A aposentadoria especial e o servidor público

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Resumo: O presente trabalho visa trazer a lume o direito que o servidor público titular de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, autarquias e fundações desses entes, possui quando labora em condições de risco ou sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física, ou seja, o direito a uma aposentadoria diferenciada, denominada de aposentadoria especial.


Palavras-chave: Aposentadoria. Diferenciada. Especial. Servidor Público.


Sumário: Introdução. 1. O servidor público e o direito à aposentadoria especial. 2. Da norma aplicável para a concessão da aposentadoria especial do servidor público. 3. Do entendimento jurisprudencial sobre a aposentadoria especial do servidor público titular de cargo efetivo. Conclusão. Referências.


INTRODUÇÃO


A aposentadoria Especial é espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, pois para a obtenção da mesma também se faz necessário um número mínimo de tempo de contribuição, nesse sentido é o magistério de Carlos Alberto Pereira de Castro, senão veja:


“A aposentadoria especial é uma espécie de aposentadoria por tempo de contribuição, com redução do tempo necessário à inativação física.”[1]


 A aposentadoria especial também pode ser considerada uma aposentadoria diferenciada, pois o legislador constituinte veda a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo Regime Próprio do Servidor Público e pelo Regime Geral da Previdência Social, respectivamente, no § 4º do Art. 40 e no § 1º do Art. 201 da Constituição Federal.


O contribuinte ou o segurado para obter a chamada aposentadoria por tempo de contribuição, integral, via de regra, precisa ter contribuído por um período de 35 (trinta e cinco) anos, se homem, e por 30 (trinta) anos, se mulher.


Contudo, para a aposentadoria especial ou diferenciada, o segurado tem que contribuir por durante 15, 20 ou 25 anos, conforme o caso, nos termos do Art. 57 da Lei 8.213/91, sendo 15 para mineiro de subsolo, 20 para exploradores sub aquáticos e 25 anos para os demais segurados, nos termos do Decreto nº 3.048/1999.


Todavia, esse período de contribuição de 15, 20 ou 25 anos, necessita que seja sob submissão a agentes que prejudiquem a saúde ou a integridade física do segurado, ou seja, para fazer jus a essa espécie de aposentadoria, o segurado não basta ter computado o tempo acima indicado, é preciso que esse lapso de tempo e período de contribuição tenha sido realizado durante o exercício de trabalho que submeta o segurado a determinados agentes físicos, químicos e biológicos, ou a uma combinação destes.


Ao segurado que desejar se aposentar por meio da aposentadoria por tempo de contribuição, que esteja filiado ao Regime Geral da Previdência, ou seja, ao INSS – Instituto Nacional do Seguro Social, via de regra, não há exigência de idade mínima para a concessão do benefício, nos termos do inciso I, do § 7º, do Art. 201 da Constituição Federal.


No entanto, para o segurado servidor público, titular de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, que desejar se valer da aposentadoria por tempo de contribuição para obter a sua aposentadoria integral, será exigido uma idade mínima, dentre outros requisitos, como tempo mínimo no serviço público e no cargo em que se dará a aposentadoria, conforme alínea “a”, do inciso III, do  § 1º, do Art. 40 da Constituição Federal .


Porém, assim como na aposentadoria por tempo de contribuição integral, não se exige idade mínima para a concessão da aposentadoria especial.


Outrossim, atualmente, não é a profissão ou a categoria profissional que caracteriza o exercício da atividade sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, mas sim a comprovação da exposição permanente, não ocasional e nem intermitente a agente nocivo que esteja acima dos limites de tolerância aceitos.


Nada obstando os fundamentos acima, apesar do legislador trazer no Art. 57, da Lei 8.213/91, a previsão da aposentadoria especial, essa previsão diz respeito ao segurado empregado, avulso ou contribuinte individual que esteja vinculado ao Regime Geral da Previdência Geral, ou seja, ao INSS – Instituto Nacional do Seguro Social. Quando o segurado for contribuinte individual, deverá ser cooperado e filiado à cooperativa de trabalho ou de produção, conforme Art. 64 do Decreto 3.048/1999.


