A aplicação do princípio da proporcionalidade nas medidas cautelares da Lei nº 12.403/11

Resumo: O presente artigo tem como objetivo o estudo da aplicação do princípio da proporcionalidade na disciplina das medidas cautelares processuais penais instituídas pela Lei nº 12.403/2011, bem como do seu emprego ao instituto da prisão preventiva. A metodologia utilizada na pesquisa foi o método hipotético dedutivo. Os resultados desta pesquisa permitiram o conhecimento das inovações trazidas com o advento da referida lei, que, por sua vez, passou a adotar um modelo poliformo, rompendo com o binário reducionista da prisão cautelar ou liberdade provisória, para oferecer ao juiz um rol de medidas cautelares alternativas à prisão preventiva. A problemática do presente estudo é a materialização de um sistema processual penal que permita a aplicação da lei penal e a proteção às garantias individuais, através dos objetivos do Estado Democrático de Direito. Nesse contexto, sobressai a importância do princípio da proporcionalidade como meio idôneo para delinear os contornos do jus puniendi e fazer a devida ponderação entre os interesses naturalmente contrapostos da sociedade e do indivíduo, com respeito no limite absoluto da dignidade da pessoa humana.

Palavras-Chave: Prisão, princípio, proporcionalidade, medidas cautelares, penal.

Abstract: The present work aims to study the application of the principle of proportionality in the discipline of criminal procedural precautionary measures established by Law nº 12.403/2011, as well as its application to the institution of preventive prison. The methodology used in the research was the hypothetical deductive method. The results of this research allowed the knowledge of innovations introduced with the advent of that law, which, in turn, began to adopt a multiform model, breaking the reductionist binary precautionary arrest or bail, to offer the judge a list of measures precautionary alternatives to preventive prison. The problem of this study is the materialization of a criminal justice system that allows the application of criminal law and the protection of individual guarantees, through the goals of a democratic state. In this context, the importance of the principle of proportionality as an appropriate means to delineate the contours of jus puniendi and do the proper balance between the naturally opposing interests of society and the individual, with respect to the absolute limit of human dignity.

Keywords: Prison, principle, proportionality, precautionary measures, criminal.

Sumário: Introdução. 1. Normas, princípios e regras. 1.1. Princípios constitucionais. 1.2. Princípio da proporcionalidade. 1.3. Princípio da razoabilidade. 1.4. Distinções entre o princípio da proporcionalidade e razoabilidade. 2. Princípio da proporcionalidade: aspectos gerais. 2.1. A origem do princípio da proporcionalidade. 2.1.2. O princípio da proporcionalidade no direito comparado (Alemanha e Estados Unidos). 2.2. Princípio da proporcionalidade e seus subprincípios. 2.2.1. Adequação 2.2.2. Necessidade. 2.2.3. Proporcionalidade em sentido estrito. 3. O princípio da proporcionalidade no âmbito do direito processual penal. 3.1. Princípio da proporcionalidade nas prisões cautelares. 3.2. Direito processual penal da emergência e o uso indiscriminado de prisões provisórias. 3.3. Subsidiariedade da prisão cautelar. 3.4. Medidas cautelares alternativas à prisão preventiva e aplicação do princípio da proporcionalidade. 3.5. Jurisprudências do STF e STJ. 3.6. Reformas legislativas no sistema cautelar do processo penal brasileiro. Conclusão. Referências.

Introdução

Sem olvidar o caráter constitucional e basilar do princípio da proporcionalidade, esse trabalho visará sua análise nos peculiares contornos com que informa o direito processual penal, notadamente face à necessidade de sua aplicação no que diz respeito às medidas cautelares processuais.

O tema estudado é de essencial importância, visto que o princípio da proporcionalidade se encaixa como peça fundamental no ordenamento jurídico de um Estado Democrático de direito. O tema foi escolhido diante da sua atualidade e das inúmeras discussões acerca das suas peculiaridades formais e materiais.

A complexidade do mundo atual, aliada ao crescimento das desigualdades, tem sido o fator principal do acirramento de movimentos político-criminais tendentes a gerar uma verdadeira hipertrofia do Direito Processual Penal, fazendo-se necessário o estabelecimento de seus limites, a fim de evitar injustiças provenientes de tensão entre o jus puniendi e o jus libertatis, tema que reconduz como tantos outros, especialmente no campo do direito, à questão do equilíbrio entre os interesses da sociedade e os interesses individuais.

O reconhecimento do princípio da proporcionalidade pela doutrina e pela jurisprudência nacionais propõe uma reflexão sobre a qualidade desse instrumento e o alcance que, hoje, ele conhece, e as potencialidades que nele podemos identificar, especialmente no âmbito da aplicação das medidas cautelares previstas na Lei nº 12.403/2011, há que se ter em conta a forma como dele se tem feito uso.

O presente estudo tem como principal objetivo analisar especialmente a proporcionalidade no âmbito das prisões cautelares e das medidas cautelares alternativas, de modo a evidenciar as garantias constitucionais, mormente a dignidade da pessoa humana. Para tanto, é utilizado o método hipotético dedutivo.

Desse modo, no primeiro capítulo serão feitas algumas análises pertinentes à problemática principiológica, procurando distinguir os princípios e as regras jurídicas e também fazer uma conceituação sobre os princípios constitucionais. Além disso, serão expostas eventuais distinções entre a proporcionalidade e razoabilidade.

O segundo capítulo destinar-se-á a uma breve introdução histórica sobre o postulado da proporcionalidade, em relação à origem e sua aplicabilidade no direito comparado, não sendo olvidada a forma com que o direito norte-americano e o alemão o desenvolveram ao longo de suas significativas experiências jurídicas.

Em outro momento estudar-se-á a aplicação do postulado da proporcionalidade no processo penal, no sentido de limitar a restrição de eventuais direitos fundamentais na apreciação do caso concreto e salvaguardar a dignidade humana. Por fim, serão abordadas questões relativas à proporcionalidade e medidas cautelares processuais e os entendimentos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema.

1. Normas, princípios e regras

De início há de se observar que o sistema jurídico tem como elemento as normas, que, por sua vez, subdividem-se em regras e princípios, sendo estruturadas de forma hierárquica, coesiva e com base na unidade do conjunto.

A distinção entre princípios e regras foi estabelecida por inúmeros juristas consagrados, tais como: Joaquim Gomes Canotilho, Ronald Dworkin, Robert Alexy, Virgílio Afonso da Silva, entre outros.

Canotilho estabeleceu alguns critérios de diferenciação entre regras e princípios, sendo estes:

“a) O grau de abstração: enquanto as regras possuem caráter mais objetivo, com incidência restrita às situações específicas as quais se dirigem, os princípios têm maior abstração e incidem sob uma pluralidade de situações; b) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios necessitam de mediações concretizadoras por parte do legislador ou do aplicador da norma, por serem vagos e indeterminados, ao passo que as regras são passíveis de aplicação direta; c) Caráter de fundamentalidade nos sistemas das fontes do direito: os princípios são normas de natureza ou papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex: princípios constitucionais) ou a sua importância estruturante no sistema jurídico (ex: princípio do Estado de Direito); d) Proximidade da ideia de direito: os princípios são “standards” juridicamente vinculantes radicados na existência de justiça ou na ideia de direito, enquanto as regras podem ser normas vinculativas com conteúdo meramente funcional; e) Natureza normogenética: os princípios são fundamentos para as regras, ou seja, constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.”[1]

Segundo o referido autor, duas questões devem ser respondidas para que seja possível superar a complexidade da diferenciação entre regras e princípios: 1) saber qual a função dos princípios (se têm função retórica ou argumentativa ou se são normas de conduta); 2) saber se existe só uma diferença de grau ou se há entre princípios e regras jurídicas uma diferenciação qualitativa.

A primeira questão é respondida com a ideia de multifuncionalidade dos princípios, tendo em vista seu caráter prescritivo (determina condutas), indicativo (auxilia na interpretação da lei), impositivo (molda regras) e integrativo (atua perante lacunas). Já a segunda é solucionada com a atribuição de uma diferença qualitativa.

Para Dworkin, a diferença entre as espécies tem um caráter lógico e, no mais das vezes, só pode ser constatada na aplicação da norma ao caso concreto. Tanto regras quanto princípios podem servir de fundamento às decisões, mas diferem na direção que dão ao trabalho do intérprete e aplicador.

As regras jurídicas não comportam aplicação parcial, sendo aplicadas no método tudo ou nada (all or nothing), ou seja, não sobrevivem à existência de regras que lhe são antinômicas. Se, em um caso concreto a ser analisado, o fato corresponde a uma situação narrada em uma regra válida, então será essa regra aplicada à solução do problema, em seu inteiro teor. As exceções das regras podem ser, em tese, todas previstas e listadas. Ao passo que os princípios – por possuírem a dimensão do peso ou importância – não determinam a decisão, mas contêm fundamentos, oriundos de outros princípios.[2]

Alexy, na linha preconizada por Dworkin, reputa o caráter normativo tanto às regras quanto aos princípios. De acordo com Alexy, há três teses distintas, no que concerne à distinção entre regras e princípios.[3] A primeira tese sustenta a impossibilidade de se diferenciar regras e princípios, haja vista a diversidade existente entre eles. Para os adeptos de uma segunda tese é possível diferenciar as regras dos princípios, sendo certo que esta diferenciação é o grau de generalidade. Alexy acaba por se filiar à última posição, na qual sustenta que há distinção entre regras e princípios, contudo essa distinção não é apenas de grau, mas, antes, uma diferenciação qualitativa.

Os princípios são normas jurídicas por meio das quais se estabelecem deveres de otimização, sou seja “são normas que ordenam que algo seja realizado na medida do possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes”.[4]

Os princípios, assim, são aplicáveis em diversos graus, e a medida de sua satisfação depende tanto de possibilidades fáticas quanto de possibilidades jurídicas, cujo âmbito é determinado pelos princípios e regras colidentes. A aplicação do princípio não está predeterminada em seu enunciado, mas depende de ponderações a serem procedidas no momento de sua aplicação.

Em sentido diverso, as regras já contêm determinações, em si, sobre o fático e juridicamente possível, sendo normas que podem ser cumpridas ou não. Para Alexy, essa seria a principal distinção entre regras e princípios.

Virgílio Afonso[5], por sua vez, estabelece outro fundamento para esta distinção, afirmando que o principal traço distintivo entre princípios e regras é a estrutura de direitos que essas normas garantem. No caso das regras, garantem-se direitos definitivos, enquanto que no caso dos princípios são garantidos direitos prima facie. Isso quer dizer, na visão do autor, que, se um direito é garantido por uma regra, ele é definitivo e, assim, deverá ser realizado totalmente, caso essa regra seja aplicável ao caso concreto e não haja exceção legal. Ao passo que, na hipótese dos princípios não se pode falar em realização sempre total daquilo que a norma exige, ao contrário, em geral a realização é apenas parcial.

Ademais, segundo a doutrina atual prevalece o entendimento de que na hipótese de conflito entre regras, só uma será válida e deverá prevalecer. Quando uma regra é válida, deve ser observada estritamente, afastando a validade das que não lhe são compatíveis.

Apenas os princípios estariam sujeitos à ponderação, ou seja, à vista do caso concreto, o intérprete irá aferir o peso que cada princípio terá na hipótese, permitindo o balanceamento de valores e interesses e, na medida do possível, preservará o máximo de cada um. A concessão dos princípios é, pois, conflitual e não antinômica, de forma que eles coexistem.

Dissentindo do entendimento acima mencionado, Humberto Ávila reputa possível que haja conflito entre regras, e que ele possa ser solucionado pela ponderação, não havendo que se falar em utilização prima facie do critério tudo ou nada.[6]

No que diz respeito ao caso de choque entre um princípio e uma regra a sistemática é diferente, devendo prevalecer aquele, por causa de sua natureza que dá base ou fundamento às regras, tornando-se seu pressuposto.

1.1. Princípios­­­­ constitucionais

O Brasil adotou como perfil político-constitucional o de um Estado Democrático de Direito, através do art. , caput, da Constituição Federal. Desse dispositivo decorrem todos os princípios fundamentais, razão por ser ele de tamanha importância.

Segundo Ingo Wolfang Sarlet[7], os princípios fundamentais constituem-se no núcleo essencial da Constituição material. São normas que dão base e que informam toda ordem constitucional.

Consideram-se princípios fundamentais aqueles que foram sendo assimilados pela consciência jurídica ao longo da história e hoje estão de forma expressa ou implícita no texto constitucional das nações modernas. Esses princípios, por sua natureza fundamental e caráter constitucional, possuem força normativa ou vinculante, sendo obrigatório para todos os poderes. 

Percebe-se, assim, que os princípios constitucionais funcionam verdadeiramente como supranormas, sendo hierarquicamente superiores às demais normas escritas ou costumeiras.

Os princípios constitucionais são basicamente de duas categorias: princípios político-constitucionais e jurídico-constitucionais.

Os princípios político-constitucionais derivam das decisões políticas fundamentais contidas na Constituição, traduzindo opções políticas, tais como: existência política da nação. Estão contidos nos artigos 1º ao 4º, do título I, da Constituição Federal.

Por sua vez, princípios jurídico-constitucionais: “são princípios constitucionais gerais informadores da ordem jurídica nacional. Decorrem de certas normas constitucionais, e destes derivam outros princípios”.[8]

Esses princípios atuam determinantemente para a efetivação de todo o ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que operam como elemento norteador para aqueles que visam interpretar as normas de caráter constitucional e infraconstitucional.

Nesse sentido, o princípio da proporcionalidade, por ser um princípio constitucional, possui força vinculante e pode ser empregado em sentido amplo, por vezes possuindo íntima relação com os outros, dentre os quais, destacam-se o princípio da legalidade, princípio da isonomia e o princípio da razoabilidade.

1.2. Princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade tem seu principal campo de atuação no âmbito dos direitos fundamentais, atuando como critério determinante das restrições impostas pelo Estado a cada indivíduo.

