A efetividade da função social da propriedade nas propriedades urbanas

Resumo: A população urbana representa, atualmente, mais de 80% da população brasileira. No entanto, as cidades brasileiras em nenhum momento foram preparadas, estruturalmente, para receber todos estes habitantes. O Direito, nesse sentido, tenta, frustradamente, regular as relações jurídicas que se formam deste sistema caótico, à exemplo das comunidades marginais, que possuem as suas próprias leis, substancialmente diferentes das leis estatais. Este ambiente de pluralismo jurídico não pode mais ser renegado pelos juristas brasileiros, que precisam pensar nas leis urbanísticas a partir deste novo contexto, levando em consideração, sobretudo, a função social que a propriedade exerce no espaço urbano. Por isso, todas as fontes tradicionais do Direito – lei, doutrina e jurisprudência – precisam se atualizar para atender a nova realidade brasileira. A pesquisa feita neste trabalho, demonstrou que no que concerne a legislação brasileira, houve um grande avanço nas últimas décadas, com objetivo de fortalecer a função social da propriedade. Ademais, a doutrina também buscou renovação, à exemplo da criação do Direito Urbanístico, cujo objetivo é analisar as relações jurídicas formadas nas cidades, tendo como base conceitos dos Direito Civil e Administrativo, mas levando em conta a análise das cidades como um todo. Com relação à jurisprudência, analisou-se qualitativamente quais são os fundamentos que estão embasando as decisões de nossos tribunais em casos pontuais e complexos. Chegando-se à conclusão de que existe uma relação umbilical entre função social da propriedade e dignidade humana, sendo que quanto mais próximo se chega da função social, mais garantido estará a dignidade humana. Sendo assim, a efetividade da função social da propriedade urbana só será atingida no momento em que o Direito for visto pelos seus operadores, enquanto instrumento de transformação social, e não mais como mantenedor do status quo.[1]

Palavras-chave: Função social, propriedade urbana, dignidade humana e Direito Urbanístico.

Sumário: Introdução. 2. Contexto Histórico Social. 2.1 Processo de Urbanização no Brasil. 2.1.1 Colonização. 2.1.2 O fim da escravidão e a Lei de Terras (1850). 2.1.3 A Jovem República e as primeiras reformas urbanas. 2.1.4. Décadas de 30, 40, 50. 2.1.5. O Regime Militar, o Banco Nacional de Habitação (BNH) e o Sistema Financeiro de Habitação (SFH). 2.2. A atual realidade fundiária brasileira. 3. Fundamentos jurídicos da propriedade urbana. 3.1 Fundamentos Principiológicos. 3.2. Marcos legais e institucionais. 3.3 O Direito Urbanístico Brasileiro. 4. Análise Jurisprudencial. 4.1. Participação popular no processo de urbanização. 4.2. Limitações ao direito de propriedade. 4.3. Concessão especial de uso para fins de moradia. 4.4. IPTU progressivo no tempo. 4.5. Regularização fundiária. Conclusão. Referências. Anexos.

INTRODUÇÃO

Maria se levanta todos os dias às 6 horas da manhã e vai trabalhar. Ana, no mesmo horário, percorre um longo trajeto de sua casa até a escola dos filhos. As duas moram na mesma cidade e somam-se à grande população urbana que, atualmente, representa 84,4% da população brasileira[2].

No entanto, Maria integra os 78,3% da população com renda per capita de até dois salários mínimos por mês[3], o que para ela significa não ter acesso à casa própria, rede de esgoto[4] e pavimentação asfáltica.

Estes são números que não podem ser ignorados pelos pensadores do Direito, ou pelo menos, por aqueles que acreditam no papel transformador do Direito. São números que representam a contradição existente em um país desigual, em que o direito à moradia, longe de ser um direito, mais se assemelha a um objeto passível de compra nas prateleiras de um supermercado.

Quais são as condições históricas e sociais que levaram a esta segregação espacial vivida por Maria, Ana e por inúmeros habitantes das cidades brasileiras? Em que sentido o Direito serve para legitimar esta segregação e até que ponto ele é capaz de revertê-la? Estas são algumas das perguntas que este trabalho se propõe a responder.

No primeiro capítulo, serão abordados os principais pontos históricos que compõem o processo de urbanização brasileiro, começando pelo período da colonização e terminando no século XXI, na jovem democracia brasileira.

No segundo momento, as bases jurídicas da propriedade serão analisadas partindo, e tendo como base, o princípio da função social. Neste sentido serão trazidas à discussão outros princípios que, constitucionalmente, se coadunam com a função social da propriedade, além dos seus marcos legais e institucionais.

A parte final do trabalho se ocupará de analisar jurisprudências que trazem discussões inovadoras sobre a função social da propriedade. A análise será feita em termos qualitativos, demonstrando quais são os fundamentos que estão embasando as decisões de nossos tribunais em casos pontuais.

O objetivo teórico deste estudo é, sobretudo, observar se o conceito de propriedade prevalece nos julgados recentes ainda enquanto direito absoluto. Ou, se ao contrário, é a função social que se sobrepõe à propriedade e lhe define os rumos.

2 CONTEXTO HISTÓRICO SOCIAL

2.1 PROCESSO DE URBANIZAÇÃO NO BRASIL

2.1.1 Colonização

No início da colonização portuguesa no Brasil, a habitação não se constituía um problema, tal qual o que temos hoje. Isto ocorria, em primeiro lugar, devido aos modos de aquisição das terras, que eram simplesmente ocupadas ou doadas àqueles que nelas desejassem estabelecer-se.

O objetivo da Coroa portuguesa, neste primeiro momento, era incentivar o povoamento do país. Desta forma, as terras, especialmente aquelas localizadas nas cidades, não tinham grande valor econômico.

A população pobre, que naquela época dividia-se, principalmente, entre escravos e homens livres, tinha fácil acesso à habitação, já que os senhores forneciam moradia “gratuita” aos seus escravos e o Município e a Igreja doavam aos demais.

Desse modo, segundo Helena Maria Menna Barreto Silva (1997, p. 13), “todo morador urbano tinha sua casa ou seu negócio sobre um terreno cedido gratuitamente ou aforado, fosse à Igreja ou fosse ao Município, sendo que este era responsável por que todos tivessem chão para morar e chão para trabalhar”.

A habitação também não significava um problema, pois o comércio imobiliário, e por conseqüência a especulação imobiliária, era escassa, graças à existência de terras em abundância, déficit habitacional insignificante e baixo custo de construção (SILVA, 1997).

A previsão legal sobre o direito de propriedade ficou à cargo da Constituição de 1824, e de acordo com Jaime Melanias dos Santos (2009, p. 33), nela “foi garantido [o direito de propriedade] em sua plenitude, restando apenas a possibilidade de desapropriação por utilidade pública mediante prévia indenização”.

2.1.2 O fim da escravidão e a Lei de Terras (1850)

A partir de meados do século XIX, os “novos capitalistas” entraram em cena.  Eram, sua maioria, estrangeiros que desejavam desenvolver um mercado interno no Brasil que se utilizasse de mão-de-obra assalariada. Por isso, além de promover o fim da escravidão definitivamente[5], incentivaram a entrada de imigrantes no país (SILVA, 1997).

Pois, como bem expôs Helena M. M. Barreto Silva (1997, p. 17), “se a terra continuasse a poder ser obtida a partir da legalização de posses, por que razão os imigrantes e os ex-escravos escolheriam trabalhar como assalariados para os fazendeiros ou nas indústrias?”.

Desta forma, Maricato (1997 apud FERREIRA, 2005, p. 3) entende que:

“Não foi por acaso que a Lei das Terras foi promulgada no mesmo ano – na verdade, em um intervalo de poucas semanas – do que a proibição definitiva do tráfico. Está claro que, em meio a um processo político-econômico em que se restringia o sistema de escravidão, a Lei das Terras serviu para transferir o indicativo de poder e riqueza das elites de então: sua hegemonia não era mais medida pelo número de escravos, mas pela terra que possuía, agora convertida em mercadoria, e o trabalho assalariado podia então se expandir no Brasil, respondendo às pressões inglesas”.

Assim, ao contrário do que acreditam alguns estudiosos do Direito, a Lei de Terras não constituiu-se em um avanço legal, cujo objetivo era democratizar a propriedade, mas sim serviu de instrumento para concentrá-la em novas mãos, que permitissem sua transformação em capital[6].

Em suma:

“A Lei das Terras, de setembro de 1850, transformou a terra em mercadoria, nas mãos dos que já detinham cartas de sesmaria ou provas de ocupação ‘pacífica e sem contestação’, e da própria Coroa, oficialmente proprietária de todo o território ainda não ocupado, e que a partir de então passava a realizar leilões para sua venda. Pode-se considerar que a Lei de Terras representa a implantação da propriedade privada do solo no Brasil. Para ter terra, a partir de então, era necessário pagar por ela (Ferreira, 2005, p. 1)”.

