Resumo: Este trabalho apresenta um estudo sobre questões importantes envolvendo a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, exigida dos participantes de procedimentos licitatórios a partir da edição da Lei 12.440/11. Serão apontados alguns princípios norteadores das relações processuais do trabalho e indicadas outras hipóteses em que a CNDT deveria ser exigida. O tema é relevante no ramo jurídico trabalhista, pois atualmente existem inúmeros casos de inadimplência de verbas rescisórias trabalhistas na Justiça do Trabalho. A Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas é instrumento inovador e eficaz para diminuir o descumprimento das obrigações.
Palavras-chave: Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas. Eficácia da Execução Trabalhista. Outras hipóteses de aplicabilidade.
Sumário: Introdução. 1. A Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas CNDT. 1.1 Banco Nacional de Devedores Trabalhistas BNDT. 2. O Processo Trabalhista. 3. A Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas como Instrumento de Eficácia das Execuções Trabalhistas. 4. Exigência da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas em Outras Hipóteses. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A execução de créditos trabalhistas, via de regra, passa pelo processo de conhecimento, onde deverão ser produzidas as provas necessárias para formar o convencimento do juiz e consequentemente obter a pretensão condenatória em face do empregador. Embora possa contar com diversos princípios e meios processuais a favor do trabalhador, muitas vezes empresas se furtam ao pagamento.
A Lei 12.440/11 instituiu a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT com a finalidade de averiguar se determinada pessoa física ou jurídica que deseja contratar com a Administração Pública possui débitos trabalhistas pendentes, sendo a certidão exigida nos procedimentos licitatórios.
Cumpre esclarecer que a lei está sendo alvo de ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, pendente de julgamento.
O diploma legislativo em questão acabou contribuindo para que empresas que desejam contratar com o poder público paguem suas dívidas trabalhistas, o que, por conseguinte, confere efetividade às execuções trabalhistas.
Acontece que não se pode deixar que a iniciativa caia em desuso, mas sim militar para que sua aplicabilidade seja ampliada, com o objetivo de proporcionar maiores benefícios aos reclamantes, que às vezes litigam por anos na Justiça do Trabalho à espera do recebimento da verba trabalhista, de natureza alimentar.
Assim sendo, este trabalho apresenta analise crítica sobre diversas questões envolvidas, e principalmente aponta como as mudanças legislativas poderão atuar de modo eficaz e proporcionar a redução dos débitos que se arrastam em batalhas processuais por anos a fio na Justiça do Trabalho.
1. A Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT
A Lei 12.440, de 7 de julho de 2011, acrescentou o artigo 642-A[1] à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e alterou a Lei 8.666/93 (Lei de Licitações), instituindo a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT. Em razão da vacatio legis de 180 dias, a norma passou a vigorar a partir de janeiro de 2012.
Atualmente, por força da referida lei, as empresas que desejam contratar com a Administração Pública através de licitação deverão, obrigatoriamente, apresentar a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, a fim de comprovar que não constam débitos judiciais trabalhistas decorrentes de decisões transitadas em julgado.
O requisito exigido impossibilita que empresas consideradas devedoras possam se habilitar em procedimento licitatório. Vale citar as palavras de LEITE: “Sensível ao relevante problema de ausência de efetividade da execução dos créditos trabalhistas, a Presidente da República sancionou a Lei n. 12.440, de 07.07.2011.” (LEITE; C. H. B. 2013, p. 1.267).
Resta claro que, acertadamente, a Lei 12.440/11 se tornou um meio de pressionar os devedores de créditos trabalhistas a cumprir com os pagamentos, uma vez que não poderão contratar com a administração pública caso estejam inscritos no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas – BNDT, que está sob a responsabilidade do Tribunal Superior do Trabalho – TST.
Entretanto, é importante destacar que o diploma legislativo em comento está sendo objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIn (ADI 4716), proposta pela Confederação Nacional da Indústria, a qual tramita perante o Supremo Tribunal Federal e ainda não foi julgada.