Segundo Paulo Bonavides, o princípio da proporcionalidade é, indubitavelmente, o mais importante mecanismo de proteção eficaz de liberdade na ordem constitucional de nossos dias e “Urge fazê-lo alvo, pois, das reflexões mais atualizadas e atualizadoras de nossos dias em matéria de defesa de direitos fundamentais perante o poder do Estado”. Ele ainda assegura:

“Chegamos, por conseguinte, ao Estado democrático de direito, à plenitude da constitucionalidade material. Sem o princípio da proporcionalidade aquela constitucionalidade ficaria privada do instrumento mais poderoso de garantia dos direitos fundamentais contra possíveis e eventuais excessos perpetrados com o preenchimento do espaço aberto pela Constituição ao legislador para atuar formulativamente no domínio das reservas de lei.”[9]

Nessa linha de raciocínio, afirma Penalva que

“A proporcionalidade é consubstancial ao Estado de Direito, com plena e necessária operatividade, ao mesmo passo que a exigência de sua utilização se apresenta como uma das garantias básicas que se hão de observar em toda hipótese em que os direitos e as liberdades sejam lesados”.[10]

O princípio da proporcionalidade insere-se na estrutura normativa da Constituição, junto aos demais princípios gerais norteadores da interpretação das regras constitucionais e infra-constitucionais. Uma vez que uma visão sistemática da Constituição permite-se auferir sua existência de forma implícita e ele deverá guiar o magistrado na interpretação e o legislador na elaboração de normas hierarquicamente inferiores.

Há várias teses acerca do fundamento jurídico desse princípio. Boa parte da doutrina entende que a regra da proporcionalidade tem seu fundamento no chamado princípio do Estado de Direito, como é o caso de Gilmar Ferreira Mendes e Luís Roberto Barroso[11]. Na Alemanha, essa concepção encontra amparo em decisões do Tribunal Constitucional e na doutrina.

Por outro lado, alguns doutrinadores encontram o fundamento da proporcionalidade nos mais diversos dispositivos constitucionais. É o caso, por exemplo, de Suzana de Toledo Barros, Antônio Magalhães Gomes Filho, e de Carlos Affonso Pereira de Souza e Patrícia Regina Pinheiro Sampaio. Eles fundamentam a aplicação da proporcionalidade nos artigos: 5º, II (legalidade); 5º, XXXV (inafastabilidade do controle jurisdicional); 1º, caput (princípio republicano); 1º, II (cidadania); 1º, III (dignidade). São ainda citados os institutos do habeas corpus (art. 5º, LXVIII), mandado de segurança (artigo 5º, LXIX), habeas data (artigo 5º, LXII), assim como o direito de petição (artigo 5º, XXXIV, a).[12]

Por fim, há a tese de que a proporcionalidade integra o direito positivo brasileiro por meio do § 2º do art. 5º, por decorrer do regime e dos princípios adotados na Constituição, defendida especialmente por Willis Santiago Guerra Filho e Paulo Bonavides.[13]

Não obstante as divergências doutrinárias acerca de seu fundamento jurídico, nota-se que a supremacia da Constituição Federal constitui ponto de partida para a compreensão do princípio da proporcionalidade, conforme os ensinamentos de Helenilson Cunha[14]:

“O conteúdo jurídico-material do princípio da proporcionalidade decorre inelutavelmente do reconhecimento da supremacia hierárquico-normativa da Constituição. A proporcionalidade como princípio jurídico implícito do Estado de Direito é uma garantia fundamental para uma concretização ótima dos valores consagrados na Constituição. A proporcionalidade é princípio que concretiza o postulado segundo o qual o Direito não se esgota na lei (ato estatal que deve representar a síntese da vontade geral)”.

Quanto à natureza jurídica do princípio da proporcionalidade, não deve restar dúvida de que se trata de princípio jurídico regulador dos conflitos entre direitos fundamentais e demais princípios insculpidos na Constituição Federal.

1.3. Princípio da razoabilidade

O princípio da razoabilidade tem sua origem e evolução ligados à garantia do devido processo legal substancial, instituto ancestral do direito anglo-saxão. De fato, seu nascedouro remonta à cláusula law of the land, inscrita na Magna Carta, de 1215, documento reconhecido como antecedentes do constitucionalismo.

Nascido sob a égide de uma concepção estritamente processual, a ideia do devido processo legal evoluiu para uma perspectiva substancial (substantive due processo of law). Com fundamento nessa característica substancial, o devido processo legal foi alçado a expressivo instrumento de defesa dos direitos individuais contra o arbítrio estatal.

O referido princípio foi introduzido expressamente pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos que entrou em vigor em 24 de abril de 1992. O Pacto Internacional foi adotado pela XXI Sessão da Assembléia Geral das Nações Unidas em 16 de dezembro de 1966.

O Congresso brasileiro aprovou o texto deste diploma internacional por meio do Decreto Legislativo n. 226/91, sendo a carta de adesão depositada em 24 de janeiro de 1992; é o que prescreve o Decreto presidencialista n. 592, de 6 de julho de 1992, passando a vigorar três meses após, ou seja, em 24 de abril de 1992. Sabe-se que o Tratado foi recepcionado pelo ordenamento jurídico como lei ordinária e, desta feita, não teve muita efetividade.

Este princípio não se encontrava expressamente previsto na Constituição Federal de 1988, contudo deixou de ser um princípio implícito e foi acrescentado pela Emenda Constitucional nº 45/2004, conforme a dicção do inciso LXXVIII, do art. 5º da Constituição Federal: "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação".

Conforme define Ávila[15], a razoabilidade estrutura a aplicação de outras normas (princípios e regras). A razoabilidade, assim como a proporcionalidade, não são normas como as demais, mas sim instrumentos para a correta aplicação das normas. Nessa condição é que se enquadram na categoria de postulados normativos aplicativos.

A partir das acepções comumente empregadas por intermédio da razoabilidade, Ávila destacou três. Em primeiro lugar, usa-se a razoabilidade como diretriz que exige a relação das normas gerais com as peculiaridades do caso concreto. Seja para indicar que o caso individual se adapta à norma, seja também para revelar que o caso individual, em razão de suas circunstâncias específicas, não se amolda à norma geral.

Em segundo lugar, a razoabilidade é utilizada como diretriz para que se estabeleça a vinculação das normas jurídicas com o mundo ao qual elas se referem, seja cotejando a norma com a realidade fática que a ela dá suporte, seja buscando estabelecer uma relação de congruência entre a medida adotada e o fim pretendido. Por fim, a razoabilidade é usada como diretriz para se estabelecer a relação de duas grandezas.

1.4. Distinções entre o princípio da proporcionalidade e razoabilidade

Na jurisprudência brasileira os princípios da proporcionalidade e razoabilidade têm sido utilizados com muita frequência, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal, como um só princípio. A tendência de confundir esses princípios pode ser notada também em inúmeros trabalhos acadêmicos e até mesmo em relatórios de comissões do Poder Legislativo.

Luís Roberto Barroso, por exemplo, afirma que "digna de menção a ascendente trajetória do princípio da razoabilidade, que os autores sob influência germânica preferem denominar princípio da proporcionalidade, na jurisprudência constitucional brasileira”.[16]

Suzana de Toledo Barros iguala ambos os conceitos, nos seguintes termos: “o princípio da proporcionalidade, […] como uma construção dogmática dos alemães, corresponde a nada mais do que o princípio da razoabilidade dos norte-americanos".[17]

Contudo, embora convirjam de alguma maneira na atuação prática, é certo que são princípios distintos, tanto quanto às suas origens, quanto às suas estruturas.

No que diz respeito à origem dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, Virgílio Afonso da Silva afirma:

“É comum, em trabalhos sobre a regra da proporcionalidade, que se identifique sua origem remota já na Magna Carta de 1215. Este documento seria a fonte primeira do princípio da razoabilidade e, portanto, também da proporcionalidade. Essa identificação histórica é, por diversas razões, equivocada. Em primeiro lugar, visto que ambos os conceitos – razoabilidade e proporcionalidade – não se confundem, não há que se falar em proporcionalidade na Magna Carta de 1215. […] A não-identidade entre os dois conceitos fica ainda mais clara quando se acompanha o debate acerca da adoção do Human Rights Act de 1998 na Inglaterra. Somente a partir daí passou a haver um real interesse da doutrina jurídica inglesa na aplicação da regra da proporcionalidade, antes praticamente desconhecida na Inglaterra.”[18]

Assim, cabe observar que os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade têm origens diferentes, pois aquele, desde longa data se utiliza mais no sistema Common Law, enquanto este é fruto de maior desenvolvimento por parte da jurisprudência alemã, que compreende o sistema Civil Law, também adotado no Brasil.

Com efeito, Helenilson Cunha, registra a posição de diversos autores acerca da utilização dos dois princípios, destacando semelhanças e diferenças entre estes:

“Com fundamento nas lições da doutrina nacional e comparada, vislumbramos pelo menos quatro diferenças, a saber: a) O princípio da proporcionalidade exige maior motivação racional nas decisões do que o princípio da razoabilidade; b) O princípio da razoabilidade, ao contrário da proporcionalidade, prescinde de consideração da relação meio-fim; c) Enquanto a razoabilidade constitui princípio geral de interpretação, a proporcionalidade, além dessa qualidade também consubstancia princípio jurídico material; d) Finalmente, a razoabilidade tem função eficacial de bloqueio, enquanto a proporcionalidade, além desta função, também assegura a concretização dos interesses constitucionalmente consagrados.”[19]

O fato é que os dois princípios, da razoabilidade e da proporcionalidade, visam impedir que o arbítrio no exercício do poder se concretiza, e, portanto, objetivam a não realização de excessos, limitando as atividades estatais, para que não se restrinjam mais do que necessários direitos dos cidadãos. Nesse aspecto, existe semelhança entre os dois princípios, porque ambos se concretizam mediante uma ponderação ou exercício de valor.

Em outros termos dir-se-ia que a razoabilidade é um princípio de interpretação que está presente em todo agir individual e social, enquanto a proporcionalidade, além desse aspecto, também possui uma materialização. Essas diferenças no conteúdo impedem a utilização do princípio da fungibilidade entre ambos, porque se existem pontos em contato, também existem aspectos autônomos.

Como se vê o princípio da razoabilidade atua como instrumento de eficácia negativa, isto é, através da ponderação e equilíbrio, objetivando evitar que o poder estatal cometa excessos contra os direitos fundamentais do indivíduo.

Ao passo que o princípio da proporcionalidade atua como instrumento de eficácia positiva, pois além de evitar o cometimento desses excessos, ainda requer a utilização de mecanismos que permitem averiguar quais as medidas apropriadas na solução dos casos concretos, o que se materializa por meio de seus subprincípios da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

2. Princípio da proporcionalidade: aspectos gerais

A proporcionalidade assume importante papel na análise das normas viciadas, por inconstitucionais, em casos que, apesar de o poder legislativo atuar dentro de formas estabelecidas pela própria Constituição, às vezes até seguindo finalidades por ela amparadas, exorbitam seus limites ao estabelecerem restrições excessivas a direitos, implicando, assim, prejuízos à própria efetividade destes.[20]

A luta da proporcionalidade é, principalmente, contra normas arbitrárias e que, não obstante formalmente perfeitas, são ofensivas a direitos dos indivíduos por se apresentarem como excessivas, apesar de visarem à satisfação de outro e determinado interesse. De fato, “a aplicação do princípio da proporcionalidade pressupõe a tensão latente e efetiva de bem protegido através de uma medida, e um bem prejudicado pela prática dessa medida”.[21]

Sem dúvida, a proporcionalidade procura estabelecer um conteúdo material ao Direito, respaldando a dignidade do ser humano e garantindo, na máxima medida, efetividade aos direitos fundamentais.

O princípio da proporcionalidade, assim como é compreendido nos dias atuais, é algo recentíssimo na história do homem. É fruto de uma lenta evolução de idéias que remontam à própria antiguidade e se desenvolve a passos lentos para chegar a uma fase de maturação, sendo, agora, largamente aplicado jurisprudencialmente e, inclusive, previsto expressamente em legislações de determinados países.

2.1. A origem do princípio da proporcionalidade

Grande parte da doutrina (Willins Santiago, Helenilson Cunha[22], Ricardo Aziz[23], entre outros), destaca que a origem e o desenvolvimento do princípio da proporcionalidade encontram-se intrinsecamente ligados à evolução dos direitos e garantias individuais da pessoa humana, verificada a partir do surgimento do Estado de Direito na Europa.

Conforme afirma Willins Santiago:

“A ideia de proporcionalidade tem sua origem vinculada ao Estado de Direito, criado com a finalidade de promover a separação de poderes e a submissão dos órgãos estatais à lei, com respeito aos direitos fundamentais dos indivíduos a ele submetidos.”[24]

Ainda segundo o autor, pode-se apontar como marco histórico para o surgimento desse tipo de formação política (Estado de Direito), a Magna Carta inglesa, de 1215, que, por sua vez, esclarece: “o homem livre não deve ser punido por um delito menor, senão na medida desse delito, e por um grave delito ele deve ser punido de acordo com a gravidade do delito”. [25]

De fato, a ideia de proporcionalidade, ainda que difusa, surge aliada à concepção de justiça e se aperfeiçoa até ser visualizada, como efetivo princípio, entre os séculos XVII e XVIII, quando na Inglaterra surgiram as teorias jusnaturalistas, na qual sustentavam a consciência de que existiam direitos oponíveis ao próprio Estado e que ele, por sua vez, deveria propiciar o respeito desses direitos.

As teses jusnaturalistas defendiam a existência de direitos inatos, anteriores ao direito posto e visavam à proteção da liberdade do homem em face do poder punitivo do Estado, sobretudo porque a falta de limitação ao poder estatal, fonte de tanto desconforto e insegurança entre os cidadãos, exigia um controle efetivo dos meios de que o Estado se utilizava para o alcance de seus fins.

Dessa forma, muito contribuiu o jusnaturalismo para a concepção dos direitos fundamentais como eles se encontram hoje, sempre com o fim de limitar o poder do Estado, de modo a garantir a liberdade do homem.

No tocante ao Direito Penal, na Idade Antiga e Idade Média já se encontravam referências à proporção entre o crime cometido e a sanção imposta ao agente.