Neste momento estava bem delimitada a divisão de classes no Brasil: de um lado os proprietários e do outro os não-proprietários, que subdividiam-se entre imigrantes e escravos. Destaca-se que essa primeira classe se transformaria na burguesia industrial da década de 30, perpetuando-se no poder político e econômico (FERREIRA, 2005).

2.1.3 A Jovem República e as primeiras reformas urbanas

“[O homem livre] é antes de mais nada um despejado. Despejado de sua terra, de sua oficina, de seus meios de trabalho, de seus meios de vida. (…) Eram os despejados das decadentes fazendas, como as de café no Vale do Paraíba, eram os despejados da Itália, eram os despejados das senzalas. Com o enorme crescimento das cidades através dessa população surge o problema de seu alojamento, ou seja, surge o problema da habitação enquanto questão social” (VILLAÇA, 1986 apud SILVA, 1997, p. 21).

Foi com esse problema habitacional que a Jovem República Brasileira se deparou nas grandes cidades. A primeira atitude da elite foi tentar esconder a pobreza “para de baixo do tapete” e isolá-los em áreas bem afastadas do centro da cidade.

Segundo Ribeiro e Cardoso (1981, apud Ferreira, 2005, p. 5), por essa razão as primeiras grandes intervenções urbanas “visaram criar uma nova imagem da cidade, em conformidade com os modelos estéticos europeus”. Nesse processo, ainda segundo os mesmos autores, “as elites buscavam afastar de suas vistas – e das vistas do estrangeiro – o populacho inculto, desprovido de maneiras civilizadas, mestiço. As reformas urbanas criaram uma cidade ‘para inglês ver’’’.

Nos primeiros anos de República, o Poder Público promoveu nas grandes cidades inúmeras reformas urbanísticas cujo objetivo era o embelezamento e o saneamento. Nas palavras de Paulo Cezar de Barros, (2002, apud FERREIRA, 2005, p. 8) “higienizar e modernizar a cidade significavam, sobretudo, eliminar os lugares infectos e sórdidos, o desmazelo, a imundície e as residências coletivas (cortiços e cabeças de porco) em que habitava a maioria da população”.

Estas reformas urbanas marcaram o início de uma prática legislativa que se perpetua até os dias de hoje: a promulgação de leis complexas e extremamente técnicas que dificultam sobremaneira a vida da população mais carente. Como exemplo citado por João Sette Whitaker Ferreira (2005, p. 8):

“Os Código de Posturas de São Paulo e do Rio, ainda no final do século XIX, já proibiam, por exemplo, os cortiços nas áreas urbanas centrais, e determinavam recuos para as construções que só podiam ser aplicados em lotes de grande área, restringindo assim por meio da lei a ocorrência de terrenos pequenos e mais baratos.”

De qualquer forma, mesmo contra os interesses da elite, a população pobre continuou aumentando e ocupando as áreas livres que encontravam, formando, neste período, os primeiros cortiços e as primeiras moradias populares localizadas em morros. Sendo que “a insalubridade, as epidemias, decorrentes da ausência de infra-estrutura, […] a violência, a alta densidade urbana, eram marcas de uma parte da cidade, e já mostravam a tônica do que viria a ser a cidade brasileira do século XX” (FERREIRA, 2005, p. 5).

2.1.4 Décadas de 30, 40 e 50

A década de 30 é marcada por uma incipiente, mas importante industrialização. Com isso a cidade assumia uma nova função, e “nascia” o novo proletariado: os operários urbanos.

A Era Vargas, conhecido como o primeiro período populista, ficou marcada, segundo Ferreira (2005, p. 11) “por introduzir pela primeira vez políticas habitacionais públicas, reconhecendo […] que o mercado privado não tinha como atender à demanda por moradia e anunciando que o Estado assumiria tal função”.

O Estado, portanto, retirou do mercado privado a responsabilidade pelo grande e insustentável déficit habitacional, mas por outro lado não resolveu o problema de forma satisfatória. Ressalta-se que, em que pese, a fama de ter-se investido muito em habitação popular neste período, em toda a Era Getulista construiu-se apenas 140 mil habitações populares, sendo que a maioria delas destinava-se ao aluguel (FERREIRA, 2005, p. 11).

Assim, como observou Maricato (1997, p. 36):

“Com a oferta de moradia de aluguel declinando, e sem que o Estado suprisse a conseqüente demanda por habitações, restava à população pobre uma solução que, na prática, “liberava” tanto o Estado quanto o mercado da responsabilidade pela questão da moradia: a ocupação pura e simples das terras, ou o loteamento das periferias, estimulado pela chegada do transporte público sobre rodas, que garantia o necessário acesso, mesmo que precário, aos loteamentos mais distantes, que sequer recebiam a infra-estrutura urbana necessária.”

O período governado pelo presidente JK teve como principais características a entrada das empresas multinacionais, o crescimento vertiginoso da economia e o aumento da desigualdade social. O Brasil, na linha dos países europeus, passou a intervir na economia e na regularização do trabalho, “não por razões filantrópicas ou humanitárias, mas porque se percebia que era necessário manter um padrão mínimo de poder aquisitivo da classe operária para que pudesse ocorrer a expansão do mercado de consumo” (FERREIRA. 2005, p. 12).

2.1.5 O Regime Militar, o Banco Nacional de Habitação (BNH) e o Sistema Financeiro de Habitação (SFH)

O Regime militar foi um dos períodos em que mais se construiu habitações, graças à criação do Banco Nacional de Habitação e do Sistema Financeiro de Habitação, estrutura esta que possibilitou a criação de um fundo monetário exclusivo para o investimento em habitação. Porém, esse investimento concentrou-se na construção de moradias para a população de média ou alta renda.

Para a população que mais necessitava, a política foi diferente: aqueles que recebiam salário inferior à 5 salários mínimos sequer tinham acesso aos programas de financiamento, e para os demais, eram construídas unidades habitacionais que não garantiam nenhuma qualidade de vida, constituindo-se em verdadeiros “conjuntos-dormitórios” (FERREIRA, 2005, p. 15).

Desta forma, segundo Ferreira (2005, p. 15):

“A submissão da terra urbana ao capital imobiliário fazia com que enquanto as periferias das grandes cidades expandiam seus limites e abrigavam o enorme contingente populacional de imigrantes, o mercado formal se restringia a uma parcela da cidade e deixava em seu interior grande quantidade de terrenos vazios.”

Somente com a promulgação da Constituição Cidadã em 1988, é que foram lançadas as bases para que uma ampla reforma de Estado, à começar pelo reforma urbana, pudesse ocorrer. A nova Carta Magna contem, em suma, a idéia de que os municípios têm maior autonomia para atuar na questão da propriedade urbana.

Os avanços efetivos com relação a esta política de descentralização e os seus efeitos na questão habitacional são os problemas que serão aprofundados no decorrer deste trabalho.

2.2 A ATUAL REALIDADE FUNDIÁRIA BRASILEIRA

O Brasil entrou no século XXI com sua população urbana atingindo 81,2% e, segundo o CENSO de 2010 as cidades abrigam hoje cerca de 161 milhões de habitantes (84,4% da população). Uma realidade muito diferente daquela encontrada na década de 40, quando os problemas urbanos já eram sentidos e apenas 31% da população encontravam-se nas cidades (MARICATO, 2003, p. 78).

Em que pese, a abertura democrática vivida pelo Brasil, as décadas de 80 e 90 foram marcadas pelo aprofundamento da desigualdade social, com números de favelas, moradores de rua, desempregados e miseráveis, crescendo exponencialmente[7]. A política neoliberal que, conforme Maricato (2010, p. 21), “baniu os subsídios, os direitos universais, a solidariedade, a fraternidade, os projetos coletivos, comunitários e sociais”, deixou marcas profundas no processo de urbanização das cidades brasileiras.

Longe da urbanização brasileira ser um processo simples, ela revela-se complexa e, muitas vezes, contraditória[8]. Desta forma, antes de se pretender resolver o problema, faz-se necessária a sua mais profunda compreensão.

A promulgação de leis progressistas, por si só, não resolve a questão, já que a população carente não estabelece suas moradias em locais proibidos (encostas de morro, região de ribeirinhas e de proteção de mananciais, etc..) por simples afronta à legislação; mas sim, por não possuírem alternativa.

As invasões de terra e a conseqüente ilegalidade fundiária destas propriedades mostram-se hoje mais como regra do que como exceção[9]. O Estado, diante das irregularidades, geralmente não toma nenhuma atitude imediata e indiretamente acaba por consentir com as invasões até o momento em que é obrigado ou à transferir a favela de local (quando possui interesse na área ou quando ele se torna perigoso para a população) ou à regularizar as moradias.

