Resumo: O trabalho visará buscar os elementos necessários para estender as imunidades constitucionais enfatizando a força e legalidade da Umbanda como Religião originalmente brasileira, essa, que em pais como o nosso (Brasil) de onde vários povos migraram e trouxeram suas particularidades étnicas culturais e também já religiosas, é inevitável pensar que estas culturas iriam se misturar e gerar uma outra, mais ampla e diversificada no caso a criação da Umbanda. E sendo essa Religião Umbanda denominada assim por um Estado laico, visa também buscar todos os benefícios atribuídos as demais religiões registradas em nosso país.[1]
Palavras-Chave: Brasil. Religiões. Imunidade tributária. Tributos. Religiões de Matriz africana. Umbanda. Liberdade de Crença. Liberdade de Culto. Tributos.
Abstract: The work will aim to seek the necessary elements to extend the constitutional immunities emphasizing the strength and legality of the original Brazilian Umbanda religion as this, that in countries like ours (Brazil) where various peoples migrated and brought their cultural and ethnic peculiarities have also religious it is inevitable to think that these cultures would mingle and generate another, broader and more diverse if the creation of Umbanda. And being this so called religion Umbanda a secular state, also aims to pursue all benefits granted other registered religions in our country.
Keywords: Brazil. Religions. Tax immunity. Taxes. Religions of Africa. Umbanda. Freedom of Belief. Freedom of Worship. Taxes.
Sumário: Introdução. 1. O marco legal das imunidades tributárias aos centros religiosos no Brasil. 1.1. Imunidades e isenções no direito tributário brasileiro. 1.2. Direitos fundamentais e a liberdade de exercício de crença religiosa. 2. A umbanda como religião no Brasil. 2.1. O histórico da umbanda e suas características. 2.2. Dados estatísticos sobre o exercício da religião umbandista. 3. Os obstáculos para a garantia da imunidade aos centros de umbanda. 3.1. O pagamento dos trabalhos/serviços que são feios nas casas de religião de matriz africana. 3.2. A questão templo vs moradia e a jurisprudência. 4. Considerações finais. Referências.
INTRODUÇÃO
Nesse contexto histórico e social, relativamente novo, em vista de outras religiões já conhecidas e conceituadas por um período bem visto e conhecido de toda Historia da humanidade, é que se buscam afirmações que possam dar respaldo necessário à Religião da Umbanda e aos seus Centros de Umbanda, que queiram pleitear o direito de não mais pagar os tributos na forma do IPTU assim já firmado na Carta Magna (Constituição Federal de 1988) em seu artigo 150 VI alínea b e §4º (templos de qualquer culto).
Este estudo faz-se necessário, pois onde o reconhecimento das religiões de matriz africana (Candomblé, Umbanda e outras), tem dificuldades em ter um destaque maior na sociedade brasileira, e ainda tem muitas vezes seus ritos, cultos e liturgias, mal interpretados, imitados, zombados de forma errônea e ainda o que é pior, de maneira jocosa, pejorativa e preconceituosa inclinando-se às vezes até para uma opinião racista.Em todos os veículos de comunicação, principalmente os de grande massa, como revistas e jornais impressos, radio e TV onde diversas vezes são expressas sátiras, crônicas, comentários de Pais de santo ou Mães de Santo em situações geralmente duvidosas.
Do modo como é tratado o assunto religião no Brasil, estabelecido como um país de Estado laico, tendo a liberdade religiosa fundamentada na legislação constitucional, esse trabalho visa demonstrar a existência e legitimidade das religiões de matriz africana em especial a Umbanda, bem como as dificuldades e obstáculos culturais de garantir a eficácia das normas constitucionais que beneficiam e promovem o exercício da crença religiosa, no caso, de ordem tributaria.
Para tanto, no 1º capitulo será trabalhado; O marco legal das imunidades tributarias no ordenamento jurídico brasileiro, estendidos aos templos religiosos no Brasil.No segundo capitulo trabalharemos mostrando, A Umbanda como uma Religião genuinamente brasileira, criada no Brasil.O terceiro capítulo irá mostrar e discutir os obstáculos para a garantia da imunidade aos templos, nesse trabalho as Terreiras, Centros ou Casas de Umbanda.
1 O MARCO LEGAL DAS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS AOS CENTROS RELIGIOSOS NO BRASIL
1.1 IMUNIDADES E ISENÇÕES NO DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO
O conceito de isenção e imunidade é muitas vezes confundido em nosso país, por isso é necessário ter noções gerais sobre a matéria constitucional que é o lugar onde devemos buscar nossos direitos e os fundamentos da matéria tributaria constante em nosso ordenamento jurídico. Conhecer as leis e as razões de sua elaboração é fundamental para o requerimento e exigência de um direito. O artigo 150 VI alínea b e § 4º da Constituição Federal de 1988[2] trata das Imunidades tributárias aos templos de qualquer culto.
E como explana o Prof. Ivens Gandra da Silva Martins na obra em que coordena, junto de outros autores [por que algumas imunidades são tão importantes, a ponto de o constituinte, colocar um muro à imposição de forma insuperável, se não só por Emenda Constitucional?][3].
De uma maneira bem específica explica o Prof. Ives Gandra:
“é que a imunidade, nas hipóteses constitucionais, constitui o instrumento que considerou fundamental para, de um lado manter a democracia, liberdade de expressão a ação dos cidadãos e, outro lado de atrair os cidadãos a contribuírem com o Estado, nas suas atividades essenciais, em que, muitas vezes o próprio Estado atua mal ou insuficientemente, como na educação, assistência social etc.”
Conforme Ives Gandra a Imunidade é uma hipótese de não-incidência tributária constitucionalmente qualificada.
Outro autor, Nascimento, questiona o que é e onde esta confirmada a imunidade tributaria, “poder-se-ia afirmar que a Imunidade é uma proteção a qual a Constituição Federal confere aos contribuintes” [4]?
Responde, e ainda afirma, que a imunidade é:
“É uma hipótese de não incidência tributária constitucionalmente qualificada. As imunidades previstas no artigo 150 da Constituição Federal só existem para impostos, mas não podemos esquecer que existem imunidades espalhadas na Constituição em relação às taxas e contribuições especiais.”
Assim se faz necessário conhecer alguns institutos das imunidades[5]: A incidência se dá quando ocorrer o fato gerador do tributo. A não-incidência se dá quando ocorrer fatos não abordados na hipótese de incidência do tributo (fatos tributariamente irrelevantes) ou quando não ocorrerem fatos.
Muitas vezes o legislador traz a não-incidência expressa, mas é apenas um reforço, pois já não haveria incidência tributária caso não estivesse explicitada.
No tocante as imunidades existem também outras modalidades, que estão no texto constitucional. Imunidade recíproca[6] às pessoas políticas (art. 150, VI, a da CF), imunidade do patrimônio, renda e serviços das Autarquias e Fundações instituídas e mantidas pelo Estado (art. 150, §2º da CF), há também Imunidade do patrimônio, da renda e dos serviços dos templos de qualquer culto (art. 150, VI, alínea b e §4º da CF) e a imunidade dos jornais, livros, periódicos e o papel destinado a sua impressão (art. 150, VI, alínea d da CF).
Há ainda Imunidade recíproca às pessoas políticas, que não podem tributar-se reciprocamente por meio de impostos, onde explica o autor[7]:
“Sem prejuízo de outras garantias ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir imposto sobre patrimônio renda e serviços uns dos outros” (art. 150, VI, “a” da CF). Tal imunidade decorre do princípio da isonomia no âmbito político, o qual afirma que as pessoas políticas são iguais. Imunidade subjetiva; refere-se à entidade e não a um determinado bem.
