Receitas decorrentes da prestação de serviços de radiodifusão aptas a integrar a base de cálculo da CIDE-FUST

Resumo: O presente estudo trata da discussão a respeito do enquadramento das receitas obtidas pelas emissoras de radiodifusão com veiculação de publicidade, propagandas e espaço de merchandising como fato gerador da CIDE-FUST.

Palavras-chave: Incidência. CIDE-FUST. Receitas. Serviços. Radiodifusão.

Sumário: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento. 2.1. Da análise da hipótese de incidência da CIDE-FUST. 2.2. Das receitas auferidas com propaganda, publicidade e merchandising. 2.3. Do enquadramento dos anunciantes como usuários do serviço de radiodifusão. 3. Conclusão

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1. INTRODUÇÃO

O presente estudo trata da discussão acerca do enquadramento das receitas obtidas pelas emissoras de radiodifusão com veiculação de publicidade, propagandas e espaço de merchandising como fato gerador da CIDE-FUST, a partir do acórdão proferido pela Sétima Turma Suplementar do Tribunal Regional Federal da Primeira Região, nos autos da Apelação em Mandado de Segurança n. 2001.34.00.011095-0/DF, no sentido de que radiodifusão é serviço de telecomunicação.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1. DA ANÁLISE DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DA CIDE-FUST

Inicialmente, é importante visualizar o que dispõe o inciso IV do art. 6º da Lei nº 9.998/2000, in verbis:

“Art. 6o Constituem receitas do Fundo:(…)

IV – contribuição de um por cento sobre a receita operacional bruta, decorrente de prestação de serviços de telecomunicações nos regimes público e privado, exluindo-se o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transportes Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações – ICMS, o Programa de Integração Social – PIS e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins”; (grifou-se)

Diante da transcrição acima, percebe-se que o legislador optou por utilizar a expressão “decorrente de prestação de serviços de telecomunicações (…)” para delimitar a receita operacional bruta sobre a qual deve incidir a contribuição.

A lei não fez distinção se a receita deveria ser auferida direta ou indiretamente da prestação de serviços de telecomunicações, mas tão somente definiu que a receita derivasse da prestação dos referidos serviços.

Dessa forma, o que se examina é o alcance da expressão “decorrente de”, para se definir as receitas que integrarão a base de cálculo do tributo. Ora, ser decorrente, por si só, implica a desnecessidade de a receita advir diretamente do ouvinte ou telespectador do serviço. É suficiente que a receita apenas decorra da condição de radiodifusora, ou seja, de características que lhes sejam peculiares.

Discussão similar ocorreu com relação à interpretação da cláusula 3.3 dos Contratos de Concessão do STFC. Esta cláusula, em apertada síntese, prevê o pagamento de um ônus de 2% incidente sobre as receitas auferidas pelas empresas decorrentes da aplicação dos planos de serviço.

Ou seja, trata-se de fato gerador com redação similar à da CIDE-FUST, que se utiliza da expressão “decorrente de”. Na ocasião, a Procuradoria Federal Especializada da Anatel enfrentou o tema por meio do Parecer nº 1.547-2009/ACD/PGF/PFE-Anatel, de 30.11.2009, aprovado em 23.03.2010, cujos trechos a seguir merecem transcrição:

“73. Por outro lado, quando a cláusula 3.3 dos contratos de concessão estabelece que o ônus recairá sobre as receitas decorrentes dos planos de serviços, básico e alternativo, não faz a distinção se essas receitas seriam diretas ou indiretas, nem tampouco se são ou não decorrentes da relação entre usuário e prestadora ou prestadora e prestadora.

