Resumo: Tendo em vista que grande parte da comunidade jurídica, assim como, pessoas comum do povo, têm interpretado as inviolabilidades do advogado, conferidas pelo art. 133 da Constituição Federal de 1988, como um privilégio classista (desconfigurando, assim, a real pretensão desta norma), o presente artigo busca desconstruir esse imaginário, na medida em que demonstra que tal prerrogativa, na verdade, é um direito fundamental do cidadão brasileiro relacionado a ampla defesa, que intenta protegê-lo no que se refere ao seu direito de defesa. Demonstra-se neste estudo que a atuação do advogado é inerente a administração da justiça e na afirmação do Estado Democrático do Direito, além de destacar o papel importante que este profissional exerce na garantia da ampla defesa.
Palavras-chave: Prerrogativas, Cidadania, Constituição.
Sumário: 1 Introdução. 2 A indispensabilidade do Advogado na construção da Justiça. 3 A presença obrigatória do advogado nos processos judiciais. 4 O advogado e a ampla defesa. 5 A inviolabilidade dos advogados conferida pelo art.133 da Constituição Federal de 1988 como proteção aos direitos do cidadão brasileiro. 4 Considerações finais.
1 INTRODUÇÃO[1]
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 foi à primeira carta política do país a atribuir à advocacia um status Constitucional por meio do seu art. 133, fazendo uma declaração expressa quanto à indispensabilidade do advogado perante a Justiça, e dos direitos que lhe revestem para poder atuar sem óbices na busca da concretização do Estado Democrático de Direito, inovando, desse modo, tanto no contexto nacional quanto no internacional (PANSIERI in CANOTILHO et. al, 2013, p. 3061).
As Constituições pretéritas se limitavam em fazer referência à participação dos advogados nos tribunais por meio do quinto constitucional, da participação da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para ocupação de cargo de juízes, além de se manifestarem sobre outras disposições esparsas. Ressalta-se que as Constituições passadas não dispunham sobre as prerrogativas do advogado em nenhuma de suas formas e muito menos do dever destes com seus clientes (TOLENTINO, 2007).
A atual Constituição do Brasil ao pronunciar que o advogado é indispensável à administração da Justiça[2], reconheceu no seu texto a importância da advocacia quanto à aplicação do direito, atribuindo ao advogado um múnus público[3]. Todavia esse ideário não é (e na época também não foi) exclusivo do documento régio nacional, tendo em vista que outros Estados – como o Equador, Espanha e Japão – emolduram também o princípio da indisponibilidade do advogado nas suas constituições, embora não fazem com a mesma clareza que a Constituição Brasileira (GOMES, 1990, p. 3-6).
Em verdade o ineditismo da constituição Brasileira na órbita nacional e internacional se verifica quanto aos direitos que é atribuído aos advogados, os quais são: a inviolabilidade dos seus atos e manifestações[4]. Ocorre que esses direitos não tem origem na proteção profissional do advogado e muito menos se manifesta como um privilégio da classe, mais sim no direito de ampla defesa conferida ao cidadão brasileiro, tendo em vista que tais inviolabilidades visam garantir que o mesmo possa proteger judicialmente o seu direito sem nenhum óbice.
Diante dessa disposição constitucional, o presente artigo analisa o direito que a Magna Carta brasileira dispensa ao advogado por meio do seu artigo 133 como decorrência do direito de defesa do cidadão, tendo como objetivo destacar a importância das inviolabilidades do advogado para a construção de Estado Democrático de Direito.
Para tanto foi utilizado à forma de pesquisa exploratória, tendo em vista que o estudo busca identificar o entendimento doutrinário sobre a proposta da pesquisa, através do método bibliográfico, utilizando-se da exposição doutrinal.
Este artigo será estruturado, além desta Introdução, em mais quatro tópicos, sendo que no primeiro procura-se demonstrar os motivos porque o advogado é indispensável para a administração da justiça. O segundo tópico destaca as razões de ser obrigatória a presença dos advogados nos processos judiciais. O terceiro tópico relaciona a atuação desse profissional com o princípio da ampla defesa. E por fim, o quarto tópico, trata-se do objetivo especifico deste artigo.