Nota-se que a evolução do conceito de proporcionalidade ocorreu com maior intensidade quando se desenvolveram outros pressupostos do Direito Penal Moderno, tais como: a legalidade, igualdade, mensurabilidade das penas.

No entanto, o conceito de proporcionalidade como um princípio constitucional, apto a nortear a atividade legislativa em matéria penal, também só foi desenvolvido pelos impulsos propiciados, sobretudo, pelas obras iluministas do século XVIII.

Nesta fase, pode-se destacar as obras de Montesquieu e Cesare Beccaria. A obra De l’espirit de lois, de Montesquieu, foi a primeira que abordou especificamente da relação necessária de proporcionalidade entre crimes e penas. Segundo Montesquieu: “É essencial que se evite mais um grande crime do que um crime menor, aquilo que agride mais a sociedade do que aquilo que a fere menos”.[26]

Ao passo que, a obra Dei delitti e delle pene, de Beccaria, concebeu a reação estatal ao crime como defesa da soberania, ou da sociedade. Neste trabalho, Beccaria também dissertou acerca da limitação do poder punitivo do Estado e a necessidade de se humanizar as penas. Destarte, afima Beccaria que:

“A grandeza das penas deve ser relativa ao estado da nação mesma. Mais fortes e sensíveis devem ser as impressões sobre os espíritos endurecidos de um povo apenas emergido do estado selvagem. É preciso o raio para abater um leão feroz que não se abala com o disparo do fuzil. Mas à medida que os espíritos se abrandam nos estados de sociedade, cresce a sensibilidade e, com ela, deve decrescer a força da pena, se houver que se manter constante a relação entre o objeto e a sensação. De quando se viu até agora pode tirar-se um teorema geral muito útil, mas pouco conforme ao uso, esse legislador ordinário das nações, a saber: para que cada pena não seja uma violência de um ou de muitos contra um cidadão privado, deve ser essencialmente pública, rápida, necessária, mínima possível nas circunstâncias dadas proporcional aos delitos e ditadas pela lei.”[27]

Como corolário da reação iluminista e dos ideais pregados por Beccaria, e tantos outros pensadores humanistas de sua época, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, insere, em seu texto, especificamente no item VIII, disposição consubstanciadora do princípio da proporcionalidade no campo do Direito Penal, ao afirmar que “a lei não deve estabelecer outras penas que as estritas e necessárias”.

No decorrer desse processo, se é certo que a ideia de proporção ligava-se às penas cominadas aos delitos, ao menos na sua origem, foi ela consagrada no direito administrativo por meio do desenvolvimento do princípio da legalidade.[28] Nota-se, portanto, claramente uma transposição das ideias surgidas no âmbito da problematização do direito penal para o estudo do poder de polícia.[29]

Aderindo ao pensamento exposto, Magalhães Gomes ensina que a origem do conceito de proporcionalidade é penal, e esse conceito foi, posteriormente, repassado à doutrina do direito administrativo:

“Importante destacar que este conceito de proporcionalidade, originado no direito penal, foi repassado para o direito de polícia durante a sua etapa de concepção liberal, ocorrida no século XIX, cuja característica maior foi o fortalecimento da proteção das esferas jurídicas individuais através do reconhecimento constitucional dos direitos que limitam o exercício do poder policial.”[30]

A trajetória do princípio da proporcionalidade no âmbito do direito administrativo se iniciou na França, contudo naquele País não existia controle de constitucionalidade repressivo ou posterior, impossibilitando o desenvolvimento da discussão do princípio em sede constitucional.

Sendo assim, a constitucionalização do princípio da proporcionalidade ocorreu na Alemanha, com o fim da Segunda Guerra mundial. Nessa fase, a preocupação da Corte Constitucional germânica com a proteção dos direitos fundamentais diante dos possíveis abusos do legislador, levou-a transplantar para o direito constitucional daquele País.

Sob a égide influência do direito alemão, outros países europeus passaram a acolher, em sede constitucional, o princípio da proporcionalidade.

O salto qualitativo no controle judicial das leis na Europa Continental ocorreu, portanto, graças à transposição, para o direito constitucional, das teorias de limitação de poder de polícia desenvolvidas no direito administrativo francês e recepcionadas pela Alemanha. As condicionantes históricas viabilizaram a evolução do Estado alemão, permitindo a solidificação da ideia de limitação também do Poder Legislativo na tarefa de realização dos direitos fundamentais.

Sobre o tema destaca Luis Francisco Torquato Avólio[31]:

“A transposição do princípio da proporcionalidade para o plano constitucional deve-se em boa parte ao papel do Tribunal Constitucional alemão. Através de sucessivos pronunciamentos, expressões claramente associadas ao pensamento da proporcionalidade foram se tronando recorrentes, até se estabelecer de forma incisiva.”

No âmbito do processo penal, Wilson Antônio Steinmetz entende que a grande discussão sobre o princípio da proporcionalidade ocorreu somente em 1925, ano em que o Dr. Hoffle, conhecido político, acometido de grave enfermidade, cumprindo prisão preventiva, faleceu.[32]

Foi na discussão desse caso, salienta o autor, que se propôs explicitamente a incorporação da proporcionalidade ao processo penal.

A aplicabilidade do princípio da proporcionalidade no direito brasileiro se deu primeiramente na ponderação entre crime e respectiva pena, “o princípio da proporcionalidade exige que faça uma ponderação sobre a relação existente entre o bem que é lesionado ou posto em perigo (gravidade do fato) e o bem de que pode alguém ser privado (gravidade da pena)”.[33]

No entanto, o conceito de proporcionalidade como um princípio jurídico, com índole constitucional, vem sendo desenvolvido ainda hoje.

2.1.1. Princípio da Proporcionalidade no direito comparado (Alemanha e Estados Unidos)

A origem do princípio da proporcionalidade, sob a atual perspectiva constitucional, pode ser remontada à experiência de vários países, inclusive de sistemas totalmente diversos, como os Estados Unidos (razoabilidade) e à Alemanha (proporcionalidade), os dois países que mais exerceram influência sob o direito brasileiro nesse tema.

Embora a Alemanha não tenha sido a precursora na previsão constitucional do princípio da proporcionalidade, foi nessa nação onde o referido princípio “deitou raízes mais profundas”, no dizer de Paulo Bonavides, notadamente porque as posições doutrinárias nem de longe eram carentes de originalidade e renovação.[34]

Sendo assim, a Alemanha foi, indubitavelmente, o país em que o princípio da proporcionalidade teve maior difusão, não só na doutrina, como também na jurisprudência. A partir do direito administrativo, o aludido princípio assumiu posição de revelo no Direito Constitucional, em meados da segunda metade do século XX.[35]

No final do século XVIII estavam consignadas, apor meio de Suarez, as origens administrativas do princípio da proporcionalidade na Alemanha, fundamentando-se no direito natural, na qual a liberdade é inata e inalienável ao homem.

A teoria da proporcionalidade vigorou primeiramente na Prússia, estando vinculada à jurisdição administrativa e ao direito de polícia, lugar em que alcançou maturidade e pôde se ampliar para os demais Estados alemães.

 Mas foi somente após a Segunda Guerra Mundial, depois do advento da lei fundamental, que o princípio da proporcionalidade passou a ter larga aplicação de caráter constitucional, sobretudo na jurisprudência do Tribunal Constitucional alemão.[36]

Nesse diapasão, de acordo com a lição de Suzana de Toledo Barros[37], só se pode falar em constitucionalismo na Alemanha, como movimento político-jurídico tendente a limitar os poderes do Estado e garantir os direitos fundamentais, a partir da Constituição de Weimar, de 1919, cujo mérito maior foi o de pôr em relevo os direitos da segunda geração, isto é, os direitos sociais.

Entretanto, o nacional-socialismo transformou a Alemanha em uma comunidade racista e rompeu com a constituição de Weimar, levando a ditadura de Fuhrer, que legou ao povo alemão a dolorosa experiência da Segunda Guerra Mundial.

Foi no período pós-guerra que aquele país sofreu uma enorme transformação nas suas bases culturais, viabilizando uma nova Constituição – A Lei Fundamental de 23 de maio de 1949.

Conforme Jorge Miranda[38], a nova carta política, ou Constituição de Bonn, promove especial relevo e atenção ao postulado da dignidade da pessoa humana, além de admitir que diretrizes do direito natural limitassem o poder estatal.

O Tribunal Constitucional alemão assimilou, em larga medida, a preocupação com os direitos fundamentais incluídos na Lei Fundamental. Ressalta Bonavides que foi em 16 de março de 1971 que, pela primeira vez, a Corte Constitucional alemã definiu, com clareza, o teor do princípio da proporcionalidade, do seguinte modo:

“O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e necessário para alcançar o objetivo procurado. O meio é adequado quando com seu auxílio se pode alcançar o resultado desejado; é necessário, quando o legislador não poderia ter escolhido um outro meio, igualmente eficaz, mas que limitasse ou limitasse da maneira menos sensível o direito fundamental.”[39]

O critério jurídico para aferir a legitimidade da intervenção do legislador nas normas que versem sobre os direitos fundamentais foi criado pelo Tribunal, que conseguiu alcançar ordem constitucional ao princípio controlador do excesso legislativo.

É o que ensina Gilmar Ferreira Mendes, ao expor que: “No direito constitucional alemão, outorga-se ao princípio da proporcionalidade ou ao princípio da proibição do excesso qualidade de norma constitucional não-escrita, derivada do Estado de Direito”.[40]

Durante as décadas de 50 e 60, na Alemanha, dois trabalhos acadêmicos tiveram como tema o princípio da proporcionalidade. Em 1955, surge a tese universitária de Rupprecht Von Krauss: “O princípio da proporcionalidade”, publicada em Hamburgo. Em 1961, Peter Lerche publica, em Colônia, a obra: “Excesso e direito constitucional, a vinculação do legislador aos princípios da proporcionalidade e da necessidade”.

O princípio da proporcionalidade foi aperfeiçoado pelo direito germânico e irradiado para grande parte do mundo do civil law como princípio implícito no ordenamento jurídico e com sede constitucional. A conceituação técnico-jurídica do princípio é, pois, fruto do labor da doutrina e jurisprudência alemãs.

No que tange ao constitucionalismo Norte-Americano, o princípio da razoabilidade teve sua origem vinculada ao caráter normativo atribuído à cláusula due process of law, ressaltando dois aspectos: o primeiro meramente processual, sendo vedados exames de ordem subjetiva relativos a possíveis arbitrariedades derivadas do Poder Legislativo, e a segunda de caráter substancial, a qual possibilita exercer o controle do arbítrio do ato legislativo e da discricionariedade do executivo.

A fase processual, pois, estava associada a uma exigência de legalidade, segundo o qual os atos do governo deveriam obedecer à determinada forma e procedimento para se evitar prejuízos aos direitos individuais. Aplicava-se esta parcialmente ao direito penal, significando que, para alguém ser considerado culpado, seria indispensável um processo regular, assegurada a ampla defesa.

Nesta fase inicial, não se permitia ao judiciário examinar o caráter injusto ou arbitrário do ato legislativo, tratava-se somente de uma garantia voltada à regularidade do processo penal, depois estendida ao processo civil e ao administrativo.

Por sua vez, na fase substantiva do due processo of law passou a se processar o controle da razoabilidade e da racionalidade dos atos dos poderes do Estado de forma geral. Nesse período, foram produzidas várias decisões por inconstitucionalidade de leis, sob o crivo de um juízo de razoabilidade exacerbado do Judiciário, tendente ao subjetivismo, uma vez que os juízes americanos tinham liberdade na tarefa de interpretar.

O controle de constitucionalidade das leis, associado ao due processo of law, garantiu, ao longo da história, ampla proteção dos direitos fundamentais da América do Norte.

Inspirado na common law, que possibilitou aos juízes americanos maior desenvolvimento do direito por meio da prática jurisprudencial, e sob a influência do jusnaturalismo, que tem o Direito como ideal de justiça e limite à atuação do Estado intervencionista, o modelo americano de controle vem permitindo conter o arbítrio do legislador e do administrador, pela sindicância da razoabilidade dos atos governamentais.[41]

O modelo americano de Constituição, que propiciou o controle jurisdicional das leis voltado para a garantia das liberdades ali consignadas, decorreu do próprio federalismo. É o que aduz Orlando Bitar:

“A natureza federal do Estado americano determinou, por um processo espontâneo de crescimento, o controle de constitucionalidade pelo Judiciário, sempre, naturalmente, concorrendo as demais causas históricas (…). Sendo o governo dos Estados Unidos de poderes limitados, seria a própria negação ao federalismo que pudessem os Estados invadir a órbita federal ou que a União fosse, na sua hegemonia, além das fronteiras que lhe impõe o respeito da autonomia local ou, finalmente, que o congresso se excedesse na sua competência de legislar para União, desprezando as restrições constitucionais expressas ou implícitas”.[42]

2.2. Princípio da proporcionalidade e seus subprincípios

Constatou a doutrina majoritária a existência de três elementos, conteúdos parciais ou subprincípios que governam a composição do princípio da proporcionalidade, sendo estes: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito.

Segundo Alexy[43], necessidade, adequação e proporcionalidade são “parcelas do princípio da proporcionalidade”, em que necessidade implica dizer se um princípio tem mais ou menos peso em certa situação, conforme as circunstâncias da situação tornem o valor que ele tutela ou promove mais ou menos necessário; adequação significa dizer que um princípio deve ser aplicado a uma situação quando é adequado para ela; e proporcionalidade em sentido estrito, onde “os ganhos devem superar as perdas”.

Para Virgílio Afonso, a ordem de apreciação dos subprincípios deve ser respeitada. Assim, o autor preceitua:

“A real importância dessa ordem fica patente quando se tem em mente que a aplicação da regra da proporcionalidade nem sempre indica a análise de todas as suas três sub-regras. Pode-se dizer que tais sub-regras relacionam-se de forma subsidiária entre si.”[44]

A impressão que muitas vezes se tem, quando se mencionam as três sub-regras da proporcionalidade, é que o juiz deve sempre proceder à análise de todas elas, quando do controle do ato considerado abusivo. Contudo, segundo Virgílio Afonso[45], a subsidiariedade quer dizer que a análise da necessidade só é exigível se, e somente se, o caso já não tiver sido resolvido com a análise da adequação; e a análise da proporcionalidade em sentido estrito só é imprescindível, se o problema já não tiver sido solucionado com as análises da adequação e da necessidade.