74. Ao contrário, fixa que todas as receitas decorrentes dos planos de serviços que, por sua vez, derivam da concessão (STFC) seriam objeto da incidência do ônus. Ou seja, interpretação que cabe aqui é de que as receitas que derivam dos planos de serviços sejam diretas ou indiretas compõem a base de cálculo do citado ônus contratual.(…)

76. De fato, as receitas de interconexão só são auferidas em razão da própria aplicação do plano de serviço. (…)

87. Desse modo, em consonância com o Informe nº 141/2007/PBOAC/PBOA/SPB, bem como com os Ofícios nºs 165 a 170/2009/PBOA-Anatel e ainda com o entendimento adotado pelo Juízo da 22ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, entendemos que as receitas decorrentes dos serviços de interconexão devem ser incluídas na base de cálculo do ônus contratual previsto na cláusula 3.3 dos contratos de concessão.” (grifou-se)

Merece reprodução, ainda, trecho do Informe nº 141/2007/PBOAV/PBOA/SPB, ao tratar do mesmo assunto:

“4.29. Mas quais seriam estas receitas? Nossa resposta foi que seriam todas as receitas que direta ou indiretamente, devem sua aferição a existência do plano básico e alternativo, estando excluídas somente àquelas que fossem absolutamente independentes de planos de serviço.

4.30. De outra forma, a expressão decorrente da aplicação seria completamente inútil no contexto da cláusula. Neste ponto não podemos deixar de lembrar a lição clássica de Carlos Maximiliano (Hermenêutica e Aplicação do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 2006) de que “presume-se que a lei não contenha palavras supérfluas, devem todas ser entendidas como escritas adrede para influir no sentido da frase respectiva” (pág. 91), lição a qual retorna adiante na mesma obra – dá-se valor a todos os vocábulos e, principalmente, a todas as frases, para achar o verdadeiro sentido de um texto, porque este deve ser entendido de modo que tenham efeito todas as suas provisões, nenhuma parte resulte inoperantemente ou supérflua, nula ou sem significação alguma” (pág. 204).” (grifou-se)

Vale acrescentar que a questão acima está em discussão no Poder Judiciário, em diversas demandas. O leading case, ajuizado pela CTBC, é a ação ordinária nº 2007.34.00.013455-4. Após a prolação de sentença de improcedência pelo juízo de 1º grau, o TRF-1ª Região, por maioria de votos, deu parcial provimento ao recurso da empresa para excluir da base de cálculo do ônus as receitas de interconexão e outras receitas referentes aos serviços adicionais prestados a terceiros, que não o próprio assinante dos planos, mas mantendo, em contrapartida, as demais receitas discutidas naquele processo (p. ex., receitas de serviços adicionais – Prestações, Utilidades e Comodidades – PUCs, entre outros). Em seguida, a ANATEL opôs embargos infringentes, os quais já foram recebidos e aguardam julgamento.

O posicionamento da ANATEL naquela ação judicial, entre várias outras questões, acompanhando o entendimento adotado no âmbito administrativo, inclusive sumulado (Súmula ANATEL nº 07, de 2005[1]), caminha no sentido de que o uso da expressão “decorrente de” significa que tanto receitas diretas quanto as indiretas, indissociáveis do próprio serviço, devem sofrer a incidência da exação.

2.2.  DAS RECEITAS AUFERIDAS COM PROPAGANDA, PUBLICIDADE E MERCHANDISING

Fazendo-se uma analogia com o posicionamento acima exposto, tem-se que as receitas auferidas pelas radiodifusoras com propaganda, publicidade e merchandising só existem em razão da própria condição de radiodifusoras.

Explica-se: elas são as únicas capazes de negociar seus espaços em virtude de prestarem serviço de radiodifusão. Caso contrário, tais espaços sequer existiriam. Não poderiam ser negociados porque, sem a possibilidade de difusão de sinais unidirecionais destinados à recepção livre pelo público em geral, não haveria qualquer interesse econômico, tanto da parte do anunciante quanto da parte da própria difusora.

Não há como negar que as receitas provenientes de propaganda, publicidade e merchandising são diretamente decorrentes da prestação dos serviços de radiodifusão telecomunicações. De fato, os espaços de veiculação negociáveis só existem porque a empresa é prestadora do serviço de radiodifusão e, portanto, detém o direito de difundir sons ou sons e imagens ao público em geral. Raciocinando-se em sentido contrário, é de se perguntar qual a pessoa que detém esse tipo de espaço apto à negociação publicitária. A resposta é clara: nenhuma, salvo aquela que detém outorga para prestação do serviço de radiodifusão, de onde se conclui que tais receitas de propaganda, publicidade e merchandising obviamente decorrem da exploração do serviço.