1.1 Banco Nacional de Devedores Trabalhistas – BNDT
O Tribunal Superior do Trabalho – TST, através da resolução administrativa n. 1.470/11 e posteriores alterações, regulamentou o Cadastro Nacional de Devedores Trabalhistas – CNDT instituindo o Banco Nacional de Devedores Trabalhistas – BNDT, que nada mais é do que uma central de informações onde, de acordo com o TST, “constam as pessoas físicas e jurídicas que são devedoras inadimplentes em processo de execução trabalhista definitiva”[2] Grifo original.
2. O Processo Trabalhista
Quando desfeita a relação empregatícia, para o empregado não há outra forma de reaver os valores senão litigando na Justiça do Trabalho, uma vez que a passagem pela Comissão de Conciliação Prévia – CCP, de acordo com entendimento do Supremo Tribunal Federal, não é mais obrigatória.
Especialmente no processo do trabalho se aplica o princípio da proteção processual ou princípio tutelar, considerando que o trabalhador está em clara posição de desvantagem técnica e econômica frente ao reclamado – empregador. O objetivo do principium é tentar corrigir a desigualdade instaurada no bojo da relação processual trabalhista entre empregado e patrão.
Outro meio processual que poderia ser aplicado em benefício do reclamante é a inversão do ônus da prova, porém até o momento existem inúmeras divergências sobre a aplicabilidade do instituto no processo trabalhista, vigendo a regra do artigo 333 do Código de Processo Civil, o ônus da prova incumbe a quem alega, com escassas exceções admitidas pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho.
Pois bem, observa-se que durante a relação de emprego, onde se instaura a subordinação do empregado, na maioria dos casos este não tem acesso a documentos e demais meios que possam comprovar suas alegações sobre fatos que necessitam ser apurados no processo trabalhista, restando se socorrer da prova testemunhal, considerada o meio de prova mais inseguro. Segundo Carlos Henrique Bezerra LEITE ‘não raro constitui o único meio de prova nesse setor especializado do Poder Judiciário brasileiro’[3].
Assim sendo, o empregado, sujeito aos poderes do empregador, ainda no processo trabalhista enfrenta dificuldades para provar os seus direitos e, por este motivo, corre o risco de não lograr todas as condenações almejadas.
Depois disso, inicia-se a fase de recursos trabalhistas, com a possibilidade de recorrer, observadas as hipóteses de lei, ao Tribunal Regional do Trabalho, Tribunal Superior do Trabalho e ao Supremo Tribunal Federal, o que confere morosidade ao processo trabalhista.
A introdução da exigência da CNDT – Certidão Negativa de Créditos Trabalhistas é novidade que, indiretamente, causou efeito no processo trabalhista. Isso porque as empresas que contratam com o poder público, em geral grandes litigantes trabalhistas, ficam cientes de que deverão saldar os débitos, sob pena de inclusão do nome no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas – BNDT.
A certidão, que é exigida em procedimentos de licitação, ajuda a combater o descumprimento das decisões condenatórias, alcançando a execução trabalhista maior efetividade. Observa-se, muitas vezes, que a empresa propõe um acordo na primeira audiência a fim de que a lide não siga em frente.
3. A Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas como Instrumento de Eficácia das Execuções Trabalhistas
Não são encontrados dados oficiais sobre a quantidade de execuções trabalhistas frustradas que existem atualmente, até porque muitas delas estão arquivadas. Porém, o cotidiano forense faz crer que são inúmeras, para não falar daquelas que ainda estão em andamento, por exemplo, em fase de penhora ou em fase de desconstituição da personalidade jurídica, cujo ritmo processual já anuncia que provavelmente não haverá pagamento.