Assim, a aplicação da regra da proporcionalidade pode esgotar-se, em alguns casos, com o simples exame da adequação do ato estatal para a promoção dos objetivos pretendidos.

2.2.1. Adequação

A adequação, também chamada de pertinência ou aptidão, deve dizer se determinada medida representa o meio certo para executar um fim almejado no interesse público.

Canotilho define a adequação, como sendo o subprincípio que:

“Impõe que a medida adotada para a realização do interesse público deva ser apropriada à persecução do fim ou fins a ele subjacentes. Consequentemente, a exigência de conformidade pressupõe a investigação e a prova de que o ato do poder público é apto para e conforme os fins justificativos de sua adoção […] Trata-se, pois, de controlar a relação de adequação medida-fim.”[46]

Diante disso, o subprincípio da adequação, que consubstancia a idoneidade e a conformidade dos meios empregados, estabelece que a providência escolhida para apreciação do caso concreto seja apropriada aos objetivos perquiridos. Trata-se, na verdade, do controle da relação de adequação entre o meio e o fim.

Questão importante é saber se a adequação deve ser completa ou apenas parcial. Sobre o tema, Pedro Penalva, citado por Suzana de Toledo Barros,[47] entende que não há que radicalizar o assunto, mostrando que um juízo de adequação se faz em face de uma situação concreta, não se podendo desconsiderar, contudo, que a lei, como produto da vontade do legislador, é, no momento de sua edição, apenas uma previsão abstrata cujas virtualidades só com o decurso do tempo vão-se relevando.

E para sustentar sua tese, Suzana traz em sua obra o exemplo do Tribunal Constitucional alemão, no qual declarou inconstitucional uma medida tributária, tendo em vista que o tempo decorrido entre a edição da norma e a decisão judicial não era ainda razoável para avaliar se a norma atingiria ou não seus objetivos.

Há autores que entendem que a adequação da norma deve ser relativizada a depender do caso concreto. Sobre o tema, Diana-Urana Galetta[48] assim se expressa: “Nem é necessário que o meio utilizado se apresente como melhor possível ou mais adequado, é suficiente que ele forneça um contributo à consecução do objetivo”.

Diante disso, desde que o meio adotado fomente ou viabilize a realização do fim almejado já reunirá condições de ser considerado constitucionalmente adequado.

2.2.2. Necessidade

O subprincípio da necessidade ou da exigibilidade, ou, ainda, da menor ingerência possível, coloca a tônica no sentido de que um ato estatal que limita um direito fundamental é somente necessário caso a realização do objetivo perseguido não possa ser promovida, com a mesma intensidade, por meio de outro ato que limite, em menor medida, o direito fundamental atingido.

Assim, o cidadão tem o direito à menor desvantagem quando da restrição de algum dos seus direitos fundamentais.

O elemento necessidade impõe a escolha dentre os meios abstratamente idôneos a alcançarem o objetivo almejado, aquele cuja adoção implique nas menores consequências negativas ao particular.[49]

Esse subprincípio impõe uma avaliação pelo aplicador do direito dos próprios meios, levando em conta a perspectiva dos eventuais prejuízos deles resultantes. Assim, o emprego de determinado meio deve limitar-se ao estritamente necessário para a consecução do fim almejado, e, havendo mais de um meio, dentro do faticamente possível, deve ser escolhido aquele que traga menos desvantagens ou prejuízos.[50]

Aspecto importante desse subprincípio diz respeito ao tempo de duração de uma medida restritiva de direito fundamental. Suzana Toledo Barros dá o exemplo da previsão do art. 5º, inciso XII, da Constituição Federal, no qual permite o legislador impor restrição ao sigilo das comunicações telefônicas, para fins de investigação criminal, e questiona se seria lícito que a lei possibilitasse uma intervenção ad eternum quando estivessem sob suspeita criminosos e organizações voltadas para a prática permanente de crimes.

É certo que, com base no referido princípio, o magistrado deve fixar quantitativamente o tempo máximo da medida restritiva, justamente para evitar que a exceção se torne a regra e, por via transversa, se viole a garantia constitucional do acusado.   

2.2.3. Proporcionalidade em sentido estrito

Conforme preceitua Ávila: “O exame da proporcionalidade em sentido estrito exige a comparação entre a importância da realização do fim e a intensidade da restrição aos direitos fundamentais”.[51] Segundo ele, a pergunta que deve ser formulada é a seguinte: O grau de importância da promoção do fim justifica o grau de restrição causada aos direitos fundamentais?

Trata-se, pois, esse subprincípio de pesar no caso concreto as desvantagens dos meios em relação às vantagens dos fins. Assim, o principal ponto desse elemento é a ponderação, a relação “custo-benefício”, ou seja, além de se levar em conta a adequação e a necessidade da opção feita, há de ter em consideração, ainda as os prejuízos e benefícios que a medida acarreta para os envolvidos.

Quanto maior é o grau da insatisfação ou de afetação de um princípio, tanto maior tem que ser a importância da satisfação de outro princípio. Os princípios possuem pesos relativos e pela necessidade de otimizar as possibilidades jurídicas, eles só podem ser restringidos na medida em que não sejam afetados mais do que o necessário para aplicação de outros.[52]

No direito processual penal considera-se que quanto mais contundente for a intervenção estatal na esfera jurídica do indivíduo, mais relevante há de ser o interesse geral da coletividade.

Mariângela Gama, fazendo referência à autora Teresa Aguado Correa, ressalta que:

“Ao legislador penal resta, então, ponderar o valor do bem jurídico a ser protegido criminalmente, assim como o desvalor da conduta a ele afrontosa (interesse geral), com o valor da liberdade ameaçada pela previsão legal de pena à prática da conduta (interesse individual), e estabelecer a medida em que é cabível abrir mão do interesse individual em nome do interesse geral que está em jogo. Não se trata mais, portanto, de analisar se é possível sacrificar um em detrimento do outro, mas o quanto isso é possível”.[53]

Com base nisso, o trabalho de balanceamento entre direitos fundamentais consagrados na Constituição é o que se espera, pois, do mandado de ponderação, próprio do princípio da proporcionalidade em sentido estrito. A necessária ponderação tem lugar no momento em que uma norma de direito fundamental entra em colisão com outra cujo mandamento diga respeito a outro direito, igualmente fundamental.

Quanto ao direito processual penal, aduz Mariângela Gomes que: “a ponderação de valores se dá entre a afronta ao bem jurídico protegido pela norma e a liberdade pessoal ameaçada pela pena”.[54]

3. O princípio da proporcionalidade no âmbito do direito processual penal

A Constituição Federal de 1988 consubstanciou expressamente em seu texto a adoção de um modelo de Estado Democrático de Direito, e, com isso o Estado passou a sujeitar-se a uma série de fins diretivos, no qual buscam a persecução e a concretização da justiça social.

Destarte, esse modelo de organização política de poder pressupõe que os indivíduos possuem certos direitos indispensáveis à própria existência e ao desenvolvimento da personalidade humana, que constituem verdadeiras barreiras de proteção contra utilização arbitrária do poder do Estado.[55]

Conforme expõe José Frederico Marques:

“A função do processo penal no Estado Democrático de Direito é a assegurar os direitos fundamentais do acusado. O processo é garantia, é instrumento rígido do controle da democracia, pois é por meio de sua condução que se verifica o grau de efetividade dos direitos fundamentais do indivíduo.”[56]

O conflito entre valores constitucionais é bastante comum no âmbito do processo penal, sobretudo quando se trata de segurança social (interesse da sociedade) versus garantias individuais (interesses do indivíduo), exigindo-se do magistrado a compatibilização ou ponderação dos direitos fundamentais no caso concreto.

A busca da justiça material pressupõe a utilização do princípio da proporcionalidade, a fim de concretizar valores de índole constitucional, tomando-se como primazia a dignidade da pessoa humana.

A Constituição Federal reconhece a existência e importância da dignidade da pessoa humana e transforma-a em um valor supremo da ordem jurídica, quando a institui como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil constituída em Estado Democrático de Direito (art. 1º, inc. III, CF).

Ingo Sarlet[57] ressalta que a dignidade humana comporta “uma função instrumental integradora e hermenêutica na medida em que serve de parâmetro de aplicação, interpretação e integração não apenas dos direitos fundamentais e das demais normas constitucionais, mas de todo ordenamento jurídico”.

A inafastável necessidade de composição dos valores da liberdade do indivíduo e da segurança social suscita a máxima da proibição do excesso nas restrições de eventuais direitos, avaliados em um caso concreto.

Defende João Carlos Vieira de Andrade[58] que se a existência de outros princípios ou valores justifica que os direitos possam ser restringidos, a ideia do homem como ser digno e livre, que está na base dos direitos e constitui, muito especialmente, a essência dos direitos, liberdades e garantias, tem de ser vista como um limite absoluto a esse poder de restrição.

Sobre o tema, Flávia D’Urso dispõe que:

“Considerou-se, alhures, que a tensão no conflito da liberdade e da segurança social insere-se em cenário jurídico no qual é estabelecida a primazia da dignidade humana na hierarquia da hermenêutica constitucional a solucioná-la. Nessa resolução dos conflitos judiciais decorrentes dessa inevitável ponderação de bens exsurge a máxima da proporcionalidade no intuito mesmo de limitar a restrição de eventuais direitos individuais, na apreciação do caso concreto. A norma que permite a invasão a esses direitos individuais deve ser interpretada. O caráter concretizante da hermenêutica constitucional, bem como do processo penal na efetivação da justiça material, que alia princípios constitucionais de caráter normativo à realidade, demanda do juiz criminal nas suas decisões uma interpretação construtiva da lei para que, nos conflitos e nas restrições a direitos fundamentais, permaneça intocado o núcleo essencial desses direitos, qual seja, a dignidade da pessoa humana”.[59]

O princípio da proporcionalidade, aplicado à resolução de conflitos entre interesses contrários, bens jurídicos essenciais contrapostos, valores e direitos fundamentais colidentes – como o exemplo dado de segurança social versus garantias individuais – permite a salvaguarda da dignidade da pessoa humana, limite dos limites, mínimo a ser preservado em defesa do indivíduo contra o arbítrio estatal, quando este atua em prol dos interesses da sociedade, na visão de Flávia D’urso.[60]

A relevância do princípio da proporcionalidade decorre do fato de a gravidade da intervenção penal ter sua variação atrelada ao grau de dignidade do bem jurídico e da sua afetação, fazendo nascer o binômio merecimento de pena e restrição da liberdade humana.[61]

A concretização do caráter normativo das disposições constitucionais relacionadas ao processo penal é de atribuição judicial. Ao juiz compete conferir efetividade aos princípios constitucionais, interpretando-os de forma hierárquica e atribuindo primazia à dignidade humana.

O labor do juiz criminal seria constitutivo e não meramente mecânico de adequação dos fatos aos termos linguísticos da norma na aplicação, por óbvio, dos institutos processuais que impliquem principalmente a restrição a direitos fundamentais.[62]

Assim, a ideia de que o magistrado no âmbito do processo penal declara o direito foi superada, cabe a ele, pois, o balanceamento e a valoração dos interesses em conflito, tendo em vista a perspectiva principiológica constitucional.

3.1. Princípio da proporcionalidade nas prisões cautelares

As prisões cautelares diferem-se das definitivas, pois são decretadas na fase investigativa ou no curso do processo, antes mesmo de um juízo definitivo de culpa do julgador.

Assume especial importância a aplicação do princípio da proporcionalidade nas prisões cautelares, uma vez que como se trata de medida processual, não raro, sob modelo de uma intervenção estatal emergencial, há o caráter restritivo a direitos essenciais.

A decisão da medida processual restritiva de direitos deve resultar da conjugação da adequação ou idoneidade, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, bem como dos requisitos legais usuais.

As prisões cautelares, por ser inseridas na dinâmica da urgência, acabam desempenhando um relevante efeito sedativo da opinião pública pela ilusão de justiça instantânea. O simbólico da prisão imediata acaba sendo utilizado para construir uma (falsa) noção de “eficiência” do aparelho repressor estatal e da própria justiça. Com isso, o que foi criado para ser excepcional, torna-se um instrumento de uso comum e ordinário, deturpando-o completamente. Nesse contexto, rompe-se com a legitimidade das prisões cautelares.[63]

Luigi Ferrajoli[64] sustenta que: “a prisão cautelar é uma pena processual, em que primeiro se castiga e depois se processa, atuando com caráter de prevenção geral e especial e retribuição”. Além disso, na visão do referido autor, se fosse verdade que elas não têm natureza punitiva, deveriam ser cumpridas em instituições penais especiais, com suficientes comodidades (uma boa residência) e não como é hoje, em que o preso cautelar está em situação pior do que a do preso definitivo, pois não tem regime semi-aberto ou saídas temporárias.

Segundo Francesco Carnelutti:

“As exigências do processo penal são de tal natureza que induzem a colocar o imputado em uma situação absolutamente análoga ao de condenado. É necessário algo mais para advertir que a prisão do imputado, junto com sua submissão, tem, sem embargo, um elevado custo? O custo se paga, desgraçadamente em moeda justiça, quando o imputado, em lugar de culpado, é inocente, e já sofreu, como inocente, uma medida análoga à pena.”[65]

Destarte, a prisão cautelar deve ser o mecanismo utilizado como instrumento para a realização do processo ou para garantia de seus resultados e não medida de punição antecipada.

Presunções arbitrárias, construídas a partir de juízos meramente hipotéticos, não podem prevalecer sobre o princípio da liberdade, cuja precedência constitucional lhe confere posição eminente no processo penal.