Ora, as propagandas poderiam ser divulgadas por vários outros meios de comunicação, tais como jornais impressos, revistas, outdoors, casos que claramente não seriam decorrentes da prestação de serviços de telecomunicações.

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Contudo, no caso das publicidades veiculadas nos canais de radiodifusão, as receitas delas auferidas obviamente decorrem da própria prestação do serviço de telecomunicação, subsumindo-se à hipótese legal do inciso IV do art. 6º da Lei nº 9.998/2000.

 No mesmo sentido, já havia se manifestado a Auditoria da ANATEL, por meio do Informe AUD nº 007/2006[2], cujos trechos a seguir transcritos merecem destaque:

“6.1. O foco da discussão é o meio de propagação da comunicação. Neste caso, o meio é a prestação de serviços de telecomunicações que geram, para as emissoras, receitas operacionais brutas com tais serviços, logo, no nosso entendimento, essas empresas são potenciais contribuintes para o Fust. Tais propagandas poderiam ser veiculadas por outros meios de comunicações, como jornais, revistas, encartes, outdoors, etc. Neste caso, as receitas operacionais brutas não seriam passíveis de contribuição do Fust, pois não são de prestação de serviços de telecomunicações.

6.2. Na nossa opinião, as empresas de radiodifusão não seriam contribuintes para o Fust, caso se enquadrassem em uma das seguintes hipóteses:

a) não são empresas de telecomunicações;

b) são empresas de telecomunicações, mas existe legislação específica que as isentam, ou;

c) são empresas de telecomunicações, mas não geram receitas operacionais brutas com tais serviços.”

Do exposto, percebe-se que as empresas de radiodifusão só não seriam contribuintes da CIDE-FUST caso: (i) não fossem empresas de telecomunicações; (ii) em sendo empresas de telecomunicações, se existisse legislação específica que as isentasse; (iii) em sendo empresas de telecomunicações, não gerassem receitas operacionais brutas com tais serviços.

Ora, o primeiro ponto restou superado pelo acórdão proferido pela 7ª Turma Suplementar do Tribunal Regional Federal da 1ª Região nos autos da Apelação em Mandado de Segurança nº 2001.34.00.011095-0 (numeração única 0011082-14.2001.4.01.3400) ao definir que radiodifusão é sim serviço de telecomunicação.

Em relação ao segundo ponto, não se vislumbra qualquer legislação específica que afaste a receita operacional bruta das radiodifusoras da incidência da CIDE-FUST. Ao contrário, o dispositivo legal é geral e expresso no sentido de que deve haver incidência do tributo sobre a receita operacional bruta decorrente da exploração do serviço de telecomunicações, in casu, de radiodifusão. Como sabido, somente a lei poderia estabelecer hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários. Eis o teor do inciso VI do artigo 97 do Código Tributário Nacional:

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:(…)

VI – as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.

A Constituição Federal ainda prevê, no art. 150, §6º, que:

§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.

Assim, não havendo diploma legal que estabeleça a isenção de parcela das receitas operacionais auferidas na prestação de serviços de telecomunicações – sejam as denominadas diretas, sejam as denominadas indiretas – não há como um normativo infralegal assim dispor. 

Cabe advertir que classificar contabilmente como receitas indiretas parte das receitas operacionais auferidas não modifica a natureza da receita. Assim, as receitas indiretas aqui referidas, por serem receitas operacionais, integram a base de cálculo da CIDE-FUST.

Quanto ao terceiro ponto, as empresas de radiodifusão somente estariam fora do âmbito de incidência da hipótese legal prevista no inciso IV do art. 6º da Lei nº 9.998/2000 caso não auferissem receitas operacionais brutas decorrentes de tais serviços.

Ora, radiodifusão gera receita operacional. Há, inclusive, disputa e pagamento pela outorga, o que evidencia o interesse econômico envolvido. Admitir a inexistência de receita decorrente do serviço de radiodifusão conduziria à conclusão inaceitável de que as radiodifusoras são prestadoras sem interesse econômico. Ao contrário, para ouvirem/assistirem ao conteúdo difundido, os ouvintes/telespectadores são obrigados a se submeterem a um bombardeio de anúncios publicitários, explícitos ou implícitos, anúncios estes que constituem a receita obtida pelas radiodifusoras, sociedades empresárias com o legítimo interesse lucrativo como qualquer outra. A diferença é que, em razão do modelo negocial do setor, a receita e consequentemente o lucro advêm da propaganda, publicidade e merchandising, por meio da venda dos espaços a serem difundidos livremente ao público em geral.