Desta feita, o legislador constituinte garantiu a possibilidade da aposentadoria especial ou diferenciada para o servidor público titular de cargo efetivo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídos os servidores das autarquias e fundações desses entes federados, porém, mediante a edição de lei complementar, nos termos do § 4º do Art. 40 da Constituição Federal.


Ocorre que, a lei complementar não foi editada até o presente momento, o que tem levado aos servidores públicos que desenvolvem atividade de risco ou sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física (condições insalubres) a, diretamente ou por intermédio de sua entidade de classe, buscar a tutela do Poder Judiciário, para salvaguardar o seu direito a uma aposentadoria diferenciada, ou seja, especial.


1. O SERVIDOR PÚBLICO E O DIREITO À APOSENTADORIA ESPECIAL


O servidor público que labora em condições de risco ou sob condições insalubres não pode ser prejudicado pela inércia do legislador infraconstitucional, a lacuna legal não pode ser óbice ao reconhecimento de um direito de garantia constitucional.


O inciso XXII, do Art. 7º, da Constituição Federal, garante ao trabalhador, urbano ou rural, o direito à redução dos riscos inerentes ao trabalho, o que também é garantido ao servidor público, nos termos do §3º, do Art. 39, da Constituição Federal, senão veja:


Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (…)


XXII – redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;


Art. 39. (…)


§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no artigo 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.”


Destarte, para que a dignidade da pessoa humana seja preservada, preservando-se o inciso III, do Art. 1º, da Constituição Federal, deve-se observar o que preceitua o inciso XXII, do Art. 7º, da Constituição Federal, sob pena de afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana.


Pertinente é destacar ainda que o Art. 7º e o §3º do Art. 39, ambos da Constituição Federal, estão em sintonia com o princípio da isonomia, trazido no caput do Art. 5º, da Constituição Federal, pois, sem dúvida, o servidor público também é trabalhador.


Por isso, não se pode esquecer do princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, princípio esse contemplado no Art. 7º, da Carta Magna, que, por determinação do §3º do Art. 39, desse mesmo diploma constitucional, alcança os servidores públicos. Esse princípio exige tratamento uniforme a trabalhadores urbanos e rurais, exige idênticos benefícios e serviços (uniformidade), para os mesmos eventos cobertos pelo sistema (equivalência). Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazarri diz que “Os critérios para concessão das prestações de seguridade social serão os mesmos”.[2]


A aposentadoria especial tem por objetivo justamente salvaguardar a saúde, a integridade física e mental do trabalhador que laborou durante certo tempo submetido a agentes nocivos.


Maria Lúcia Luz Leiria, preleciona que:


“A finalidade do benefício de aposentadoria especial é de amparar o trabalhador que laborou em condições nocivas e perigosas à saúde, reduzindo o tempo de serviço/contribuição para fins de aposentadoria. “[3]


Desta feita, nas palavras do ilustre professor Edmilson de Almeida Barros Júnior, “O fato gerador de contribuição previdenciária para custeio deste benefício é o trabalho exercido em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, com exposição a agentes nocivos de modo permanente, habitual, não ocasional nem intermitente.”.[4]


O Doutor Edmilson de Almeida Barros Júnior, ao comentar sobre a aposentadoria especial, sustenta que “O benefício é previsto na Lei Maior tanto para estatutários (federais, estaduais e municipais), como para celetistas.”.[5]


Por isso, vários servidores públicos titulares de cargos efetivos de todo o Brasil – vinculados ao regime próprio do servidor público da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas autarquias e fundações, que laboram sob condições de risco e insalubres – estão requerendo a aposentadoria especial, tanto na via administrativa como na judicial.


Todavia, a Administração Pública não tem reconhecido o pedido à aposentadoria especial.


Contudo, o Poder Judiciário, inclusive o Supremo Tribunal Federal, tem reconhecido, reiteradamente, o direito à aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo efetivo que esteja submetido ao labor em condições de risco e a insalubridade, desde que a submissão seja permanente, não ocasional e nem intermitente.