Dessa forma, a gravidade em abstrato do crime não basta para justificar, por si só, a privação cautelar da liberdade individual do acusado, ainda que o delito imputado ao réu seja legalmente classificado como hediondo ou a esse juridicamente comparado. Isso por efeito da vedação constitucional de presunção da culpabilidade (art. LVII, CF).

Nem mesmo o clamor público das ruas é considerado fator determinante para a decretação ou manutenção da prisão cautelar. A prisão cautelar, em nosso ordenamento jurídico, não deve sujeitar-se, pois, no que concerne aos fundamentos que possam legitimá-la, ao clamor emergente da população, sob pena de completa e grave violação ao postulado fundamental da liberdade.

Conforme aponta Sanguiné:

“Quando se argumenta com razões de exemplaridade, de eficácia da prisão preventiva na luta conta delinquência e para restabelecer o sentimento de confiança dos cidadãos no ordenamento jurídico, aplacar o calor público criado pelo delito etc. que evidentemente nada tem haver com os fins puramente cautelares e processuais que oficialmente se atribuem à instituição, na realidade, se introduzem elementos estranhos à natureza cautelar e processual que oficialmente se atribuem à instituição, questionáveis tanto desde o ponto de vista jurídico-constitucional como da perspectiva da político-criminal. Isso revela que a prisão preventiva cumpre funções reais (preventivas gerais e especiais) de pena antecipada incompatíveis com sua natureza.”[66]

Nesse sentido, consolida-se o entendimento da Suprema Corte do país:

“HABEAS CORPUS – PRISÃO CAUTELAR DECRETADA COM APOIO EM MÚLTIPLOS FUNDAMENTOS: SUPOSTA COAÇÃO NO CURSO DO PROCEDIMENTO PENAL; PRIVILEGIADA CONDIÇÃO SOCIAL E FUNCIONAL DOS PACIENTES; POSSIBILIDADE DE EVASÃO DO DISTRITO DA CULPA; EXISTÊNCIA DE CLAMOR PÚBLICO E NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO DE CREDIBILIDADE DAS INSTITUIÇÕES – ILEGITIMIDADE JURÍDICA DA PRISÃO CAUTELAR QUANDO DECRETADA, UNICAMENTE, COM SUPORTE EM JUÍZOS MERAMENTE CONJECTURAIS – INDISPENSABILIDADE DA VERIFICAÇÃO CONCRETA DE RAZÕES DE NECESSIDADE SUBJACENTES À UTILIZAÇÃO, PELO ESTADO, DESSA MEDIDA EXTRAORDINÁRIA – SITUAÇÃO EXCEPCIONAL NÃO VERIFICADA NA ESPÉCIE – INJUSTO CONSTRANGIMENTO CONFIGURADO – IRRELEVÂNCIA, PARA EFEITO DE CONTROLE DE LEGALIDADE DA DECISÃO QUE DECRETA A PRISÃO CAUTELAR, DE EVENTUAL REFORÇO DE ARGUMENTAÇÃO ACRESCENTADO PELAS INSTÂNCIAS SUPERIORES – PRECEDENTES – “HABEAS CORPUS” DEFERIDO. PRISÃO CAUTELAR – CARÁTER EXCEPCIONAL.

I- A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional, somente devendo ser ordenada, por tal razão, em situações de absoluta e real necessidade. A prisão processual, para legitimar-se em face de nosso sistema jurídico, impõe – além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e indício suficiente de autoria) – que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do indiciado ou do réu.

II- A decisão que ordena a privação cautelar da liberdade não se legitima quando desacompanhada de fatos concretos que lhe justifiquem a necessidade, não podendo apoiar-se, por isso mesmo, na avaliação puramente subjetiva do magistrado de que a pessoa investigada ou processada, se em liberdade, poderá delinquir ou interferir na instrução probatória ou evadir-se do distrito da culpa ou, então, prevalecer-se de sua particular condição social, funcional ou econômico-financeira para obstruir, indevidamente, a regular tramitação do processo penal de conhecimento.

III- O clamor público – precisamente por não constituir causa legal de justificação da prisão processual (CPP, art. 312)- não se qualifica como fator de legitimação da privação cautelar da liberdade do indiciado ou do réu. Precedentes.

IV- O estado de comoção social e de eventual indignação popular, motivado pela repercussão da prática da infração penal, não pode justificar, só por si, a decretação da prisão cautelar do suposto autor do comportamento delituoso, sob pena de completa e grave aniquilação do postulado fundamental da liberdade”. (sic). [67]

Com efeito, a prisão cautelar deve ser decretada somente em casos excepcionais e de relevância social, vinculando-se à existência concreta dos seguintes requisitos: fumus commissi delicti e periculum libertatis. Desse modo, deve haver, não só, a prova da existência do delito e indícios suficientes de autoria (art. 312, CPP), como também que a liberdade do imputado represente, de fato, ameaça ao desenvolvimento da ação penal.

O fumus commissi delicti exige a existência de sinais externos, com suporte fático real, extraídos dos atos de investigação levados a cabo, em que por meio de um raciocínio lógico, sério e desapaixonado permita deduzir com maior ou menor veemência a comissão do delito, cuja realização e consequências apresentam como responsável um sujeito concreto.[68] Em outras palavras, esse requisito representa a probabilidade, baseada em uma cognição sumária, de que o acusado seja o autor do crime.

Quanto ao periculum in libertatis, pode-se considerar que é o perigo que decorre do estado de liberdade do sujeito passivo, previsto no Código de Processo Penal como risco para garantia da ordem pública, ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal (art. 312, CPP).[69]

O princípio da proporcionalidade se destina a nortear a conduta do juiz frente ao caso concreto, pois, após averiguar o preenchimento dos requisitos do fumus commissi delicti e do periculum libertatis, ele deverá ponderar a gravidade da medida imposta com a finalidade pretendida.

A prova da existência do crime e os indícios suficientes da autoria são elementos necessários, mas não suficientes para a decretação da prisão cautelar. A análise do “direito hipotético” não deve se limitar a “probabilidade de uma condenação”. Há mais a ser considerado nesse juízo prognóstico. O juiz deverá também considerar a probabilidade de que seja imposta uma pena privativa de liberdade a ser executada.[70]

A proporcionalidade não deve ser almejada somente tendo como parâmetro a pena cominada ao delito, mas considerando-se principalmente a pena que provavelmente será aplicada ao final da sentença condenatória. Apenas no caso em que o magistrado preveja, com base nos elementos concretos existentes nos autos, que o imputado terá que se submeter a uma a pena privativa de liberdade, a prisão cautelar será proporcional ao provimento definitivo que ela visa assegurar.

Sobre o tema, leciona Antônio Vieira que:

“Encarcerar provisoriamente um acusado e lhe dar como perspectiva de condenação o cumprimento de uma pena alternativa, por exemplo, faz com que ele teime e rejeite mais o processo que a própria sanção. Esta perigosa inversão de valores, por sua vez, certamente conduzirá a uma renúncia forçada ao direito de defesa e de resistência à pretensão punitiva, uma vez que o imputado sempre vislumbrará na pena um alívio ao tormento processual, e desejará que a condenação se ultime o mais rapidamente possível, de modo a minimizar seu sofrimento”.[71]

Assim, se a pena ao final decretada for multa, restritiva de direito, ou uma pena privativa de liberdade que será condicionalmente suspensa (sursis), ou, ainda, uma pena privativa de liberdade a ser cumprida em regime aberto, será ilegal a decretação da prisão preventiva, posto que desproporcional ao resultado final do processo cuja utilidade se quer assegurar.

Nessa direção tem-se a prudência e a proporção na vedação pela lei de imposição de quaisquer medidas cautelares – incluindo a prisão preventiva – para as infrações às quais não seja prevista pena privativa de liberdade (art. 283, §1º, do CPP).

O juiz, portanto, deve observar a relação existente entre a eventual sanção cominada ao crime em tese praticado, e àquela imposta em sede de medida cautelar, para impedir que o imputado seja submetido a uma medida cautelar que se revele mais gravosa do que a sanção a ser aplicada ao final.

Na visão de Eugênio Pacelli, a Lei nº 12.403/2011 cometeu relevante falha, abrindo um caminho para decretação da prisão cautelar, o qual fere o princípio da proporcionalidade, assim aduz que:

“Como a lei autoriza a decretação da prisão preventiva para os casos de descumprimento de cautelares (art. 282, § 4º, CPP), admitir-se a imposição de alguma delas (cautelares, diversas da prisão) para tais infrações implicaria sempre o risco de decretação da prisão pelo descumprimento da cautelar, para crimes dos quais, ao final, não se espera, em tese, a imposição da pena privativa de liberdade.”[72]

Por outro lado, há manifesta proporcionalidade no que diz respeito aos crimes culposos, para os quais permanece desautorizada a prisão preventiva, ressalvada a hipótese do art. 313, parágrafo único, CPP, a qual limita a prisão até a identificação do acusado.[73]

Afigura-se também inadequada e desnecessária a decretação de prisão cautelar para as infrações de menor potencial ofensivo, já que pra essas é previsto o processo conciliatório da transação penal, e também os casos de proposta e aceitação da suspensão condicional do processo (art. 89, da Lei nº 9.099/95).

A Lei nº 12.403/2011 valeu-se mais uma vez do critério da proporcionalidade ao fixar o referencial de pena cominada ao delito para fim de limitação à aplicação da cautelar de prisão, consoante se vê do art. 313, I, do CPP.

Com efeito, o artigo citado dispõe que a decretação da preventiva dependerá de se tratar de crime para o qual a pena máxima prevista no tipo seja superior a quatro anos. A razão desse referencial está diretamente vinculada ao limite da pena previsto para substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, qual seja: quatro anos (art. 44, I, CP). No mesmo sentido, o disposto no art. 33, § 2º, b, do CP, que permite o início de cumprimento de pena em regime aberto àquele que tenha sido condenado à pena não superior a quatro anos.

As demais condições de admissibilidade para decretação da prisão cautelar instituídas pela nova lei (art. 313, incisos II a III e parágrafo único, todos do CPP) também reiteram a excepcionalidade dessa medida, uma vez que se tornaram mais rigorosas.

Para se decidir acerca do tempo de duração das prisões cautelares torna-se completamente aplicável o princípio da proporcionalidade, no qual servirá para verificar a necessidade de prorrogá-las, devendo o magistrado analisar as circunstâncias de cada caso concreto, a saber: pluralidade de réus, diversidade de testemunhas, necessidade de expedição de cartas precatórias. Todos estes elementos demandam maior lapso temporal para conclusão da instrução processual.

Nesse diapasão, a jurisprudência dominante nos Tribunais pátrios é no sentido de que a revogação da prisão preventiva por excesso de prazo não viola o princípio da razoabilidade se não houver nenhuma desídia na fase instrutória, e sim decorrer somente da complexidade do processo criminal ou por atitude do próprio réu, conforme se verifica abaixo:

“HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ALEGAÇÃO DE ESCESSO DE PRAZO PARA O TÉRMINO DA INSTRUÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDAE. ALEGAÇÃO DA AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS AUTORIZADORES DA PRISÃO CAUTELAR. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. GRAVIDADE CONCRETA DO CRIME. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA CONFIGURADA. MEDIDAS CAUTELARES SUBSTITUTIVAS À PRISÃO. INADMISSIBILIDADE. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. EXISTÊNCIA DE CONDIÇÕES FAVORAVEIS DA PACIENTE. IRREVELÂNCIA. ORDEM DENEGADA.O prazo para a conclusão da instrução criminal não tem as características de fatalidade e de improrrogabilidade, fazendo-se imprescindível raciocinar com o juízo de razoabilidade para definir o excesso de prazo, não se ponderando mera soma aritmética de tempo para os atos processuais. Dessa forma, o constrangimento ilegal por excesso de prazo só pode ser reconhecido quando houver demora injustificada, o que não ocorre no presente caso. Ademais, o feito originário encontra-se com designação de audiência de instrução e julgamento para data próxima, na qual provavelmente ocorrerá o encerramento da instrução criminal. As medidas cautelares substitutivas do cárcere não se mostram compatíveis, ante o não atendimento dos pressupostos legais, não se considerando adequadas e suficientes, em face da gravidade e das circunstâncias do crime. Ordem denegada.” (sic). [74]

A proporcionalidade também é critério para a manutenção ou revogação da prisão preventiva. Se no decorrer do processo penal as provas produzidas demonstram, com base em um juízo prognóstico, que a provável pena a ser aplicada não será privativa de liberdade, o juiz deverá revogar a prisão cautelar.

3.2. Direito processual penal da emergência e o uso indiscriminado das prisões provisórias

No contexto político-social do Brasil atualmente prevalece o emergencialismo das propostas de reforma penal e processual penal, na qual a sociedade ainda acredita na eficiência da imposição de penas mais gravosas e medidas cada vez mais restritivas da liberdade no combate à criminalidade.

A realidade da sociedade brasileira mostra a ineficácia da Constituição Federal, tendo em vista a redução, cada vez maior, da efetivação dos direitos e garantias fundamentais. Nesse passo, pode-se constatar verdadeira crise do Estado Social ou constitucionalismo democrático.

O Estado passa a decretar de forma indiscriminada e arbitrária a prisão provisória como forma de combate à criminalidade, ao invés de implementar políticas públicas aptas a minimizar as causas da delinquência, como por exemplo, a redução da desigualdade social.

Como exemplo de decisão arbitrária em relação à prisão cautelar, decretada com motivação inidônea, colaciona-se o seguinte julgado:

“HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE ENTORPECENTES, POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA E POSSE DE MEDICAMENTO SEM REGISTRO NA ANVISA – PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL DECORRENTE DA MANUTENÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR – PROCEDÊNCIA – DECISÃO MOTIVADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA ANTE A GRAVIDADE GENÉRICA DO CRIME E POSSIBILIDADE DE FUGA – FALTA DE INDICAÇÃO DE FATOS CONCRETOS A JUSTIFICAR A NECESSIDADE DA MANUTENÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR – MOTIVAÇÃO INIDÔNEA – CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO – DECISÃO CASSADA – VIGÊNCIA DA LEI Nº 12.403/2011 – NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO. LIMINAR CONFIRMADA – ORDEM CONCEDIDA. 1. A primeira decisão está amparada em fundamentação genérica e abstrata e a segunda apenas fez remissão à primeira. Portanto, deixou-se de observar o dever de motivação, inerente à atividade jurisdicional e previsto pelo Código de Processo Penal e pela própria Constituição Federal”. (sic).[75]

Segundo Flávia D’urso: “o emergencialismo diz com a adoção de providências legais e jurisdicionais cunhadas pela improvisação, rigorismo, ausência de coordenação sistemática, pouca ou nenhuma técnica e, em grande parte, inconstitucionais”.

É nesse diapasão que se permite o ingresso do que se convencionou chamar de legislação álibi, com a proliferação de leis que favorecem a intervenção de cunho emergencial e a adoção de medidas processuais penais, em especial às de restrição de liberdade, como se automáticas fossem. Em sua grande maioria, tais leis e medidas demonstram-se ineficazes e lesivas, eivadas de vícios de constitucionalidade.

Essa “legislação-álibi”, na perspectiva de Marcelo Neves serve para:       

“criar a imagem de um Estado que responde normativamente aos problemas reais da sociedade, embora as respectivas relações sociais não sejam realmente normatizadas de maneira consequente conforme o respectivo texto legal. Nesse sentido, pode-se afirmar que a legislação-álibi constitui uma forma de manipulação ou de ilusão que imuniza o sistema político contra outras alternativas, desempenhando uma função ideológica.”[76]

A larga utilização da legislação álibi leva à descrença do próprio sistema jurídico, além disso, acarreta em profundos conflitos sociais porque distingue, com relevância institucional, quais as culturas que gozam de legitimação e dominação pública.[77]

Com base nesse tipo de legislação, as prisões provisórias acabam sendo decretadas para construir uma noção de eficiência do aparelho estatal e da própria justiça, criando na população a enganosa sensação de que os problemas sociais estão sendo amenizados.

Na mesma direção, Paulo Rangel adverte:

“Não podemos confundir prisão cautelar com política pública séria de combate a violência, ou seja, nada tem a ver com a prisão cautelar os altos índices de violência urbana que assolam nosso País. Se há roubos, homicídios, estupros, etc, ocorrendo nas grandes metrópoles, deve o Estado adotar as medidas necessárias para conter essa onda de violência e não culparmos o judiciário que não lançou mão de uma medida cautelar para contê-la. Uma coisa é a certeza de que nas ruas não há polícia, outra, bem diferente, é, em decorrência disso, haver necessidade de, no curso do processo, o réu ser preso”.[78]

Conforme expõe Maria Kato[79], indubitavelmente, o processo penal de emergência almeja "assegurar, dentro do contexto do caos e da desordem, o controle do réu, por um instrumento técnico significativo, que é a prisão provisória".

Ainda segundo a autora, a sociedade em sua grande maioria, não sabe diferenciar o instituto da prisão cautelar e o da prisão definitiva, pois acredita que a prisão provisória é um instrumento de punição utilizado pelo Estado. Destarte, o Estado, buscando atender o clamor social, aplica a prisão, como um analgésico, mostrando uma aparente retribuição rápida ao mal causado pelo "indivíduo culpado". Contudo, quando cessa a custódia cautelar, decai uma profunda decepção, acreditando a sociedade que o Estado deixou de punir o culpado, quando, em verdade, a sanção sequer fora aplicada.

Medidas drásticas, como a prisão preventiva, que, por sua vez, deveriam ser usada de forma excepcional, acabam por se tornar regra, sendo sua decretação dada de forma indiscriminada.

Diante desse contexto, surge o desafio de obter a harmonia entre as medidas cautelares processuais penais e os direitos e garantias individuais assegurados na CF.

Para o combate desse quadro social afigura-se imperiosa o resgate da hermenêutica constitucional concretizante e principiológica, na concepção de Flávia D’urso.

O caráter concretizante da hermenêutica constitucional, bem como a efetivação da justiça material no âmbito do processo penal, demanda do juiz criminal nas suas decisões uma interpretação construtiva da lei para que, nos conflitos e restrições dos direitos fundamentais, permaneça preservada a dignidade da pessoa humana.[80]

O princípio da proporcionalidade contribui, então, de forma direta para esse propósito concretizante da constituição e protetor da dignidade da pessoa humana, na medida em que possibilita que se encontre a medida necessária e mais adequada para o conflito, sem, contudo, violar direitos de caráter fundamental.

3.3. Subsidiariedade da prisão cautelar

Qualquer intervenção estatal na liberdade do cidadão – sede natural de interferência do Direito e do Processo Penal –, ao menos em um contexto de Estado Democrático de Direito, só se justifica diante de situações graves, que representam risco ou dano a direito fundamental.

Afora essas hipóteses, a intervenção penal corre sério risco de se converter em um mal maior que aquele decorrente da conduta a que visa prevenir e reprimir.

Diante disso, conclui-se que o próprio direito penal deve ser subsidiário, o último recurso (ultima ratio) a ser empregado diante de condutas graves e da constatação da ineficiência de normas de outras naturezas (civil, administrativa, tributária, entre outras) em assegurar a devida tutela aos bens jurídicos por elas (condutas) violados ou ameaçados de violação.

O mesmo também se observa com relação à subsidiariedade da pena privativa de liberdade, a qual somente é decretada diante da impossibilidade de sua substituição pela pena restritiva de direito.

O encarceramento deve ser na medida do possível evitado, devido ao seu alto potencial estigmatizante e aos inúmeros problemas sociais que dele decorrem, incluindo-se o aumento da violência e da criminalidade.

Destarte, diante dos casos mais graves, muito maiores razões há para que o aprisionamento preventivo tenha seu âmbito de incidência restringido e bem delimitado, enquanto medida excepcional que é. Com isso, pode-se dizer que ao menos como regra e em princípio, não pode a prisão cautelar superar em gravidade – quantitativa e qualitativa – o próprio direito penal cuja aplicação se busca no processo.

Menciona Edilson Bonfim que: “ao estabelecer a imposição das medidas cautelares preferencialmente em relação à prisão temporária e preventiva, demonstra o legislador o intuito de evitar que a prisão antes da condenação definitiva ganhe ares de definitividade”.[81]

As preocupações em positivar as conclusões acima no que tange à subsidiariedade da prisão cautelar é, sem dúvidas, uma das marcas da reforma processual promovida pela Lei nº 12.403/2011. Preocupação esta que se expressa nos seguintes artigos:

“Art. 282 […]

§4º No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, se deu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). […]

§6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).

Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentalmente: […]

II- converter a prisão em flagrante em prisão preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão”;

Essa ideia surgiu, sobretudo, com a finalidade de superar uma mentalidade anterior ainda atrelada a uma legislação e um ideal geridos de antecipação de culpa, de banalização do aprisionamento provisório diante de um sistema bipolar, em que ou se decretava a prisão ou se concedia a liberdade, que, por sua vez, não se fazia em conjunto com medidas eficazes em acautelar a persecução penal.

Destarte, aduz Aury Lopes que:

“A excepcionalidade deve ser lida em conjunto com a presunção da inocência, constituindo um princípio fundamental de civilidade, fazendo com que as prisão cautelares sejam (efetivamente) a ultima ratio do sistema, reservada para os casos mais graves”.[82]

Insta ressaltar que a subsidiariedade da prisão cautelar não significa que a sua imposição dependerá da anterior tentativa de eficácia de outras medidas diversas da prisão provisória de liberdade. A expressão ultima ratio traduz, sobretudo, um juízo de preferência, para fins de tutela da investigação e do processo.

Por força de clara opção legislativa, o magistrado deve privilegiar as cautelares diversas da prisão, reservando esta última apenas nos casos em que os onerosos custos sociais decorrentes da privação de liberdade de alguém possam ser superados pela necessidade de tutela das funções de investigação e do regular e efetivo exercício da jurisdição penal, ou da ordem pública.

As medidas cautelares diversas da prisão devem priorizar o caráter substitutivo, ou seja, como alternativas à prisão cautelar, reservando a prisão preventiva como último instrumento a ser utilizado.

3.4. Medidas cautelares alternativas à prisão preventiva e a aplicação do princípio da proporcionalidade

Medidas cautelares são essencialmente providências estatais que buscam assegurar a utilidade e efetividade do resultado da tutela jurisdicional, que se dará pela sentença penal condenatória ou, eventualmente absolutória.

Esclarece Aury Lopes:

“Fica evidenciado, assim, que as medidas cautelares não se destinam a fazer justiça, mas sim garantir o normal funcionamento da justiça através do respectivo processo penal de conhecimento. Logo, são instrumentos a serviço do instrumento processo; por isso, sua característica básica é a instrumentalidade qualificada ou ao quadrado.”[83]

As medidas cautelares não são novidade nos demais ramos do Direito. É remota a noção trazida pelo Código de Processo Civil de necessidade de que sejam aplicadas determinadas medidas visando garantir a satisfação da prestação jurisdicional, bem como sua própria utilidade e finalidade.

Edilson Bonfim destaca que até mesmo no CPP as medidas cautelares já eram previstas sob forma de medidas assecuratórias (arts. 125 a 144), que são aquelas providências concebidas para garantir a eventual e futura indenização ou reparação à vítima do processo, bem como assegurar o pagamento das custas processuais existentes, ou ainda, evitar que o réu venha a se locupletar dos ganhos obtidos com a prática criminosa.[84]

Entretanto, com o advento da Lei nº 12.403/2011 surgiram as medidas cautelares pessoais alternativas, também chamadas de medidas cautelares subjetivas diversas da prisão provisória.

Comumente as medidas cautelares referidas precisam ser efetivadas com urgência, sob pena de perecimento dos elementos de convicção aptos para a caracterização da conduta criminosa. Diante disso, é importante ressaltar que essas medidas devem ser utilizadas sob o amparo do princípio da proporcionalidade, para evitar a indevida restrição a direitos fundamentais do acusado.

Nesse diapasão, a modificação legislativa procurou inserir ao Código de Processo Penal a proporcionalidade como critério para a aplicação das medidas cautelares. Esse tema agora está disciplinado legislativamente em suas máximas ou subprincípios da necessidade, adequação e da proporcionalidade em sentido estrito, com a alteração da redação do art. 282, que assim dispõe:

“O art. 282, caput: “As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:

I – necessidade para a aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais;

II – adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado”.

Isto posto, para a imposição de alguma medida cautelar é imperativo verificar se há necessidade dessa medida e, sendo imprescindível sua imposição, buscar entre as medidas possíveis, a mais adequada, entendida como a que impõe uma restrição menos gravosa ao direito do acusado a ser afetado pela medida cautelar.

A respeito da necessidade, não se pode justificar a aplicação das cautelares com base em meras especulações acerca de possibilidade de reiteração criminosa, de riscos abstratos de interferência negativa na instrução ou investigação, o mesmo se podendo dizer quanto à possibilidade de fuga do investigado.

E essa preocupação, hoje positivada, encontra fundamento no grande número de decisões proferidas vazias de amparo fático, que se limitam à repetição do texto da lei na aplicação de medidas restritivas de direitos pessoais em matéria processual.

Havendo uma pluralidade de medidas cautelares pessoais, haverá que examinar também a adequação de cada uma delas ao caso concreto. A adequação remete à relação meio-fim que deve nortear a escolha do juiz pela medida mais apropriada e, portanto, que se apresente mais eficaz em preservar o processo contra os riscos que se evidenciem pela análise das circunstâncias apuradas.

Para tanto, a gravidade do crime, as circunstâncias do fato e as condições pessoais do acusado servem como referenciais para orientação do magistrado, não só para definição da medida mais adequada, mas também para definição do grau de limitação que esta deverá impor à liberdade do investigado.

Deve ser tida como inconstitucional uma medida eleita na restrição a direito fundamental que não se vê apta a alcançar os objetivos perseguidos. Conforme aduz Flávia D’urso: “o juiz criminal encontra-se constitucionalmente obrigado à opção funcional do meio adequando-o estritamente aos fins que se objetivam”.[85]

A medida cautelar proporcional é, pois, a que traduz a ideia de que o acusado tem direito a menor desvantagem possível, impondo ao magistrado eleger uma medida menos lesiva aos direitos do indiciado.

Importante expor que as medidas cautelares alternativas à prisão preventiva exigem também a presença dos mesmos requisitos dessa, sendo estes: fumus commissi delicti e periculum in libertatis. Desse modo, a medida alternativa somente deverá ser utilizada quando cabível a prisão preventiva, mas, em razão da proporcionalidade, houver outra restrição menos onerosa que sirva para tutelar aquela situação.[86]

Nesse ponto Eugênio Pacelli[87] questiona: “como cobrar-se uma definitiva prova de materialidade como requisito necessário à decretação da cautelar, se a cautelar no caso concreto pode visar justamente à obtenção da prova de materialidade?”

No ponto de vista do referido autor:

“A situação é diversa no que se refere à decretação da prisão preventiva, já que para esta, por ser a mais drástica das cautelares, expressamente exigiu o legislador, ademais dos “indícios de autoria”, também a “prova da materialidade”, conforme expressamente prevê o art. 321 do CPP. Destarte tem-se que os indícios de autoria são requisitos comuns a todos os tipos de cautelares, mas a prova da materialidade é requisito específico para decretação da custódia preventiva.”[88]

No mais, as medidas cautelares alternativas terão cabimento nos crimes cuja pena máxima seja igual ou inferior a quatro anos (situação em que o art. 313, I, do CPP veda a prisão preventiva).

Aury Lopes revela preocupação com a possível banalização das medidas cautelares, pois ainda que essas medidas possam ser aplicadas aos crimes que prevêem um patamar de pena inferior, elas representam significativa restrição da liberdade.

O referido autor ressalta que: “o maior temor é que tais medidas sejam deturpadas, não servindo efetivamente como redutoras de danos, mas sim de expansão de controle”.[89]

Expõe ainda Aury que:

“Medidas como as de proibição de frequentar lugares, de permanecer, e similares, implicam verdadeira pena de “banimento”, na medida em que impõem ao imputado severas restrições ao seu direito de circulação e até mesmo de relacionamento social.”[90]

Destarte, o problema surge quando condutas de pouca reprovabilidade penal e que não ensejam qualquer tipo de controle cautelar, passem a ser objeto de intensa incidência de restrições.