2 A indispensabilidade do Advogado na construção da Justiça.
A Constituição Brasileira por meio do art. 133 ao afirmar que o advogado é indispensável à administração da Justiça, conferindo-lhe algumas prerrogativas, não apenas ratificou a lógica presente na teoria do processo pátrio quanto a postulação, mais reconheceu também o advogado como instrumento garantidor do contraditório, da ampla defesa, da segurança jurídica, da cidadania e dos direitos humanos, e, portanto, indispensável para a realização da Justiça.
Ao afirmar que o advogado é indispensável à administração da Justiça, faz-se necessário esclarecer alguns pontos. “Em primeiro lugar, o advogado não faz parte da administração do cognominado Poder Judiciário, não exercendo, assim, nenhum tipo de ingerência nas funções administrativas dos órgãos jurisdicionais […]” (TOLENTINO, 2007, p.39). Em segundo lugar, a essencialidade e a indisponibilidade do advogado deve ser: “[…] entendidas no contexto de aplicação do ordenamento jurídico, em atividade vinculada ao órgão jurisdicional atuando na reconstrução, e mais, na ressemantização democrática e participada das normas jurídicas aplicáveis ao caso concreto” (TOLENTINO, 2007, p. 40).
Desse modo, sob a égide da constituição pátria, o advogado quanto ao Poder Judiciário deve atuar como “[…] intermediário entre o cidadão e a função jurisdicional do Estado, efetivamente na apresentação de defesa técnica, garantido igualdade de condições entre os litigantes […]”(BARROS, 2010, p.94) e por esse motivo é um grande promotor e responsável pelos princípios que norteiam a justiça no ordenamento jurídico brasileiro.
É por meio do advogado que o direito do cidadão é alcançado, pois é este o profissional que além de iniciar a ação judicial, é que o acompanha todo o processo, fiscalizando os atos do Juiz em favor do seu constituinte, se precavendo de todas as formas para que nenhum direito (material ou processual) seja passado despercebido, é o que se indispõe contra o magistrado ou com a parte contrária diante de algum entendimento equivocado.
Sem o advogado para vigiar o processo, as partes estariam despidas do sentimento de segurança, porquanto os seus direitos estariam nas mãos apenas do magistrado que por alguma razão poderia prejudicá-las[5], além do que, alguns direitos necessitam da percepção técnica do advogado para que seja arguido dentro do processo[6], o que evidencia tanto a necessidade quanto a responsabilidade deste profissional para a garantia da ampla defesa.
Ademais, o advogado “[…] em atividade extrajudicial, aconselha e assessora, previne […]” (BITTAR, 2012, p.434), sendo que muitas vezes emprega essas ações além de sua função profissional, haja vista trabalhar diretamente com o sofrimento humano. E por isso “o advogado está, mais do que todos os profissionais, habilitado para penetrar na problemática do desenvolvimento social […]” (PEREIRA apud BITTAR, 2012, p. 433), e possibilitar a realização da cidadania e dos fundamentos do Estado Brasileiro[7].
De fato, o art. 133 da Constituição Federal de 1988 colocou o advogado como um garantidor da decisão judicial, uma vez que sem ele não há possibilidade da intermediação do cidadão e o Poder Judiciário, para que alcance o provimento judicial. Desse modo, a presença do advogado no processo é a garantia de que no mesmo irá prosperar o controle da jurisdição, a segurança jurídica, o contraditório e a ampla defesa, e de modo que “sem advogado não há justiça” (GOMES, 1990).
3 A presença obrigatória do advogado nos processos judiciais
Não restam dúvidas que a Constituição pátria por meio do art.133 consagra a presença obrigatória do advogado nos processos judiciais (TOLENTINO, 2007, p. 38). Em consonância com a ordem constitucional seguem o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (EOAB) por meio do art. 4º[8] e o Código de Processo Civil (CPC) através do art. 103[9]. Sobre essa determinação legal, Humberto Theodoro (2011) ensina que “a capacidade de postulação em nosso sistema processual compete exclusivamente aos advogados, de modo que é obrigatória a representação da parte em juízo por advogado legalmente habilitado (art.36). Trata-se de um pressuposto processual, cuja inobservância conduz à nulidade do processo […].” (THEODORO JUNIOR, 2011, p. 114).