Outro agravante do caótico processo de urbanização está no fato de que, por muito tempo, os profissionais da área de planejamento urbano importaram técnicas de regulamentação do espaço urbano de países desenvolvidos, sem considerar as especificidades da realidade brasileira.

Esta realidade foi bem demonstrada por Boaventura de Souza Santos em estudo empírico realizado em uma favela brasileira[10]. Nela ele constatou existir uma relativa autonomia da comunidade, decorrente entre outros fatores, da “ilegalidade coletiva da habitação à luz do direito oficial brasileiro”.

Diante da ciência dessa ilegalidade e receosos de chamar a atenção das autoridades, a população da favela passou a se organizar internamente para resolver os conflitos que surgiam, notadamente os conflitos relativos à terra. A associação de moradores geria um direito não-oficial, que naquela época, resolvia grande parte dos problemas da favela, existindo, segundo Boaventura (1993, p. 42), uma situação de pluralismo jurídico, definido por ele da seguinte forma:

“Existe uma situação de pluralismo jurídico sempre que no mesmo espaço geopolítico vigoram (oficialmente ou não) mais de uma ordem jurídica. Esta pluralidade normativa pode ter uma fundamentação econômica, rácica, profissional ou outra; pode corresponder a um período de ruptura social como por exemplo, um período de transformação revolucionária; ou pode ainda resultar, como no caso de Pasárgada, da conformação específica do conflito de classe numa área determinada da reprodução social – neste caso, a habitação.”

Forma-se assim toda uma cidade a parte daquela formalmente reconhecida em registros públicos, esta cidade é chamada pelos estudiosos de cidade ilegal ou informal[11]. Segundo Maricato (2001, p. 4) “a essência das ocupações ilegais e da produção dessa cidade informal está na ausência de uma política pública que abranja a ampliação do mercado legal privado”.

Atualmente, a solução encontrada pelo governo está na urbanização das favelas (que se contrapõe aos projetos de remoção de moradores defendidos na década de 80). Sendo que a regularização fundiária, apesar de consistir em um ato meramente formal é de suma importância para que o processo de urbanização se complete, garantindo tranquilidade à população e consequentemente qualidade de vida (MARICATO, 2003, p. 83).

3. FUNDAMENTOS JURÍDICOS DA PROPRIEDAE URBANA

3.1 Fundamentos Principiológicos

Inicialmente, ressalta-se que a dignidade humana não pode ser conceituada em termos atemporais e universais[12].

A atemporalidade é, obviamente, decorrente do fato do ser humano ter possuído diferentes prioridades ao longo de toda a história da humanidade, prioridades estas que se confundiram com as garantias individuais mínimas e consequentemente com o conceito de dignidade.

A universalidade já não se revela tão clara assim. Somos fatalmente tentados a conceituar a dignidade levando em conta apenas as nossas próprias referências culturais[13]. Esquecendo, no entanto, que todas as sociedades possuem suas próprias concepções acerca da dignidade humana, sendo elas tão incompletas e problemáticas quanto a nossa. A diferença está no fato de que “nem todas estas concepções se dão em termos de Direitos Humanos” (SANTOS, B., 2001, p. 19).

Boaventura (2001, p. 20) explica que:

“Todas as culturas tendem a distribuir as pessoas e os grupos sociais entre dois princípios competitivos de pertença hierárquica. Um – o princípio da igualdade – opera através de hierarquias entre homogêneas (a hierarquia de estratos socioeconômicos, a hierarquia cidadão/estrangeiro); o outro – o princípio da diferença – opera através da hierarquia entre identidades e diferenças consideradas únicas (a hierarquia entre etnias ou raças, entre sexos, entre religiões, entre orientações sexuais). Os dois princípios não se sobrepõem necessariamente e, por esse motivo, nem todas as igualdades são idênticas e nem todas as diferenças são desiguais).” (grifo nosso).

Desta forma, a partir da análise contemporânea e específica da realidade brasileira, pode-se afirmar que a dignidade humana constitui o princípio basilar de todo o nosso ordenamento jurídico.

Porém, em que pese a sua primordialidade, a dignidade é utilizada dentro do universo jurídico de forma ilimitada e muitas vezes controversa. Isto decorre em parte da impossibilidade de se atribuir a ela um conceito ergometricamente fechado; e em parte por culpa dos próprios operadores do direito, que desconhecem a essência desse princípio e o utilizam indiscriminadamente, como se ele tudo comportasse. Nas palavras de Carmen Lucia Antunes Rocha: (2000, p. 72):

“O princípio da dignidade da pessoa humana entranhou-se no constitucionalismo contemporâneo, daí partindo e fazendo-se valer em todos os ramos do Direito. A partir de sua adoção se estabeleceu uma nova forma de pensar e experimentar a relação sociopolítica baseada no sistema jurídica; passou a ser princípio e fim do plano nacional e internacional.  Contudo, não por ser um princípio matriz no constitucionalismo contemporâneo se pode ignorar a ambigüidade e a porosidade do conceito jurídico da dignidade da pessoa humana. Princípio de freqüente referência tem sido igualmente de parca ciência pelos que dele se valem, inclusive nos sistemas normativos. Até o papel por ele desempenhado é diversificado e impreciso, sendo elemento em construção permanente mesmo em seu conteúdo.”

Todas estas premissas comprovam a dificuldade teórica em se atribuir à dignidade humana um conceito único. Por isso, para não incorrer em análises superficiais, o presente trabalho não adentrará nesta seara, e somente considerará a dignidade humana enquanto princípio interpretativo e de coesão de todo o ordenamento jurídico.

Ou seja, considerar-se-á que todos os direitos inseridos em nosso ordenamento devem ser analisados à luz da dignidade humana, não sendo diferente com o direito de propriedade.

É neste ponto que se encaixa a função social da propriedade, que conforme já visto anteriormente foi um princípio construído historicamente no Brasil, que venho conferir à propriedade o seu “quinhão de dignidade”.

Segundo Tepedino, “a função social é (…) capaz de moldar o estatuto proprietário em toda a sua essência, constituindo, como sustenta a melhor doutrina, o título justificativo, a causa, o fundamento de atribuição dos poderes ao titular” (2005, p. 106); sendo que “não há, no texto constitucional brasileiro, garantia à propriedade, mas tão-somente garantia à propriedade que cumpre a sua função social” (TEPEDINO, 2005, p. 105).

No caso específico da propriedade urbana, a Constituição deixou à cargo das leis municipais, através de seus planos diretores[14] o estabelecimento de mecanismos que garantam o cumprimento da função social.

Os legisladores não definiram conceitualmente a função social da propriedade urbana e assim, não engessaram o papel dos municípios no processo de redemocratização da terra. Ao invés disso, definiram instrumentos[15] possíveis de serem utilizados pelo poder público ou mesmo pelos próprios cidadãos na busca desse direito fundamental.

A propriedade urbana, portanto, possui a sua base principiológica alicerçada principalmente na dignidade do ser humano e na função social. São estes princípios que devem nortear as decisões judiciais e a execução das políticas urbanas.

3.2 Marcos Legais e Institucionais

Segundo Ermínia Maricato (2010, p. 6):

“A Constituição brasileira de 1988, promulgada em um momento de ascenso das forças sociais que lutavam pela democratização do país, assegura ao poder municipal a competência para definir o uso e a ocupação da terra urbana, e o Estatuto da Cidade reforça essa orientação autônoma e descentralizadora. O fortalecimento da autonomia do poder local se deu como reação à centralização autoritária da política urbana exercida pelo governo ditatorial no período anterior, entre 1964 e 1985”.

No entanto, esta reação veio apenas dos movimentos progressistas, notadamente o Movimento Nacional de Reforma Urbana (MNRU)[16], enquanto que os representantes do mercado imobiliário e de outros setores conservadores da sociedade pressionaram pela aprovação de um texto legal que garantisse o direito de propriedade na sua plenitude.

O MNRU lutou pela aprovação de uma Constituição avançada que reconhecesse a função social da propriedade e do direito à moradia como direitos fundamentais. Por isso propuseram a descentralizasse do poder de regulamentação da propriedade e o fortalecimento da autonomia dos municípios.

Por outro lado, a ala conservadora enxergou na vinculação da função social da propriedade à aprovação de leis municipais, a possibilidade de transformar a função social da propriedade:

“[…] em uma mera figura retórica. Afinal, a limitada experiência brasileira de planejamento urbano até então tinha sido amplamente ineficaz no que diz respeito ao poder do planejamento urbano de reverter as condições históricas de desenvolvimento urbano excludente no País” (FERNANDES, 2010, p. 59).