O argumento de que os usuários não pagam pela prestação do serviço não procede, uma vez que os usuários não se restringem aos telespectadores e ouvintes, mas também englobam as empresas e os próprios os órgãos governamentais, que se utilizam daquele canal para divulgarem seus produtos/ideias/serviços à população.

Nesse aspecto, há receita auferida e há perfeito enquadramento no conceito de “receita operacional bruta, decorrente de prestação de serviços de telecomunicações”, tal qual previsto no inciso IV do art. 6º da Lei nº 9.998/2000.

No mesmo sentido, também se manifestou a Auditoria da ANATEL, por meio do Informe AUD nº 007/2006[3], cujos trechos a seguir transcritos merecem realce:

“4.12. Com relação às citações contidas no Parecer, transcritas no item 4.10, esta Auditoria entende que “usuários” do serviço de telecomunicação das emissoras de radiodifusão não é apenas o “ouvinte ou o telespectador”, mas também as “empresas e o governo”. São esses últimos que geram receita operacional bruta de prestação de serviços de telecomunicações ao contratarem os serviços dessas emissoras para veicularem (transmitirem) propagandas, anúncios, merchandising, etc.

4.13 Nesse contexto, incluímos, também, como “usuárias” dessas emissoras as suas afiliadas, coligadas, retransmissoras e repetidoras, uma vez que estas também “contratam” a prestação de serviços de telecomunicações.”

2.3. DO ENQUADRAMENTO DOS ANUNCIANTES COMO USUÁRIOS DO SERVIÇO DE RADIODIFUSÃO

Outro aspecto que merece reflexão é a questão de se tratar a propaganda e o merchandising como uma prestação de serviço gratuito de telecomunicação ao usuário.

Ora, na grande maioria das vezes, o ouvinte ou o telespectador sequer possui interesse no conteúdo transmitido por meio das publicidades, sendo fato que os verdadeiros interessados são os anunciantes, que também são usuários e efetivamente “pagam” por aqueles serviços.

Dessa forma, como visto acima, não há como deixar de enquadrar os anunciantes como usuários, que remuneram as radiodifusoras pela utilização de seu espaço. Tampouco há como deixar de afirmar que estas auferem receitas operacionais com os anúncios feitos em seus espaços, em decorrência de sua própria condição de radiodifusoras.

Muito bem descreveu esta situação a Auditoria da ANATEL, no Informe AUD nº 007/2006[4], cujo trecho segue destacado:

“4.14 Ainda sobre essa questão, seria um “sofismo” afirmar que a propaganda é uma prestação de serviço de telecomunicação ao “telespectador ou ouvinte”, pois, na maioria das vezes, “estes” não estão interessados no seu conteúdo. Dessa forma, as “empresas e o governo” seriam os verdadeiros “usuários” da prestação desses serviços mediante o pagamento destes. Estas emissoras, pela prestação de serviços de telecomunicações decorrentes da veiculação de propagandas e transmissão de programas, auferem receita operacional bruta e, assim sendo, são, no nosso entendimento, passíveis de recolhimento da contribuição ao Fust.”

Vender espaço na grade de programação é inerente à condição de radiodifusor. Ninguém mais pode fazê-lo. Logo, percebe-se que a receita obtida decorre da prestação do serviço. A receita obtida é operacional e decorre da prestação do serviço de telecomunicações. O Manual do Sistema de Coleta de Informações da Anatel – SICI [5] traz a definição de receita operacional bruta. Vejamos:

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“Receita Operacional Bruta (ROB): Decorrente das vendas totais de uma empresa, sem as deduções, devoluções, abatimentos, etc. Corresponde à receita total, não considerando qualquer desconto, nem mesmo as despesas operacionais ou custos.”