Essa exigência se justifica pelo fato do direito ser semelhante as demais ciências, possuindo teorias próprias, método de estudo, conceitos, e técnicas que escapam do conhecimento do cidadão comum. Sendo que somente com o domínio profundo do conhecimento jurídico que há possibilidade do exercício eficaz de direitos.
Permitir que o cidadão comum tivesse voz no processo sem auxílio do advogado, seria uma grande incoerência com a atual ordem constitucional, pois a parte ficaria sob o poder do magistrado sem nenhuma vigilância.
Além do que, a pessoa comum do povo que não fosse bacharel em direito não iria poder dispor de todos os meios para a sua defesa, não por limitação legal, mas sim por sua própria ignorância, pois seria ausente do seu conhecimento os prazos processuais, as formas de exceção, os tipo de recursos, e até mesmo o conteúdo material do direito (BARROSO, 2008, p. 36).
Dessa forma, na ordem jurídica pátria o leigo não possui capacidade postulatória no processo, porquanto a sua ignorância poderia lhe prejudicar (se fosse parte atuando em nome próprio) ou prejudicar a outrem (se fosse defensor). Daí porque “[…] sabiamente, a legislação determina ser obrigatória à participação do advogado em juízo (…), a fim de que o cidadão não ponha em risco certo seu patrimônio, quando não sua liberdade (AQUAVIVA, 2002, p.4).”
A propósito, sobre esse assunto, Randolpho Gomes (1990) ensina que “não basta, porém, que tenha as partes seus defensores. É preciso que sejam eles “advogados” e que sejam “independentes”, tanto dos poderes públicos como em relação aos magistrados. Não pode haver qualquer submissão de uns a outros, sob pena de padecer a Justiça. Advogados e Juízes postam-se no mesmo patamar hierárquico […]” (GOMES, 1990, p. 9).
Deve-se ter em mente que a presença do advogado no processo além de garantir o perfeito andamento do feito como citado anteriormente, estabelece um tratamento isonômico entre as partes na medida que lhes possibilitam o livre e amplo exercício da defesa, pois se fosse facultado buscar a tutela judicial sem o advogado, poderia existir situações em que uma parte fosse assessorada por um advogado enquanto a outra não se fizesse representar por esse profissional, de modo que a primeira apresentaria uma argumentação mais elaborada e buscaria todas as garantias presente no Direito para se defender, enquanto a outra não poderia agir de tal forma, pelo simples fato de desconhecer o Direito, tornando, desse modo, a discussão judicial desequilibrada.
A ideia da indispensabilidade do advogado é tão nítida no ordenamento jurídico pátrio que existem correntes na doutrina no sentido de que o art.133 sob a luz do princípio da ampla defesa não só estabelece a imprescindibilidade do advogado no processo, mais confere ao cidadão brasileiro o direito fundamental ao advogado, de modo que este profissional em nenhum tempo pode faltar ao processo.
Como bem disserta Tolentino (2007): “Entende-se que o constituinte originário, ao afirmar a indispensabilidade do advogado à administração da justiça, optou expressamente por exigir a presença do profissional nos procedimentos jurisdicionais, não abrindo espaço para qualquer tipo de facultatividade. (…) Assim, o direito ao advogado é entendido como direito fundamental do cidadão, previsto constitucionalmente, que objetiva auxiliá-lo na plena participação no processo democrático de construção, reconstrução e aplicação do ordenamento jurídico, conferindo assim legitimidade ao direito, propiciando ao cidadão configurar-se como emissor e, ao mesmo tempo, destinatário das normas jurídicas” (TOLENTINO, 2007, p. 38-40).
Entretanto, a imprescindibilidade do advogado no sistema jurídico brasileiro é relativa, tanto pela previsão do art. 106 do CPC, quanto pela disposição da lei 9.099/95, onde o STF já pacificou o entendimento de que apesar de ser imprescindível a presença de advogado em causa do juizado especial criminal, o mesmo não se verifica quanto aos juizados especial cível[10].
Apesar dessa exceção, observa-se da argumentação exposta que a presença do advogado é relevante para a devida aplicação do direito, sem este profissional o processo corre grande risco de padecer de algum vicio. Consequentemente, sua obrigatoriedade pela constituição se verifica como verdadeira garantia da ampla defesa, do devido processo legal e do Estado democrático de direito.