De qualquer forma, a função social da propriedade foi incorporada ao texto constitucional nos artigos 182 e 183[17], enquanto que o direito à moradia foi reconhecido apenas uma década depois[18].

O objetivo dos lobistas imobiliários funcionou relativamente bem durante algum tempo, já que de 1988 até 2001, ano da aprovação do Estatuto das Cidades, quase nada foi feito nos municípios com relação à regulamentação da propriedade.

A Lei 10.257/2001, conhecida como Estatuto da Cidade (EC) nasceu então com o objetivo de democratizar não só a propriedade urbana, mas a própria cidade, através de mecanismos que combatem a segregação territorial e assegurem que os negócios imobiliários não sejam obstáculos ao direito de moradia da população (MARICATO, 2010, p. 7).

Edesio Fernandes (2010, p. 61) explica que o EC possui quatro dimensões principais:

“[…] uma conceitual, que explicita o princípio constitucional central das funções sociais da propriedade e da cidade e os outros princípios determinantes da política urbana; uma instrumental, que cria uma série de instrumentos para materialização de tais princípios de política urbana; uma institucional, que estabelece mecanismos, processos e recursos para a gestão urbana; e, finalmente, uma dimensão de regularização fundiária dos assentamentos informais consolidados.”

Mesmo com a promulgação de uma lei avançada, do ponto de vista da garantia dos direitos fundamentais, pode-se dizer que a verdadeira “reforma urbana” só passou a acontecer a partir de uma série de ações do governo federal no sentido de pôr em prática os preceitos legais. À começar pela criação do Ministério das Cidades em 2003 e pela criação do Conselho Nacional das Cidades em 2004. A nova pasta fez a conexão entre os vários Ministérios envolvidos com a questão da moradia, agilizando o processo burocrático que antes engessava o Governo; enquanto que o Conselho, formado por representantes de toda a sociedade, apresentou ao governo soluções criativas para resolver os reais problemas da população urbana.

Observa-se desta forma que a regulação trazida pela Constituição de 88, pelo Estatuto das Cidades e pelos planos diretores municipais, colocados em prática por diversas iniciativas do poder público e também da sociedade estão “rompendo com a cultura patrimonialista que tradicionalmente no Brasil utilizou o poder público e as leis para produzir desigualdade e preservar privilégios e interesses de grupos minoritários abastados” (REALI e ALLI, 2010, p. 44).

3.3 O Direito Urbanístico Brasileiro

Além dos marcos legais e institucionais que foram sendo criados ao longo das últimas décadas, pelo Poder Público, com o intuito de instrumentalizar a reforma urbana, um novo ramo também foi criado dentro do Direito, pautado, sobretudo, na problemática das cidades.

O Direito Urbanístico surgiu com o objetivo de resolver ou, ao menos amenizar, as consequências da ocupação fundiária excludente, que têm se observado no Brasil desde o longínquo período de colonização.

Edesio Fernandes (2002, p. 58), um dos estudiosos que mais obras escreveu sobre o assunto, observou que, no que concerne ao processo de urbanização algumas questões imprescindíveis ainda não foram respondidas pelos nossos juristas, tais como, “que tipo de implicações a ordem jurídica têm tido no processo de crescimento urbano, e quem tem se beneficiado da manutenção inquestionada de tal status quo?”

Isto significa dizer que antes mesmo de pensar em soluções para o problema habitacional das cidades, em especial para a ocupação ilegal, é necessário que os juristas se desapeguem do formalismo civilista e compreendam as cidades através de um contexto mais amplo e interdisciplinar.

É neste sentido que o Direito Urbanístico se afirma enquanto ramo autônomo do Direito, cujo objetivo é transformar o conceito tradicional de propriedade urbana em algo mais próximo da realidade brasileira, através da integração (e inovação) de conceitos do Direito Civil e do Direito Administrativo. Nas palavras de Fernandes (2002, p. 33):

“(…) é preciso arrancar o tratamento jurídico do direito de propriedade imobiliária do âmbito individualista do Direito Civil para colocá-lo no âmbito social do Direito Urbanístico, de tal forma que o direito coletivo ao planejamento das cidades, criado pela Constituição Federal de 88, seja materializado. Da mesma forma, é preciso arrancar o tratamento jurídico da gestão urbana do âmbito restritivo do Direito Administrativo para colocá-lo no âmbito mais dinâmico do Direito Urbanístico, de tal forma que o direito coletivo à gestão participativa das cidades, também criado pela Constituição Federal de 88, seja efetivado”.

O Direito Urbanístico encontra alguns obstáculos, entre os quais se podem destacar a relutância de alguns juristas em reconhecê-lo enquanto ramo autônomo do Direito e, principalmente, o fato dos cursos de Direito ainda possuírem currículos obsoletos, que “incluem quatro anos e meio de discussões formais sobre o Código Civil totalmente ultrapassado em muitos aspectos” (FERNANDES, 2002, p. 37).

Por outro lado, o reconhecimento internacional[19] da importância do Direito Urbanístico na construção de uma reforma urbana sólida e duradoura, vem despertando o interesse de novas gerações de juristas, atentos às mudanças paradigmáticas do Direito.

Os avanços são gradativos, porém permanentes. Não há mais espaço, portanto, para entendimentos conservadores no sentido de considerar o Direito Urbanístico “um ramo meramente exótico, um vanguardismo  jurídico pretensioso ou um modismo passageiro”, pois hoje sabe-se que se trata “de um substrato  de longa decantação no leito da  história do nosso  ordenamento jurídico” (DANTAS,  2008, p. 8).

4 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL

Passa-se à análise dos posicionamentos jurisprudenciais acerca da função social da propriedade. Como fonte de pesquisa foi utilizada a internet, especialmente os sites dos tribunais selecionados.

Pela incapacidade de se analisar neste estudo a totalidade das decisões judiciais do país, fixou-se temporalmente, como referência de pesquisa, as ações julgadas pelos tribunais nos últimos 5 anos (2007 à 2011); e territorialmente foram selecionados três tribunais estaduais: Rio Grande do Sul, Pernambuco e, é claro, Paraná; além do Superior Tribunal de Justiça, que em tese estaria representando todo o país. A escolha dos dois primeiros Tribunais levou em conta a grande discrepância existente entre a região nordeste e a região sul do Brasil, especialmente no que concerne à terra.

No intuito de delimitar ainda mais o estudo e torná-lo mais interessante foram selecionados cinco temas relacionados diretamente com a função social da propriedade. São temas polêmicos que causam muitas divergências nos tribunais, alguns por serem recentes e outros por serem extremamente inovadores, à exemplo da concessão de uso especial para fins de moradia.

No primeiro momento será analisado o art. 40, § 4º do EC, que traz a necessidade da participação popular na elaboração dos planos diretores. Na sequência tratar-se-á das limitações ao direito de propriedade, a partir da análise de um julgado da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça que resolveu um conflito entre direito de vizinhança e o direito de construir. 

A concessão de uso para fins de moradia, instrumento de regulamentação fundiária trazida pela Medida Provisória 2.220/2001, será analisada a partir de dois julgados do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que em seu bojo discutem além da constitucionalidade do referido instituto, também as conseqüências de sua aplicação.

Será tratado do IPTU progressivo no tempo enquanto medida tributária apta à fazer cumprir a função social da propriedade. Com enfoque na discussão acerca de sua aplicabilidade imediata ou a necessidade dela ser subsidiária em relação à outros instrumentos, tais como o parcelamento e a edificação compulsória.

Por fim, será feita a análise de uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul, pedindo a regularização fundiária de uma área em que residem várias famílias de baixa renda.

Foram escolhidos casos que trazem questões polêmicas e que ao mesmo tempo ilustram alguns dos inovadores institutos trazidos pelo Estatuto da Cidade. Permitindo ainda que outras questões que se entrelaçam com os referidos institutos sejam trazidos à discussão, mesmo que superficialmente.

Não se pretenderá neste estudo fazer uma análise quantitativamente da jurisprudência, que neste caso se revelaria superficial. O intuito é analisar estes mecanismos jurídicos a partir dos principais debates criados dentro dos próprios tribunais, seja acerca das possíveis interpretações dadas à estes mecanismos, seja acerca das conseqüências que estas decisões poderá produzir no mundo real.

4.1 Participação popular no processo de urbanização

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul julgou improcedente a ADI nº 70020914131, de junho de 2008, interposta pelo Procurador Geral da Justiça do Estado, em face de Lei Municipal de Gravataí.