Dessa maneira, tem-se que toda receita decorrente das vendas totais de uma empresa configura-se receita operacional e, portanto, integra a base de cálculo da CIDE-FUST.

Assim sendo, como poderiam não ser enquadradas na hipótese de incidência da CIDE-FUST aquelas receitas obtidas com as negociações dos espaços das radiodifusoras, uma vez que estes espaços só existem e possuem valor em razão de sua veiculação por meio da prestação de serviços de telecomunicações?

Dessa maneira, tem-se que toda receita que só pode ser obtida em razão da condição de radiodifusor configura base de cálculo da CIDE-FUST.

Esses argumentos estão plenamente alinhados com a tese da Consultoria Jurídica junto ao Ministério das Comunicações de que deve haver cobrança de FUNTEL sobre interconexão[6]. Vejamos:

“6. Embora inexista dispositivo legal acerca de não incidência da contribuição para o Funttel, prevista no art. 4º, inciso III da Lei nº 10.052, de 2000, existe uma celeuma jurídica sobre se é possível considerar a receita auferida pelas prestadoras de serviços de telecomunicações pela prestação de serviço de interconexão como fato gerador da mencionada contribuição.(…)

13. Assim, a hipótese de incidência da contribuição prevista no art. 4º, inciso II da Lei do Funttel é a auferição de receita bruta, observadas as deduções legais, decorrente da prestação de serviços de telecomunicações.

14. A definição de serviços de telecomunicações está prevista no art. 60 da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997:(…)

17. Ora, se a interconexão é uma atividade que possibilita o serviço de telecomunicações e se qualquer receita proveniente desse serviço remunerada por preço ou tarifa é fato gerador da contribuição prevista no art. 4º, inciso II da Lei nº 10.052, de 2000, é fato que a receita proveniente da interconexão está abarcada pela hipótese de incidência prevista na norma.(…)

26. Cumpre destacar que a contribuição para o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações – Fust, previsa no art. 6º, inciso IV da Lei nº 9.998, de 17 de agosto de 2000, possui a mesma hipótese de incidência do Funttel, divergindo desse em razão da finalidade da contribuição. Em recente decisão, a Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região entendeu na Apelação nº 2006.34.00.000403-8/DF, no tocante à contribuição para o Fust, que:

TRIBUTÁRIO – PROCESSUAL CIVIL – CONTRIBUIÇÃO PARA O FUNDO DE UNIVERSALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES-FUST – RECEITA OPERACIONAL BRUTA – BASE DE CÁLCULO, LEGALMENTE, PREVISTA – LEI Nº 9.998/2000, ART. 6º, IV, E PARÁGRAFO ÚNICO – EXCLUSÃO DE RECEITAS DECORRENTES DE INTERCONEXÃO – INADMISSIBILIDADE – REQUISITOS LEGAIS – CUMPRIMENTO – FALTA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA – ÔNUS DA PROVA – CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, ART. 333, I – APLICABILIDADE.

a) Recurso – Apelação em Mandado de Segurança.

b) Decisão de origem – Segurança denegada.

1 – As Apelantes não infirmam o fato de que as receitas decorrentes do compartilhamento das respectivas redes de telefonia compõem a receita operacional bruta, que é a BASE DE CÁLCULO definida nos termos de norma legal válida.

2 – Não infirmada a ocorrência do fato gerador da obrigação e inexistente prova inequívoca de que as receitas decorrentes do compartilhamento de redes de telefonia não integram a receita operacional bruta, que é a base de cálculo definida, legalmente, para o recolhimento da Contribuição Para o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações – FUST, não merece acolhida a pretensão das Impetrantes.

3 – Apelação denegada.

4 – Sentença confirmada.

27. Ora, este entendimento é perfeitamente aplicável às contribuições ao Funttel, já que a hipótese de incidência é semelhante à da contribuição do Fust.

28. Cabe ressaltar, ainda, que a interpretação do multicitado art. 6º, §4º do Decreto nº 3.737, de 2001 que mais se aproxima do comando constitucional. Com efeito, a Constituição Federal prevê, no art. 150, §6º que:

§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.