4 O advogado e a ampla defesa
Toda atividade que advogado exerce dentro do processo na construção da defesa de seus clientes, nada mais é do que a concretização do direito constitucional a ampla defesa, uma vez que esta é “[…] o asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo omitir-se ou calar-se, se entender necessário” (MORAES, 2011, p. 113), abrangendo “[…] o direito de informação (nemo inauditus damnari potest), a bilateralidade de audiência (contrariedade) e o direito à prova legitimamente obtida ou produzida […] (TUCCI apud LOPES, 2007, p. 97).
A ampla defesa de direitos, assegurada isonomicamente a qualquer um do povo, tem como objetivo otimizar (i) as atividades argumentativas desenvolvidas ao longo do discurso processualizado, (ii) a produção e análise crítica dos instrumentos de prova e (iii) a possibilidade de impugnação de decisões pelos meios recursais cabíveis; sendo certa a limitação temporal da atuação defensiva nos termos preclusivos dispostos no ordenamento jurídico (TOLENTINO, 2007, p. 111).
Nesse sentido, quando o advogado ajuíza uma ação, contesta uma inicial ou ajuíza uma réplica, oferece provas e testemunhas, responde a despachos e interpõe um recurso, ou quando realiza quaisquer dos atos processuais, ele o faz devido ao princípio da ampla defesa, o qual é instituidor do processo, e sem o mesmo não poderia se falar em justiça.
Em adição, no processo penal a ampla defesa é consubstanciada por meio da autodefesa e da defesa técnica, a primeira trata-se da defesa pessoal da parte (que pode ser exercida por meio do interrogatório e da presença nos atos instrutórios), já a segunda é aquela exercida por advogado devidamente inscrito na OAB, possuindo saber jurídico e gozando de autonomia e das inviolabilidades constitucionais.
Nas outras esferas do direito não há que se falar na autodefesa, prevalecendo somente à defesa técnica, e isto implica dizer que sem o advogado – como já mencionado anteriormente – não há ampla defesa (com ressalva do art. 36 do CPC e da Lei 9.999/95), haja vista ele ser o único competente e legalmente autorizado para consumar a defesa técnica.
Nesse sentido leciona Greco Filho (2010) que “para que o exercício da defesa, porém, seja criterioso e amplo, é essencial a presença da chamada “defesa técnica”, que deve ser efetivada por advogado. Além do que o próprio réu, pessoalmente, possa trazer a seu favor, deve ele, ainda que não queira, ser acompanhado de advogado, o qual deve ser intimado de todos os atos processuais” (GRECO FILHO, 2010, p. 87).
A defesa técnica é a efetivação da ampla defesa, pois só com participação dos advogados das partes na discussão dentro do processo, através da argumentação jurídica e da vigilância processual que se garante que o direito a liberdade, direito de resposta, direito de acesso a informação e o contraditório não serão limitados, e que o juiz não irá decidir de forma parcial (BARROSO, 2008, p. 37). Além do que, somente por meio do advogado é possível trazer ao processo todas as informações e teses jurídicas capazes de elucidar o direito, haja vista ele possuir o conhecimento do direito maior que a parte.
Neste esteio pondera Tolentino (2007): “[…] para que seja observada a ampla defesa de direitos, faz-se necessária a participação do advogado. Esse profissional, levando-se em consideração seus conhecimentos técnico-jurídicos, viabiliza a atuação defensiva de direitos de maneira ampla, assegurando a observância das disposições constitucionais regentes do processo” (TOLENTINO, 2007, p. 107).
Nicola Carulli (apud BARROSO, 2008, p. 36-39), ao estudar o direito processual penal, elenca alguns motivos pelos quais a presença do advogado é notadamente indispensável para a garantia da ampla defesa, os quais são: a) a incapacidade do imputado de se defender sozinho por não possuir conhecimentos de direito material e processual; b) a exposição desprotegida da parte diante dos poderes conferidos ao Ministério Público (no caso, seria o advogado da parte contrária); c) a dificuldade da parte de comportar-se adequadamente nos atos da instrução; d) a situação psicológica de fragilidade, de instabilidade emocional e falta de serenidade do acusado; e) a impossibilidade de atuação física quando o réu está preso.
Observa-se, portanto, que a presença do advogado no processo judicial é uma garantia e uma efetivação da ampla defesa, daí o motivo pelo qual a constituição consagra a indisponibilidade do advogado e lhe atribui imunidades, e da mesma forma segue as legislações infraconstitucionais.
