A desnecessidade de observância do art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal na contratação de serviços contínuos

Resumo: O presente trabalho pretende evidenciar a desnecessidade de observância do artigo 16 da LRF na contratação de serviços contínuos. Neste sentido, busca-se esclarecer os conceitos que envolvem a denominada ação governamental, além dos entendimentos do TCU e da AGU a respeito da matéria sob enfoque.

Palavras-chave: Art. 16 da LRF. Serviços Contínuos. Inaplicabilidade.

Sumário: Introdução. 1. Os conceitos de “criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental”. 2. O art. 16 da LRF frente aos contratos de serviços contínuos. 2.1. O entendimento do Tribunal de Contas da União. 2.2. O entendimento da Advocacia Geral da União. Conclusão.

INTRODUÇÃO

A Lei Complementar 101, amplamente conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, foi editada num contexto em que o Estado brasileiro necessitava apresentar provas de maior controle de sua finanças perante entes financiadores e eventuais investidores.

Ponderações ideológicas à parte, a LRF, de fato, conferiu maior segurança e seriedade à condução das finanças públicas, na medida em que instituiu, para  União, Estados e Municípios, regras claras sobre limite de despesas com pessoal, metas fiscais a serem atingidas e metodologias a serem empreendidas pelo entes na execução e controle orçamentários.

Umas das inovações introduzidas pela LC 101 consistiu na exigência insculpida em seu artigo 16 no seguinte sentido:

“Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 1o Para os fins desta Lei Complementar, considera-se:

I – adequada com a lei orçamentária anual, a despesa objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exercício;

II – compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não infrinja qualquer de suas disposições.

§ 2º A estimativa de que trata o inciso I do caput será acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas.

§ 3º Ressalva-se do disposto neste artigo a despesa considerada irrelevante, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 4º As normas do caput constituem condição prévia para:

I – empenho e licitação de serviços, fornecimento de bens ou execução de obras;

II – desapropriação de imóveis urbanos a que se refere o § 3o do art. 182 da Constituição.”

Muito foi discutido pela doutrina e pela jurisprudência do Tribunal de Contas da União a respeito dos conceitos de “criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental”. Em última instância, tratava-se de elucidar em quais hipóteses se imporia a instrução de processos com as manifestações das áreas orçamentárias a respeito dos requisitos de que cuidam os incisos e parágrafos do dispositivo acima reproduzido.

Uma das celeumas instauradas em torno da necessidade ou não de observância do art. 16 da LRF residiu na discussão atinente aos contratos de serviços contínuos firmados pela Administração Pública com base no art.  57, II, da Lei 8.666/93. Isso porque, por diversas vezes, os órgãos de controle e as consultorias jurídicas internas dos órgão e entidades da Administração vinham a exigir a observância de tais requisitos em contratação rotineiras, tais como serviços de limpeza, vigilância e manutenção predial.

1. OS CONCEITOS DE “CRIAÇÃO, EXPANSÃO OU APERFEIÇOAMENTO DE AÇÃO GOVERNAMENTAL”.

A leitura do art. 16 da LRF exclusivamente fundamentada no senso comum pode conduzir o intérprete a equívocos, dada a amplitude que o conceito de “ação governamental” pode assumir. Trata-se de definição intimamente relacionada com o conceito de orçamento-programa, que, ao contrário do conceito tradicional de orçamento, focado no “que o governo compra”, tem por principal objetivo estabelecer aquilo “que o governo faz”.

É nesse contexto que se enquadra a “ação governamental”: conceito técnico, como quase tudo o que consta da LRF, extraído da gestão pública, que configura o substrato de origem de todos os programas e subprogramas que devem contar das peças orçemantárias.  É a partir desse fundamental que se dá toda a classificação funcional-programática adotada nos orçamentos no Direito Financeiro.

De tudo isso é possível observar que não é qualquer despesa pública capaz de caracterizar uma ampla “ação governamental”, embora aquela, em última instância, derive desta. Tanto é verdadeira esta distinção que o próprio caput do art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece que somente a crição ou expansão de ação governamental que implique aumento de despesa necessita observar os seus ditames. Nesse sentido, é o acórdão TCU 883/2005, Primeira Câmara:

“4.21. O corolário dessa construção hermenêutica seria o de que nem todas as despesas públicas, independentemente de valor, sujeitam-se à exigência de figuração no demonstrativo de impacto orçamentário-financeiro exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, cuja preocupação seria apenas com a despesa que afete o resultado fiscal, ainda que futuramente.”