29. Ademais, o Código Tributário Nacional estabelece que:

Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:(…)

III – a definição do fato gerador da obrigação tributária principal, ressalvado o disposto no inciso I do § 3º do artigo 52, e do seu sujeito passivo;(…)

VI – as hipóteses de exclusão, suspensão e extinção de créditos tributários, ou de dispensa ou redução de penalidades.

30. Ora, se a Lei nº 10,052, 2000, não estabeleceu uma hipótese de não-incidência como poderia o Decreto estabelecer?

31. A interpretação de que a previsão do §4º. Do art. 6º do Decreto se refere também aos valores de interconexão transferidos levaria a conclusão de que o Decreto seria ilegal nesse ponto e, por consequência, inconstitucional, por ausência de previsão legal na Leo nº 10,052, de 2000.” (grifou-se)

Como se extrai do caso acima, pode-se dizer que admitir que a base de cálculo é zero poderia implicar riscos à própria tese da incidência da CIDE-FUST e da CIDE-FUNTEL sobre interconexão.

Conforme se vê, a Consultoria Jurídica junto ao Ministério das Comunicações possui entendimento de que, se a interconexão é uma atividade que possibilita o serviço de telecomunicações e se qualquer receita proveniente desse serviço é fato gerador da contribuição prevista no art. 4º, inciso II, da Lei nº 10.052, de 2000, é fato que a receita proveniente da interconexão está abarcada pela hipótese de incidência prevista na norma.

Fazendo-se uma analogia, pode-se afirmar que, se a propaganda, publicidade e merchandising são as atividades que viabilizam financeiramente a prestação do serviço de radiodifusão e se a receita decorrente desse serviço é fato gerador da contribuição prevista no inciso IV do art. 6º da Lei nº 9.998/2000, é fato que a receita proveniente da propaganda, publicidade e merchandising, obtida pelas radiodifusoras, está abarcada pela hipótese de incidência prevista na referida norma.

Assim, qualquer tentativa de afastar parcela da receita operacional bruta da hipótese de incidência da CIDE-FUST – sem a existência de lei autorizadora – deve ser rechaçada, uma vez que já restou demonstrado que há usuários (empresas, órgãos governamentais, dentre outros interessados em anunciar) que efetivamente pagam às radiodifusoras pela utilização de seus espaços. Nesse caso, não se está a falar de tarifa, mas sim de preço.

Desse modo, não há como negar que as emissoras de radiodifusão abertas, assim como as distribuidoras de TV fechada, como as de TV a Cabo, auferem receita operacional bruta decorrente da prestação de serviços de telecomunicações com assinaturas, propagandas, programas, dentre outros, enquadrando-se, pois, como contribuintes da CIDE-FUST.

Nesse mesmo sentido se manifestou a Auditoria Interna da ANATEL, por meio do Parecer Técnico nº (s/n), de 06.12.2006, inserto nos autos do processo administrativo nº 53500.0157102006, cujos trechos a seguir merecem reprodução:

“(…) é bom esclarecer, antes de tudo, que qualquer tipo de prestação de serviço ou venda de bem é remunerada por preço (receita). No caso de serviços públicos, o preço tem o nome de tarifa. No caso dos usuários, esta Auditoria entende que eles não são apenas o “ouvinte ou o telespectador”, mas também as empresas, o governo, as afiliadas, coligadas, retransmissoras, repetidoras, etc, que remuneram (preço) as empresas de radiodifusão para que estas prestem serviços de telecomunicações por meio da transmissão de conteúdo (propaganda, programas, etc).”

3. CONCLUSÃO

Diante do exposto, é de se concluir, portanto, que as receitas oriundas de propaganda, publicidade e merchandising, obtidas pelas prestadoras de serviço de radiodifusão, integram a base de cálculo da CIDE-FUST, pelos seguintes motivos, em suma: (i) a expressão “decorrente” contida no inciso IV do art. 6º da Lei nº 9.998/2000 é ampla e afasta a necessidade de as receitas advirem diretamente do ouvinte ou telespectador; (ii) as radiodifusoras constituem sociedades empresárias que legitimamente possuem interesse econômico, com a diferença que atuam num setor cujo modelo negocial conduz a que a receita obtida advenha de propaganda, publicidade e merchandising, por meio da venda dos espaços a serem difundidos livremente ao público em geral; (iii) as radiodifusoras, nessa linha, obtêm receita decorrente da prestação dos seus serviços, valendo lembrar que as outorgas são inclusive disputadas, com pagamento pela sua obtenção; (iv) os espaços de veiculação negociáveis só existem porque a empresa é prestadora do serviço de radiodifusão e, portanto, detém o direito de difundir sons ou sons e imagens ao público em geral. Ou seja, apenas aquela que detém outorga para prestação do serviço de radiodifusão detém esse tipo de espaço apto à negociação publicitária, de modo que a receita advinda dessa negociação é claramente decorrente da exploração do serviço de radiodifusão prestado; (v) os anunciantes publicitários, que pagam às radiodifusoras para veicularem seus produtos/ideias, podem ser considerados usuários do serviço de radiodifusão, uma vez que pagam para usar o espaço difundido livremente ao público em geral; (vi) a classificação contábil atribuída à receita obtida com a negociação dos espaços de merchandising não altera a sua natureza: direta ou indireta, sendo ela operacional e decorrente da prestação de serviços de telecomunicações, integra a base de cálculo do tributo (vii) a título de exemplo, as receitas de interconexão obtidas pelas prestadoras de serviços de telecomunicações, segundo posicionamento da Anatel e do Ministério das Comunicações, sofrem incidência da CIDE-FUST e CIDE-FUNTTEL.

 

Referências
Informe AUD nº 007/2006, de 16/06/2006 (fls. 01 a 05 do processo administrativo nº 53500.015710.2006 ANATEL).
Informe AUD nº 007/2006, de 10/05/2006 (fls. 06 a 09 do processo administrativo nº 53500.015710.2006 ANATEL).
MANUAL DO SISTEMA DE COLETA DE INFORMAÇÕES – SICI – Edição Março/2012 Fonte: Manual SICI – versão março 2012. Disponível em: http://sistemas.anatel.gov.br/sici/NovaColeta/upload/modelo/MANUALSICIpdf.pdf
Parecer nº 1989/2012/ALM/CGNS/CONJUR-MC/AGU, de 12.12.2012, aprovado por meio do Despacho nº 7293/2012/JFB/GAB/CONJUR-MC/CGU/AGU, de 13.12.2012.
 
Notas:
[1]  “Não podem ser excluídas da base de cálculo das contribuições ao FUST, dentre outras, as receitas a serem repassadas a prestadoras de serviços de telecomunicações a título de remuneração de interconexão e pelo uso de recursos integrantes de suas redes.
Não podem ser excluídas da base de cálculo das contribuições ao FUST, dentre outras, as receitas recebidas de prestadoras de serviços de telecomunicações a título de remuneração de interconexão e pelo uso de recursos integrantes de suas redes.
Esta Súmula entra em vigor na data de sua publicação produzindo seus efeitos a partir da vigência da Lei n.º 9.998/00, de 17 de agosto de 2000, que instituiu o FUST.”

[2] Informe AUD nº 007/2006, de 16/06/2006 (fls. 01 a 05 do processo administrativo nº 53500.015710.2006 ANATEL).

[3] Informe AUD nº 007/2006, de 10/05/2006 (fls. 06 a 09 do processo administrativo nº 53500.015710.2006 ANATEL).

[4] Informe AUD nº 007/2006, de 10/05/2006 (fls. 06 a 09 do processo administrativo nº 53500.015710.2006 ANATEL).

[5] MANUAL DO SISTEMA DE COLETA DE INFORMAÇÕES – SICI – Edição Março/2012 Fonte: Manual SICI – versão março 2012. Disponível em: http://sistemas.anatel.gov.br/sici/NovaColeta/upload/modelo/MANUALSICIpdf.pdf

[6] Parecer nº 1989/2012/ALM/CGNS/CONJUR-MC/AGU, de 12.12.2012, aprovado por meio do Despacho nº 7293/2012/JFB/GAB/CONJUR-MC/CGU/AGU, de 13.12.2012.


Informações Sobre o Autor

Isabela Xavier Calixto

Procuradora Federal, Pós-Graduada em Direito Público e Direito Tributário


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