Todavia, o principio da ampla defesa também outorga ao profissional advocatício deveres perante o cliente e a sociedade – deveres estes imprescindíveis para a efetividade do referido princípio constitucional – os quais são: a busca da melhor defesa do seu patrocinado e a luta incessante para que no processo e em questões atinentes a ele, a defesa não sofra limitações de nenhum tipo, assim como o dever de agir licitamente dentro do processo para que ampla defesa da parte contrária também não seja restringida.
No primeiro caso, é clara a disposição do Art. 2°, § 2° da Lei 8.906/94[11] que impõe ao advogado que exerça a melhor defesa possível ao seu representado, na medida que lhe confere o dever de se esforçar para que a pretensão do seu cliente seja alcançada, utilizando-se de todos os meios jurídicos e técnicas argumentativas para isso (desde que dentro da licitude).
Quanto aos deveres do advogado perante a sociedade sob a ótica da ampla defesa, não é despiciendo observar os mandamentos da previsão do artigo 5º do CPC, que impõem ao advogado a atuar no processo sempre de acordo com o princípio da boa-fé, o que implica, entre outras deveres, em: realizar a defesa da parte ao expor os fatos em juízo desconforme a verdade; proceder com lealdade; não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes que são destituídas de fundamento; não produzir provas, nem praticar atos inúteis ou desnecessários à declaração ou defesa do direito (NEVES, 2016, p. 147-154).
Além do que, quando o mesmo busca materializar os direitos do seu patrocinado, se interpondo contra todo ato que limite o direito de informação, contraditório e colheita de prova de seu cliente, ele não está apenas lutando em prol do seu constituinte, mas também para que a ampla defesa seja garantida, evitando assim, que o seu eventual desrespeito na causa em que atua, não seja um pressuposto para futuras situações de violação dessa garantia constitucional.
Assim sendo, não há como desassociar, no ordenamento pátrio, a ampla defesa da atuação advocatícia (salvos as exceções já mencionada), pois aquela é garantia da efetividade desta, e esta também é instrumento para que aquela permaneça vigente. Soma-se ainda, que a ampla defesa, ao mesmo tempo que é uma garantia, é também instituidora de deveres ao advogado, para que este, na sua atuação, não a viole.
5 A inviolabilidade dos advocagados conferida pelo art.133 da constituição Federal de 1988 como proteção aos direitos do cidadão brasileiro
O art. 133 da Constituição Federal do Brasil consagrou o advogado como partícipe indispensável na relação processual, isso porque ele é o responsável pelo diálogo técnico-jurídico que deve ser estabelecido entre o cidadão e o Poder Judiciário afim de que “o bem da vida” seja alcançado através da decisão judicial.
Ocorre que muitas vezes esse diálogo se torna áspero devido às resistências dos poderes que circundam o caso ou pelo próprio calor do debate jurídico[12], como bem observa Mario Covas (1987) ao discursar que “o advogado é um profissional do conflito, ele atua sempre onde existe um conflito, visando a sua composição e a celebração da paz, com a realização da justiça. Em seu trabalho, inevitavelmente o advogado desagrada a parte contrária e, muitas vezes, incomoda juízes, promotores e outras autoridades. Por isso mesmo, inúmeras vezes os advogados sofrem constrangimentos, coações e ameaças, que redundam em prejuízo para seu constituinte, para a fiel observância da lei e para a própria realização da justiça” (COVAS apud BARROS, 2010, p. 93).
Por esses motivos, o referido artigo visando que o cidadão e o seu advogado não fossem lesados pelos percalços que envolvem as indisposições do debate jurídico, concedeu ao advogado o direito de inviolabilidade por seus atos e manifestações no seu exercício profissional. É nesse sentido que Dirley Cunha Junior (2012, p. 1194) afirma que sem a garantia desses direitos aos advogados não seria possível consolidar o Estado de Direito.