Deve-se fazer uma interpretação extensiva abrangendo todos os impostos incididos sobre o patrimônio, renda e serviços para onde realmente é destinada sua utilização.
Segundo o Prof. Gandra, esta imunidade possui uma dimensão[8]:
“Imunidade subjetiva: refere-se à entidade e não a um determinado bem. Patrimônio, renda e serviços vinculados às finalidades essenciais ou dela decorrentes: diferentemente das pessoas políticas, basta que o patrimônio, a renda e os serviços não estejam vinculados à finalidade para que não haja imunidade. Nas pessoas políticas a imunidade abrange qualquer patrimônio, renda e serviços.”
Ao que refere aos templos de qualquer culto cuja expressão, é ampla, e que abrange não só as Igrejas, como também as lojas maçônicas, casa do pastor, convento, os centros de formação de Rabinos, seminários, casa paroquiais, imóveis que facilitam o culto, veículos utilizados para atividades pastorais, como o templo móvel e etc.
Assim, os anexos dos templos também são abrangidos, desde que o patrimônio, renda e serviços sejam relacionados com as finalidades essenciais do templo, e tendo em vista que a imunidade tem limite, pode não alcançar atividades desvinculadas do culto como segue no artigo art. 150, §4º da CF, segue-se ainda aqui, no exemplo do Prof. Gandra, onde o “estacionamento da Igreja pode ser tributado por ISS, IPTU, IR, etc., entretanto, o que é comercializado dentro do templo esta a salvo da tributação, pois faz parte do culto”. Nesse caso, o exemplo apresentado antes já existe discussões nos tribunais, em relação à tributação ou não do estacionamento dos templos.
As imunidades em nosso ordenamento jurídico brasileiro mostram vedação total ao poder de tributar nos limites traçados pela Constituição.
Imunidade tributária é a limitação imposta pela Constituição à instituição de tributos sobre determinados objetos ou a serem suportados por determinados sujeitos. Pode a imunidade ser de dimensão subjetiva[9]. Um exemplo de imunidade objetiva é a do artigo 150, VI, alínea d da Constituição, que veda a instituição de impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
Não se há de confundir imunidade com isenção. Apesar de ambas resultarem no não pagamento do tributo, a isenção é instituída pela Lei infraconstitucional, e a imunidade pela Constituição do Brasil de (1988).
A imunidade, por sua vez, é garantida pela Constituição. Não pode o Estado, por exemplo, sob qualquer pretexto, efetivar tributos sobre os livros e jornais ou os templos de qualquer culto (Igrejas, Terreiras, Mesquitas etc.), as imunidades não podem ser revogadas, sequer por emenda à Constituição, pois constituem proteção absolta à direito fundamental, a liberdade de expressão, não podendo ser objeto de emendas (CF/88, art. 60, §4º, IV)[10].
São também exemplos de imunidades protetoras de direitos fundamentais as imunidades concedidas aos partidos políticos, por preservar a democracia, e a imunidade dos templos religiosos (sem distinção de orientação dogmática) por preservar a liberdade de consciência e de crença.
Assim, somente diante de uma nova Constituição tais imunidades podem ser revogadas. É a proteção máxima que o Direito pode oferecer, pois somente através de uma reconstrução dele podem ser removidas. Existem, é certo, imunidades que não constituem forma de preservação de direitos fundamentais. Ainda assim, pelo fato de integrarem o texto constitucional, estas imunidades só por emenda à Constituição podem ser abolidas. Contudo ainda há outras diferenças, uma delas reside no modo de interpretar as normas que as concedem, e, conseqüentemente, no alcance de tais normas.
As imunidades tributárias, segundo entendimento majoritário na doutrina, são previsões constitucionais que impedem e dão um limite para a competência tributária, assim no sentido de impedir que as normas de tributação incidam sobre os fatos imunizados.
Sendo assim, à lei ordinária é defeso a inclusão, nas hipóteses de incidência de um determinado tributo, de fatos que são abrangidos pelas normas constitucionais de imunidade, pois tornar-se-iam absolutamente inconstitucionais.
Os fatos definidos dentre as imunidades tributárias passariam a compor, então, o âmbito da não incidência. Neste sentido menciona Hugo de Brito Machado: “é possível dizer-se que a imunidade é uma forma qualificada de não incidência”. (Hugo de Brito Machado) [11].
A Isenção que esta prevista no (CTN) Código Tributário Nacional de 25 de outubro de 1966[12], elencada no rol dos artigos 176 á 179, para alguns autores é uma hipótese de não-incidência legalmente qualificada, pois é Lei infraconstitucional; para outros autores, se trata de uma exclusão do crédito tributário, pois, embora tenha acontecido o fato gerador do tributo (haja incidência), o ente tributante (FISCO) está impedido de constituir e cobrar o crédito tributário. A isenção pode ser concedida por lei, mas também por a mesma ou outra lei, pode ser revogada a qualquer tempo em não tendo sido concedida por prazo determinado e sob determinadas condições, pode ser retirada toda ou em parte a qualquer tempo, nada podendo fazer o contribuinte.
No caso da isenção, não se impede que seja instituído o tributo sobre os fatos previstos na norma isentiva. Assim sendo, por expressa previsão legal, tem-se a ocorrência do fato gerador e, conseqüentemente, a formação da obrigação tributária e, posteriormente, o seu crédito, que, por sua vez, é então excluído. Nesse sentido a hipótese de incidência é obtida com a exclusão, dentre os fatos tributáveis, somente das hipóteses de imunidade, ficando a isenção, de início, dentre os fatos tributáveis.
Para que desapareça uma imunidade, é preciso alterar a Constituição, já para que desapareça uma isenção, basta que a lei seja revogada, pois se trata de uma lei infraconstitucional, não necessitando do poder constituinte[13] originário das leis constitucionais.
A isenção, por ser uma exceção à regra, que é a incidência do tributo, deve ser interpretada restritivamente. Já a imunidade, por ser concedida por norma Constitucional, deve ser interpretada de forma extensiva, observando-se outros princípios contidos na Constituição e a finalidade a que foram concedidas. Não se admite interpretação literal ou restritiva à regra que concede a imunidade, pois isto seria por a menor o princípio constitucional.
Feitas as considerações sobre o marco legal e o conceito de imunidade tributária, cabe-nos justificar a hipótese prevista no §4º, alínea b, do inciso IV, do artigo 150 da Constituição Federal, que tem como fundamento, por um lado o direito à liberdade religiosa e do exercício de culto religioso e por outro o dever do Estado de não impedir o exercício deste direito, obstaculizando-o.
1.2. DIREITOS FUNDAMENTAIS E A LIBERDADE DE EXERCÍCIO DE CRENÇA RELIGIOSA.
A liberdade de religião e de opinião é um direito humano fundamental reconhecido em muitos ordenamentos jurídicos. A liberdade religiosa inclui ainda, a liberdade de ter ou não ter, seguir ou não seguir qualquer religião, ou até mesmo de não ter opinião sobre a existência ou não de Deus (agnosticismo e ateísmo)[14].
A Declaração Universal dos Direitos Humanos[15] adotada pelos 58 estados membros conjunto das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, no Palais de Chaillot em Paris, (França) e ratificada pelo Brasil, nos dias atuais conta com mais de 192[16] paises espalhados entre os 5 continentes ja definia a liberdade de religião e de opinião em sua plenitude no artigo 18:
“Todo o homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observâcia, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.”