Sobre o que o intérprete deve entender por “criação”, “expansão” ou “aperfeiçoamento”, peço vênia, para reproduzir as ponderações tecidas pelo Tribunal de Contas da União no acórdão TCU 1085/2007 – Plenário, as quais delineam, com precisão o conteúdo dos referidos conceitos:

‘O vocábulo criação deriva do latim creatio, sendo empregado no sentido de ato de criar, que configura a manifestação da vontade estatal promotora do nascimento da relação jurídica de repercussão no campo financeiro-orçamentário. Aqui é tomada com  o sentido de instituição de uma atividade nova, portanto, que não esteja prevista no sistema de programação governamental.

Por outro lado, a expansão implica conceito que determina a existência de ação preexistente, na medida em que não encerra algo novo. Reproduz tão-somente atividade devidamente institucionalizada que, por opção de política governamental, necessita ser expandida, por conveniência do interesse público. É ditado, portanto, em razão das exigências derivadas das demandas sociais, da prestação de serviços públicos e dos investimentos que ao Poder Público cabe realizar.

(…)

Finalmente, tem-se o aperfeiçoamento, que não se encaixa nas situações anteriores, embora de certa forma pressuponha a existência de programa em execução. Nesse caso, a atividade é voltada somente para o aprimoramento das ações de governo, mas gera conseqüências financeiras com sua implementação.’

2. O ART. 16 DA LRF FRENTE AOS CONTRATOS DE SERVIÇOS CONTÍNUOS

Não se pretende aqui debater o conceito de serviços contínuos, nem muito menos, as discussões pontuais que ainda persistem em torno de sua caracterização. O propósito do presente tópico reside apenas em demonstrar a desnecessidade de observância do art. 16 da LRF nos casos de serviços corriqueiros, classificados pela Administração como de natureza continuada.

Parte-se, pois, da premissa abstrata no sentido da simples definição de tais serviços como aqueles de que os órgãos e entidades necessitam em caráter permenente e que, por isso, podem ter a vigência de seus respectivos contratos, prorrogada para além dos exercícios financeiros em que firmados. Vamos então à demonstração do entendimento que nos parece consolidado no âmbito do Tribunal de Contas da União e da Advocacia Geral da União. 

2.1. O ENTENDIMENTO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO

À luz do que foi exposto no tópico 02 supra, não é qualquer despesa pública que impõe a necessidade de atendimento dos ditames legais do art. 16 da LC 101/00. Nem mesmo a possibilidade de que determinados contratos, caso daqueles que têm por objeto serviços contínuos, superem os exercícios financeiros em que firmados é capaz de impor, por si só, a necessidade de manifestações da áreas orçamentárias de órgão e entidades a respeito da LRF.

Nesse sentido, serviços corriqueiros, usuais e permanentes, já previstos na leis orçamentárias anuais, não alcançam o conceito de ação governamental. É aqui, pois, que se enquadram, geralmente, os serviços contínuos contratados pela Administração. Trata-se, a propósito, da conclusão adotada pelo Tribunal de Contas da União no Acórdão 883/2005, Primeira Câmara:

“Já as despesas contínuas, mormente as relacionadas a serviços de manutenção e funcionamento do setor público, por não serem criadas ou aumentadas em suas renovações contratuais ou licitações anuais, não se sujeitariam aos preceitos dos arts. 16 e 17, em virtude de não constituírem gastos novos (foram criadas no passado e, portanto, já fizeram parte de leis orçamentárias pretéritas) e porque previstas na lei orçamentária vigente por força do dispositivo das LDO determinando que os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público da União terão como limites de despesas correntes e de capital, para efeito de elaboração dos respectivos orçamentos, o conjunto de dotações fixadas na lei orçamentária anterior.”

2.2. O ENTENDIMENTO DA ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

Conforme se delineou na introdução do presente artigo, uma das razões que conduziu à instauração da celeuma aqui discutida, foi a insistência, especialmente de determinadas consultorias e assessorias jurídicas no sentido da sentido de que os processo de contratação de serviços contínuos fossem instruídos com a demonstração dos requisitos exigidos no art. 16 da LRF.

Com o fito de por termo à divergência daí surgida, a AGU, em abril do corrente ano, aprovou, por intermédio da Portaria AGU 124 (DOU de 02/05/2014), a Orientação Normativa 52, que tem por objeto exatamente a discussão em questão. Nesse sentido, vale dizer que as orientações normativas firmadas pelo Advogado Geral da União ostentam caráter vinculante perante todos os órgãos e membros da instituição, de modo a harmonizar os procedimentos e interpretações a ela pertinentes. Trata-se de medida adotada com fulcro nos incisos I, X, XI e XIII do art. 4º da Lei Complementar nº 73/93. Vejamos, pois, o conteúdo da citada orientação normativa:

“As despesas ordinárias e rotineiras da administração, já previstas no orçamento e destinadas à manutenção das ações governamentais preexistentes, dispensam as exigências previstas nos incisos i e ii do art. 16 da Lei Complementar nº 101 de 2000”. 