2. DA NORMA APLICÁVEL PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO


O servidor público ocupante de cargo efetivo tem garantido o direito a uma aposentadoria diferenciada, isto é, especial, conforme se observa no § 4º, do Art. 40, da Constituição Federal, senão veja:


Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. (…)


§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


I portadores de deficiência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


II que exerçam atividades de risco; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.” (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


Esse mesmo mandamento se repete em outras normas de regência, como é o caso da Constituição Estadual do Estado de Pernambuco, que no § 4º, do Art. 171, traz a possibilidade da aposentadoria especial para o servidor público, senão veja:


Art. 171 – Aos servidores públicos do Estado, inclusive de suas autarquias e fundações, titulares de cargos efetivos, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e as disposições deste artigo. (…)


§ 4º É vedada à adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


I portadores de deficiência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


II que exerçam atividades de risco; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.” (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)


Corroborando com a garantia constitucional acima demonstrada, ou seja, com o direito do servidor público ocupante de cargo efetivo obter sua aposentadoria de forma diferenciada, ou seja, após o exercício de labor durante menor tempo de serviço, isto é, menor tempo de contribuição, pode-se dizer que se tem, ainda, o §12, do Art. 40, da Constituição Federal, pois, por meio desse dispositivo constitucional, o legislador constituinte diz que o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo deverá observar, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social, conforme abaixo :


“§ 12 – Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.”


Desta feita, em conformidade com os fundamentos constitucionais acima, para a concessão da aposentadoria especial do servidor público titular de cargo efetivo, dever-se-á adotar o que está previsto nos Arts.  57 e 58 da Lei nº 8.213/91, ou seja, da Lei de regência do regime geral de previdência social, bem como o que prevê o Decreto 3.048/99, em seu anexo IV, desses dispositivos destaca-se abaixo o Art. 57 da Lei de regência do regime geral de previdência social:


“Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.”


Cabe reiterar que 15 (quinze) anos é para mineiro de subsolo, 20 (vinte) anos é para exploradores sub aquáticos e 25 (vinte e cinco) anos é para os demais segurados, por exemplo, para os médicos, nos termos do Decreto nº 3.048/1999.


O regime geral de previdência social é aquele que é administrado pelo INSS – Instituto Nacional do Seguro Social, que anteriormente era denominado de INPS – Instituto Nacional de Previdência Social.


Assim sendo, subsidiariamente, para se conceder a aposentadoria especial do servidor público titular de cargo efetivo, pode-se adotar a legislação aplicável ao regime geral da previdência geral, conforme acima demonstrado.


A ilustre professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro ao comentar sobre a aposentadoria especial do Servidor Público traz que “na falta da lei complementar prevista no artigo 40, § 4º, foi interposto Mandado de Injunção, no qual o Supremo Tribunal Federal supriu a omissão legislativa, estendendo aos servidores públicos a norma do artigo 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91.[6]


Por isso, o servidor público deve atentar para o que está previsto no Art. 57 e 58 da Lei 8.213/1991, principalmente, ao fixado no § 8º, do Art. 57, haja vista que de acordo com o mesmo, o servidor terá que se afastar da exposição aos agentes nocivos a sua saúde, sob pena de ter a sua aposentadoria cancelada, conforme se depreende da leitura conjugada do § 8º, do Art. 57 com o Art. 46, da Lei 8.213/1991. Waldir Novaes Martinez, ao tratar sobre o trabalhador que se aposenta por aposentadoria especial e continua trabalhando na área de risco diz que: “Este segurado pode ter o benefício cancelado”.[7]


Porém, importante é não olvidar que essa orientação pode ir de encontro ao inciso XVI, do Art. 37, da Constituição Federal, haja vista a possibilidade de alguns servidores públicos poderem acumular até 02 (dois) cargos públicos para determinados cargos, o que torna imperativa a não aplicação do § 8º, do Art. 57, da Lei 8.213/1991, ao servidor público que esteja protegido pelo inciso XVI, do Art. 37, da Constituição Federal, sob pena de patente inconstitucionalidade.


3. DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL SOBRE A APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO TITULAR DE CARGO EFETIVO


Conforme dito alhures, o Poder Judiciário tem acolhido o pleito para a concessão da aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo efetivo que exerça atividade de risco ou que a desenvolva sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou integridade.


O Poder Judiciário, atento aos ditames da Lei de Introdução ao Código Civil,  ou seja, aos Arts. 4º e 5º, do Decreto-Lei 4657/1942, tem se valido da analogia para atingir os fins sociais e o bem comum.