O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos[17] de 16 de dezembro de 1966, na terceira parte artigo 18, em que o Brasil aceitou e aderiu em 24 de abril de1992, por meio do Decreto nº592[18], também regula o direito a liberdade de expressão nas formas de religião[19]:
“Toda pessoa terá direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião. Esse direito implicará a liberdade de ter ou adotar uma religião ou uma crença de sua escolha e a liberdade de professar sua religião ou crença, individual ou coletivamente, tanto pública como privadamente, por meio do culto, da celebração de ritos, de práticas e do ensino.”
A religião, assim como a linguagem, pode endossar e subverter os sentidos, alienar pessoas e grupos sociais. Exemplo disso são algumas leituras de caráter religioso decorrentes de hermenêuticas que, utilizadas a favor dos interesses de alguns humanos, transitam e transcrevam sentidos e significados, movendo mundos por meio de interesses pessoais, pronúncias que, muitas vezes, destroem, mutilam, matam e sentenciam mundos e vidas.[20]
Para se obter a legitimação de um culto religioso é necessário ter primeiro o entendimento do que se trata como sendo uma Religião[21].
“RELIGIÃO deriva do termo latino “Re-Ligare”, que significa “religação” com o divino. Essa definição engloba necessariamente qualquer forma de aspecto místico e religioso, abrangendo seitas, mitologias e quaisquer outras doutrinas ou formas de pensamento que tenham como característica fundamental um conteúdo Metafísico, ou seja, de além do mundo físico.”
No presente trabalho pretende-se salientar importantes tópicos a respeito da evolução social e a participação constitucional como fonte disciplinadora e conciliadora da força do Estado e do poderio religioso para nossa sociedade contemporânea.
O delineamento histórico dimensiona a constante e longínqua influência assumida pelas religiões no decorrer dos tempos e seu relacionamento estreito com as pessoas detentoras do poder político nas sociedades.
Os núcleos de formação dos Estados democráticos inserem sempre a participação popular nesses governos, permitindo a expansão dos direitos fundamentais, e como conseqüência, a liberdade religiosa.
Na recém criada republica brasileira o DECRETO Nº 119-A, DE 7 DE JANEIRO DE 1890[22], proibia a intervenção da autoridade federal e dos Estados federados em matéria religiosa, consagrando o pleno exercício dos cultos extinguindo o padroado e estabelecendo outras providencias.
O artigo 1º do decreto, em sua essência estabelece o principio da laicidade, a saber:
“Art. 1º E’ proibido á autoridade federal, assim como á dos Estados federados, expedir leis, regulamentos, ou actos administrativos, estabelecendo alguma religião, ou vedando-a, e crear differenças entre os habitantes do paiz, ou nos serviços sustentados á custa do orçamento, por motivo de crenças, ou opiniões philosophicas ou religiosas.”
O mesmo decreto garante também igualdade de tratamento a todas as religiões, respeitando as diferenças e diversidades de cada uma em seu artigo segundo[23].
A garantia da liberdade religiosa é disposta de forma ampla no artigo 3º o decreto, ao absorver não somente os indivíduos, mas também as diferentes formas de agremiação como: igrejas, associações, etc.
Assim dispõe o artigo 3º do Decreto n.º 119-A, de 1890:
“Art. 3º A liberdade aqui instituida abrange não só os individuos nos actos individuaes, sinão tabem as igrejas, associações e institutos em que se acharem agremiados; cabendo a todos o pleno direito de se constituirem e viverem collectivamente, segundo o seu credo e a sua disciplina, sem intervenção do poder publico”
Também a respeito da liberdade de associação religiosa dispõe a mesma lei em seu artigo 5º:
“Art. 5º A todas as igrejas e confissões religiosas se reconhece a personalidade juridica, para adquirirem bens e os administrarem, sob os limites postos pelas leis concernentes á propriedade de mão-morta, mantendo-se a cada uma o dominio de seus haveres actuaes, bem como dos seus edificios de culto”.
A Constituição Federal de 1988 no Titulo II (Dos Direitos e Garantias Fundamentais) – CAPITULO I (Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos) consagra o direito à Liberdade religiosa em seu texto no artigo 5º inciso VI[24]:
“é inviolável a liberdade de consciência e de crenças, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
A Constituição Federal mantém essa postura, ao colocar o artigo 150 IV alínea b e §4º na CF/88 mantendo o Estado laico e assim permitindo a livre manifestação das religiões.
A concretização do modelo atual de liberdade de religião é resultado da base principio lógica, que sustenta a Constituição, centrada na Igualdade, na Tolerância e na diversidade de pensamentos políticos e filosófico-religiosos[25]. Em tal base encontra-se o principio da Laicidade[26].
Esses princípios abrigam a harmonia necessária para se manterem plenos os direitos individuais, conseguindo dimensionar e solucionar suas mais diversas diferenças. E em busca de tal equilíbrio conciliatório, eles (princípios) asseguram uma liberdade religiosa respeitada e não abusiva. É então esclarecido o papel dos principais componentes, em que cada princípio expressa uma parte específica do conjunto que mantém perene a liberdade religiosa.
Alguns autores registram a Interdependência entre liberdade religiosa que se refere liberdade de crença e liberdade de culto, já que elas estão ligadas, mas ao mesmo tempo tem o sentido diferenciado.
A livre crença ou liberdade de credo permite ao indivíduo optar por qualquer religião de sua vontade ou necessidade, já o livre culto[27] exterioriza a adoração da crença por meio de atos e liturgias solenes que daquela religião especifica que assim exigir.
Nesse sentido, a livre organização protege as religiões, pela personalidade jurídica, podendo elas atuar na sociedade sem dependência nem vínculo algum com o Estado.
O fato de existir uma liberdade tão expressiva como a religiosa, resguardada constitucionalmente, exige uma delimitação interpretativa em relação aos outros direitos fundamentais, pois sua interpretação é, então, realizada considerando-se a Lei Maior, como um sistema em que interage entre seus diversos artigos, não podendo haver a incidência de determinado princípio sem a devida harmonização com os demais.
Assim, no “enfrentamento da liberdade religiosa com direitos tão relevantes, deve-se buscar a melhor forma de adequá-los harmoniosamente, sem permitir que haja hierarquia, preferência ou violações recíprocas” [28].
Encontrado o encaixe interpretativo constitucional da liberdade religiosa, parte-se para sua irradiação em diversos campos sociais protegidos constitucionalmente, como o ensino, a família e o trabalho, demonstrando as transformações que a religião trouxe em cada caso.
2. A Umbanda como Religião no Brasil.
2.1 O HISTÓRICO DA UMBANDA SUAS CARACTERÍSTICAS E LEGISLAÇÃO.
As definições e conceitos aqui tratados podem diferir em alguns tópicos por se tratar de uma visão generalista e enciclopédica[29]. Por tratar-se de um conjunto religioso com várias ramificações, as informações aqui expostas busca dar informaçõa e conhecimentos da forma mais abrangente possível e sem discriminação ou preconceitos, pois todas as “umbandas[30]” têm suas razões para existir e de serem cultuadas.
Umbanda é uma religião formada dentro da cultura religiosa brasileira que sincretiza vários elementos, inclusive de outras religiões como o catolicismo[31], o espiritismo e as religiões afro-brasileiras. A palavra umbanda deriva de m’banda, que em quimbundo[32] uma linguagem ainda usada em cantos ou pontos tem o significao “sacerdote ou curandeiro”.
A história a Umbanda tem suas oringens difusas. Entretanto afirma Vagner Silva que esta religião foi criada em “1908 pelo Médium Zélio Fernandino de Moraes, sob a influência do Caboclo das Sete Encruzilhadas”[33].