CONCLUSÃO

À luz de tudo o que foi exposto e na esteira do entendimento consolidado da AGU e do TCU, pode-se, portanto, dizer que serviços contínuos comuns e corriqueiros, como vigilância, limpeza, copeiragem e apoio administrativo prescindem, para a sua contratação, da observância dos requisitos de que cuida a Lei de Responsabilidade Fiscal em seu art. 16. Isso porque tais contratações não repercutirão em nenhuma despesa para além daquela relativa a seus próprios custos. Em outro dizer, não se trata de “projeto”, de que deverá resultar determinado “produto”, o qual implicaria, posteriormente, na assunção de outros custos para a Administração.

O risco, portanto, do qual a LRF, em seu art. 16, tentou resguardar o patrimônio público, a saber: o desequilíbrio financeiro, não paira sobre essas hipóteses.  Não se enquadram tais casos naquilo que o caput do mencionado dispositivo legal convencionou chamar de “criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental”. Cuida-se, na realidade, de atividade habitual, corriqueira, que, dessa forma, tem o condão de possivelmente gerar consequências negativas sobre as finanças do órgão ou entidade, em virtude de não possuírem o efeito multiplicador de despesas, característico da expansão de ações governamentais.

Nesse contexto, os documentos que atestam a disponibilidade orçamentárias para os serviços já é capaz de demonstrar a viabilidade financeira em se promover a licitação e sua posterior e eventual contratação. Por meio de tal documento já se está a efetuar a afetação de recursos no elemento de despesa efetivamente correspondente ao serviço que se pretende seja prestado. Trata-se, portanto, tão-somente de gerenciar os recursos disponibilizados pela Lei Orçamentária Anual, sem, de forma alguma, desrespeitar os limites por ela impostos.


Informações Sobre o Autor

Larissa de Barros Pontes

Procuradora Federal de 2 Categoria. Lotada na Procuradoria Regional Federal da 1 Região. Bacharel em Direito e Especialista em Direito Público


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A desnecessidade de observância do art. 16 da lei de responsabilidade fiscal na contratação de serviços contínuos

Resumo: O presente trabalho pretende evidenciar a desnecessidade de observância do artigo 16 da LRF na contratação de serviços contínuos. Neste sentido, busca-se esclarecer os conceitos que envolvem a denominada ação governamental, além dos entendimentos do TCU e da AGU a respeito da matéria sob enfoque.

Palavras-chave: Art. 16 da LRF. Serviços Contínuos. Inaplicabilidade.

Sumário: Introdução. 1. Os conceitos de “criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental”. 2. O art. 16 da LRF frente aos contratos de serviços contínuos. 2.1. O entendimento do Tribunal de Contas da União. 2.2. O entendimento da Advocacia Geral da União. Conclusão.

Introdução

A Lei Complementar 101, amplamente conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, foi editada num contexto em que o Estado brasileiro necessitava apresentar provas de maior controle de sua finanças perante entes financiadores e eventuais investidores.

Ponderações ideológicas à parte, a LRF, de fato, conferiu maior segurança e seriedade à condução das finanças públicas, na medida em que instituiu, para  União, Estados e Municípios, regras claras sobre limite de despesas com pessoal, metas fiscais a serem atingidas e metodologias a serem empreendidas pelo entes na execução e controle orçamentários.

Umas das inovações introduzidas pela LC 101 consistiu na exigência insculpida em seu artigo 16 no seguinte sentido:

“Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I – estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes;

II – declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 1o Para os fins desta Lei Complementar, considera-se:

I – adequada com a lei orçamentária anual, a despesa objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exercício;

II – compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não infrinja qualquer de suas disposições.

§ 2º A estimativa de que trata o inciso I do caput será acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas.

§ 3º Ressalva-se do disposto neste artigo a despesa considerada irrelevante, nos termos em que dispuser a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 4º As normas do caput constituem condição prévia para:

I – empenho e licitação de serviços, fornecimento de bens ou execução de obras;

II – desapropriação de imóveis urbanos a que se refere o § 3o do art. 182 da Constituição.”

Muito foi discutido pela doutrina e pela jurisprudência do Tribunal de Contas da União a respeito dos conceitos de “criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental”. Em última instância, tratava-se de elucidar em quais hipóteses se imporia a instrução de processos com as manifestações das áreas orçamentárias a respeito dos requisitos de que cuidam os incisos e parágrafos do dispositivo acima reproduzido.

