição Federal, que fora regulamentado pela Lei 8.742/93, bem como violação ao quanto decidido na ADIN 1232-1.
A colenda Suprema Corte reconheceu a repercussão geral da matéria debatida, cumprindo o aguardo da decisão final pelo plenário da Corte.
6. Conclusão:
De todo o quanto exposto, verifica-se que o benefício de amparo assistencial ao idoso e ao portador de deficiência é uma importante política pública para materialização da assistência social, destinada a amparar e proteger aqueles que se encontram em situação de miserabilidade que põe em risco a sua própria subsistência.
Em virtude disso, toda discussão acerca do referido benefício ganha contornos mais problemáticos, já que a orientação que se firmar na jurisprudência acabará por repercutir em milhares de ações judiciais, impactando diretamente os cofres da assistência social.
Há, portanto, evidente colisão entre dois princípios constitucionais fundamentais. De um lado, o princípio da legalidade e o equilíbrio financeiro atuarial de um sistema de assistência social que deve ser economicamente saudável para poder custear a sobrevivência de milhares de brasileiros em situação de miséria. De outro, a materialização do princípio da dignidade da pessoa humana como centro do Estado Democrático de Direito, o que possibilitaria que o Poder Judiciário, caso a caso, verificasse se existem outros elementos aptos a demonstrar a situação de miserabilidade suscitada, além do requisito objetivo da renda “per capita”.
Neste momento, resta apenas aguardar o pronunciamento final do Supremo Tribunal Federal sobre a questão, em sede de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida, cuja decisão repercutirá diretamente na vida de milhares de brasileiros e brasileiras, de uma forma ou de outra.
Informações Sobre o Autor
Rubens José Kirk de Sanctis Junior
Procurador Federal da Advocacia-Geral da União. Professor universitário e de curso preparatório para concursos públicos.