Outra problemática diz respeito ao prazo máximo de duração das medidas, uma vez que a lei não o determina, e isso conduz por diversas vezes a resultados gravíssimos para o acusado, que se vê submetido por um prazo indeterminado a rigorosas restrições de direitos fundamentais.

Na decretação da medida alternativa de suspensão de função pública, ou, mais grave ainda, da atividade de natureza econômica ou financeira dada por um longo prazo, por exemplo, poderá ter uma repercussão na antecipação de pena pelo fato de acarretar a insolvência econômica do acusado ou falência de sua empresa.[91]

Outro exemplo pode ser dado quanto à imposição de determinado prazo para comparecimento periódico em juízo. Caberá ao julgador aqui agir com razoabilidade, “evitando-se a imposição de prazos excessivamente curtos que inviabilizem o próprio comparecimento do acusado e, ao mesmo tempo, deixando-se de impor prazos muito longos, que venham a gerar a inutilidade da medida”.[92]

A avaliação do prazo razoável de duração das medidas cautelares é de caráter absolutamente subjetivo do juiz que, por sua vez, levará em conta questões como: complexidade do processo, conduta das partes e consequências da demora.   

Ao longo do processo, o magistrado pode verificar, contudo, que aquela medida decretada não deve mais subsistir. Por essa razão, as medidas cautelares alternativas podem ser modificadas a qualquer tempo. Conforme assegura Aury Lopes: “as medidas são revisáveis de ofício, cabendo ao juiz, independente de pedido, buscar a medida adequada e suficiente no caso concreto”.[93]

3.5. Jurisprudências STF e STJ

O princípio da proporcionalidade é frequentemente utilizado como fundamento para as decisões proferidas pela Suprema Corte e pelo Superior Tribunal de Justiça. A proporcionalidade externada mediante seus subprincípios (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) serve de parâmetro para a decretação de medidas cautelares, sendo a prisão cautelar decretada de forma subsidiária.

As decisões jurisprudenciais de ambos os tribunais traduzem a ideia da subsidiariedade da prisão preventiva, sendo essa decretada como ultima ratio. Ademais, ressaltam os julgadores que as circunstâncias do fato criminoso, a gravidade do crime, as condições pessoais do acusado servem como referenciais para a decretação das medidas cautelares, pois revelam a medida mais adequada ao caso concreto.

Nesse sentido, traz-se à colação, recentes julgados do STJ, in verbis:

“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. DESPROPORCIONALIDADE. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. AGENTE PRIMÁRIO, DE BONS ANTECEDENTES E COM RESIDÊNCIA FIXA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. ADEQUAÇÃO E SUFICIÊNCIA. COAÇÃO ILEGAL EM PARTE DEMONSTRADA. 1. A aplicação de medidas cautelares, aqui incluída a prisão preventiva, requer análise, pelo julgador, de sua necessidade e adequação, a teor do art. 282 do CPP, observando-se, ainda, por força do princípio da proporcionalidade, se a constrição é proporcional ao gravame resultante de eventual condenação posterior. 2. A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar e quando realmente mostre-se necessária e adequada às circunstâncias em que cometido o delito e às condições pessoais do agente. Exegese do art. 282, § 6º, do CPP. 3. No caso, a segregação antecipada mostra-se desproporcional, revelando-se devida e suficiente a imposição de medidas cautelares alternativas, dada a apreensão de reduzida quantidade de estupefaciente, a demonstrar que não se trata de tráfico de grande porte, e às condições pessoais do agente, menor de 21 (vinte e um) anos ao tempo do delito, primário e possuidor de domicílio certo. 4. Condições pessoais favoráveis, mesmo não sendo garantidoras de eventual direito à soltura, merecem ser devidamente valoradas, quando demonstrada possibilidade de substituição da prisão por cautelares diversas, proporcionais, adequadas e suficientes aos fins a que se propõem. 5. Recurso provido, em menor extensão, para revogar a custódia preventiva do recorrente, mediante a imposição das medidas alternativas à prisão previstas no art. 319, I, IV e V, do Código de Processo Penal” (sic).[94]

“RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ESTELIONATO SIMPLES E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PRISÃO PREVENTIVA. DESNECESSIDADE. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. PROPORCIONALIDADE, ADEQUAÇÃO E SUFICIÊNCIA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. COAÇÃO ILEGAL EM PARTE DEMONSTRADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 2. A aplicação de medidas cautelares, aqui incluída a preventiva, requer a análise, pelo julgador, de sua necessidade e adequação, a teor do art. 282 do CPP, observando-se, ainda, se a constrição é proporcional ao gravame resultante de eventual condenação posterior. 3. A prisão somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar e quando realmente mostre-se necessária e adequada às circunstâncias em que cometido o delito e às condições pessoais do agente. Exegese do art. 282, § 6º, do CPP. 4. Evidenciado que os fins acautelatórios almejados quando da ordenação da preventiva podem ser alcançados com a aplicação de medidas cautelares diversas, presente o constrangimento ilegal apontado na inicial. 5. Observado o binômio proporcionalidade e adequação, devida e suficiente, diante das particularidades do caso concreto, a imposição de medidas cautelares diversas à prisão para garantir a ordem pública, evitando-se a reiteração delitiva, para assegurar a conveniência da instrução criminal e a aplicação da lei penal. 6. Condições pessoais favoráveis, mesmo não sendo garantidoras de eventual direito à soltura, merecem ser devidamente valoradas, quando demonstrada a possibilidade de substituição da prisão por cautelares diversas, proporcionais, adequadas e suficientes ao fim a que se propõem. 7. Recurso ordinário parcialmente conhecido e, nessa extensão, em parte provido para revogar a prisão preventiva do recorrente, mediante a imposição das medidas alternativas previstas no art. 319, incisos I, IV, V e VII, arbitrando-se a fiança no valor de 10 (dez) salários mínimos” (sic).[95]

A mais Alta Corte legal do país, não poderia entender de forma diferente. Assim sendo, há julgado na esteira do entendimento ditado pelo STF que reconhece a aplicação do princípio da proporcionalidade nas medidas cautelares processuais penais. Aduz-se a seguir julgado nesse sentido: 

“1.Trata-se de habeas corpus, com pedido de medida liminar, impetrado contra acórdão proferido pela Quinta Turma do STJ que, nos autos do RHC 36.988/RS, indeferiu o pedido de revogação da prisão preventiva. Requer a concessão de liminar para que os réus sejam postos em liberdade. 2. Em juízo de cognição sumária, constata-se que a ordem de prisão preventiva está devidamente fundamentada, de acordo com os pressupostos do art. 312 do CPP. De início, saliento que condições pessoais favoráveis não obstam a decretação da prisão preventiva, mormente quando calcada na garantia da ordem pública, como ocorre no caso em exame. Claro que torna um pouco mais difícil, pois os primários não devem ser levados ao ergástulo, como regra. Tudo depende do caso concreto. Por outro lado, consigno que a decisão está fundamentada de modo razoável em fatos concretos que revelam o fumus commissi delicti (o delito teve testemunhas presenciais) e o periculum libertatis, que decorre das circunstâncias do crime, reveladoras de personalidades (ou condutas) de risco. Segundo se infere do expediente policial, o crime foi praticada sob o olhar de uma criança e com agir revelador de dolo intenso, tudo a reforçar a necessidade da custódia preventiva. Acrescento estar presente o requisito objetivo trazido pela Lei nº 12.403 de 20111, de modo que não há evidente ilegalidade a ser sanada. Mas, de fato, isso não basta. A Lei nº 12.403/2011 passou a estabelecer um novo filtro hermenêutico para aplicação das medidas cautelares em matéria penal, exigindo a "adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado" (art. 282, II, CPP). Assim, além dos já referidos requisitos, exige-se do julgador especial valoração da necessidade da medida à luz do postulado da proporcionalidade, o qual consubstancia" uma pauta axiológica que emana diretamente das idéias de justiça, equidade, bom senso, prudência, moderação, justa medida, proibição de excesso, direito justo e valores afins". A nova lei, portanto, veio positivar o que já encontrava eco na doutrina e jurisprudência: a necessária filtragem, sob o crivo da proporcionalidade, dos pressupostos legais da cautelaridade. A apresentação espontânea na Delegacia, após inicial evasão, não é suficiente para que a medida constritiva seja revogada. Ao contrário, deve-se reconhecer que, além de a medida ser proporcional e adequada, foi fundamentada em elementos concretos.Trata-se, portanto, de típica medida cautelar, plenamente justificada, o que dispensa condenação e não tem a ver com o princípio do estado de inocência. Assim, não reconheço ilegalidade na coação. Posto isso, voto no sentido de denegar a ordem de habeas corpus. Como é cediço, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem consagrado o entendimento de que o juízo valorativo sobre a gravidade genérica do delito e o clamor ou comoção social não constituem, por si sós, fundamentação idônea a autorizar a prisão preventiva. Na espécie, porém, as decisões impugnadas demonstraram a existência dos crimes e de indícios suficientes de autoria, bem como a necessidade da custódia cautelar dos Acusados para a garantia da ordem pública. Com efeito, o Juízo de primeiro grau ressaltou a intensa gravidade do delito, aferida a partir de dados concretamente extraídos dos autos, o qual foi praticado na presença de várias pessoas, inclusive de uma criança, o que demonstra a periculosidade concreta dos agentes, a justificar a medida constritiva. Nesse sentido, é importante ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça já firmou o entendimento de que "o modus operandi, os motivos, a repercussão social, dentre outras circunstâncias, em crime grave (na espécie, inclusive, hediondo), são indicativos, como garantia da ordem pública, da necessidade de segregação cautelar , dada a afronta a regras elres de bom convívio social." Nesse contexto, o acórdão impugnado encontra, a princípio, fundamento na jurisprudência desta Corte, no sentido de que é legítima a prisão preventiva para garantir a ordem pública quando fundamentada na descrição da natureza e os meios destacados de execução dos crimes” (sic).[96]

3.6 Reformas legislativas no sistema cautelar do processo penal brasileiro

O sistema cautelar processual penal brasileiro não previa medidas cautelares pessoais entre a liberdade e a prisão, o que tornava difícil a utilização do princípio da proporcionalidade, que tem como um de seus escopos, a busca de outra medida menos gravosa do que a prisão.

Contudo, a ­­recente edição da Lei nº 12.403, de 4 de maio de 2011, constituiu um grande progresso para a matéria das medidas cautelares no sistema pátrio, pois possibilitou a conformidade do Código de Processo Penal à Constituição Federal, representando a garantia da unidade do ordenamento jurídico.

As alternativas à segregação previstas na lei sustentam bases sólidas para implementação de uma política de substituição à prisão provisória, dotando os juízes instrumentos sistematizados para esse mister.

 Foi enorme a contribuição da adoção de um modelo polimorfo, que finalmente criou condições de eficácia para o princípio constitucional da proporcionalidade.

Não obstante as mudanças conferidas, a prática judicial tem demonstrado que a decretação da prisão, não raro, é feita sem uma análise da possibilidade da aplicação de outras medidas cautelares alternativas.

Nesse diapasão, o atual presidente em exercício do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, apresentou, em 31/1/2014, uma proposta de reforma do Código de Processo Penal, a qual impõe os juízes a se manifestarem sobre a possibilidade de aplicação das medidas cautelares alternativas previstas no artigo 319 do CPP, antes de ser determinada a prisão em flagrante ou preventiva.[97]

O texto pretende alterar o art. 310 do CPP, prevendo que o magistrado, ao se deparar com um auto de prisão em flagrante ou com um pedido de prisão preventiva, deverá primeiramente fundamentar o porquê de não aplicar ao caso as medidas cautelares previstas no art. 319 do CPP.

Destarte, a prisão preventiva somente seria decretada se outras medidas cautelares revelassem insuficientes, ainda que aplicadas cumulativamente, devendo o juiz fundamentar eventual ineficácia delas nos elementos do caso concreto.

A referida proposta é baseada na jurisprudência da Suprema Corte, a qual considera a prisão, antes do trânsito em julgado da condenação, medida excepcional, que somente pode ser decretada se cabalmente demonstrada a sua necessidade, com base em elementos do caso concreto.

Importa destacar que a consolidação de uma cultura de substituição das prisões processuais não depende apenas da mudança do texto legal. Aliado a essas reformas, necessita-se, sobretudo, de uma alteração na compreensão dos institutos das medidas cautelares pelos juízes e demais operadores do direito, para que passem a efetivamente aplicar o princípio da proporcionalidade em suas decisões.

O desenvolvimento de uma nova política criminal processual pressupõe que os princípios constitucionais se encontrem conformados ao contexto real, para que a dignidade da pessoa humana assuma no processo penal absoluta diretriz dos atos dos poderes públicos.

Conclusão

O presente estudo procurou demonstrar a relevante alteração legislativa implantada pela Lei nº 12.403/2011, a qual modificou dispositivos do Código de Processo Penal, passando a sistemática aplicável às medidas cautelares de natureza pessoal no processo penal está em congruência com a Constituição Federal de 1988.

Constatou-se que a mencionada lei, orientada pelo princípio da proporcionalidade, não só destaca a excepcionalidade e a subsidiariedade da prisão cautelar, como também põe à disposição do aplicador do direito um rol de medidas alternativas pessoais.

Tem o magistrado agora ao seu dispor todas as medidas cautelares previstas pelo art. 319 do Código de Processo Penal, conferindo-lhe o legislador outros instrumentos para melhor avaliar entre a manutenção da liberdade de locomoção e a custódia cautelar.

A proporcionalidade, prevista na lei, autoriza um juízo preliminar da possível pena a ser aplicada ao acusado, evitando-se a decretação da custódia cautelar em casos nos quais, quando da sentença condenatória, o acusado não tenha que ser submetido à pena privativa de liberdade.

Assim, para crimes mais brandos, os quais é cominada pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos não seria possível a decretação da prisão cautelar, pois a lei permite para estes a substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, bem como a adoção do regime inicial aberto de cumprimento da pena. Sendo a medida cautelar decretada nesses casos desproporcional.