Antes de se ter o surgimento da Umbanda como uma nova religião, já havia, de fato, o trabalho de outras pessoas, que eram (guias,pretos-velhos, caboclos, crianças), assim como religiões ou simples manifestações religiosas espontâneas cujos rituais envolviam incorporações e o louvor aos orixás[34]. Entretanto, foi através de Zélio que organizou-se uma religião com rituais e contornos bem definidos à qual deu-se o nome de Umbanda, contudo, nesta época, não havia liberdade religiosa. Todas as religiões que apontavam semelhanças com rituais afros eram perseguidas, os terreiros destruídos e os praticantes presos.
Em 1945, José Álvares Pessoa, dirigente de uma das sete casas de umbanda fundadas inicialmente pelo Caboclo das Sete Encruzilhadas, obteve junto ao Congresso Nacional a legalização da prática da Umbanda. A partir dai, muitas tendas cujos rituais não seguiam o recomendado pelo fundador da religião, passaram a dizer-se umbandistas, de forma a fugir da perseguição policial. Foi aí, conforme o Professor e escritor Rubens Saraceni que a ”religião começou a perder seus contornos bem definidos e a misturar-se com outros tipos de manifestações religiosas”. De tal forma que hoje a Umbanda genuína é praticada em pouquíssimas casas.
Hoje, existem diversas ramificações onde podemos encontrar influências que utilizam a palavra umbanda, como as indígenas (Umbanda de Caboclo), as africanas (Umbandomblé, Umbanda traçada) e diversas outras de cunho esotérico (Umbanda Esotérica, Umbanda Iniciática). Existe também a “Umbanda Popular”, onde encontraremos um pouco de cada coisa ou um cadinho de cada ancestralidade, onde o sincretismo[35] (associação de santos católicos aos orixás africanos) é muito comum.
Os fundamentos da umbanda variam conforme o local, região ou vertente de quem a pratique, mesmo assim existem alguns conceitos básicos que são encontrados na maioria das casas e assim podem, com certa ressalva e cuidado, ser generalizados para todas as formas de umbanda.
O primeiro delas é a existência de uma fonte criadora universal, um Deus supremo, chamado Olorum. Algumas das entidades, quando incorporadas, podem nomeá-lo de outra forma, como por exemplo Zambi para pretos-velho, Tupã[36] para caboclos, entre outros, mas são todos o mesmo Deus.
O segundo conceito é a obediência aos ensinamentos básicos dos valores humanos, como: fraternidade, caridade e respeito ao prósximo, sendo a caridade uma máxima encontrada em todas as manifestações existentes.
O terceiro conceito estruturador da religão é o culto aos orixás como manifestações divinas em que cada orixá controla e se confunde com um elemento da natureza do planeta ou da própria personalidade humana, em suas necessidades e construções de vida e sobrevivência. A exceção a incorporação deste conceito está no seguimento Umbandista denominado Umbanda Branca (alguns umbandistas cultuam a chamada umbanda branca, ésta no entanto não cultua os orixás, sendo unicamente voltada ao culto de caboclos, pretos velhos e crianças) que em um quarto conceito caracteriza a manifestação dos Guias para exercer o trabalho espiritual incorporado em seus médiuns ou “aparelhos ou cavalo-de-santo”[37].
O quinto conceito a ser destacado seria o Mediunismo, como uma forma de contato entre o mundo físico e o espiritual, manifestado de diferentes formas. Há uma doutrina, que regra, uma conduta moral e espiritual a ser seguida em cada casa, de forma variada e diferenciada.
Por último podemos afirmar como conceito fundante e para nortear os trabalhos dos terreiros, a crença na imortalidade da alma, a crença na reencarnação e nas leis cármicas.
Na Umbanda os orixás são manifestações do Grande Deus Olorum. Orisha é uma palavra yoruba[38] para designar um ser sobre-humano, ou um Deus. Todo o universo surge de Olorum através das radiações que ficam individualizadas em cada orixá.
Essas radiações são personificadas de formas diferentes nos diversos terreiros – depende da influência histórica que cada um sofreu. A radiação (vibração da água) pode ser relacionada apenas a Iemanjá, mas pode ser subdividida em Oxum: água doce, Nanã: pântano e Iemanjá: mares. Ocorre semelhante com Ossain que é das matas e Oxóssi caçador das florestas. Muitos escritores da umbanda relacionam as Sete Linhas da Umbanda[39] aos Orixás, outros preferem relacionar as Sete Linhas da Umbanda com as vibrações e não diretamente a orixás, já que eles são mais de sete.
Os orixás não são originários da umbanda, muito antes eles já eram reverenciados nas terras africanas por diversas tribos. Muitos deles não se tornaram conhecidos aqui no Brasil, e até mesmo nas tribos africanas, pois cada uma possuía seu orixás e desconhecia outros que eram cultuados em tribos diferentes.
Quando começou o tráfico de escravos para o Brasil e outros cantos do mundo, muitos negros de tribos diferentes foram vendidos juntamente, assim diversas maneiras e caracteristicas de cultuar seus orixás de tribos distantes e diferentes, vieram parar em terras brasileiras e formaram o grande panteão do Candomblé. Notadamente a nação (tribo de aldeia africana) que mais influenciou foi a Iorubá. Nesta visão ainda própria dos ritos tribais, o orixá era um ancestral que todos tinham em comum.
No nascimento do Candomblé, considerado por estudiosos das religioes de matriz africana, como a primeira Religião originalmente trazida pelos escravos para o Brasil, os homens passaram a ser filhos espirituais dos orixás, pois a relação de ancestralidade que existia na tribo não se confirmava mais tendo de adaptada na nova realidade da América.
A partir da Umbanda, configura-se uma nova visão o qual seria o Orixá Cósmico; o orixá, pela cosmogonia umbandista, nunca viveu na terra, ele é muito mais que o espírito desencarnado de um homem e toda criação é o resultado do trabalho harmônico dos orixás, espíritos elevadíssimos, pois são os verdadeiros arquitetos e mantenedores da criação.
No sincretismo, a umbanda se torna uma junção de elementos africanos (orixás e culto aos antepassados), indígenas (culto aos antepassados e elementos da natureza); do Catolicismo (o europeu, que trouxe o cristianismo e seus santos que foram sincretizados pelos Negros Africanos),e do Espiritismo (fundamentos espíritas, reencarnação, lei do carma, progresso espiritual etc).
A umbanda prega a existência pacífica e o respeito ao ser humano, à natureza e a Deus. Respeitando todas as manifestações de fé, independentes da religião. Em decorrência de suas raízes, a umbanda tem um caráter eminentemente pluralista, compreende a diversidade e valoriza as diferenças. Não há dogmas ou liturgia universalmente adotadas entre os praticantes, o que permite uma ampla liberdade de manifestação da crença e diversas formas válidas de culto. A máxima dentro da umbanda é como afimou Zelio Fernadino “Dê de graça, o que de graça recebeste: com amor, humildade, caridade e fé”[40].
Assim, na umbanda o sincretismo religioso com o catolicismo e os seus santos, mesmo como no antigo Candomblé dos escravos, faz-se necessário como uma forma de tornar aceito o culto afro-brasileiro sem que fosse visto como algo estranho e desconhecido, e, portanto, perseguido e combatido.
Em regiões diferenciadas do Brasil há discordância sobre as cores votivas de cada orixá conforme a tradição seguida por seus seguidores. Da mesma forma quanto ao Santo sincretizado a cada orixá. Alguns exemplos: Exu – Santo Antonio no Rio de Janeiro, chamado de Bará no Rio Grande do Sul; Oxumaré – São Bartolomeu no Brasil Ogum – São Jorge, principalmente no centro-sul do Brasil e Santo Antonio na Bahia; Oxossi – São Sebastião, principalmente no centro-sul do Brasil, São Jorge na Bahia; Xangô – São Jerônimo,São João Batista, São Miguel Arcanjo; Iemanjá – Nossa Senhora dos Navegantes; Oxum – Nossa Senhora da Conceição; Iansã – Santa Bárbara; Omulu – São Roque; Obá – Santa Rita de Cássia, Santa Joana d’Arc; Obaluaê – São Lázaro; Nanã – Sant’Anna; Ibeji – Cosme e Damião; Oxalá – Divino Jesus Cristo, o Ser Cristalino.