Recentemente, no Estado de Pernambuco, o SIMEPE – Sindicato dos Médicos de Pernambuco obteve êxito perante o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, numa demanda impetrada por meio de Mandado de Injunção em face do Estado de Pernambuco, cujo objeto foi garantir o direito a aposentadoria especial a uma médica, servidora pública titular de cargo efetivo do Estado de Pernambuco, que já havia completado 25 (vinte e cinco) anos de trabalho sob condições insalubres.


O Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, ante a inércia do Estado de Pernambuco em promover a edição da Lei Complementar Estadual para regular a aposentadoria especial do servidor em tela, pautou-se no entendimento do Supremo Tribunal Federal para proferir a seguinte decisão em favor da médica servidora:


0191458-9 – Descrição MANDADO DE INJUNÇÃO 


Relator HELENA CAÚLA REIS 


Data 04/02/2010 15:26 


Fase REGISTRO / PUBLICAÇÃO NO DJ  Texto MANDADO DE INJUNÇÃO N.º 191.458-9 – Recife. Impetrante: Glória Maria Barbosa Bittencourt. Impetrados: Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco. Exmo. Governador do Estado de Pernambuco. Relatora: Desa. Helena Caúla Reis. Órgão Julgador: Corte Especial. EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. OMISSÃO LEGISLATIVA NA REGULAMENTAÇÃO DO ART. 171, § 4º, PARTE FINAL, DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA, SUSCITADA PELA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE PERNAMBUCO. ACOLHIMENTO. PRELIMINAR DE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO, SUSCITADA PELO GOVERNO DO ESTADO. REJEIÇÃO. MÉRITO. NORMA DE EFICÁCIA LIMITADA, QUE DEMANDA REGULAMENTAÇÃO POR LEI COMPLEMENTAR. INÉRCIA LEGISLATIVA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI Nº 8.213/91. SERVIDORA QUE CUMPRIU A MAIOR CARÊNCIA PREVISTA PARA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL PELO RGPS. DIREITO A TER O PEDIDO DE APOSENTADORIA ANALISADO PELA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA À LUZ DA LEI Nº 8.213/91. ORDEM INJUNCIONAL PARCIALMENTE CONCEDIDA. DECISÃO UNÂNIME. I – Conforme dispõe o inciso IV do § 1º do art. 19 da Carta Estadual, compete privativamente ao Governador do Estado deflagrar o processo legislativo relativo à matéria que verse sobre servidor público, motivo pelo qual deve ser reconhecida a ilegitimidade da Assembléia Legislativa Estadual para figurar como autoridade impetrada no mandamus. Preliminar de ilegitimidade passiva, suscitada pela Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco, acolhida à unanimidade. II – Contra a abusiva mora legislativa do texto constitucional, a Lei Maior previu a reação injuncional (art. 5º, inciso LXXI, da Constituição Federal e art. 61, I, “h”, da Constituição Estadual), inclusive com a finalidade de impedir o seu próprio desprestígio, outorgando ao Judiciário o poder de declarar a omissão e também, como vem entendendo o Supremo Tribunal Federal, ao adotar uma posição concretista, de implementar o exercício do direito, liberdade ou prerrogativa constitucional, no caso específico, até que sobrevenha regulamentação pelo poder competente. Portanto, considerando que a impetrante alega omissão legislativa que estaria inviabilizando o exercício de direito subjetivo seu, assegurado constitucionalmente, descabe cogitar-se de impossibilidade jurídica do pedido. Preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, suscitada pela autoridade impetrada, rejeitada à unanimidade. III – Sendo o art. 171, § 4º da Constituição Estadual norma de eficácia limitada, demanda, por isso, regulamentação por lei complementar, a fim de dar concretude ao texto constitucional. IV – Na hipótese em tela, por inexistir lei complementar estadual regulamentadora do direito à aposentadoria especial, conclui-se que a inércia legislativa vem frustrando a eficácia de situações subjetivas, reconhecidas constitucionalmente, traduzindo, portanto, séria ofensa à Carta Estadual. V – É possível o Tribunal de Justiça remover, no caso concreto, o obstáculo consistente na inexistência de lei complementar que discipline a concessão de aposentadoria especial dos servidores públicos estaduais estatutários que desempenhem atividades exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. VI – Os documentos juntados com a impetração comprovam que a autora contava, em 19/12/2008, com 26 (vinte e seis) anos, 4 (quatro) meses e 17 (dezessete) dias de serviço como médica da Secretaria de Saúde do Estado, tendo, assim, cumprido a maior carência prevista para a concessão de aposentadoria especial pelo Regime Geral de Previdência Social, conforme se observa do caput do art. 57 da Lei 8.213/91. VII – É de ser garantido à impetrante o direito de ter seu pedido de aposentadoria especial analisado à luz da Lei 8.213/91, pela autoridade administrativa competente, desde que não sobrevenha a edição da lei complementar reclamada, tendo em vista a mora legislativa, o pacífico entendimento adotado pelo STF sobre a matéria e a necessidade de se dar eficácia às normas constitucionais. IX – Ordem parcialmente concedida. Decisão unânime. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Mandado de Injunção n.º 191.458-9, em que figuram como impetrante Glória Maria Barbosa Bittencourt, e como impetrados a Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco e o Exmo. Governador do Estado de Pernambuco, ACORDAM os Desembargadores componentes da Corte Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, na sessão do dia 11/01/2010, por decisão unânime, em acolher a preliminar de ilegitimidade passiva, suscitada pela Assembléia Legislativa do Estado de Pernambuco, rejeitar a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, arguida pelo Governador do Estado de Pernambuco e, no mérito, em conceder parcialmente a ordem injuncional, para garantir à impetrante o direito de ter seu pedido de aposentadoria especial analisado à luz da Lei 8.213/91, pela autoridade administrativa competente, desde que não sobrevenha a edição da lei complementar reclamada, tudo nos termos do Relatório, Votos e Parecer Ministerial, digitados anexos, que passam a integrar este aresto. Recife, 27 de janeiro de 2010. Desa. Helena Caúla Reis Relatora PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE PERNAMBUCO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO Gabinete Desa. Helena Caúla Reis Praça da República, lfcs Mandado de Injunção nº 191.458-9