Realmente, é frustrante para o reclamante e seu defensor (advogado particular/sindicato) litigar numa causa trabalhista, às vezes por anos, e ao final não conseguir obter a satisfação do crédito constituído nos autos. Isso também gera, por via transversa, um sentimento de descrédito na Justiça.
De um lado os processos judiciais trabalhistas tramitam lentamente, do outro o devedor, na intenção de fraudar a execução, vai lançando mão de inúmeros artifícios para desconstituir os bens empresarias e os que estão em seu nome, além de praticar outras condutas ilícitas/ilegítimas, as quais nem sempre se pode prever.
Também existem casos em que a atuação do magistrado está em dissonância com o princípio do impulso oficial, fortemente aplicado à execução trabalhista por expressa previsão no caput do artigo 878 da Consolidação das Leis Trabalhistas[4], o que não ajuda a reparar as desigualdades entre os litigantes.
Quanto à Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, tratada nos itens anteriores, cumpre destacar se destina a compelir os devedores ao pagamento, de modo que se estiverem inscritos no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas – BNDT não poderão participar de licitações, ou seja, constitui verdadeiro instrumento de pressão.
Esse instrumento de pressão, sem dúvida, torna a execução trabalhista mais eficaz.
4. Exigência da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas em Outras Hipóteses
È possível ampliar ainda mais a efetividade das execuções trabalhistas partindo desse mesmo ponto.
Primeiramente, pelo princípio da autonomia privada os particulares poderão contratar livremente, nada impedindo que esses contratantes possam exigir mutuamente a mencionada Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, a fim de averiguar se a outra parte é um devedor trabalhista. Seria uma forma de se certificar da idoneidade da conduta alheia, avaliando o comportamento nas demandas trabalhistas com trânsito em julgado, ou seja, constatar se é dado cumprimento às decisões judiciais das quais não caiba recurso, àquelas que perfazem coisa julgada.
Isso seria de grande valia em determinados casos onde há possibilidade de sobrevir responsabilidade subsidiária ou solidária pelo pagamento dos créditos trabalhistas, como se observa em determinados litígios de sucessão de empregadores, entre outros.
Ademais, certificando-se de que a empresa contratada não possui débitos na Justiça do Trabalho, que é boa pagadora, preservamos, ainda, as verbas públicas, em casos como a terceirização de mão-de-obra onde poderá existir responsabilidade subsidiária da Administração Pública pelo pagamento das verbas trabalhistas.
E não para por aí. Os benefícios da exigência da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas também podem ser ampliados para outras hipóteses, que dependerão de aprovação do legislador.
Pois bem, a inexistência de negativação do nome nos órgãos de proteção ao crédito, como SERASA e SPC, semelhante a não inscrição no BNDT – Banco Nacional de Devedores Trabalhistas, deveria ser requisito exigido em operações empresariais e de pessoas físicas, já que as normas de ordem pública devem disciplinar situações de interesse geral.
Assim sendo, baseado no modelo da Lei 12.440/11, já em utilização, e clamando por outras mudanças apropriadas, deveriam ser criadas normas para manter a exigência da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT nas demais situações que envolvam a figura dos devedores trabalhistas, como, por exemplo, para impedir a constituição de nova empresa em seu nome. Isso fará alcançar a segurança jurídica, que está no patamar constitucional como os direitos dos trabalhadores, adquiridos após muitas lutas sociais.
Estamos diante de um modelo a ser seguido. A Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, também poderia ser exigida em outras diversas situações, como forma de fechar o cerco contra os empresários que atuam em desconformidade com os ditames legais, praticando atos que não são admitidos. Eles deveriam ficar impedidos, caso inscritos no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas – BNDT, de: ser sócio ou constituir outra empresa, a fim de evitar a prática de novas fraudes contra trabalhadores; solicitar abertura de conta corrente, cuja intenção pode ser movimentar o dinheiro e fugir de eventuais penhoras on line; transmissão de bens, a não ser com autorização judicial, para impedir as fraudes em execução.