Uma das celeumas instauradas em torno da necessidade ou não de observância do art. 16 da LRF residiu na discussão atinente aos contratos de serviços contínuos firmados pela Administração Pública com base no art.  57, II, da Lei 8.666/93. Isso porque, por diversas vezes, os órgãos de controle e as consultorias jurídicas internas dos órgão e entidades da Administração vinham a exigir a observância de tais requisitos em contratação rotineiras, tais como serviços de limpeza, vigilância e manutenção predial.

1. Os conceitos de “criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental”.

 A leitura do art. 16 da LRF exclusivamente fundamentada no senso comum pode conduzir o intérprete a equívocos, dada a amplitude que o conceito de “ação governamental” pode assumir. Trata-se de definição intimamente relacionada com o conceito de orçamento-programa, que, ao contrário do conceito tradicional de orçamento, focado no “que o governo compra”, tem por principal objetivo estabelecer aquilo “que o governo faz”.

É nesse contexto que se enquadra a “ação governamental”: conceito técnico, como quase tudo o que consta da LRF, extraído da gestão pública, que configura o substrato de origem de todos os programas e subprogramas que devem contar das peças orçemantárias.  É a partir desse fundamental que se dá toda a classificação funcional-programática adotada nos orçamentos no Direito Financeiro.

De tudo isso é possível observar que não é qualquer despesa pública capaz de caracterizar uma ampla “ação governamental”, embora aquela, em última instância, derive desta. Tanto é verdadeira esta distinção que o próprio caput do art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece que somente a crição ou expansão de ação governamental que implique aumento de despesa necessita observar os seus ditames. Nesse sentido, é o acórdão TCU 883/2005, Primeira Câmara:

“4.21. O corolário dessa construção hermenêutica seria o de que nem todas as despesas públicas, independentemente de valor, sujeitam-se à exigência de figuração no demonstrativo de impacto orçamentário-financeiro exigido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, cuja preocupação seria apenas com a despesa que afete o resultado fiscal, ainda que futuramente.”

Sobre o que o intérprete deve entender por “criação”, “expansão” ou “aperfeiçoamento”, peço vênia, para reproduzir as ponderações tecidas pelo Tribunal de Contas da União no acórdão TCU 1085/2007 – Plenário, as quais delineam, com precisão o conteúdo dos referidos conceitos:

‘O vocábulo criação deriva do latim creatio, sendo empregado no sentido de ato de criar, que configura a manifestação da vontade estatal promotora do nascimento da relação jurídica de repercussão no campo financeiro-orçamentário. Aqui é tomada com  o sentido de instituição de uma atividade nova, portanto, que não esteja prevista no sistema de programação governamental.

Por outro lado, a expansão implica conceito que determina a existência de ação preexistente, na medida em que não encerra algo novo. Reproduz tão-somente atividade devidamente institucionalizada que, por opção de política governamental, necessita ser expandida, por conveniência do interesse público. É ditado, portanto, em razão das exigências derivadas das demandas sociais, da prestação de serviços públicos e dos investimentos que ao Poder Público cabe realizar. (…)

Finalmente, tem-se o aperfeiçoamento, que não se encaixa nas situações anteriores, embora de certa forma pressuponha a existência de programa em execução. Nesse caso, a atividade é voltada somente para o aprimoramento das ações de governo, mas gera conseqüências financeiras com sua implementação.’

2. O art. 16 da lrf frente aos contratos de serviços contínuos

Não se pretende aqui debater o conceito de serviços contínuos, nem muito menos, as discussões pontuais que ainda persistem em torno de sua caracterização. O propósito do presente tópico reside apenas em demonstrar a desnecessidade de observância do art. 16 da LRF nos casos de serviços corriqueiros, classificados pela Administração como de natureza continuada.

Parte-se, pois, da premissa abstrata no sentido da simples definição de tais serviços como aqueles de que os órgãos e entidades necessitam em caráter permenente e que, por isso, podem ter a vigência de seus respectivos contratos, prorrogada para além dos exercícios financeiros em que firmados. Vamos então à demonstração do entendimento que nos parece consolidado no âmbito do Tribunal de Contas da União e da Advocacia Geral da União. 

2.1. O entendimento do tribunal de contas da união

À luz do que foi exposto no tópico 02 supra, não é qualquer despesa pública que impõe a necessidade de atendimento dos ditames legais do art. 16 da LC 101/00. Nem mesmo a possibilidade de que determinados contratos, caso daqueles que têm por objeto serviços contínuos, superem os exercícios financeiros em que firmados é capaz de impor, por si só, a necessidade de manifestações da áreas orçamentárias de órgão e entidades a respeito da LRF.