Segundo o proponente, a Lei nº 2253/2004 que, autorizou a implantação dos chamados “loteamentos fechados”[20], teria tramitado sem qualquer consulta popular, o que afrontou o art. 177, §5º da Constituição Estadual[21] e o art. 29, XII, da CF. Os principais argumentos utilizados pelas partes foram os seguintes:

Por maioria, o pedido foi julgado improcedente, destaca-se, no entanto, os votos do Des. José Aquino Flores de Camargo (relator), que manifestou-se pela improcedência, e da Desª. Ana Maria Nedel Scalzilli, que julgou a ADI procedente, sendo acompanhada por outros quatro desembargadores:

O segundo caso trata-se da ADI nº 70028427466 de 2009, proposta pelo Procurador Geral de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, em face da Lei nº 1.468, de 31 de outubro de 2001, do Município de Horizontina, que “altera o Plano Diretor, estreita a faixa de proteção verde do Distrito Industrial, extingue parte do traçado da Rua São João e altera a localização da Rua Osório”, sobre os seguintes argumentos:

Por maioria a ação foi julgada procedente, vencidos, porém os Desembargadores Maria Isabel de Azevedo Souza, Roque Joaquim Volkweiss e José Antônio Hirt Preiss. Destaca-se o teor dos três principais votos:

Ressalta-se que entre os três tribunais pesquisados, só foram encontradas ações que questionam a constitucionalidade de leis municipais alteradoras do Plano Diretor, por não terem sido elaboradas em amplo processo de discussão popular no Estado do Rio Grande do Sul.

Isto tem um motivo principal, qual seja o fato de haver na Constituição Estadual deste Estado um artigo que, além de confirmar a exigência da participação popular trazida pela Constituição Federal, também regulamenta a forma como se dará essa participação.

O Desembargador Araken de Assis em decisão proferida nos autos de outra ação sobre o mesmo tema definiu a importância da previsão constitucional estadual:

“A norma constitucional não se satisfaz com mera publicidade dos atos legiferantes, mas, sim, exige, em conformidade com sua correta exegese, a efetiva participação dos representantes comunitários na sua progênie, mediante audiência pública, na qual serão consultados, pondo-se em debate os pontos controversos. O poder público não pode escapar a esta exigência, face ao caráter de diretriz basilar no âmbito municipal que toca ao Plano Diretor, servindo de linha mestra para o desenvolvimento na esfera do Município, sob os aspectos geográficos, sociais, urbanísticos e econômicos, e que irá causar influência direta no modo de vida da população local. Eis a sua importância. O constituinte derivado estadual buscou, com a norma precitada, atender ao mandamento da Constituição Federal, estabelecido no artigo 29, XII, que prevê a efetiva participação das entidades locais no planejamento municipal (ADI nº 70005449053, TJRS, 2003, grifo nosso).”

4.2 Limitações ao direito de propriedade

A segunda turma do Superior Tribunal de Justiça julgou em 26/08/2010, o Recurso Especial nº 302.906, cujo pedido era a Nunciação de Obra Nova, em que figuravam como partes a Associação de Moradores do Alto da Lapa, a construtora responsável pela obra e o Município de São Paulo.

O Município concedeu alvará para que a construtora, também proprietária do terreno, construísse prédio multifamiliar em um local conhecido como City Lapa, sem observar que o terreno possuía uma cláusula restritiva de uso, gravada pelo primeiro proprietário no registro do imóvel, que permitia apenas a construção de imóveis de caráter unifamiliar.

No caso em tela, a Associação de Moradores do Alto da Lapa procurava ver conservado as restrições convencionais que incidem sobre o terreno localizado em um dos famosos bairros-jardins de São Paulo.

O Ministro-relator, em seu Voto, destacou o contexto histórico em que se deu a formação de tais bairros, ajudando-nos a compreender por que a conversação de residências unicamente unifamiliares é tão importante para os moradores do local:

“Os bairros City Lapa e Bela Aliança formam um dos mais belos conjuntos urbanísticos de São Paulo. Sua qualidade não se mede apenas pela expressiva proporção de áreas verdes que possuem em razão da forma como foram pensados pelo urbanista que concebeu o traçado de suas ruas e pequenas praças e áreas verdes que lhes são contíguas” (REsp nº 302.906, julgado em 26/08/2010, p. 56).

Ele destacou ainda que a formação destes bairros não ocorreu por iniciativa do Poder Público, mas sim graças à urbanistas ingleses visionários que no início do século XX trouxeram para o Brasil os métodos de organização urbana que eram praticados na Europa:

“Na City Lapa encontram-se hoje dois bairros plenamente consolidados – e, nem por isso, menos ameaçados – após a passagem de mais de meio século da sua implantação. Curioso é que sua beleza estética e apelo paisagístico não são fruto de legislação urbanística e ambiental firme, algo que inexistia à época da criação dos loteamentos, nem da ação enérgica de administradores públicos visionários. Ao revés, são filhos da aplicação criativa de dispositivos pouco conhecidos do público em geral, inseridos no vetusto Código Civil de 1916 (normas de vizinhança)” (REsp nº 302.906, julgado em 26/08/2010, p. 55).

O caso possui inúmeras questões materiais e processuais interessantes, no entanto, para os fins deste trabalho, nos limitaremos à analisar o direito puramente material que consiste no conflito entre o direito de construir e o direito de vizinhança.

Em primeira e segunda instância, determinou-se a demolição do prédio, por afrontar as restrições convencionais.  No STJ, o relator, Ministro Herman Benjamin, opinou por manter a decisão do Tribunal estadual. Dois ministros divergiram de seu voto e outros dois o acompanharam. 

Abaixo se encontram os principais fundamentos dos votos do Ministro-relator Herman Benjamin e do voto da Ministra Eliana Calmon, que inaugurou a divergência:

Em primeiro lugar, a questão que se coloca é referente à maleabilidade com que a lei é aplicada. Observa-se que os dois ministros utilizaram como fundamento legal de seus votos o mesmo artigo da Lei Municipal 8.001/73, sendo que um se utilizou do caput e alínea “a” do art. 39 e o outro do §1º deste artigo. Vejamos o texto de lei:

“Art. 39. As restrições convencionais de loteamentos aprovados pela Prefeitura, referentes a dimensionamento de lotes, recuos, taxa de ocupação, coeficiente de aproveitamento, altura e número de pavimentos das edificações, deverão ser atendidas quando:

a) as referidas restrições forem maiores do que as exigidas pela legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo;

b) as referidas restrições estejam estabelecidas em documento público e registrado no Cartório de Registro de Imóveis.

§1º. As categorias de uso permitidas nos loteamentos referidos no “caput” deste artigo serão aquelas definidas para as diferentes zonas de uso pela legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo.

§2º. As disposições deste artigo aplicam-se apenas às zonas de uso Z1, Z9, Z14, Z15, Z17, Z18 e aos corredores de uso especial Z8-CR1, Z8-CR5 e Z8-CR6” (grifo nosso).

Ou seja, o ministro Benjamin optou por se utilizar apenas do caput do artigo que prevê a prevalência das restrições convencionais sobre as leis municipais, quando aquelas forem mais rigorosas. Enquanto que a Ministra Eliana Calmon interpretando o § 1º do referido artigo entendeu que ele “reserva ao Poder Público a categorização, dentro dos loteamentos, das zonas de uso e ocupação do solo”, sendo que “estas regras são imutáveis pelo particular”.

Em suma o que se observa é que eles não basearam seus votos na lei, mas ao contrário, utilizaram a lei para legitimar seus posicionamentos acerca do assunto.

No segundo momento, adentrando no conflito entre o direito de vizinhança e o direito de construir, observa-se que, em que pese, o primeiro ter prevalecido sobre o segundo, isto não significa necessariamente que a função social da propriedade tenha sido reconhecida.

Isto porque ao mesmo tempo em que os bairros-jardins são importantes mecanismos para a manutenção de áreas arborizadas nos centros das cidades, eles também ajudam a perpetuar a prática imobiliária de supervalorizar terrenos centrais, criando assim os chamados “vazios imobiliários”.

Estes domicílios ociosos, que refletem a soma dos imóveis vagos e dos fechados, representam, segundo o Censo 2010 do IBGE, 14,8% dos imóveis brasileiros[22], se aproximando do déficit habitacional brasileiro.

São imóveis que, não por acaso, “se concentram nas áreas mais centrais e, (são) portanto, atendidas por infraestrutura e oferta de serviços urbanos” (MARICATO, 2010, p. 15) Ao passo em que o restante da cidade é impelido à se expandir em regiões de risco e de preservação ambiental, que em regra não possuem um mínimo de infraestrutura apta à garantir a dignidade do ser humano.

Disto pode-se observar que enquanto “alguns lutam pelo direito à cidade, outros (lutam) por ganhos extras advindos de atividades que são especulativas, na maior parte das vezes” (MARICATO, 2010, p. 14).