O acórdão acima coaduna com os ditames constitucionais e legais supra indicados, bem como com a posição balizadora exarada pelo Supremo Tribunal Federal, quando dos julgamentos dos Mandados de Injunções de nº  721/DF e 758/DF, cujo relator foi o Min. Marco Aurélio, ementado abaixo:


“MANDADO DE INJUNÇÃO – NATUREZA. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. MANDADO DE INJUNÇÃO – DECISÃO – BALIZAS. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. APOSENTADORIA – TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS – PREJUÍZO À SAÚDE DO SERVIDOR – INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR – ARTIGO 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral – artigo 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91.”


Atualmente, tramita no Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco um Mandado de Injunção Coletivo, também impetrado pelo SIMEPE – Sindicato dos Médicos de Pernambuco, em face do Estado de Pernambuco, a fim de salvaguardar o direito a aposentadoria especial dos demais médicos que são servidores públicos titulares de cargos efetivos do Estado de Pernambuco, e que laboram sob as condições especiais supra indicadas. Ao mesmo tempo se busca garantir igual direito aos médicos da rede municipal. Esse Mandado de Injunção está na fase de julgamento.


As constantes demandas judiciais propostas pelos servidores públicos em busca da aposentadoria especial fez com que a Administração Pública editasse a Orientação Normativa SRH/MP No- 6, de 21 de junho de 2010 e a Instrução Normativa MPS/SPS Nº 1, de 22 de julho de 2010, exaradas, respectivamente, pelo Secretário de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e pelo Secretário de Políticas de Previdência Social, o que é fruto das constantes conquistas perante o Poder Judiciário.


Paralelamente as demandas judiciais em busca da aposentadoria especial para o servidor público acima enquadrado, tramitam, no Congresso Nacional, dois Projetos de Leis que pretendem regulamentar a aposentadoria especial do servidor público, são o PLP 554-10 e PLP 555-10.


No entanto, ao contrário das normas que estão sendo consideradas pelo Poder Judiciário para deferir a aposentadoria especial, o legislador está exigindo, em um dos projetos de lei acima indicado, idade mínima e, além disso, ele está majorando o tempo de serviço/contribuição a ser cumprido.