Nesse sentido, serviços corriqueiros, usuais e permanentes, já previstos na leis orçamentárias anuais, não alcançam o conceito de ação governamental. É aqui, pois, que se enquadram, geralmente, os serviços contínuos contratados pela Administração. Trata-se, a propósito, da conclusão adotada pelo Tribunal de Contas da União no Acórdão 883/2005, Primeira Câmara:

“Já as despesas contínuas, mormente as relacionadas a serviços de manutenção e funcionamento do setor público, por não serem criadas ou aumentadas em suas renovações contratuais ou licitações anuais, não se sujeitariam aos preceitos dos arts. 16 e 17, em virtude de não constituírem gastos novos (foram criadas no passado e, portanto, já fizeram parte de leis orçamentárias pretéritas) e porque previstas na lei orçamentária vigente por força do dispositivo das LDO determinando que os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público da União terão como limites de despesas correntes e de capital, para efeito de elaboração dos respectivos orçamentos, o conjunto de dotações fixadas na lei orçamentária anterior.”

2.2. O entendimento da advocacia geral da união

 Conforme se delineou na introdução do presente artigo, uma das razões que conduziu à instauração da celeuma aqui discutida, foi a insistência, especialmente de determinadas consultorias e assessorias jurídicas no sentido da sentido de que os processo de contratação de serviços contínuos fossem instruídos com a demonstração dos requisitos exigidos no art. 16 da LRF.

Com o fito de por termo à divergência daí surgida, a AGU, em abril do corrente ano, aprovou, por intermédio da Portaria AGU 124 (DOU de 02/05/2014), a Orientação Normativa 52, que tem por objeto exatamente a discussão em questão. Nesse sentido, vale dizer que as orientações normativas firmadas pelo Advogado Geral da União ostentam caráter vinculante perante todos os órgãos e membros da instituição, de modo a harmonizar os procedimentos e interpretações a ela pertinentes. Trata-se de medida adotada com fulcro nos incisos I, X, XI e XIII do art. 4º da Lei Complementar nº 73/93. Vejamos, pois, o conteúdo da citada orientação normativa:

“AS DESPESAS ORDINÁRIAS E ROTINEIRAS DA ADMINISTRAÇÃO, JÁ PREVISTAS NO ORÇAMENTO E DESTINADAS À MANUTENÇÃO DAS AÇÕES GOVERNAMENTAIS PREEXISTENTES, DISPENSAM AS EXIGÊNCIAS PREVISTAS NOS INCISOS I E II DO ART. 16 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 101 DE 2000”.

Conclusão

À luz de tudo o que foi exposto e na esteira do entendimento consolidado da AGU e do TCU, pode-se, portanto, dizer que serviços contínuos comuns e corriqueiros, como vigilância, limpeza, copeiragem e apoio administrativo prescindem, para a sua contratação, da observância dos requisitos de que cuida a Lei de Responsabilidade Fiscal em seu art. 16. Isso porque tais contratações não repercutirão em nenhuma despesa para além daquela relativa a seus próprios custos. Em outro dizer, não se trata de “projeto”, de que deverá resultar determinado “produto”, o qual implicaria, posteriormente, na assunção de outros custos para a Administração.

O risco, portanto, do qual a LRF, em seu art. 16, tentou resguardar o patrimônio público, a saber: o desequilíbrio financeiro, não paira sobre essas hipóteses.  Não se enquadram tais casos naquilo que o caput do mencionado dispositivo legal convencionou chamar de “criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental”. Cuida-se, na realidade, de atividade habitual, corriqueira, que, dessa forma, tem o condão de possivelmente gerar consequências negativas sobre as finanças do órgão ou entidade, em virtude de não possuírem o efeito multiplicador de despesas, característico da expansão de ações governamentais.

Nesse contexto, os documentos que atestam a disponibilidade orçamentárias para os serviços já é capaz de demonstrar a viabilidade financeira em se promover a licitação e sua posterior e eventual contratação. Por meio de tal documento já se está a efetuar a afetação de recursos no elemento de despesa efetivamente correspondente ao serviço que se pretende seja prestado. Trata-se, portanto, tão-somente de gerenciar os recursos disponibilizados pela Lei Orçamentária Anual, sem, de forma alguma, desrespeitar os limites por ela impostos.


Informações Sobre o Autor

Larissa de Barros Pontes

Procuradora Federal de 2 Categoria. Lotada na Procuradoria Regional Federal da 1 Região. Bacharel em Direito e Especialista em Direito Público


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