4.3 Concessão especial de uso para fins de moradia

A concessão especial de uso para fins de moradia é um instituto de regularização fundiária de imóveis públicos que inicialmente foi previsto no Estatuto da Cidade, nos artigos 15 a 20. Os artigos, no entanto, foram vetados pela Presidência da República, pelos seguintes fundamentos:

“O instituto jurídico da concessão de uso especial para fins de moradia em áreas públicas é um importante instrumento para propiciar segurança da posse – fundamento do direito à moradia – a milhões de moradores de favelas e loteamentos irregulares. Algumas imprecisões do projeto de lei trazem, no entanto, riscos à aplicação desse instrumento inovador, contrariando o interesse público. […]

Os arts. 15 a 20 do projeto de lei contrariam o interesse público sobretudo por não ressalvarem do direito à concessão de uso especial os imóveis públicos afetados ao uso comum do povo, como praças e ruas, assim como áreas urbanas de interesse da defesa nacional, da preservação ambiental ou destinadas a obras públicas. Seria mais do que razoável, em caso de ocupação dessas áreas, possibilitar a satisfação do direito à moradia em outro local, como prevê o art. 17 em relação à ocupação de áreas de risco. […]

Em reconhecimento à importância e validade do instituto da concessão de uso especial para fins de moradia, o Poder Executivo submeterá sem demora ao Congresso Nacional um texto normativo que preencha essa lacuna, buscando sanar as imprecisões apontadas”[23].

Assim, em 4 de setembro de 2001, para suprir a lacuna deixada pelo referido veto, o Poder Executivo editou a Medida Provisória nº 2.220, regulamentando o a Concessão especial de uso para fins de moradia nos seguintes termos:

“Art. 1o  Aquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinqüenta metros quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, tem o direito à concessão de uso especial para fins de moradia em relação ao bem objeto da posse, desde que não seja proprietário ou concessionário, a qualquer título, de outro imóvel urbano ou rural.”

Com relação a este instituto analisaremos dois julgados, ambos do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que demonstram um pouco das controvérsias que giram em torno dele.

O recurso de apelação nº 0133373-1 da 7ª Câmara Cível do TJPE, julgado em 07/04/2009, foi interposto pelo Município do Recife com o objetivo de reformar a sentença do juízo de primeiro grau, que julgou improcedente o pedido de demolição de imóvel de uso habitacional, com área de 42 m², por este estar localizado em logradouro público municipal.

Além do reexame, o Município interpôs recurso voluntário argüindo a inconstitucionalidade da MP 2.220/2001 que regula a concessão de uso especial para fins de moradia, por conter previsão de usucapião de um bem público por particular. O acórdão manteve a decisão do juiz de 1º grau.

O segundo caso trata-se de apelação interposta pelo Município do Cabo de Santo Agostinho, Pernambuco, contra sentença proferida em sede de ação demolitória que julgou procedente o pedido de demolição de imóvel irregularmente construído em área pública. Porém, a desapropriação foi condicionada ao pagamento de verba indenizatória à família que ali residia. A decisão de 1º grau, citada no acórdão, baseia-se, em suma, nos seguintes argumentos:

“A ré construiu em área de logradouro público, especificamente numa faixa posteriormente projetada como rua […] O direito à habitação deve ser assegurado pelo Poder Público, e a concessão de uso especial já foi devidamente regulamentada pelo MP 2.220/2001.[…]

Posto isto, é que julgo procedente, em parte, o pedido demolitório formulado pelo Município para deferi-lo diante da condição de ser assegurada a ré, valor indenizatório que arbitro em R$ 6.000,00, considerando as condições precárias das edificações questionadas […]”.

O relator reformou a sentença, entendendo que inexiste direito à indenização àqueles que irregularmente constroem e ocupam imóvel público.

No quadro abaixo estão citados os principais argumentos que fundamentaram as decisões dos Desembargadores relatores nos dois casos:

Da análise dos votos proferidos, observa-se que ainda paira sobre o instituto da concessão especial de uso para fins de moradia, grandes questionamentos na jurisprudência, seja a respeito de sua constitucionalidade, seja a respeito de sua aplicação.

Muitos defendem a tese de que o instituto fere a imprescritibilidade dos imóveis públicos e a supremacia do interesse público sobre o particular, uma vez que confere o uso do imóvel ao particular, à título gratuito.

Por outro lado, estão aqueles que defendem a constitucionalidade da concessão, por entenderem que ela em nada se confunde com a usucapião de imóveis públicos.  O defensor público do Estado de São Paulo Carlos Henrique Loureiro[24], afirma que:

“A Concessão de Uso Especial para fins de Moradia, como instrumento jurídico da política urbana (…) é, mais do que um direito do cidadão, é um dever do Estado, eis que esta vinculada a uma política de desenvolvimento urbano que tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e o bem estar de seus habitantes (…). Assim, na medida em que se coloca como instrumento da política de desenvolvimento urbano, de fundamento constitucional e legal, sua aplicação não depende de previsão em leis municipais (nem mesmo no Plano Diretor) ou estaduais de regularização fundiária e urbanística, eis que decorre diretamente da disciplina constitucional específica, que nada mais é do que uma conseqüência do reconhecimento da função social da propriedade pública.”

4.4  IPTU Progressivo no tempo

Com relação a este tema, a primeira questão que se coloca é com relação à diferenciação entre seletividade e progressividade. Segundo Hugo de Brito Machado (2010, p. 337) “a progressividade evidencia-se pelo crescimento da alíquota em razão do crescimento da base de cálculo, enquanto que a seletividade onera de forma diferente os bens sobre os quais incide”.

Assim sendo, a jurisprudência majoritária admite a possibilidade de tributação diferente para imóveis diferentes, como por exemplo, alíquotas de IPTU maiores para imóveis não-edificados com relação aos edificados, com base na seletividade.

Porém, no que diz respeito à progressividade no tempo, o STF editou a seguinte súmula:

“Súmula nº 668 – Constitucionalidade – Lei Municipal – Alíquotas Progressivas – IPTU – Função Social – Propriedade Urbana. É inconstitucional a lei municipal que tenha estabelecido, antes da Emenda Constitucional 29/2000, alíquotas progressivas para o IPTU, salvo se destinada a assegurar o cumprimento da função social da propriedade urbana.”

Com base nesta súmula, as leis municipais anteriores à 2000 que instituíram o IPTU progressivo, foram consideradas inconstitucionais, pacificando o assunto que outrora fora muito debatido.

Porém, com relação à segunda parte da súmula, que ressalva a possibilidade de se aplicar o IPTU de forma progressiva, se o objetivo for assegurar a função social da propriedade, a questão ainda é controversa.

Alguns magistrados entendem que o único requisito para que a lei municipal seja constitucional é o fato dela se destinar ao cumprimento da função social. Ou seja, entendem que este instrumento tributário por estar expressamente previsto na Constituição enquanto mecanismo apto à garantir a função social da propriedade teria aplicabilidade imediata.

Por outro lado, outros magistrados, entendem que a sua aplicação deveria se dar de forma subsidiária. Ou seja, seria preciso que antes da aplicação do IPTU progressivo no tempo, fossem aplicadas as sanções previstas pelo art. 182, § 4º, I da CF, que versam sobre a edificação e parcelamento compulsório[25].

Analisaremos dois acórdãos, ambos do Tribunal de Justiça do Paraná, onde evidencia-se as duas teses citadas acima e suas respectivas argumentações.

O primeiro acórdão trata-se de Apelação Cível de nº 276694-1, interposta perante o Tribunal de Justiça do Paraná em 2008, originária da Comarca de Ribeirão Claro, em que são partes, Marino Accioly de Barros e o Município de Ribeirão Claro. O apelante pugna pela reforma da decisão do juiz a quo alegando, entre outras coisas, a impossibilidade da cobrança do IPTU progressivo no tempo pelo Município não ter aplicado anteriormente as outras medidas sancionatórias (edificação e parcelamento compulsório).

O relator indeferiu a apelação, baseado-se na autonomia municipal, considerando desnecessário a aplicação de tais medidas, desde que o imposto progressivo sirva, efetivamente, para cumprir a função social da propriedade.

O segundo caso trata-se de agravo de instrumento de nº 0718826-3, interposto contra decisão que deferiu o pedido de liminar de suspensão de exigibilidade do crédito tributário relativo à cobrança do IPTU progressivo do ano de 2010. Neste caso, o desembargador decidiu pela ilegalidade da cobrança, já que o imposto não foi aplicado sucessivamente às outras medidas previstas constitucionalmente.