CONCLUSÃO


Portanto, ainda que a Constituição Federal garanta a possibilidade de uma aposentadoria diferenciada, ou seja, especial, para os servidores públicos titulares de cargos efetivos que laborem sob condições de risco ou especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, a mesma deixa a regulação desse direito ao legislador infraconstitucional, ao estabelecer a necessidade de edição de lei complementar.


Contudo, a inércia do legislador infraconstitucional não pode servir de óbice para a concessão da aposentadoria diferenciada ou especial trazida na Constituição Federal, bem como na Constituição Estadual do Estado de Pernambuco, como tem sido reconhecido pelos Tribunais Pátrios, inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal e o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco.


Nesse diapasão, até que se supra a lacuna legal com a edição de uma lei complementar para disciplinar a aposentadoria especial do servidor público, nos termos do §4º, do Art. 40, da Constituição Federal, impõe-se, por analogia, a aplicação da lei de regência do regime geral da previdência social, ou seja, a incidência do Art. 57 da Lei 8.213/91.


Por isso, o servidor público titular de cargo efetivo que labore sob condições de risco ou especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física, que desejar se valer das condições atuais para obter a aposentadoria especial, deverá requerer a mesma o quanto antes, sob pena de ter que cumprir com os requisitos trazidos no Projeto de Lei acima suscitado.


 


Referências

BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Direito previdenciário médico: benefícios por incapacidade laborativa e aposentadoria especial. São Paulo: Atlas, 2010.

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Brasília. Senado Federal, 2010.

BRASIL. Lei nº 8.213/1991. Brasília. Senado Federal, 2010.

BRASIL. Decreto nº 3.048/1999. Senado Federal, 2010.

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário / Carlos Alberto Pereira de Castro; João Batista Lazzari. 8ª. Ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2007.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23ª. Ed. São Paulo, 2010.

LEIRIA, Maria Lúcia Luz. Direito Previdenciário e estado democrático de direito: uma (re)discussão à luz da hermenêutica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001.

MARTINEZ, Waldir Novaes. PPP na aposentadoria especial: quem deve fazê-lo, para quem entregá-lo: 230 perguntas e respostas sobre o PPP e o LTCAT. São Paulo: LTr, 2003.

 

Notas:

[1] Castro, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário / Carlos Alberto Pereira de Castro; João Batista Lazzari. 8ª. Ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2007. pág. 499.

[2] Castro, Carlos Alberto Pereira de. Manual de Direito Previdenciário / Carlos Alberto Pereira de Castro; João Batista Lazzari. 8ª. Ed. Florianópolis: Conceito Editorial, 2007. pág. 98.

[3] LEIRIA, Maria Lúcia Luz. Direito Previdenciário e estado democrático de direito: uma (re)discussão à luz da hermenêutica. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. Pág. 164.

[4] BARROS JÚNIOR, Edmilson de Almeida. Direito previdenciário médico: benefícios por incapacidade laborativa e aposentadoria especial. São Paulo: Atlas, 2010. Pág. 141.

[5] Ibidem

[6] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23ª. Ed. São Paulo, 2010, Pág. 567.

[7] MARTINEZ, Waldir Novaes. PPP na aposentadoria especial: quem deve fazê-lo, para quem entregá-lo: 230 perguntas e respostas sobre o PPP e o LTCAT. São Paulo: LTr, 2003, Pág. 39.


Informações Sobre o Autor

Charlston Ricardo Vasconcelos dos Santos

Assessor Jurídico do Sindicato dos Médicos de Pernambuco – SIMEPE; Membro Honorário da Academia Brasileira de Direito Processual Civil; Pós-graduando em Direito Previdenciário, Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Instituto dos Magistrados de Pernambuco e Universidade Cândido Mendes; Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Católica Dom Bosco; Aperfeiçoamento em Benefícios em Espécie pela R2 e LFG; Aperfeiçoamento por extensão em Direito Médico pela Faculdade Americana BLIC College e OAB/PE; Aperfeiçoamento por extensão em Contratos pela Fundação Getúlio Vargas; Aperfeiçoamento por extensão em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas; Aperfeiçoamento por extensão em Direito Bancário pelo Instituto dos Advogados de São Paulo Bacharel e Bacharel em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira