Resumo: O presente artigo trata da eficácia da Ação Civil Pública frente ao dano ambiental, sendo desenvolvido em três capítulos: lições prévias de responsabilidade civil ambiental, seguido pelas noções acerca da Ação Civil Pública e por fim uma pesquisa qualitativa e quantitativa sobre a eficácia da ação civil pública frente ao dano ambiental, tomando-se por base ações em trâmite no Município de Viamão (RS). [1]
sumário: Introdução. 1 Responsabilidade civil e dano ambiental. 1.1 Dano ambiental – conceito. 1.2 Responsabilidade civil por dano ambiental. 1.3 Reparação do dano ambiental. 1.3.1 Reparação in situ ou in natura. 1.3.2 Compensação ecológica. 1.3.3 Indenização. 2 A Ação Civil Pública na defesa do meio ambiente. 2.1 A Ação Civil Pública na tutela dos direitos fundamentais de terceira dimensão. 2.2 Ação Civil Pública: noções propedêuticas. 2.3 Alguns aspectos processuais da Ação Civil Pública. 2.3.1 A propositura da Ação Civil Pública: legitimidade, litisconsórcio, assistência e prescrição. 2.3.2 Competência. 2.3.3 O inquérito civil e o termo de ajustamento de conduta. 3 A eficácia da Ação Civil Pública frente ao dano ambiental – estudo de casos ocorridos no município de Viamão. 3.1 Principais temas atacados em sede de Ação Civil Pública no município de Viamão. 3.1.1 Danos em razão de parcelamento de solo sem licenciamento ambiental. 3.1.2 Danos em razão de ocupação de área de preservação permanente. 3.1.3 Poluição sonora. 3.1.4 Dano decorrente de extração mineral irregular. 3.2 A eficácia das Ações Civis Públicas – dados estatísticos. Considerações finais.
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal da República Federativa do Brasil impõe a garantia do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, para as presentes e futuras gerações. Para tanto, a legislação nacional nos disponibiliza instrumentos pelos quais viabilizamos a proteção ambiental, dentre eles, a Ação Civil Pública, que é regida pela Lei nº 7.347/85 e objetiva, dentre outros direitos metaindividuais, o meio ambiente.
No entanto, se faz necessária a avaliação de sua eficácia, pois, sobre isto, surgem os seguintes questionamentos: até que ponto a Ação Civil Pública é eficaz frente ao dano ambiental? Este instrumento processual é capaz de socorrer o meio ambiente do dano sofrido e alcançar sua reparação?
A fim de responder tais questionamentos tomar-se-á por base casos ocorridos no Município de Viamão, escolhido por apresentar uma vasta problemática ambiental e um considerável número de Ações Civis Públicas ajuizadas. Destarte, na primeira parte deste trabalho serão apresentadas noções de responsabilidade civil por dano ambiental e meios de reparação dos eventos danosos. Na segunda, será trabalhada a Ação Civil Pública, evolução histórica, aspectos gerais da Lei nº 7.347/85, bem como algumas discussões doutrinárias sobre o instituto. Finalmente, a terceira parte se ocupará da pesquisa de Ações Civis Públicas em trâmite no Município de Viamão, através de breves relatos de casos de maior ocorrência no município, seguido de uma pesquisa por amostragem acerca de sua eficácia social, considerando tempo de trâmite, petição inicial, atores da ação, e a eficácia propriamente dita.
Importante sublinhar que o presente trabalho não pretende apontar as soluções para a problemática da tutela jurisdicional do meio ambiente, porém, poderá servir como fonte de pesquisa.
1. RESPONSABILIDADE CIVIL E DANO AMBIENTAL
O artigo 225[2] da Constituição Federal chancela a proteção do meio ambiente no país, e responsabiliza tanto o Poder Público quanto a coletividade nesta relação direito/dever. Assim, podemos dizer de forma interpretativa que a responsabilidade civil por dano ambiental – já prevista na Lei nº 6.938/81[3] – possui conteúdo axiológico[4] recepcionado pela Constituição Federal.
A seguir serão verificadas breves noções sobre dano ambiental, aproximando-se de seu conceito, da responsabilidade civil advinda do evento danoso ou da prevenção desse, bem como suas formas de reparação, consubstanciadas na reparação in natura, compensação ecológica e indenização, que, mais tarde, servirão como elementos para entendimento da Ação Civil Pública decorrente do dano ambiental.
1.1 DANO AMBIENTAL – CONCEITO
A Lei brasileira não cuidou de conceituar o dano ao meio ambiente[5], limitando-se a noções de degradação da qualidade ambiental – como “alteração adversa das características do meio ambiente”[6] – e de poluição – “degradação da qualidade ambiental resultante das atividades que direta ou indiretamente: a) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem estar da população; b) criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; c) afetem desfavoravelmente a biota; d) afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente; e) lancem matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos”[7].
Dessa forma, Édis Milaré[8], (alertando a finalidade eminentemente didática do conceito), diz ser o dano ambiental “a lesão aos recursos ambientais[9], com conseqüência de degradação – alteração adversa ou in pejus – do equilíbrio ecológico e da qualidade de vida”.
É importante ressaltar que nem toda alteração ecológica resulta em degradação ambiental. Inevitavelmente, a evolução mundial depende de modificações no ambiente, mas isso pode ser associado ao conceito de desenvolvimento sustentável, a fim de não culminar em dano. Nesse sentido, seria excessivo dizer que todas as alterações ambientais causam prejuízo, pois assim estaríamos negando a possibilidade de mudança e inovação, fadando o meio ambiente e o planeta ao imobilismo, o que é irreal[10].
Aquele que comete o dano ambiental por forma direta ou indireta por ele é responsável, respondendo administrativa, civil e penalmente pelo seu ato.
O próximo ponto a ser abordado tratará especificamente da responsabilidade civil, que está expressa no artigo 14, parágrafo 1º da Lei de Política Nacional do Meio Ambiente, termos em que “é obrigado, independente da existência de culpa, indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.
1.2 RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANO AMBIENTAL
A responsabilidade civil por danos causados ao meio ambiente pode ser definida como a obrigação que determinada pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responder por um ato omissivo ou comissivo que causa dano ou lesão ao meio ambiente e reparar tal dano de maneira in natura ou pecuniária.[11] Não obstante, cabe complementar que, dada complexidade da reparação do dano ambiental, há a necessidade primeira de preveni-lo “procurando, por meios eficazes, evitar o dano”[12].
A partir dessa premissa, destaca-se um princípio basilar do Direito Ambiental: o princípio do poluidor-pagador.
Ao contrário do que expressa o senso comum, o princípio do poluidor-pagador não indica a ação de “pagar para poder poluir”, pois não há meios de se estabelecer uma liceidade para a degradação ou poluição ambiental.
Podem ser identificadas duas órbitas de alcance deste princípio: a) busca evitar a ocorrência de danos ambientais, que seria um caráter preventivo; e b) ocorrido o dano, visa a sua reparação, em um aspecto repressivo[13]. Assim, cabe ao poluidor tanto o ônus de prevenir o dano que sua atividade possa ocasionar, quanto à objetividade na reparação do dano dela decorrente. Nas palavras de Antonio Herman Benjamim:
“Em termos de responsabilidade civil, dispõe a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente que “é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade”.
Trata-se, pois de responsabilidade civil objetiva, tanto no que se refere a danos pessoais (patrimoniais e morais) ou, na dicção da Lei, “danos causados a terceiros”, quando na hipótese de dano ambiental puro (“danos causados ao meio ambiente”). [14]
Ainda no que diz respeito aos princípios inerentes à responsabilidade civil ambiental, se faz importante destacar os princípios da prevenção e da reparação integral.
Etimologicamente, a palavra “prevenir” advém do latim praevenire, tendo como significado “agir antecipadamente”. Por conseguinte, o princípio da prevenção, aponta para a necessidade de evitar, na origem, as transformações prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente[15], o que vem a ser consagrado de acordo com o desenvolvimento de um país ou as opções tecnológicas[16], conforme dispõe o Princípio 8 da Declaração do Rio de Janeiro (1992), como segue:
“Para atingir o desenvolvimento sustentável e mais alta qualidade de vida para todos, os Estados devem reduzir e eliminar padrões insustentáveis de produção e promover políticas demográficas adequadas”.[17]
Na revisão doutrinária sobre princípios do Direito Ambiental também consta o princípio da precaução, o qual não deve ser confundido com o princípio da prevenção. Enquanto este se dá nos casos em que os impactos ambientais já são conhecidos, levando à obrigatoriedade de licenciamentos e estudos de impacto ambiental, por exemplo, aquele veda as intervenções no meio ambiente em que não se sabe o impacto ambiental possível ou sua inocuidade[18]. De acordo com Paulo Affonso Leme Machado,
“No princípio da prevenção previne-se porque se sabe quais as consequências de iniciar determinado ato, prosseguir com ele ou suprimi-lo. O nexo causal é cientificamente comprovado, é certo, decorre muitas vezes até da lógica.
No princípio da precaução previne-se porque não se pode saber quais as consequências que determinado ato, ou empreendimento, ou aplicação científica causarão ao meio ambiente no espaço e/ou no tempo, quais os reflexos ou conseqüências. Há incerteza científica não dirimida.”[19]
Outro princípio fundamental é o princípio da reparação integral[20] que significa que
“a lesão causada ao meio ambiente há de ser recuperada em sua integridade e qualquer norma jurídica que disponha em sentido contrário ou pretenda limitar o montante indenizatório a um teto máximo será inconstitucional”[21].
A norma infraconstitucional foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, tendo seu fundamento no artigo 225, parágrafo 3º, consagrando, assim, a responsabilidade objetiva em relação ao evento danoso. Isso importa dizer que a responsabilidade civil por dano ambiental possui os seguintes pressupostos: a) demonstração da existência do dano; e b) o nexo de causalidade. Assim, cabe ao causador do dano a integral reparação do bem lesado, independente da existência de culpa, chancelando a teoria objetiva.
Em relação à pessoa do poluidor, o caput do artigo 225 da Carta Maior preceitua que é dever do poder público e da coletividade preservar e defender o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. Destarte, a Constituição Federal abrange a todos, pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado como possíveis legitimados passivos da ação de responsabilidade civil por dano ambiental.
Conquanto a prevenção seja a melhor prática para defendermos o Planeta, ocorrido o dano se faz necessária sua reparação, que poderá se dar por via natural, compensação ecológica ou indenização em espécie, como será apresentado a seguir.
1.3 REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL
Uma vez confirmada a responsabilidade civil por um evento danoso, cabe ao seu autor a reparação integral do meio ambiente.
O parágrafo 3º do artigo 225 da Constituição Federal de 1988 e o parágrafo 1º, do artigo 14 da Lei nº 6.938/81 estabeleceram a responsabilidade objetiva do poluidor, desprezando o aspecto subjetivo do seu ato. Quanto ao limite dessa responsabilização a norma silenciou, culminando na responsabilidade sem culpa e indenização ilimitada[22]. Dessa forma vem à tona o princípio da indisponibilidade do interesse público na proteção do meio ambiente, impedindo a adoção de qualquer dispositivo que vise a limitar a reparabilidade de danos ambientais.
A reparação do dano ambiental poderá se dar através de três formas: a) recuperação in situ ou in natura; b) compensação ecológica; e c) indenização[23].
1.3.1 Recuperação in situ ou in natura
A restauração natural do meio ambiente não está em pé de igualdade com os demais meios de reparação ambiental. Isso porque a recuperação in natura deve ser a opção fundamental da responsabilização civil, uma vez que visa a reestruturar o bem lesado.
Seu fundamento legal pode ser encontrado na Constituição Federal (artigo 225, parágrafo 1º, inciso I), que incumbe ao Poder Público o dever de “preservar e restaurar os processos ecológicos e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas”. Além disso, se o objetivo maior da tutela constitucional ambiental é a preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações, nada mais racional que viabilizar a recuperação do próprio local degradado, visando a uma aproximação do status quo ante.
Logicamente o retorno ao status quo ante propriamente dito é uma tarefa praticamente impossível, pois dificilmente há um inventário ou estudo científico do local degradado antes da ocorrência do dano. Todavia, a reparação in natura pode ser implementada através de um projeto técnico de recuperação ambiental que vise a proporcionar os benefícios funcionais existentes no ecossistema anterior.
1.3.2 Compensação ecológica
Restando impossibilitada a recuperação in natura no local imediatamente atingido, a remediação do dano ambiental poderá se dar a partir da aplicação da compensação ecológica.
O termo ‘compensar’, segundo o Dicionário Aurélio[24], significa estabelecer equilíbrio entre; equilibrar, contrabalançar; reparar o dano. A partir desta proposição, Édis Milaré[25] conclui que compensar significa colocar um peso ou valor para suprir outro peso ou valor que tenha sido danificado, tirado, lesado. Destarte, a compensação ecológica pode ser definida como uma prática “consistente em uma área distinta de área degradada, tendo por objetivo assegurar a conservação de funções ecológicas equivalentes”[26].
A compensação ecológica tem precedentes históricos no Código Florestal (Lei nº 4.771/65), de maneira que instituiu no artigo 44, inciso III[27], a compensação da reserva legal por outra área de equivalente relevância ambiental. Marcelo Abelha Rodrigues[28] por seu turno, ao tratar da origem deste instituto, coloca em pauta o artigo 1º[29] da Resolução CONAMA nº 10/87, que prevê a compensação para os casos de licenciamento de atividades e obras de grande porte, o que veio a ser consagrado no ano 2000 pela Lei nº 9.985 (que instituiu o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – Snuc), em seu artigo 36, parágrafo1º[30].
O restabelecimento das funções ecológicas mediante a compensação ambiental poderá prever medidas de auto-regeneração ecológica – cabendo ao ser humano uma intervenção limitada ao acompanhamento e controle do ecossistema afetado – ou uma atuação mais ostensiva da atividade humana – como em caso de replantio de espécies, despoluição do solo e recursos hídricos, etc.. Outra opção é a conciliação de ambas as técnicas, mas o grande definidor da alternativa mais adequada será o caso concreto[31].
Há de se admitir, porém, que a compensação ecológica poderá ser apenas parcial, tanto no aspecto qualitativo quanto quantitativo. Isso porque uma vez danificado um ecossistema, dificilmente conseguiremos repor todas as funções ecológicas afetadas.
Por outro lado, a compensação é sobremaneira mais vantajosa em relação à indenização em espécie, posto que demanda na conservação do meio ambiente, na aplicação do princípio da responsabilidade civil e intergeracional, ainda que por via de equivalência.
1.3.3 Indenização
Apenas quando a reconstituição natural não seja viável é que se deve lançar mão da indenização em dinheiro. Por conseguinte, a reparação econômica deve ser entendida como uma forma subsidiária de sanar a lesão ambiental. [32]
O problema dessa forma de reparação é a quantificação econômica do dano ambiental. A avaliação de tal indenização deverá passar por critérios mínimos, como: 1º) sua posição na escala dos valores ético-jurídicos de toda uma comunidade; 2º) estágio do conhecimento científico e tecnológico de que depende intimamente; e 3º) pela suscetibilidade da reconstituição/regeneração do meio danificado, ou não[33]. Além disso, o arbitramento econômico do dano deverá partir do valor que seria gasto na reintegração natural do mesmo, incluindo as despesas feitas com os estudos prévios necessários, se esta fosse possível[34].
De qualquer modo, essa deverá ser a última alternativa de reparação ambiental, pois não há como contabilizar o valor do meio ambiente, exceto sob a ótica utilitarista, que fatalmente estaria reduzindo seu conteúdo ético, seu significado axiológico para a perpetuação da vida na Terra.
Com a finalidade de conferir eficácia à proteção ambiental e responsabilizar efetivamente os autores do dano ao meio ambiente, a legislação brasileira traz como um de seus principais instrumentos a Ação Civil Pública, matéria da qual se ocupará o próximo capítulo.
2 A AÇÃO CIVIL PÚBLICA NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE
Se o apelo à consciência já não basta para a garantia do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a evolução do Direito Ambiental trouxe consigo instrumentos jurisdicionais que visam a promover a defesa ambiental, chamando os eventuais agressores à sua real responsabilidade.
A Declaração do Rio/92 assinala em seu Princípio 10[35] a obrigação do Estado em proporcionar o acesso aos procedimentos judiciais, entre os quais o ressarcimento de danos e recursos pertinentes. Dentre os procedimentos para a tutela do meio ambiente, podemos destacar no Brasil a Ação Popular (ação que pode ser impetrada por qualquer cidadão visando anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural[36]); o Mandado de Segurança Coletivo (que visa à proteção de direito líquido e certo lesado ou ameaçado de lesão por ato de autoridade, conforme artigo 5º, incisos LXIX[37] e LXX[38], da Constituição Federal); e a Ação Civil Pública, objeto deste trabalho e que será abordada mais amplamente a partir do presente capítulo.
Importante enfatizar, preliminarmente, que a Ação Civil Pública é um instrumento de educação democrática, pois é um instituto de solução judicial e pacífica dos conflitos qualificados pela presença de direitos difusos e coletivos e tutelados pela Constituição Federal[39], que é a expressão máxima do Estado Democrático de Direito no Brasil.
A fim de esclarecer os mais variados aspectos da Ação Civil Pública, tanto em relação às suas características processuais quanto na sua aplicabilidade, este capítulo se iniciará pela gênese dos direitos fundamentais até sua tutela pela Ação Civil Pública. A título de esclarecimentos, será abordada a história da Ação Civil Pública, suas heranças do Direito Internacional bem como seu processo de criação no país. Por fim, os aspectos processuais deste instrumento, para que então, no terceiro capítulo, possamos analisar sua eficácia.
2.1 A AÇÃO CIVIL PÚBLICA NA TUTELA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS DE TERCEIRA DIMENSÃO
Retomando as lições de Orci Paulino Bretanha Teixeira[40] “os direitos podem ser examinados em gerações sucessivas”. A doutrina apresenta três gerações de direitos do homem, as quais são referenciadas como primeira, segunda e terceira geração. Essa sucessão de gerações se deve ao fato de que os direitos fundamentais surgiram da ideia de que era necessário proteger o ser humano contra a investida do Estado[41], inicialmente vinculada aos direitos de liberdade e igualdade, mas que, ao longo do tempo, passou por um processo evolutivo, cumulando com novos direitos fundamentais.
Não raramente a doutrina abre o questionamento acerca da nomenclatura utilizada na classificação dos direitos fundamentais: geração ou dimensão?
Segundo André Ramos Tavares[42], os autores que preferem o termo “geração” referem-se a ele como tendo o significado de sequência de direitos humanos. Entretanto, de acordo com Ingo Wolfgang Sarlet[43], o substantivo geração conduz à uma noção de substituição gradativa de um direito por outro, o que seria tecnicamente equivocado. Por esse motivo boa parte da doutrina aderiu ao vocábulo “dimensão”[44], pois este traduz o reconhecimento progressivo de novos direitos fundamentais, sem alternância e cumulando com aqueles já conhecidos.
Ante ao exposto, este trabalho adotará a terminologia “dimensões de direitos fundamentais”, concordando com a melhor propriedade dessa expressão, e justificando-se pela semântica de tais substantivos[45].
Feita a opção terminológica, passa-se a um conciso estudo acerca das dimensões de direito fundamental.
Os direitos fundamentais de primeira dimensão estão associados à fase inicial do constitucionalismo ocidental[46], isto é, são aqueles surgidos com o Estado liberal do século XVIII, sendo a primeira categoria de direitos humanos surgida, e que engloba, atualmente os chamados direitos individuais e direitos políticos.[47]
Seguindo uma inspiração jusnaturalista[48], podem ser elencados como de primeira dimensão os direitos à vida, à liberdade, à propriedade, e à igualdade perante a Lei. Em suma: os direitos de primeira dimensão têm como característica a exigência de abstenção do Estado de certas condutas que possam opor à dignidade da pessoa humana[49].
Ao contrário dos direitos fundamentais de primeira dimensão, os direitos de segunda dimensão são caracterizados por uma prestação positiva por parte do Estado, uma vez que não se quer evitar a sua intervenção, e sim uma liberdade por intermédio do Estado[50]. Assim, tal categoria diz respeito aos direitos sociais, culturais e econômicos, podendo citar como exemplo o direito ao trabalho, à proteção em caso de desemprego, ao salário mínimo, entre outros.
A terceira dimensão de direitos fundamentais é caracterizada pela sua titularidade coletiva ou difusa, como no caso do direito do consumidor e do direito ambiental. Esta dimensão pode ser denominada como de “direitos de solidariedade e de fraternidade”[51], pois traz como nota distintiva o desprendimento da figura do homem-indivíduo e vinculando-se à proteção de grupos humanos. Destarte, mesmo que os direitos de terceira dimensão estejam voltados para o ser humano, a preocupação aqui é com a esfera coletiva, ou seja, com o grupo social, sendo seus titulares indetermináveis, implicando incursionar pelo universo dos direitos difusos[52].
Ainda no que tange às dimensões dos direitos fundamentais, é importante registrar que alguns autores reconhecem uma quarta categoria, concernentes ao direito de democracia, à informação e ao pluralismo[53]. Todavia, tal posicionamento aguarda consagração na esfera do direito internacional e das ordens constitucionais internas[54].
Conforme citado anteriormente, o direito ambiental está inserido no rol de direitos fundamentais de terceira dimensão[55], e carece de instrumentos processuais que se destinem a protegê-lo e torná-lo efetivo. A Ação Civil Pública é um dos instrumentos que se destina à tutela desses direitos, pois está inserida no rol das garantias repressivas fundamentais e aptas a tutelar os direitos fundamentais, e, por conseguinte, o meio ambiente.
Desse modo, a sequência deste estudo se ocupará da Ação Civil Pública, que é consideerado o mais eficiente veículo de acesso à jurisdição na tutela ambiental[56].
2.2 AÇÃO CIVIL PÚBLICA: NOÇÕES PROPEDÊUTICAS.
A Ação Civil Pública é disciplinada pela Lei nº 7.347/85, e pode ser definida como
“o instrumento processual adequado para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico e por infrações da ordem econômica (artigo1º)[57], protegendo, assim, os interesses difusos da sociedade.”[58]
A tutela dos direitos difusos no Brasil foi influenciada por diversos movimentos e encontros internacionais, cuja temática envolvia a proteção jurídica dos direitos individuais e coletivos, como exemplo o Congresso de Pavia de 1974; o de Florença, em 1975; e o Congresso de Salermo, também em 1975. Em nível nacional podem ser destacados o trabalho de Ada Pellegrini Grinover, Barbosa Moreira e Waldemar Mariz, que culminou, num primeiro momento na Lei de Política Nacional do Meio Ambiente[59].
Apesar de a Lei nº 6.938/81 ser um dos grandes avanços na defesa do meio ambiente enquanto direito difuso, perdurava o clamor por uma tutela processual efetiva, porquanto surgiu, por meio de uma mescla de projetos, a Lei da Ação Civil Pública. O primeiro, com autoria de Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco e Waldemar Mariz de Oliveira, tinha por objetivo criar uma Lei processual para a defesa do meio ambiente, consoante com o artigo 14 da Lei nº 6.938/81. O segundo, de autoria de Nelson Nery Júnior, Édis Milaré e Antonio Augusto Mello de Carvalho Ferraz aproveitou as bases anteriores, e ampliou alguns aspectos, como a legitimidade ativa e o inquérito civil, adquirindo mais rápido o status de Lei[60].
Não obstante, importa destacar que os projetos que deram origem à Ação Civil Pública possuem como fonte inspiradora a class action, do direito anglo-saxão[61], conforme denuncia a própria exposição de motivos da Lei nº 7.347/85, fazendo alusão à Regra 23 da class ation norte-americana. De acordo com a Regra 23 da Federal Rules Civil Procedure, a propositura da class action possui como requisitos: a) um número expressivo de pessoas envolvidas, de modo a ser impraticável um litisconsórcio; b) um denominador comum em relação aos fatos e ao direito; c) a tipicidade dos interesses a serem reclamados; e c) a adequação da representatividade através de um dos membros desta classe. Destarte, a propositura de uma ação neste formato impediria uma “avalanche” de ações com o mesmo objeto, pedido e causa de pedir, decisões inconsistentes em relação à classe como um todo, além de evitar prejuízos a terceiros detentores dos mesmos interesses[62].
Embora a notável influência, cabe registrar que não há uma perfeita relação entre a Ação Civil Pública e a class action. Tal afirmação se dá em razão de que a primeira espécie de ação tem como objetivo os direitos difusos, metaindividuais. Já a segunda trata de uma representatividade de direitos de uma classe, isto é, de um volume significativos de legitimados, com direitos individuais, e que, para uma viabilidade processual mais justa e eficaz sua propositura se dá por via da representatividade.
Sancionada em 1985, a Lei das Ações Civis Pública veio preencher uma lacuna na legislação pátria, uma vez que instrumentalizou a operação de certos direitos então carentes de viabilização prática. Luiz Antonio Fleury Filho[63], referindo-se aos registros históricos do surgimento da Lei da Ação Civil Pública, relata que a intentio legis era sacramentar os direitos difusos “trazendo uma unção de perenidade ou, ao menos, de alguma transcendentalidade”, conforme ofício enviado por ele ao então presidente da República José Sarney, ao apresentar o projeto da Lei nº 7.347/85:
“A preocupação do central do projeto é a de disciplinar juridicamente e de defender instrumentos eficazes de defesa aos chamados interesses difusos. (…) Os interesses difusos de transcendental importância, estão ao desabrigo, sem qualquer meios de proteção jurisdicional, por que até agora a ninguém a Lei conferiu poderes para promover em juízo a sua defesa. (…) Daí, Sr. Presidente, a importância histórica da aguardada sanção, que, sem dúvida, virá resolver tão angustiante problema, atendendo aos mais legítimos anseios de toda a população, e dessa forma, harmonizando-se com o auspicioso ideário de Nova República!”[64]
Lançada então no mundo jurídico, a Ação Civil Pública merece uma breve discussão acerca de seu nomen iuris. Para muitos, o caráter “pública” estaria relacionado à legitimidade ativa da Ação Civil Pública, uma vez que, ao falar nesse instrumento, pensa-se imediatamente na atuação do Ministério Público. Todavia, o artigo 5º da Lei nº 7.347/85 enumera na legitimação ativa não só o Ministério Público, mas também autarquias, empresas públicas, fundações, sociedades de economia mista e algumas associações, além da inovação da Lei nº 11.448/07, trazendo para este rol a Defensoria Pública. Logo, não parece ser este o critério para a caracterização desta ação como pública[65].
Seguindo essa lógica, Édis Milaré complementa que o critério para a Ação Civil Pública ser identificada como ‘pública’ passa ser então o seu objeto[66]:
“Até a pouco entendíamos que quando se falava em ação civil pública se queria em verdade referir ao problema da legitimação, e não do direito substancial discutido em juízo. Ação civil pública, então, era aquela que tinha como titular uma parte pública – o Ministério Público. (…) Agora, porém, com a edição da Lei 7.347/85, que conferiu legitimidade para ação civil pública de tutela de alguns interesses difusos não só ao Ministério Público, mas também às entidades estatais, autárquicas paraestatais e às associações que especifica (artigo5º da Lei), novo posicionamento se impõe diante da questão”[67].
Superada a questão terminológica, passa-se aos estudos dos aspectos processuais da Ação Civil Pública.
2.3 ALGUNS ASPECTOS PROCESSUAIS DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA
A Lei das Ações Civis Públicas traz em seu bojo algumas peculiaridades e discussões doutrinárias no seu âmbito processual. Destarte, importante destacar nesse tópico alguns desses aspectos processuais relevantes da Ação Civil Pública, para fins de melhor entendimento do instituto.
2.3.1 A propositura da Ação: legitimidade, litisconsórcio, assistência e prescrição.
A legitimidade ativa da Ação Civil Pública, conforme mencionado anteriormente, está definida no artigo 5º[68] da Lei nº 7.347/85. No entanto, cabe neste momento mencionar algumas peculiaridades.
A primeira observação é pertinente ao rol de legitimados. Os sujeitos constantes no artigo 2º foram taxativamente enumerados, esclarecendo, assim, que não existem outros legitimados para propor a Ação Civil Pública, independentemente do interesse em discussão[69].
Recentemente, o artigo 5º da Lei nº 7.347/85 sofreu alterações trazidas pela Lei Federal nº 11.448/07, de forma que o rol de legitimados foi ampliado, trazendo para este grupo a Defensoria Pública e o Distrito Federal, que não constavam no texto original. Contudo, tal novidade, concernente à Defensoria Pública, não trouxe uma unanimidade na doutrina pátria.
A legitimidade da Defensoria Pública para o ajuizamento de demandas coletivas tem como escopo o verdadeiro acesso à justiça, conforme discorre André da Silva Ordacgy:
“A inovação legislativa trazida pela Lei nº. 11.448/07, consistente na legitimidade ativa da Defensoria na Ação Civil Pública, encontra eco nos reclames de um efetivo favorecimento do acesso à justiça aos hipossuficientes econômicos. Representa, na realidade, a valorização da Defensoria Pública enquanto instituição essencial á função jurisdicional do Estado, na forma dos artigos 5º, LXXIV[70] e 134, caput[71], da Constituição da República, consistindo em verdadeira integralização da assistência jurídica, antes restrita, com exceção do direito consumerista, à esfera individual do jurisdicionado.”[72]
No entanto, ao mesmo tempo em que a Carta Magna é o fundamento para quem defende a legitimidade da Defensoria Pública, ela também é o motivo para que autores como Voltaire de Lima Moraes descordem desta prerrogativa. Segundo o autor, a alteração do artigo 5º da Lei nº 7.347 é inconstitucional:
“Se assim é, como legitimar a Defensoria Pública para a tutela de interesses difusos, cujos titulares, sabidamente, são indeterminados (artigo81, parágrafo único, I, do CDC), não se podendo assim identificar quantos são necessitados e quantos não são? […]
Logo, se for aceita a legitimidade da Defensoria Pública para a defesa de interesses difusos, isso implica ampliar suas funções institucionais para defender em juízo não somente necessitados, mas também não-necessitados, em flagrante infringência ao disposto no artigo134. caput, da CF. Ademais, tendo o artigo 5º, LXXIV, da CF, disposto que o conceito de necessitados está vinculado à carência de recursos financeiros, descabe à norma infraconstitucional ampliar esse conceito”.[73]
Partindo da mesma premissa de Moraes, a Associação Nacional do Ministério Público ajuizou em agosto de 2007 a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3943-1, contra a legitimação da Defensoria Pública, ação esta que ainda está tramitando no Supremo Tribunal Federal.
Em outra perspectiva, há de se ressaltar o pensamento de Hugo Nigro Mazzilli que afirma ser recomendável que se amplie beneficamente o leque de legitimados ativos nas Ações Civis Públicas[74]. Contudo, há muito o que se discutir ainda sobre as tutelas coletivas e sua legitimidade, o que caberia, inclusive, ser abordado em trabalho específico.
Sobre a legitimidade das associações, vale dizer que estas possuem o requisito da pré-constituição há pelo menos um ano. Tal condição visa a assegurar um mínimo de seriedade na condução das demandas, evitando-se que se forme uma associação ad hoc, com a finalidade exclusiva de mover determinados pleitos, gerando, assim, condutas não recomendáveis sob o ponto de vista ético[75].
Ainda sobre as associações, sua legitimação processual só se perfectibilizará se guardar correspondência temática com o caso concreto. Assim, sendo ela a única proponente, e seu objeto de constituição incompatível com o interesse que pretende tutelar, será ela considerada como parte ilegítima, não satisfazendo as condições da ação, logo, inviabilizando-se tal propositura. Quando for o caso de litisconsórcio, a associação que não preencher o requisito da pertinência temática será excluída da ação. Por outro lado, não há necessidade de previsão estatutária explícita para que a associação se legitime para a defesa do meio ambiente, por exemplo, bastando-se que, dentre os valores pelos quais pugna, possa ser inferida tal particularidade[76].
Quanto ao litisconsórcio na Ação Civil Pública, há de se falar que o parágrafo 2º do artigo 5º da Lei nº 7.347/85 prevê expressamente a possibilidade de tal cumulação, tanto no polo ativo quanto no polo passivo. Assim, a sua propositura é concorrente e disjuntiva, ou seja, pode ser intentada pelos legitimados em conjunto ou separadamente. Além disso, o autor assegura que a propositura da ação, seja pela via individual ou pela via litisconsorcial, inibe a impetração de iniciativa idêntica pelos demais, gerando litispendência[77].
A grande discussão acerca do litisconsórcio no polo ativo, entretanto, reside na ação em conjunto dos Ministérios Públicos da União, Distrito Federal e Estados, conforme previsto no parágrafo 5º[78] do artigo 5º da Lei em comento.
Primeiramente pode ser afirmado que existe uma inadequação terminológica[79] em relação ao Ministério Público da União e do Distrito Federal, pois, conforme se depreende da leitura do parágrafo 5º[80] do artigo 5º da Lei nº 7.347, eles teriam uma legitimidade concorrente. Ora, consoante com o artigo 128[81] do texto constitucional, o Ministério Público da União compreende o Federal, o do Trabalho, o Militar, o do Distrito Federal e dos Territórios. Desta feita, não haveria como se falar em litisconsórcio entre o Ministério Público da União e o Ministério Público do Distrito Federal, uma vez que este último está contido no primeiro. Pedro da Silva Dinamarco[82] justifica tal inadequação em razão de que a Lei das Ações Civis Públicas é anterior à Constituição Federal, época em que Ministério Público da União ainda não compreendia o órgão do Distrito Federal. Todavia, Marcelo Abelha[83] contrapõe tal entendimento, já que o parágrafo em análise decorre do artigo 113[84] do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078/90), ou seja, posterior à promulgação da Carta Maior. Assim, podemos concluir que realmente há uma impropriedade quando ao litisconsórcio entre o Ministério Público Federal e o Ministério Público do Distrito Federal, uma vez que se trata do mesmo órgão.
Outra controvérsia doutrinária se estabelece acerca dos princípios institucionais da unidade e da indivisibilidade do Ministério Público, consagrados pelo artigo 127, parágrafo 1º[85] da Constituição Federal. Para João Batista de Almeida[86], tal litisconsórcio não se justifica, pois, segundo os princípios supracitados, o Ministério Público não pode se dividir em entidades autônomas e que se unem em determinadas demandas judiciais. Por outro lado, Pedro Dinamarco[87] e Motauri de Souza[88] entendem que os ditos princípios valem somente dentro de cada instituição, não havendo um “Ministério Público Nacional” que abarque todos, de forma una e indivisível. Destarte, o Ministério Público Federal é uno e indivisível, assim como o é o Ministério Público de cada um dos Estados, isoladamente.
Em análise crítica, são absolutamente compreensíveis ambas as linhas de argumentação. Por outro lado, porém, não se pode descartar a possibilidade deste debate trazer conflitos ou incompatibilidades entre os diferentes Ministérios Públicos, bem como uma insegurança e prejuízos à sociedade. Dessa forma, faz-se necessário um entendimento unificado sobre a matéria, para que tais discussões não deem margem para agravar a mora judicial discutindo-se legitimidade, enquanto o que está em voga é a emergência na defesa dos direitos coletivos. Nesse sentido, Kazuo Watanabe assinala:
“Desde que a defesa dos interesses e direitos difusos e coletivos esteja dentro das atribuições que a Lei confere a um órgão do Ministério Público, a este é dado atuar em qualquer das Justiças, até mesmo em atuação conjunta com um outro órgão do Ministério Público igualmente contemplado com a mesma atribuição. A alusão ao litisconsórcio é feita, precisamente, para consagrar a possibilidade dessa atuação conjunta, com o que se evitarão discussões doutrinárias estéreis a respeito do tema e, mais do que isto, um inútil e absurdo conflito de atribuições, que não raro revela muito mais uma disputa de vaidades do que defesa efetiva da atribuição privativa de um órgão do Ministério Público”.[89]
Embora a Lei nº 7.347/85 preveja expressamente a possibilidade de litisconsórcio, nada mencionou quanto à assistência. Entretanto, dada a relação guardada entre a Ação Civil Pública e a Ação Popular – sendo que nesta última é clara a possibilidade de assistência – Rodolfo Camargo Mancuso[90] entende como perfeitamente possível este instituto na Ação Civil Pública. No entanto, os co-legitimados que quiserem participar do processo intentado por outro deverão aparecer na relação processual na qualidade de assistentes litisconsorciais, uma vez que não é admitida em nosso sistema a constituição superveniente de litisconsórcio facultativo unitário[91].
Não obstante, é vedada a participação do particular, nem como assistente simples, nem como assistente litisconsorcial, uma vez que ele não está incluso no rol de legitimados[92]. Todavia, nada impede este particular de agir em defesa do meio ambiente, com fulcro no artigo 5º, LXXIII da Constituição Federal[93] por via da Ação Popular.
Uma vez proposta a Ação Civil Pública, está consignada no parágrafo 3º do artigo 5º a hipótese de desistência da ação, caso em que, sendo infundada, o Ministério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa. Abre-se aqui a possibilidade de substituição sucessiva[94] no polo ativo.
Dado o interesse social e supra-individual discutido na Ação Civil Pública, se quem desistir da ação for o Ministério Público, tem-se outra peculiaridade: poderá outro legitimado fazer o controle da desistência, porém, pelo seu atributo de fiscal da lei, pode o magistrado entendê-la como infundada. Dessa forma, ele remeterá os autos ao procurador geral de justiça, que, ou insistirá na desistência ou designará outro órgão do Ministério Público para assumir a titularidade da Ação Civil Pública.
Convém reafirmar que não é qualquer desistência que pressupõe a substituição no polo ativo, mas apenas a infundada[95].
Se o polo ativo possui tantas particularidades, o mesmo não ocorre com a legitimação passiva, em que qualquer pessoa, física ou jurídica, de direito público ou privado, poderá figurar como réu, já que todos são passíveis de infringir as normas de proteção ao meio ambiente. Todavia, o Poder Público poderá sempre figurar no polo passivo de qualquer demanda relacionada à reparação do meio ambiente, conforme ensina Édis Milaré:
“Se ele não for responsável por ter ocasionado diretamente o dano, por intermédio de um de seus agentes, o será ao menos solidariamente, por omissão no dever de fiscalizar e impedir que tais danos aconteçam. A propósito, vale lembrar que a Constituição Federal impôs ao Poder Público o dever de preservar e defender o meio ambiente para as presentes e futuras gerações.”[96]
Ante ao exposto, restará então ao Estado, o direito de regresso contra o causador direto do dano, ou contra o agente que, por culpa, deu causa à danosidade ambiental.[97]
Conforme já abordado no primeiro capítulo, a responsabilidade civil por dano ambiental pode ensejar a condenação em dinheiro e o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, além de que a responsabilidade aqui é objetiva. Ante ao exposto, a defesa do réu ficará restrita à demonstração de que ele não é o responsável pelo fato imputado; ou que não houve a ocorrência do dano; ou ainda, que a ocorrência não é lesiva ao meio ambiente.
Uma vez proferida a sentença, a Lei nº 7.347/85 dispõe que ela produzirá efeito erga omnes, exceto no caso em que ela for julgada improcedente. Nesta segunda hipótese, qualquer legitimado, munido de novas provas, poderá intentar nova ação com idêntico fundamento[98].
Vale destacar que com a edição da Lei nº 9.494/97[99], o efeito erga omnes foi restringido aos “limites da competência territorial do órgão prolator”, conforme seu artigo 2º[100]. Tal preceito atende ao princípio federativo, segundo o qual a decisão do Poder Judiciário de um Estado não pode demandar efeitos gerais a outro.