4.5 Regularização Fundiária

O Ministério Público ajuizou ação civil pública, pretendendo a regularização de um loteamento localizado em Taquari, Estado do Rio Grande do Sul. O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo a responsabilidade subsidiária do Município em proceder à regularização do terreno, e o Tribunal manteve a sentença de primeiro grau.

Pelo o que se depreende dos autos, Ari Costa de Oliveira, já falecido, ocupou com sua família há cerca de 20 anos atrás, uma área relativamente grande em uma região periférica do município.  

Como não houve oposição de um possível proprietário ou mesmo do município, Ari Costa passou a dividir o terreno em pequenos lotes e vendê-los à terceiros, através de contrato de compra venda, sem realizar a averbação junto à Matricula do Imóvel.

Ocorre que mesmo todo o loteamento encontrando-se em situação, inúmeras famílias passaram à morar nestes terrenos e até mesmo à reclamar ao município melhores condições de infra-estrutura (saneamento, água, luz…). Sendo que, o próprio município, a despeito da ciência da situação irregular concedeu a infra-estrutura básica e nunca tomou nenhuma atitude no sentido de exigir a regularização da área.

A análise desta ação civil pública terá o objetivo principal de demonstrar quais são as reais condições das propriedades urbanas no Brasil e como se dá o processo de formação das irregularidades fundiárias tão discutidas no Direito.

Para este fim é primordial a reprodução dos depoimentos dos moradores que encontram-se transcritas nos autos do processo:

“Afirma Elaine Santiago (fls. 165/167):

Juiz de Direito: Dona Elaine, o que que a senhora sabe em relação a esse loteamento aí, que existiria aí, que tria sido implementado pelo Ari Costa de Oliveira?

Testemunha: Ele vendeu os terrenos, né…

Juiz de Direito: A senhora comprou terreno?

Testemunha: Sim, comprei.

Juiz de Direito: Como é que foi isso aí?

Testemunha: Ele ofereceu, ele tava vendendo, os irmãos dele… Os pais deles tinham falecido, né, ele tava precisando de dinheiro, eles abriram uma estrada na rua, eles repartiram os terrenos entre os três irmãos, e o irmão dele, o Hélio, vendeu a parte dele, legalizou e vendeu, a irmã dele ficou com a partilha toda da terra e ele vendeu os terrenos…(…)

Juiz de Direito: E o que que tinha lá, de infra-estrutura nesse loteamento?

Testemunha: Nada, só os terrenos, tinha estrada e os terrenos, ele fez um acordo de boca, assim, ele fez um acordo com nós, né, ele vendeu pro senhor Heraldo (…), ele vendeu cinco terrenos, vendeu pra mim, vendeu pros meus irmãos, assim, de boca, na época, né, a gente não tinha muita informação, foi vendido assim, e ele prometeu depois com o tempo nos ajudar na luz, né, faltava luz, que teria como colocar, e água, abriu a estrada, a Prefeitura abriu a estrada.”(grifo do autor).

No julgamento do recurso de apelação pela 1ª Câmara Cível do TJRS, o relator Des. Jorge Maraschin dos Santos opinou por manter a sentença, sendo seguido por um de seus pares, enquanto o Des. Luiz Felipe Siveira Difini opinou pela reforma da sentença. Vejamos os principais argumentos dos magistrados:

O caso deflagra uma situação comum no Brasil. São pessoas simples que compraram terrenos imbuídos de boa-fé, estabeleceram suas moradias há mais de uma década sem oposição do Poder Público e, por verdadeiro desconhecimento legal, não realizaram os devidos procedimentos burocráticos para que esses terrenos fossem regularizados.

O Judiciário poderia, neste caso, ter optado pelo estrito cumprimento da lei e determinado a responsabilidade exclusiva dos loteadores na regularização do terreno, já que o art. 40 da Lei n. 6799/79[26] prevê, apenas a faculdade do Poder Público em regularizar o terreno e não a sua responsabilidade subsidiária.

Porém, nota-se que a maioria dos magistrados optaram por prestigiar o direito à moradia das várias famílias que ali estavam e, ao mesmo tempo, punir o Poder Público pela inércia ante o seu dever fiscalizatório.

Por fim que, ressalta-se que apesar da maioria das decisões judiciais ainda fundamentarem-se na Lei 6.799/79, já existe uma nova lei que dispõe sobre a regularização fundiária urbana, trazendo entre outras disposições o conceito de regularização fundiária de interesse social, que ao que parece se adéqua ao presente caso. Dispõe a Lei 11977/2009:

“Art. 47.  Para efeitos da regularização fundiária de assentamentos urbanos, consideram-se: 

VII – regularização fundiária de interesse social: regularização fundiária de assentamentos irregulares ocupados, predominantemente, por população de baixa renda, nos casos: 

a) em que a área esteja ocupada, de forma mansa e pacífica, há, pelo menos, 5 (cinco) anos;

b) de imóveis situados em ZEIS; ou 

c) de áreas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios declaradas de interesse para implantação de projetos de regularização fundiária de interesse social; 

Art. 55.  Na regularização fundiária de interesse social, caberá ao poder público, diretamente ou por meio de seus concessionários ou permissionários de serviços públicos, a implantação do sistema viário e da infraestrutura básica, previstos no § 6o do art. 2o da Lei no 6.766, de 19 de dezembro de 1979, ainda que promovida pelos legitimados previstos nos incisos I e II do art. 50”. (grifamos).

CONCLUSÃO

O processo de urbanização brasileiro ocorreu de forma inteiramente desordenada, espelhando a enorme desigualdade social do país. Neste processo, formou-se uma divisão entre as cidades formais e aquelas ditas “informais”. Estas últimas foram assim chamadas, pois as pessoas que ali estão, encontram-se em situação de total irregularidade fundiária e à margem da legislação estatal.

Estas áreas, no entanto, não foram ocupadas por simples afronta à legislação, mas sim pela ausência de alternativas que lhes garantissem o direito à moradia.

O Estado, por sua vez, durante a maior parte da história brasileira foi omisso nesse processo, acabando por legitimá-lo e algumas vezes até o incentivar.

Nas últimas décadas, em especial depois da Constituição de 88, vários movimentos sociais se formaram em torno da idéia de construir cidades verdadeiramente democráticas. O resultado desta pressão social foi que pela primeira vez na história do país, a função social da propriedade deixou de ser um princípio abstrato previsto no bojo da Constituição, e passou a ser regulamentada em leis específicas e avançadas.

No entanto, estas leis, à exemplo do Estatuto da Cidade, não produzem efeitos por si só. É necessário que haja vontade política por parte da Administração Pública em aplicá-las. Quando isto não ocorre, cabe ao Judiciário lhes dar a “exata medida”. É neste momento, em que valor, fato e norma se unem, que o Direito deixa de ser algo abstrato e genérico e passa a produzir efeitos concretos e transformadores da sociedade.

Por óbvio não são os juízes que constroem ou administram as cidades com suas palavras, mas são as decisões proferidas por eles que nos dão a exata dimensão do significado da função social da propriedade urbana no atual contexto brasileiro.

Por isso, ciente da importância dos intérpretes do Direito e também de suas limitações enquanto guardiões da lei, o presente trabalho analisou cinco questões acerca da função social da propriedade através de jurisprudências especialmente selecionadas.

Pode-se observar que a norma não é clara. Ao contrário, dela se podem extrair as mais variadas interpretações, sendo que a lei pode ser (e em regra é) utilizada de acordo com os interesses e valores pessoais do intérprete.

Entre as decisões judiciais analisadas, aquelas em que os juízes se despiram de formalismos jurídicos e procuraram analisar de forma interdisciplinar o caso concreto, foram aqueles em que mais próximo se chegou da dignidade humana, e consequentemente de se garantir à propriedade sua função social.

No entanto, ao mesmo tempo em que foram proferidas decisões extremamente garantistas, observou-se também certo grau de incerteza com relação à conceituação da função social de propriedade e ao cabimento dos instrumentos trazidos pelo Estatuto da Cidade, à exemplo da concessão especial de uso para fins de moradia, que não raras vezes foi confundido com usucapião de terras públicas.

Estas incertezas levaram os magistrados, na maior parte das vezes, a darem preferência à aplicação de normas infraconstitucionais, como o Código Civil, que possuem um texto detalhado, embora retrógrado, ao invés de utilizar os princípios constitucionais em toda a sua abstração.

Ademais, concluiu-se que o Direito, inclusive a função social da propriedade, para ser eficaz, cumprindo o resultado ao qual se destina, precisa nascer a partir das necessidades da sociedade e à ela retornar, em um constante processo dialético.

A função social da propriedade, desta forma, não se constitui, apenas, em simples limitações ao direito de propriedade. Mais do que isso ela é um instrumento através do qual se procura garantir o cumprimento da dignidade humana. Portanto, dizer que a função social da propriedade é eficaz é o mesmo que dizer que a sua aplicação ao caso concreto atinge o objetivo esperado, que outro não é, senão garantir a dignidade do homem.