Importante caracteristica para o tema deste estudo é o fato de que a Umbanda tem como lugar de culto o templo, terreiro ou Centro, que é o local onde os Umbandistas se encontram para realização do culto aos orixás e dos seus guias, que na umbanda se denominam giras. O chefe do culto no Centro é o Sacerdote ou Sacerdotisa (pode ser Babá, Zelador, Dirigiente, Diretor(a) de culto, Mestre(a), sempre dependendo da forma escolhida por cada casa).
São os médiuns mais experientes e com maior conhecimento, normalmente fundadores do terreiro, que coordenam as sessões/giras e que irão incorporar o guia-chefe, este por sua vez comandará a espiritualidade e a materialidade durante os trabalhos. Como uma religião espiritualista, a ligação entre os encarnados e os desencarnados se faz por meio dos médiuns. Na Umbanda existem várias classes de médiuns, de acordo com o tipo de mediunidade. Normalmente há os médiuns de incorporação, que irão “emprestar” seus corpos para os guias e para os orixás.
Há também os atabaqueiros[41], que transmitem a vibração da espiritualidade superior por via dos atabaques,tocando de cada forma para cada Orixá, criando um campo energético favorável à atração de determinados espíritos, sendo muitas vezes responsáveis pela harmonia da gira[42]. Há os Corimbas, que são os que comandam os cânticos e as cambonas que são encarregadas de atender as entidades, provisionando todo o material necessário para a realização dos trabalhos.
Embora caiba ao sacerdote ou à sacerdotisa responsável o comando vibratório do rito, grande importância é dada à cooperação, ao trabalho coletivo de toda a corrente mediúnica. Segundo a Umbanda, as entidades que são incorporadas pelos médiuns podem ser pretos-velhos, caboclos, boiadeiros, mineiros, crianças, marinheiros, ciganos, baianos, orientais, xamãs e exus.
O culto nos terreiros é dividido em sessões de desenvolvimento e de consulta, e essas, são subdivididas em giras. Nas sessões de consulta, onde comumente podemos encontrar Pretos-Velhos, Caboclos, Ciganos. As pessoas conversam com as entidades a fim de obter ajuda e conselhos para suas vidas, curas, descarregos, e para resolver problemas espirituais diversos. As ocorrências mais comuns nessas sessões são o passe[43] e o descarrego[44].
Ainda terreiros as entidades fazem com que as energias negativas sejam deslocadas para outro plano astral e caso essa energia negativa seja de um espirito obsessor, ele (a pessoa) é retirado e encaminhado para tratamento ou para um lugar mais adequado no astral inferior caso ele não aceite a luz que lhe é dada. Nesses casos pode ser necessária a presença de um ou mais Exus[45] (um gênero de espírito desencarnado) para auxiliar a desobsessão.
Nos dias de consulta há o atendimento da assistência e nos dias de desenvolvimento há as giras médiunicas, que são fechadas à assistência, onde os sacerdotes educam e ensinam os mecanismos próprios da mediunidade.
2.2 DADOS ESTATÍSTICOS SOBRE O EXERCÍCIO DA RELIGIÃO UMBANDA NO BRASIL.
No Brasil onde a população possui vários tipos de seguimentos religiosos e filosóficos diferentes, não poderia deixar ser diferente quanto ao numero de religiões existentes e seus praticantes, no ultimo censo demográfico por amostragem ocorrido pelo principal órgão governamental de pesquisa de campo o IBGE[46] no ano de 2000, onde alem o do questionamento étnico também veio à questão da religião seguida por cada um.
Com as questões indagadas, as pessoas assim se declaram por sua cor ou raça: dos entrevistados habitantes no Brasil à época 170 milhões de brasileiros, 91 milhões se classificaram como sendo de etnia branca (53,7%), 10 milhões de pessoas como pretos (6,2%), 65 milhões como pardos (38,4%) e 734 mil como indígenas (0,4%), informações prestadas pela população brasileira em pesquisa realizada no Censo do ano 2000.
O Brasil é um país de grande diversidade religiosa, porém de muita influência européia, e com isso, no Censo do ano 2000, a maioria da população entrevistada se declarou católica apostólica romana, seguida dos evangélicos, como segue a tabela abaixo:
Distribuição percentual da população residente, por religião no Brasil 1991/2000:
A tabela demonstra uma parte da população urbana e rural, contudo, muito dos locais onde são praticadas as religiões afro-brasileiras, nesse caso, a religião umbandista não possui registro na AFROBRAS (Federação da Religião Afro-Brasileira) e assim as pessoas que freqüentam acabam por não integrar nem fazerem parte da pesquisa assim, por conseguinte dessa estatística.
Dados coletados em pesquisa de campo na cidade de Porto Alegre, em um dos órgãos com maior número de afiliados registrados na AFROBRÁS, informam que nos registros oficiais desta entidade, no âmbito da cidade de Porto Alegre e região metropolitana existem 1729 (Mil setecentos e vinte e nove) templos registrados. Contudo, na entrega do documento informativo anexo ao presente estudo, o presidente informou extra-oficialmente[47] que estima-se haver mais de 10.000 (Dez mil) templos Afro-Umbandistas ativos.
Embora a religiosidade de origem africana seja reconhecida como uma importante característica da identidade nacional, os praticantes da Religião Umbanda e Candomblé ainda são vítimas do preconceito no Brasil dos dias de hoje. Para alertar a sociedade para esse fato, o dia 21 de janeiro do ano de 2010, foi incluído no calendário cívico como o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. Neste dia, várias manifestações foram externadas em varias regiões do Brasil, como marchas, giras nos centros em aéreas urbanas de grande circulação populacional, como Porto Alegre. Nessa cidade a II Marcha Estadual pela Vida e Liberdade Religiosa[48] foi realizada no dia 25 de janeiro. O evento integrou a programação do Fórum Social Mundial.
As religiões, portanto, fazem parte da cultura humana, presentes em todos os povos, em todas as épocas históricas. Nesse sentido, embora diferentes, todas têm algo em comum: a busca de uma relação com o mundo metafísico[49]
A data é uma homenagem à memória de Mãe Gilda[50], Yalorixá (Mãe de santo) do Terreiro de Abassá de Ogum, um dos mais tradicionais terreiros da Bahia. Ela teve sua fotografia publicada em um jornal evangélico de grande circulação, associada ao charlatanismo. Depois de sofrer a invasão e a depredação de seu templo religioso, por parte de pessoas associadas a outros seguimentos religiosos, a mãe de santo apresentou problemas de saúde que culminaram com a sua morte, provocadas por um infarto, em 21 de janeiro de 2000. A partir desse fato a Umbanda e todas outras religiões de cunho afro-brasileiras, obtiveram mais força e também notoriedade para poder mostrar seus fundamentos e por suas vez trazer mais adeptos aos cultos.
Assim sendo, mesmo demonstrando-se irrefutáveis argumentos e dados sobre a existência e à adesão a esta religião de matriz africana, por grande parte da população, sabemos que a hegemonia religiosa católica acaba por, de certa forma, marginalizar as expressões desta matriz, fomentando uma cultura de não diversidade religiosa e exclusão do acesso aos benefícios sócio-juridicos garantidos pela ordem constitucional.
A seguir, na terceira parte deste estudo, analisaremos alguns obstáculos para a garantia da imunidade tributária aos centros religiosos de Umbanda.
3. Os obstáculos para a garantia da imunidade TRIBUTÁRIA aos centros de Umbanda
Tendo demonstrado que o marco regulatório nacional e internacional garante o reconhecimento da imunidade tributária dos templos religiosos de umbanda, resta-nos verificar se há obstáculos em nível de garantia pelo Poder Judiciário.
Daí também a formulação de hipóteses para o não exercício deste direito estar vinculada muito mais à cultura do Direito, seja por incompreensão dos fundamentos religiosos desta religião, seja por preconceito em virtude de suas raízes étnicas e culturais.
O que estamos afirmando é que os obstáculos para efetivação desta garantia podem estar situados para além da lei e de seu conteúdo normativo; ou seja, nas esferas do que denominamos estrutura e cultura do Direito.
Isso porque, conforme FEIX[51] superando o pensamento positivista precisamos compreender as três dimensões do fenômeno jurídico: o conteúdo do Direito, a estrutura do Direito e a cultura do Direito[52]. O conteúdo diz respeito a toda a normatização, ao Direito Objetivo, às regras vigentes em determinado ordenamento. A estrutura diz das instituições, dos órgãos, dos mecanismos e procedimentos necessários à sua implementação; referindo-se diretamente às condições materiais, aos recursos financeiros e orçamentários necessários para garantir a implementação do que está dito na lei (seu conteúdo). Por último, a cultura do Direito nos fala das representações sociais, dos sentimentos, das percepções que temos sobre os direitos e quem são seus titulares, espaço onde se reproduzem os estereótipos, as falsas expectativas, os preconceitos e toda a sorte de discriminações a cerca de seus “verdadeiros destinatários” [53].
A compreensão do Direito como sistema, composto pelos três componentes acima referidos leva-nos a investigar a posição dos tribunais sobre duas hipóteses por nós formuladas.
As hipóteses situadas na cultura do Direito, de que a garantia não é efetivada pela estrutura do Direito (os tribunais) por confusão conceitual entre os requisitos para incidência da imunidade e algumas características da religião de umbanda, que formulamos da seguinte forma. A primeira, de que os serviços religiosos prestados nos terreiros são pagos afastaria a incidência da imunidade. A segunda, de que a garantia não seria efetivada porque os imóveis urbanos onde estão situados os templos religiosos de umbanda são ao mesmo tempo imóveis residenciais, confundindo-se com estes.
Passamos, pois a apresentar nossa pesquisa, realizada entre o primeiro semestre do ano de2010 o segundo semestre do ano de 2011, nos tribunais, utilizando as seguintes palavras chaves: imunidade tributária; templos de qualquer culto; casas de religião e religiões de matriz africana.
O resultado da pesquisa nos levou a analisar vários acórdãos, que serão classificados a partir da análise das duas hipóteses acima referidas. É preciso registrar que só encontramos decisão relacionada à segunda hipótese, conforme veremos a seguir.
3.1 A QUESTÃO DO pagamento dos trabalhos/serviços que são feitos nas casas de religião de matriz africana
Os trabalhos ou serviços realizados no interior das terreiras, yles[54] ou nas matas, possuem todo um ritual que necessita de pessoas e elementos materiais adequadas para o seu desenvolvimento, por isso cada rito tem seu lugar para ser feito, pessoas especificas para fazer todo trabalho, o que demanda gastos e custos.
As pessoas que procuram um lugar uma religião para postarem sua fé seja ela da maneira que for, tem o livre arbítrio e consciência limpa para acreditar naquilo em que estão se propondo a fazer e assim ter fé e esperança sempre no bem comum, contudo há correntes contrarias que buscam de outras formas às vezes não tão gentis, de tentar dissuadir essa idéia de melhoria das mais diversas formas, assim diz em sua publicação Edir Macedo[55]:
“As pessoas, normalmente, agem como as águas, que procuram sempre o caminho mais fácil para o seu escoamento. Procuram também um caminho mais fácil, mais rápido e menos complicado para resolverem seus problemas e, por causa disso, muita gente esta atolada no mais profundo lamaçal.”
Esse “lamaçal” do qual se refere o autor, seria o envolvimento de pessoas com as religiões de matriz africana Sendo este forte formador de opinião publica, por ter espaço considerável nos meios de comunicação e de mídia televisada, discrimina e obstaculiza muito mais a realização dos trabalhos cultos e ritos das religiões afro-brasileiras, ainda quando de maneira equivocada, interpreta o que é feito e pedido em razão do bem de outras pessoas, assim como fica demonstrado na citação a seguir:
“Todos os trabalhos e despachos têm uma única finalidade: satisfazer o “santo” para conseguir favores, em curto prazo. É feito um negócio entre a pessoa e demônio. O exu promete um favor em troca de um despacho, num determinado lugar, com dia e hora marcados.”
A intolerância se expressa diante das mias variadas formas: de gênero, de etnia, de geração, de orientação sexual, de padrão físico-estético, e também, de religião/religiosidade, até mesmo sócio econômico.
A intolerância religiosa pode causar espanto, mas muitos conflitos e guerras violentas foram, são e ainda serão travados, em nome de um determinado grupo ou de outro, por uma convicção, por uma crença religiosa de um ou de outro. Este é um problema extremamente complexo porque tais confrontos, costumeiramente, não carregam motivações exclusivamente religiosas, mas a estas se somam razões de ordem econômica, social, política, cultural, variáveis a cada experiência histórica.
As religiões são seguidas para que as pessoas tenham fé, amizade, deseje saúde, paz, prosperidade umas para as outras, mas para haja essa harmonia entre os seres humanos é necessário se ter tolerância uns com os outros que é um dos fundamentos da fé cristã e umbandista, nesse sentido seguem os autores Victor Hellern, Henry Notaker e Jostein Gaader no livro O Livro das Religioes, explanam assim: “A tolerância não limita o direito de fazer propaganda, mas exige que esta seja feita com respeito pela opinião dos outros” [56].
Os sacrifícios e as oferendas podem ser realizadas por qualquer pessoa em qualquer lugar, desde que haja coerência na escolha do local adequado no horário a ser feito e pode ser entregue nas matas, nas ruas, em cemitérios, nas praias, ou até mesmo nos templos. Geralmente esses trabalhos/serviços são feitos por pessoas com uma mediunidade mais avançada e de mais tempo na religião, vem dai que Umbanda tem seus fundamentos na natureza e no povo das matas, faz-se ai também a relação dos autores com uma tribo[57], e nesse sentido dizem:
“Fazer um sacrifício a um animal pode ser algo bastante simples. Um membro da tribo vai ate o tumulo de seu pai, por exemplo, oferece uma pequena quantidade de comida e bebida, e pede ajuda para resolver uma situação difícil… O chefe da tribo é responsável pelos sacrifícios do grupo mais extenso. Em nome de toda tribo, ele se dirige aos espíritos de antigos chefes e faz orações pedindo uma boa caça ou uma boa safra. Na época da colheita, os primeiros furtos são oferecidos aos espíritos dos chefes. E com o acompanhamento de orações, cantos e danças, as pessoas — em geral usando mascaras e outros adornos – expressam sua gratidão e oram para continuar tendo proteção.
Os trabalhos/serviços, não possuem o cunho de enriquecimento através do exercício da religião. O fato de se exigir recursos ou pedido da compra dos materiais a serem utilizados, é mera condição para poder dar seguimento aos trabalhos e, assim manter o abastecimento necessário ao serviço prestado.
Ao celebrar um casamento e outros rituais como crisma, batizado e também missas pelos que morreram ou estão adoentados em uma igreja católica, é pedido uma ajuda para que se possam manter as despesas do dia a dia do templo, como a compra de materiais utilizados nesses rituais; podendo estes ser: velas, papeis flores etc. Ainda sim existem algumas taxas específicas e fixas para cursos de batizado e casamento, ajudando na manutenção predial do lugar, com suas despesas, por exemplo: abastecimento de água e energia elétrica.
Assim questiona Carlos Vender do Nascimento na obra Imunidades Tributárias, “Como interpretar a expressão “rendas relacionadas com as finalidades essenciais” enunciadas no §4º do art. 150 da Constituição federal?”, e explica respondendo[58]:
“Não se diga que o produto da locação de um imóvel ou da alienação de qualquer bem da entidade caracterize-a como de natureza econômica. Por conseguinte, o fato não se constitui em nenhuma ameaça ao mercado das empresas que operam no mesmo ramo de renda derivada do próprio patrimônio da entidade, indispensável sem dúvida, ao seu processo de sobrevivência.”
Assim da mesma forma, pode-se afirmar que, os trabalhos e os custos de serviços religiosos prestados e cobrados no âmbito da religião Umbanda, não se caracterizam como de natureza econômica, porque não visam remuneração do próprio serviço e não geram lucros aos proponentes, como os já exemplificados anteriormente, ocorridos e efetuados nas igrejas, terreiras ou templos religiosos de qualquer natureza, estando, portanto protegidos pela incidência tributaria da imunidade já prevista Constituição Federal.
3.2. A questão templo versus moradia
A discussão com relação às imunidades tributárias, já tem sido pauta dos tribunais regionais e federais há algum tempo. Muitos pedidos, com relação ao não pagamento de específicos e determinados impostos, batem às portas do STF procurando garantir direitos estabelecidos na Constituição Federal. No que diz respeito imunidades, buscam o bem comum em toda sua amplitude no contexto dos direitos de Liberdade como garantia da vida em Sociedade. Como diz Edgar Neves da Silva[59]:
“As imunidades foram criadas estribadas em considerações extrajurídicas, atendendo à orientação do poder constituinte em função das idéias políticas vigentes, preservando determinados valores políticos, religiosos, educacionais, sociais culturais e econômicos, todos eles fundamentais à sociedade brasileira. Dessa forma assegura-se, retirando das mãos do legislador infraconstitucional, a possibilidade de, por meio da exação imposta, atingi-los. Resguarda o equilíbrio federativo, a liberdade política, religiosa, de associação, do livre pensamento, e de expressão da cultura, o desenvolvimento econômico etc., e, assim, não deve considerar a imunidade como um beneficio, um favor fiscal, uma renúncia à competência tributária ou um privilégio, mas sim uma forma de resguardar e garantir os valores da comunidade e do individuo.
Ocorre que a maioria dos templos religiosos possui um espaço reservado para a pessoa se estabelecer naquele local, nas igrejas existe a casa paroquial[60], onde ali reside o padre, sacerdote ou pastor, porem, como a maioria, ou quase a totalidade, dos locais usados como templos das religiões de matriz africana ex. Umbanda, Nação e o Candomblé, esse locais, são os mesmos utilizados para residência das pessoas e a pratica da religião, sendo assim, é necessário que se estenda sobre esses locais, o manto da imunidade constitucional para os templos de qualquer culto, e não se faça a confusão que é feita de templo VS moradia.
Essa discussão já tomou decisão através Tribunal de Justiça do rio Grande do Sul, onde se segue: Nº70026416487[61]
“APELAÇÃO CÍVEL. TRIBUTÁRIO. iptu. ação DECLARATÓRIA. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA. TEMPLOS DE QUALQUER CULTO. BENEFÍCIO QUE SE ESTENDE A TODO PATRIMÓNIO MÓVEL OU IMÓVEL, respeitadas as EXCEÇÕES. Salvo exceções, o que não é o caso em exame, todo o patrimônio móvel ou imóvel de qualquer religião está afetado, ainda que lucrativamente, ao culto, sua finalidade essencial. Por isso não há porque distinguir prédio ou terreno onde se exerce o culto (templo propriamente dito), e terreno ou prédio dado em locação ou utilizados para outra finalidade.”
Pode-se observar a mesma posição adotada em nova jurisprudência do tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, com o voto do senhor Dr. Des. Genaro José Baroni Borges segue[62]:
“O artigo 150, VI, da Constituição Federal estabelece vedações absolutas ao poder de tributar, contemplando, no que importa para o caso, os “templos de qualquer culto” (alínea b). A disposição não é nova; passa por todas as constituições desde a de 1891 (art. 11, 2º) e prestigia o princípio da liberdade religiosa que compreende a liberdade de crença, a liberdade de culto e a liberdade de organização religiosa (CF – art. 5º, VI). Acresce o disposto no parágrafo 4º daquele mesmo artigo: “as vedações expressas no inciso VI, alíneas “b” e “c”, compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas”.O “punctum dolens” está em precisar o significado constitucional da palavra “templo”. Pontes de Miranda, por exemplo, ao comentar o artigo 31,IV, b) da Constituição de 1946, de igual redação, emprestou-lhe sentido estrito: “ficaram imunes a impostos os templos de qualquer culto; não, porém, as casas de residência dos padres, pastores, rabinos, etc., salvo se dentro do próprio edifício do templo.).Salvo exceções, o que não é o caso em exame, todo o patrimônio móvel ou imóvel de qualquer religião está afetado, ainda que lucrativamente, ao culto, sua finalidade essencial. Por isso não há aqui porque distinguir, prédio ou terreno onde se exerce o culto (templo propriamente dito), e terreno ou prédio dado em locação ou utilizados para outra finalidade”.
Outro e apenas mais um exemplo da corrente majoritária também se mostra em mais uma lide julgada nos Tribunais do Rio Grande do Sul, na Apelação e Reexame Necessário nº.70003042694, relator Des. Roque Joaquim Volkweiss[63]:
“DIREITO TRIBUTÁRIO. IPTU. IMÓVEL LOCADO. ENTIDADE QUE SE DEDICA AO CULTO RELIGIOSO. IMUNIDADE. As entidades descritas no art. 150, VI, “b” da Constituição Federal são imunes ao pagamento de impostos. A destinação dada aos imóveis pelas entidades religiosas não autoriza o Município a cobrar o IPTU. O fato de estarem alugados não afasta a presunção que o produto arrecadado deste contrato esteja sendo aplicado nas atividades essenciais da entidade. À unanimidade, negaram provimento ao 1º apelo. Por maioria negaram provimento ao 2º e confirmaram a sentença em reexame necessário, vencido o Presidente que o proveu. “
Com a busca do entendimento e o mesmo posicionamento em ambas as esferas jurisdicionais, estadual, com os julgados do TJ/RS e nas decisões auferidas em âmbito federal, no caso o STF, tem se observado uma unificação em corrente majoritária em prol da obtenção de quem busca esse direito. Esta tendência em sendo firmada com inúmeras decisões favoráveis aos templos das mais diferentes religiões pela corte maior do nosso país, em varias seções do seu Pleno do Supremo Tribunal Federal, a exemplo no Recurso Extraordinário 325.822/SP[64]:
“Recurso Extraordinário. 2. Imunidade tributária de templos de qualquer culto. Vedação de instituição de impostos sobre o patrimônio, a renda e serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades. Artigo 150, VI, “b” e §4º, da Constituição. 3. Instituição religiosa. IPTU sobre imóveis de sua propriedade que se encontram alugados. 4. Imunidade prevista no artigo 150, VI, “b”, deve abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas também, o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas. 5. O § 4º do dispositivo constitucional serve de vetor interpretativo das alíneas “b” e “c”, do inciso VI do art. 150 da Constituição Federal. Equiparação entre as hipóteses das alíneas referidas. 6. Recurso extraordinário provido. (Relator: Ministro Ilmar Galvão, Relator para o acórdão o Min. Gilmar Mendes, julgado dia 18/12/2002, D.J.U. 14/05/2004, P. 33, in Revista Dialética de Direito Tributário, nº 106, os. 178-187).