A proporcionalidade objetiva, pois, impedir a decretação de medidas cautelares pessoais arbitrárias e indevidas, evitando-se que esses institutos representem a antecipação da pena ou recurso atenuante da crise social e passem a atuar como verdadeiros instrumentos a fim de garantir a efetividade e utilidade do processo penal.

Analisou-se também que a jurisprudência no âmbito do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça é assente quanto à aplicação do princípio da proporcionalidade, submetendo as medidas cautelares processuais a uma aplicação racional dos seus subprincípios (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito), tendo em vista ser esse o seu fundamento legitimador, uma vez que uma medida cautelar desproporcional é inconstitucional, não podendo ser admitida.

Pode-se concluir com o presente estudo que a aplicação do princípio da proporcionalidade é essencial para proteção das garantias individuais, por ser ele o meio idôneo para delinear os contornos do jus puniendi. Esse princípio representa elemento imprescindível no ordenamento jurídico de um Estado Democrático de direito, pois permite a melhor salvaguarda da dignidade da pessoa humana.

 

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Notas:
[1]CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, 1998, p.1034.

[2]DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Tradução: Nelson Boeira. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 39.

[3]ALEXY, Robert. Teoría de los direchos fundamentales. Tradução: Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008 p. 89

[4]Idem, p.86.

[5]SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais conteúdo essencial, restrições e eficácia. 2. ed., São Paulo: Malheiros, 2010, p. 45.

[6]ÁVILA. Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 47.

[7]SARLET, Ingo Wolfang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1988. p. 99.

[8]SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 93.

[9]BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 15. ed. São Paulo: Malheiros, 2004, pp. 394 e 386.

[10]PENALVA, Ernesto Pedraz. Constituición, jurisdicción y proceso, Madri: Akal, 1990, p. 342.

[11]Mendes, Gilmar Ferreira. O princípio da proporcionalidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: novas leituras, Bol. IOB 14, 2000, p. 372; Barroso, Luís Roberto. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito constitucional, Revista dos Tribunais – Cadernos de Direito Constitucional e Ciência Política, 23, 1998, pp. 75 e 77.

[12]Barros, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 3. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2003, p. 93; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A violação do princípio da proporcionalidade pela Lei 9296/96, Bol. IBCCrim 45 (1996), p. 14 (Gomes Filho cita apenas os arts. 60, § 4º, IV e 5º, II, ambos da CF); SOUZA, Carlos Afonso Pereira de; SAMPAIO, Patrícia Regina Pinheiro. O princípio da razoabilidade e o princípio da proporcionalidade: uma abordagem constitucional. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/15076-15077-1-PB.pdf> Acesso em: 17 jul. 2014.

[13]Guerra Filho, Willis Santiago. Princípio da proporcionalidade e teoria do direito. Direito Constitucional–estudos em homenagem a Paulo Bonavides. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 278; do mesmo autor, Hermenêutica constitucional: direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. São Paulo: Martins Fontes, 2002, p. 20, in verbis: "A circunstância de ele (o princípio da proporcionalidade) não estar previsto expressamente na Constituição de nosso País não impede que o reconheçamos em vigor também aqui, invocando o disposto no § 2º do art. 5º"; Bonavides, Paulo, op. cit. , p. 396.

[14]PONTES, Helenilson Cunha. O princípio da proporcionalidade e o direito tributário. São Paulo: Dialética, 2000, p. 51.

[15]ÁVILA. Humberto Bergmann. A distinção entre princípios e regras e a redefinição do dever de proporcionalidade, Revista de Direito Administrativo, 215 (1999), pp. 154-158 e 168-175.

[16]Barroso, Luís Roberto. "Dez anos da constituição de 1988 (foi bom pra você também?)", Revista de Direito Administrativo, 214, 1998, p. 18.

[17]BARROS, Suzana de Toledo, op. cit., p. 57

[18]DA SILVA, Virgílio Afonso. O proporcional e o razoável. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 798, 2002, pp. 29-30.

[19] PONTES, Helenilson Cunha. op. cit., p. 83.

[20]BARROS, Suzana de Toledo. op. cit., p. 25.

[21]CANAS, Vitalino. Proporcioalidade (princípio da). In: Dicionário Jurídico da Administração Pública. Lisboa, v. 6, 1994, p. 22.

[22]PONTES, Helenilson Cunha, op. cit., pp. 44-45.

[23]CRETTON. Ricardo Aziz. Os princípios da proporcionalidade e razoabilidade e sua aplicação no direito tributário. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001, p. 57.

[24]Guerra Filho, W. S. Teoria processual da constituição. 2. ed. São Paulo: Celso Bastos Editor, 2002. p. 75.

[25]Idem, ibidem.

[26]MONTESQUIEU, Charles de Secondat. O espírito das leis. Tradução: Cristina Murachco. São Paulo: Martins Fontes, 1996, pp. 100-102.

[27]BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. Tradução: Lucia Guidicini e Alessandro Berti Contessa. São Paulo: Martins Fontes, 1998, pp. 138-139.

[28] BARROS, Suzana de Toledo, op. cit., pp. 36-37.

[29] Idem, p. 45.

[30]GOMES, Mariângela Gama de MagalhãesO princípio da proporcionalidade no Direito penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 50

[31]AVÓLIO, Luis Francisco Torquato. Provas ilícitas: interpretações telefônicas e gravações clandestinas. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 60.

[32]STEINMETZ, Wilson Antônio. Colisão de direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001, p.146.

[33]LOPES, Maurício Antônio Ribeiro. Critérios constitucionais de determinação dos bens jurídicos penalmente relevantes. Tese de Livre Docência em Direito Penal. Faculdade de Direito da “Universidade de São Paulo”. São Paulo, 1999, p. 473.

[34]BONAVIDES, Paulo, op. cit., p. 370.

[35]Idem, p. 407.

[36]STERN, Klaus. Protokol der 112. Jahresversammlung dês Schweizerischen Juristenvereins vom 29. Und. 30 September und 1. Oktober 1978 in Zurich, in ZSR, v. 97, 1978. p. 552-553. apud BONAVIDES, Paulo, op. cit, p. 408. 

[37]BARROS, Suzana de Toledo, op. cit., p.47.

[38]MIRANDA, Jorge. Manual de direito constitucional. Coimbra: Coimbra: 1990, p. 209.

[39]RESS, George. Der grundstaz dês verhaltnismassigkeit in europaischen rechts-ordnungen apud BONAVIDES, Paulo, op. cit., pp. 409-410.

[40]MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos, São Paulo: Saraiva, 1990, p. 204.

[41]BARROS, Suzana Toledo. op. cit., pp. 62-63.

[42]BITAR, Orlando. Obras completas de Orlando Bitar. Brasília: Conselho Federal de Cultura e Departamento de Assuntos Culturais, v. 3, 1978, p. 85.

[43]ALEXY, Robert. Teoria de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2001, p. 161.

[44]DA SILVA, Virgílio Afonso. O proporcional e o razoável. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 798, 2002, p. 34.

[45]Idem, p. 35.

[46]CANOTILHO apud D’URSO, Flavia. Princípio constitucional da proporcionalidade no processo penal. São Paulo: Editora Atlas, 2007, pp. 66-67.

[47]PENALVA apud BARROS, Suzana de Toledo, op. cit., pp. 80-81.

[48]GALETTA, Diana-Urana. Principio di proporzionalità e sindocato giurisdizionale nel diritto amministrativo, Milano: Giuffrè, 1998. p.17.

[49]GALETTA, Diana-Urana, op. cit., p. 17.

[50]GUERRA, Marcelo Lima. Execução indireta. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p.175.

[51]ÁVILA. Humberto Bergmann. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 124.

[52]ARAÚJO, Francisco Fernandes. Princípio da proporcionalidade: significado e aplicação prática. Campinas: Copola, 2002. p. 65. 

[53]Correa apud Gomes, Mariângela Gama de Magalhães, op. cit., p. 171.

[54]Gomes, Mariângela Gama de Magalhães, op. cit., p. 171.

[55]GOMES FILHO, Antonio Magalhães. A motivação das decisões penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 28.

[56]MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. 1. ed., São Paulo: Bookseller, v. 1, 1998, p. 37.

[57]SARLET, Ingo Wolfang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2001, p. 83.

[58]ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na constituição portuguesa de 1976. 2. ed. Coimbra: Almedina, 2001, p. 296.

[59]D’Urso, Flávia. Princípio constitucional da proporcionalidade no processo penal. São Paulo: Atlas, 2007, pp. 93-94.

[60]Idem, pp. 61-63.

[61]BIANCHINI, Alice. Pressupostos materiais mínimos da tutela penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 85

[62]WARAT, Luiz Alberto. Introdução geral do direito. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1994, p. 61.

[63]LOPES JÚNIOR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, v. 2, 2010, p. 59.

[64]FERRAJOLI, Luigi. O direito como sistema de garantias. In: OLIVEIRA JR., José Alcebíades de (Org.). Novo em direito e política. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, pp. 101-102.

[65]CARNELUTTI, Francesco. Leccionessobre el processo penal. Tradução: Santiago Santis Melendo. Buenos Aires: Editora Bosch, v. 2, 1950, p. 75.

[66]SANGUINÉ, Odone. A inconstitucionalidade do clamor público como fundamento da prisão preventiva. In: Revista dos Estudos Criminais, nº 10, 2003, p.114.

[67]BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus: HC 95.290 SP. 2ª Turma. Relator Ministro Celso de Mello. Julgamento: 1/3/2011. Publicação: 1/8/2012. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22086421/habeas-corpus-hc-95290-sp-stf>. Acesso em: 22 de ago. 2014.

[68]ILLES RUS, Angel Vicente. Las medidas cautelares personales en El processo penal. In: Revista de derecho procesal, nº 1, Madri, 1995, p. 66.

[69]LOPES JUNIOR, Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas cautelares diversas: Lei nº 12.403/2011, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p.76.

[70]BENETTISidneiPrisão provisória: direito alemão e brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991, p. 272.

[71]VIEIRA, Antônio. Artigo: Princípio da proporcionalidade e prisão provisória, p. 7. Disponível em: <http://www.ibadpp.com.br/135/principio-da-proporcionalidade-e-prisao-provisoria-por-antonio-vieira>. Acesso em 6 ago. 2014.

[72]OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 17. ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 520.

[73]OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. op. cit., p. 506.

[74]BRASIL. Tribunal de Justiça da Bahia. HC nº 03161773420128050000. 2ª Câmara Criminal. 1ª Turma. Relator Desembargador Carlos Roberto Santos Araújo. Julgamento: 1/11/2012. Publicação: 17/11/2012. Disponível em: <http://tj-ba.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/115372468/habeas-corpus-hc-3161773420128050000-ba-0316177-3420128050000>. Acesso em: 19 de ago. 2014.

[75]BRASIL. Tribunal de Justiça do Paraná. HC nº 967735-2. 3ª Câmara Criminal. Relator Desembargador Rui Bacellar Filho. Julgamento: 18/10/2012. Disponível em: <http://tj-pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22586868/9677352-pr-967735-2-acordao-tjpr>. Acesso em: 25 de ago. 2014.

[76]NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009, p. 39-40.

[77]D’Urso, Flávia, op. cit., p. 90.

[78]RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 10. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 603.

[79]KATO, Maria Ignez Lanzellotti Baldez. A (des)razão da prisão provisória. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 83. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/20216/o-principio-constitucional-da-proporcionalidade-como-sustentaculo-da-prisao-provisoria/3>. Acesso em: 29 de ago. 2014.

[80]D’Urso, Flávia, op. cit., pp. 88-91.

[81]BONFIM, Edilson Mougenot. Reforma do código de processo penal: comentários à lei nº 12.403 de 4 de maio de 2011: prisão preventiva, liberdade provisória e fiança. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 25.

[82]LOPES JUNIOR, Aury. op. cit., pp. 29-30.

[83]Idem, p. 90.

[84]BONFIM, Edilson Mougenot, op. cit., p. 19.

[85]D’Urso, Flávia, op. cit., p. 107.

[86]LOPES JUNIOR, Aury, op. cit., p. 90.

[87]PACELLI, Eugênio Domingos Barroso da Costa. Prisão preventiva e liberdade provisória: a reforma da lei nº 12.403/2011. São Paulo: Atlas, 2013, p. 27.

[88]Idem, Idibem.

[89]LOPES JUNIOR, Aury, op. cit., p. 127.

[90]Idem, Idibem.

[91]LOPES JUNIOR, Aury, op. cit., pp. 135-136.

[92]BONFIM, Edilson Mougenot, op. cit., p. 43.

[93]LOPES JUNIOR, Aury, op. cit., p. 9.

[94]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso ordinário em habeas corpus nº 43937 TO 2013/0418925-7, 5ª Turma. Rel.: Min. Jorge Mussi, Julgamento: 18/03/2014. Publicação: 28/03/2014. Disponível em: <http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/25034622/recurso-ordinario-em-habeas-corpus-rhc-43937-to-2013-0418925-7-stj/inteiro-teor-25034623>. Acesso em: 15 de set. 2014.

[95]BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso ordinário em habeas corpus nº: 46162 SP 2014/0055021-1, 5ª turma. Rel. Min. Jorge Mussi. Julgamento: 15/05/2014. Publicação: 22/05/2014. Disponível em: < http://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/25086959/recurso-ordinario-em-habeas-corpus-rhc-46162-sp-2014-0055021-1-stj>. Acesso em: 15 de set. 2014.

[96]Brasil. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus – HC nº 118323 RS, Relator Ministro Teori Zavascki. Julgamento: 18/06/2013. Publicação: 20/06/2013. Disponível em: <http://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/23380701/medida-cautelar-no-habeas-corpus-hc-118323-rs-stf>. Acesso em: 16 de set. 2014.

[97]BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=259198>.
   Acesso em: 01 de out. 2014.


Informações Sobre o Autor

Isabela Veras Sousa Porpino

Advogada em Recife/PE. Graduada em direito pela Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP. Pós graduada em Direto Constitucional Aplicado pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus


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