Sendo o advogado o profissional que em favor da parte se indispõe contra os personagens dos diversos tipos de autoridades[13] – se utilizando muitas vezes de argumentos que a primeira vista se mostrem ofensivos e/ou de conduta aparentemente subversiva e desobediente – para que o direito do seu mandatário seja realizado, nada mais justo que seus atos e manifestações dentro da defesa do seu cliente não sofram impedimentos, pois caso contrário, aqueles que estão insatisfeitos com sua atuação, poderiam aproveitar das ausências dessas garantias a fim de prejudicá-lo e até mesmo impedir que o direito pleiteado seja alcançado, obstruindo dessa forma vários princípios atinentes a Justiça[14].
Com efeito, buscando evitar estes tipos de ocorrências, e por consequência, visando garantir uma defesa justa e equânime para que o Estado Democrático de Direito seja realizado, é que o legislador constituinte atribuiu essa prerrogativa aos advogados (BARROS, 2010, p. 93).[15]
Além do que, seria demasiado incoerente se reconhecer a indispensabilidade do advogado para a administração da Justiça, e não lhe assegurar prerrogativas que permitissem exercer o seu múnus público.
Ressalta-se ainda que se o advogado não estivesse munido de tais garantias, poderia falhar na elaboração da defesa do seu representado – afetando o direito de ampla defesa do mesmo – por mero receio de advogar uma versão inverosemelhante que lhe prejudicasse de algum modo. Notadamente “[…] se o advogado censurasse pontos na narrativa do cliente, temendo as consequências para si de os submeter ao Judiciário, estaria retirando do cidadão um meio e um recurso necessário para o exame de sua pretensão” (MAMED, 2011, p.40).
As inviolabilidades constitucionais atinentes aos advogados, não visam proteger somente o profissional, mas também o próprio constituinte (SILVA, 2004, p. 582)[16], no sentido de que este não terá sua defesa limitada, pois o seu patrocinador poderá atuar no processo sem receio de represálias.
Em regra o advogado não tem interesses pessoais na causa, e muito menos na indisposição ou na subversão contra os sujeitos processuais, quem os tem é o seu patrocinado. Quando o advogado comete excessos na defesa oral ou escrita assemelhado a algum tipo de crime (calunia, injuria, difamação, desacato…), ele o faz na defesa do direito do seu cliente, e é como se o próprio constituinte estive se pronunciando – uma vez que o advogado só deve reproduzir aquilo que seu cliente narrou ou que se depreende dos autos.
Nesse sentido Paulo Lôbo (2011)[17] leciona que “essa peculiar imunidade profissional não constitui um privilégio, tampouco carta de identidade. Em verdade o escopo da lei é menos a proteção do profissional e muito mais a do cliente. O segredo que guarda não é seu, é do cliente. Os atos e manifestações profissionais são proferidos em razão do patrocínio do cliente. Os instrumentos de trabalho não são bens de desfrute pessoais, mas existe em função do cliente” (LÔBO, 2011, p. 65).
Ressalta-se ainda, que apesar do art. 133 da Constituição Federal ter dignificado a advocacia conferindo-lhes prerrogativas inexistentes na órbita de outras vocações[18], o mesmo artigo ao declarar a indisponibilidade do advogado impôs a este profissional o encargo de contribuir para a realização da justiça, vinculando o acesso à justiça a atuação advocatícia, e dessa forma, acaba por impor ao advogado a função social de defender o seu cliente da melhor forma possível.
4 considerações finais
O advogado no atual sistema jurídico é um personagem indispensável para a realização da Justiça, pois além de ser o intermediário obrigatório entre o cidadão e o Judiciário, a sua atuação visa garantir que a defesa das partes não sofra limitações, possibilitando, desta forma, que o direito seja eficazmente aplicado.
Em razão disso, as prerrogativas conferidas a esse profissional, por meio do art. 133 da Constituição Federal, visa protegê-lo quando estiver atuando na defesa dos direitos dos seus clientes.
Todavia, essa proteção constitucional não é um privilégio da classe, mas sim um mecanismo constitucional para garantir a efetividade do direito de defesa dos cidadãos brasileiros. Isso porque, a atuação do advogado, dentro do processo judicial, entre outras finalidades, é se interpor contra todo ato que limite o direito de informação, contraditório e colheita de prova de seu cliente, garantido, desse modo, a ampla defesa e o contraditório.
Informações Sobre o Autor
Samyr Leal da Costa Brito
Bacharel em direito pela UNEB, Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela UNINTER e Pós-graduando em Gestão da Inovação e Desenvolvimento Regional pela UFRB