Na mesma corrente, algumas decisões de tribunais de outros estados do Brasil denotam a busca pelo consentimento da liberdade religiosa com relação ás demandas que envolvem tributação aos templos religiosos, a exemplo da decisão favorável presente no julgado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no Agravo Interno no Agravo de Instrumento Nº002664-40.2011.8.19.0000, relatora a Em. Des.ª Claudia Telles[65]:
“ AGRAVO INTERNO. DECISÃO DA RELATORA QUE DEU PROVIMENTO AO RECURSO ACOLHENDO A EXCEÇÃO DE PRÉ EXECUTIVIDADE E EXTINGUINDO O PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. ENTIDADE RELIGIOSA SEM FINS LUCRATIVOS. INTELIGÊNCIA DO ART. 150,VI, B DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMUNIDADE TRIBUTÁRIA QUE DEVE ABRANGER NÃO SOMENTE OS PRÉDIOS DESTINADOS AO CULTO, MAS TAMBÉM O PATRIMÔNIO, A RENDA E OS SERVIÇOS RELACIONADOS COM AS FINALIDADES ESSENCIAIS DAS ENTIDADES MENCIONADAS. CRÉDITO TRIBUTÁRIO QUE JÁ SE ENCONTRA PRESCRITO. RECURSO DESPROVIDO. O recurso não merece acolhimento. A decisão que rejeitou a exceção de pré-executividade parte do pressuposto de que a imunidade fiscal prevista no artigo 150, VI, b e §4º da Constituição Federal estaria limitada aos imóveis das igrejas onde são realizados os respectivos cultos. Não procede esta fundamentação, eis que a norma constitucional em tela não estabelece tal limitação, devendo a imunidade abranger não somente os prédios destinados ao culto, mas também o patrimônio, a renda e os serviços relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.”
Contudo, esta não é uma posição pacífica em nossos tribunais. Nas religiões de matriz africana, onde não há ostentação material por parte da maioria de seus seguidores, em geral a maioria de seus sacerdotes, faz e segue a religião e não vive exclusivamente dela. Isso torna mais difícil para eles (sacerdotes), fazer a prova, de que realmente os templos onde são feitas as práticas religiosas, não são somente suas moradias, pois essas em sua grande maioria são templos apenas em seu interior e por fora uma residência normal.
Por esta razão, acabam recebendo os encargos como tal, ocasionando também posições divergentes em relação aquela apresentada acima, conforme julgado do Tribunal de Justiça de Minas Gerais a seguir. Apelação Cível nº1.0005.06.019194-6/001. Relator Dês. Brandão Teixeira [66]:
“EMENTA: AÇÃO DECLARATÓRIA E CONDENATÓRIA – TRIBUTÁRIO – IMUNIDADE – TEMPLOS DE QUALQUER CULTO – ARTIGO 150, VI, “b”, DA CF/88 – ÔNUS DA PROVA DO ENTE IMUNE – SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE – RECURSO DESPROVIDO. I – Para que a entidade religiosa possa ser considerada imune aos impostos sobre o patrimônio (IPTU) é necessária a prova de que seus imóveis desempenham atividades essenciais à consecução de seus objetivos institucionais. Caso contrário, não conseguindo provar referida vinculação, passa a se sujeitar à tributação como os demais contribuintes” (vide: Ricardo Alexandre. Direito Tributário esquematizado. São Paulo: Método, 2007. p. 157).
O Relator na APELAÇÃO CÍVEL interposta pela DIOCESE DE ITABIRA contra a sentença nos autos de ação declaratória e condenatória pleiteando a imunidade tributária dos seus imóveis existentes no MUNICÍPIO DE BELO ORIENTE, julgou parcialmente procedente o pedido. Vejamos parte do voto do Relator:
“A i. Magistrada julgou improcedente o pedido declaratório de imunidade tributária sobre os imóveis da Diocese nos termos formulados, por restringir a imunidade aos imóveis destinados a seus fins institucionais. Inconformada, insurge-se a DIOCESE DE ITABIRA contra a sentença, alegando que restou incontroverso o fato de que todos os bens de sua propriedade são utilizados em suas finalidades institucionais, tais como, centros pastorais ou de formação humana-religiosa, locais de reunião e administração, residências de padres e religiosos encarregados dos trabalhos da Igreja, sendo que alguns poucos imóveis que não estão diretamente ligados à realização dos cultos tem a renda revertida para a arrecadação de fundos com o fim de auxiliar na sustentação da sua missão institucional, razão pela qual a imunidade relativa ao IPTU deveria abranger todos os seus imóveis e não apenas os prédios destinados à celebração dos cultos religiosos.”
Portanto, mesmo em se tratando de demanda da igreja Católica, a posição jurisprudencial é controversa. Este fato leva-nos ao questionamento, ainda não possível de resposta no âmbito desta pesquisa, mas que exige aprofundamento, sobre o alcance deste direito ao conjunto de religiões não hegemônicas, principalmente não originadas na tradição ocidental européia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No primeiro capítulo trabalhou-se a informação e o esclarecimento a respeito da diferença entre isenções e imunidades tributárias, existentes em nosso ordenamento jurídico, buscando elucidar o leitor para um maior entendimento da matéria tributária exposta no trabalho, tendo como foco principal as imunidades relativas aos templos de qualquer culto elencados no artigo 150 VI alínea b da Constituição Federal de1988, essas, estendidas a todas as religiões, buscando abranger a todas, principalmente as de matriz africana, no que diz respeito a esse trabalho em especial a Religião Umbanda, assim, consubstanciando-se nos princípios constitucionais da liberdade do exercício de culto e de crença religiosa.
Avançando em nosso trabalho, no segundo capítulo, para o conhecimento do leitor, são abertas e reveladas, as características dessa religião genuinamente brasileira, com um aprofundamento melhor no sentido de conhecer essa religião, seus fundamentos e algumas liturgias praticadas por seus sacerdotes, adeptos e seguidores, desde o inicio de sua criação, também inserindo dados que mostram o registro da sua existência, dentro um percentual da população brasileira.
Ao final, no terceiro e último capítulo, foram trabalhadas as questões sociais e jurídicas envolvidas nas demandas propostas á serem elucidadas pelos tribunais, a cerca das atividades, dos imóveis e os serviços/trabalhos desenvolvidos nos templos, que envolvem destinação de verbas e pagamentos para o fomento e manutenção dos templos e sua religião e também a questão do templo como moradia, que no caso é maioria de seu templos nas religiões afro-brasileiras, são ao mesmo tempo residência e templo para estas pessoas, no caso o Cacique de Umbanda, (Babalorixá, Yalôrixa ,Babalaô)[67].
Foram os desafios desse estudo, que nos levou a não esgotar a matéria e nos remete a novos questionamentos e novas hipóteses, sobre o porquê do não exercício desse direito, em relação aos seguidores das religiões afro-brasileiras. Esses são os que deveriam buscar e usufruir de seus benefícios estabelecidos nesse marco legal que é o artigo 150 VI alínea b e §4º da Constituição Federal de 1988.
Informações Sobre o Autor
Edaurdo Isaías dos Santos Rocha
Acadêmico de Direito no Centro Universitário Metodista do IPA