Referências
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REALI, Mário e ALLI, Sérgio. A cidade de Diadema e o Estatuto da Cidade. In: CARVALHO, Celso Santos e ROSSBACH, Ana Claudia (Orgs.) O Estatuto da Cidade:  comentado. Brasília: Ministério das Cidades, 2010. 35-55 p.
ROCHA, Carmem Lúcia. O princípio da dignidade humana e a exclusão social. In: Anais do XVVI Conferência Nacional dos Advogados – Justiça: realidade e utopia. Brasília: OAB, Conselho Federal, p. 72, v. I, 2000.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma concepção multicultural dos Direitos Humanos. Rio de Janeiro: Contexto Internacional, vol. 23, nº 1, jan/jun 2001, pp. 7-34.
SANTOS, Boaventura de Souza. Notas sobre a história jurídico-social de Pasárgada in SOUSA, José Geraldo Junior (Org.) Direito Achado na Rua. 4ª Ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1993, pp. 42-47.
SANTOS, Jaime Melanias. O direito à moradia e a função social da propriedade. São Paulo: FADISP, 2005. 159 p. Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo. Disponível em: .  Acesso em: 25/06/2011.
SILVA, Helena Maria Menna Barreto. Terra e moradia: que papel para o município? São Paulo: USP, 1997. 260 p. Tese (Doutorado) – Curso de Pós-Graduação em Estruturas Ambientais Urbanas, Universidade de São Paulo. Disponível em: . Acesso em: 25/06/2011.
TEPEDINO, Gustavo e SCHREIBER, Anderson. A Garantia da Propriedade no Direito Brasileiro, Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VI, Nº 6  Junho de 2005, pp. 101-119.
 
Notas:

[1] Trabalho orientado pelo Prof. Celso Guerra Junior, advogado e professor.
[2] Dados do Censo 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (gráfico 1 em anexo).
[3] Idem (gráfico 2 em anexo).
[4] Segundo o IBGE, 44,5% da população não têm acesso à rede de esgoto pública (gráfico 3 em anexo), mas apenas à fossas sépticas e outras formas de esgotamento sanitário, que não são fiscalizadas do poder público.
[5]Como nos lembra João Sette Whitaker Ferreira (2005), em 1830, o Brasil havia aprovado a lei que proibia o tráfico negreiro, mas a lei não produziu efeitos, pois os senhores de escravos resistiam em alterar sua mão-de-obra. O tráfico negreiro só deixou de ser uma prática corriqueira no Brasil, em 1849, quando a Inglaterra ameaçou fechar os portos brasileiros. 
[6]O primeiro artigo da Lei de Terras previa: “Ficam proibidas as aquisições de terras devolutas por outro título que não seja o de compra”. Este artigo, nas palavras de Silva (1997, p. 17), representava a essência da lei, já que a partir daquele momento “não poderia o poder público continuar a ceder terras devolutas para os que queiram cultivar ou morar; e não poderiam os cidadãos apossar-se delas”.

[7]  Dados do Censo 2010 realizado pelo IBGE. Disponível em: http://www.censo2010.ibge.gov.br. Acesso em: 28 de julho de 2011.
[8] Como exemplo desta contradição, podemos citar o fato de que muitas vezes os aparelhos eletroeletrônicos chegam às favelas antes mesmo do saneamento básico e da moradia digna.
[9]  Ermínia Maricato (2010) traz o exemplo de São Paulo e Rio de Janeiro, onde a população moradora de favelas e a população moradora de loteamentos ilegais somada representa metade dos habitantes da cidade.
[10] O texto é fruto de um estudo sociológico realizado pelo autor em uma favela do Rio de Janeiro, a qual ele deu o nome fictício de Pasárgada; e apesar de ter sido escrito na década de 70 continua atual para os interesses deste artigo.  
[11] Sobre a cidade informal, Ermínia Marcato (2010, p. 12): “A influência do pensamento urbanístico dos países do norte e a importação de modelos de planejamento e gestão urbanos só fizeram aprofundar a cidade partida entre incluídos e excluídos onde se verifica a existência de verdadeiras “ilhas de primeiro mundo”, reguladas por zoneamento detalhado, marcadas por uma arquitetura fashion, local de produção do mercado formal. Do outro lado está a cidade informal, construída predominantemente pelos seus próprios moradores com seus parcos recursos. A representação dessa cidade busca afirmar a hegemonia das “ilhas de primeiro mundo” tomando a parte pelo todo. Além de invisíveis, os bairros informais também são desconhecidos, em grande parte, nos cadastros, mapas, arquivos e registros urbanos”.
[12] Em que pese a tendência da internacionalização dos direitos humanos, estamos longe de dizer que existe um conceito universal de dignidade humana, que seja reconhecido pelo mundo todo.
[13] Como ensina Michel Löwy no livro “As aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen”, ninguém que está afundado em um pântano até a cintura pode se puxar pelos próprios cabelos para sair de tal situação. Isto seria o mesmo que dizer que as pessoas não são capazes de enxergar as culturas alheias de modo imparcial, para isto seria necessário que elas conseguissem sair dos “pântanos culturais em que se encontram afundadas”.
[14] Os planos diretores possuem o encargo de definir as políticas específicas que serão aplicadas ao Município no tocante à propriedade, mas devem respeitar, conforme preceitua o art. 182, caput, CF, as diretrizes gerais que foram fixadas pelo Estatuto da Cidade.
[15] Não cabe aprofundar-se na conceituação de cada um destes instrumentos neste momento, mas alguns deles serão vistos na última parte deste artigo, que trata sobre as aplicações jurisprudenciais da função social da propriedade urbana.
[16]Em 1987 foi realizado o primeiro Fórum Nacional de Reforma Urbana, onde várias entidades populares assinaram o Projeto de Emenda Constitucional de Iniciativa Popular para que a questão urbana fosse incluída na Constituição, especialmente no tocante à moradia.
[17] Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.
§ 1º – O plano diretor, aprovado pela Câmara Municipal, obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, é o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana.
§ 2º – A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.
§ 3º – As desapropriações de imóveis urbanos serão feitas com prévia e justa indenização em dinheiro.
§ 4º – É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento,      sob pena, sucessivamente, de:
I – parcelamento ou edificação compulsórios;
II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;
III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.
Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
§ 1º – O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.
§ 2º – Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.
§ 3º – Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião. 
[18]  O direito à moradia seria reconhecido em 2000, através da Emenda Constitucional 26.
[19]  A ONU realizou em 1996, em Istambul, Turquia, a Conferência Habitat II, onde a Agenda Habitat foi consolidada como plano global, cujo objetivo é promover uma reforma urbana ampla, garantindo a todos o direito à moradia digna. Neste encontro o Direito Urbanístico foi reconhecido como ferramenta indispensável à concretização das metas da Agenda Habitat. 
[20] Em síntese a lei “estabeleceu normas e autorizou o Município a conceder, a título precário, o uso de áreas públicas de loteamentos a serem implementados”, conforme relatório do acórdão. 
[21] Art. 177 – Os planos diretores, obrigatórios para as cidades com população de mais de vinte mil habitantes e para todos os Municípios integrantes da região metropolitana e das aglomerações urbanas, além de contemplar os aspectos de interesse local, de respeitar a vocação ecológica, o meio ambiente e o patrimônio cultural, serão compatibilizados com as diretrizes do planejamento do desenvolvimento regional.”[…]
“§ 5º – Os Municípios assegurarão a participação das entidades comunitárias legalmente constituídas na definição do plano diretor e das diretrizes gerais de ocupação do território, bem como na elaboração e implementação dos planos, programas e projetos que lhe sejam concernentes. 
[22] Dados do Censo 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (gráfico 4 em anexo). 
[23] Inteiro teor do veto disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/Mensagem_Veto/ 2001/Mv730-01.htm.
[24] Tese Institucional  do Núcleo de Habitação e Urbanismo, Defensoria Pública do Estado de São Paulo,  Carlos Henrique A. Loureiro, 2008
[25] Art. 182 – A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.
§ 4º – É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, sucessivamente, de:
I – parcelamento ou edificação compulsórios;
II – imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana progressivo no tempo;
III – desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.
[26] Art. 40 da Lei 6799/69- A Prefeitura Municipal, ou o Distrito Federal quando for o caso, se desatendida pelo loteador a notificação, poderá regularizar loteamento ou desmembramento não autorizado ou executado sem observância das determinações do ato administrativo de licença, para evitar lesão aos seus padrões de desenvolvimento urbano e na defesa dos direitos dos adquirentes de lotes.

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Danielle Cristina Braz

Advogada

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