Apesar da Lei 12.440/2011 que instituiu a mencionada CNDT ainda estar pendente de manifestação quanto à sua constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, isso não impede sirva de base para outras criações legais que possam ajudar a minimizar as execuções frustradas e impor ou forçar, de alguma forma, o pagamento dos créditos trabalhistas.
Pelo exposto, atenta-se para diversas propostas que poderiam conferir mais efetividade às execuções trabalhistas. A imposição da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas em procedimentos licitatórios já fez a sua parte, contribui para que haja mais determinação das empresas no pagamento dos débitos judiciais do trabalho.
CONCLUSÃO
O objetivo da edição da Lei 12.440/2011, que instituiu a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT, foi, sem dúvida, proporcionar segurança jurídica nas contratações de empresas com o poder público, mas, indiretamente, também se tornou um meio de pressionar os devedores trabalhistas ao pagamento dos débitos.
Não se pode esquecer que discussões sobre a (in) constitucionalidade ainda estão tramitando perante o Supremo Tribunal Federal, através da ADI 4716, proposta pela Confederação Nacional da Indústria – CNI.
Apesar das peculiaridades do processo do trabalho, na prática ainda precisa-se de outros instrumentos para compelir os devedores ao pagamento dos débitos trabalhistas.
Embora pareça positivo incluir a exigência da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas – CNDT em algumas situações apontadas seria necessária elaboração de diploma legislativo. Já no caso da contratação entre particulares, as partes poderiam exigir a apresentação da certidão, não por força de lei, mas em função da autonomia de vontade e de cláusula contratual expressa nesse sentido.
Referências
CARRION, Valentim. Comentários à Consolidação das Leis do Trabalho. Legislação complementar / Jurisprudência. 38° ed. Atualização de Eduardo Carrion. São Paulo: Saraiva, 2013.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 6° ed. São Paulo: LTR, 2007.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra Leite. Curso de Direito Processual do Trabalho. 11° ed. São Paulo: LTR, 2013.
CONSELHO SUPERIOR DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Reportagem especial – Fraudes prejudicam a execução trabalhista. Disponível em http://www.csjt.jus.br/noticias1/-/asset_publisher/By5C/content/reportagem-especial-fraudes-prejudicam-a-execucao-trabalhista?redirect=%2Fnoticias1. Acesso em 24 de julho de 2013.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI questiona exigência de certidão negativa de débito trabalhista. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=199050. Acesso em 24 de julho de 2013.
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. O que é CNDT? Disponível em http://www.tst.jus.br/o-que-e-cndt. Acesso em 24 de julho de 2013.
Notas:
§ 1º O interessado não obterá a certidão quando em seu nome constar:
I – o inadimplemento de obrigações estabelecidas em sentença condenatória transitada em julgado proferida pela Justiça do Trabalho ou em acordos judiciais trabalhistas, inclusive no concernente aos recolhimentos previdenciários, a honorários, a custas, a emolumentos ou a recolhimentos determinados em lei; ou
II – o inadimplemento de obrigações decorrentes de execução de acordos firmados perante o Ministério Público do Trabalho ou Comissão de Conciliação Prévia.
§ 2º Verificada a existência de débitos garantidos por penhora suficiente ou com exigibilidade suspensa, será expedida Certidão Positiva de Débitos Trabalhistas em nome do interessado com os mesmos efeitos da CNDT.
§ 3º A CNDT certificará a empresa em relação a todos os seus estabelecimentos, agências e filiais.
§ 4º O prazo de validade da CNDT é de 180 (cento e oitenta) dias, contado da data de sua emissão.
Informações Sobre o Autor
Tereza Fernanda Martuscello Papa
Graduada em Direito pela Universidade Iguaçu UNIG. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho UGF. Docente da Universidade Iguaçu onde leciona Direito Civil Direito Processual Civil Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho. Advogada