Um último questionamento circunda a propositura da Ação Civil Pública que visa à reparação do dano ambiental: qual o tempo de prescrição?
Em conformidade com os ensinamentos de Édis Milaré[101], a Ação Civil Pública não conta com disciplina específica em matéria prescricional. Porém tudo direciona à conclusão de que se trata de matéria imprescritível, o que pode ser justificado, por exemplo, com o tempo de manifestação das consequências de uma contaminação, que pode chegar à vários anos, não podendo ser estabelecido um prazo concreto.
2.3.2 Competência
O foro competente para processar e julgar a Ação Civil Pública é regulado pelo artigo 2º da Lei nº 7.347/85, segundo o qual, diz-se competente o foro onde houver ocorrido o dano, cujo juízo terá a competência funcional para processar e julgar a causa.
Na leitura de Rodolfo de Camargo Mancuso[102], o legislador tratou de fixar dois critérios para a determinação da competência: o local do fato e a competência funcional. No caso do local do fato tem-se uma competência relativa, posto que tal se dá em decorrência do interesse das partes e da facilidade na coleta de provas. Por outro lado, a competência funcional, estabelecida na segunda parte do artigo 2º, é uma competência absoluta[103], já que é firmada em razões de ordem pública, onde se prioriza o interesse do próprio processo[104].
Segundo os aspectos territorial e funcional, quando o dano se der nos limites de uma única comarca, o juízo competente será o do local do fato. Problema maior se verifica quando o dano ultrapassa as fronteiras desta única comarca, ou de um Estado, por não ser tão simples a determinação da competência.
Seguindo uma didática bastante objetiva, Álvaro Luiz Valery Mirra[105] preleciona que os danos ambientais que ultrapassam os limites da comarca ou do Estado, têm repercussão, respectivamente, estadual ou nacional, aplicando-se a regra do artigo 93, inciso II[106] do Código de Defesa do Consumidor, a qual prescreve como competente a Justiça Federal, cujo foro será o da capital do Estado ou do País. Se por ventura esses danos não forem considerados de alcance estadual ou nacional, aplica-se o disposto no artigo 2º da Lei das Ações Civis Públicas. Considera-se, nesse caso, como competente o foro de cada um dos territórios sujeitos ao dano, fixando-se um deles para conhecer e julgar a demanda pelo princípio da prevenção, conforme dispõe o artigo 219, caput[107] do Código de Processo Civil, combinado com o artigo 19[108] da Lei nº 7.347/85.
Quanto à competência em razão da pessoa litigante, não há prerrogativa de foro para julgamento da Ação Civil Pública, quando figurar como réu um Ministro de Estado ou o Presidente da República[109], conforme entendimento já acolhido pelo Supremo Tribunal Federal[110]. Quando se tratar da União, suas autarquias e empresas públicas como parte na ação, a causa correrá perante a Justiça Federal[111], cujo foro competente será o do Distrito Federal ou da Capital do Estado, conforme determina o artigo 109, inciso I[112] da Constituição Federal.
Por fim, podemos concluir que, em que pese a ideia do artigo 2º em dar competência ao juízo do local do dano (dada a facilidade de verificação de provas, bem como o contato com a comunidade atingida) a determinação da jurisdição por vezes deverá obedecer a critérios de organização judiciária, se sobrepondo à regra exarada pela Lei da Ação Civil Pública[113].
2.3.3 O inquérito civil e o compromisso de ajustamento de conduta
Ainda que o objeto deste trabalho resida na Ação Civil Pública propriamente dita, o inquérito civil e o compromisso de ajustamento de conduta, que se incluem na fase pré-processual da Ação Civil Pública, merecem uma breve menção.
O inquérito civil encontra fundamento legal no artigo 8º, parágrafo 1º[114] da Lei da Ação Civil Pública, sendo posteriormente recepcionado pela Carta Magna em seu artigo 129, inciso III[115]. Seu conceito e objeto são sintetizados por Hugo Nigro Mazzilli:
“Inquérito Civil é um procedimento administrativo investigatório a cargo do Ministério Público; seu objeto é a coleta de elementos de convicção que sirvam de base à propositura de uma Ação Civil Pública para a defesa de direitos transindividuais – ou seja, destina-se a colher elementos de convicção para que, à sua vista, o Ministério Público possa identificar ou não a hipótese em que a Lei exige sua iniciativa na propositura de uma Ação Civil Pública.”[116]
Mediante esta definição, podemos concluir que somente o Ministério público está autorizado a instaurar o inquérito civil, isto é, os demais legitimados para a propositura da Ação Civil Pública não poderão se utilizar deste instrumento pré-processual.
O inquérito civil possui três características: a) facultativo, já que o parágrafo 1º do artigo 8º emprega o verbo “poderá”, não deixando margem ao caráter da não obrigatoriedade; b) escrito, posto que todos os atos no curso do inquérito devem estar documentados, sob pena de diluir-se ao longo do tempo; e c) inquisitivo, uma vez que ele não se sujeita ao princípio do contraditório[117]. Porém, a estas características podem ser a instrumentalidade, a publicidade e a participatividade[118].
A instrumentalidade advém da ideia de que de nada servirá este procedimento se já existirem elementos suficientes para instruir ou inibir a Ação Civil Pública. A publicidade diz respeito ao dever do inquérito civil em ser público, posto que servirá de base para a propositura de uma ação que visa a tutelar direitos coletivos, e, por conseguinte, devendo seus titulares ter acesso às suas informações. Por fim, o inquérito civil deve ser participativo em razão de que a livre convicção do Ministério Público será viabilizada através de elementos que atestem uma situação mais próxima da verdade, ouvindo e permitindo que o inquirido tenha a dizer[119].
Basicamente o inquérito civil é composto por três fases: a instauração, a instrução e a conclusão[120].
A fase de instauração é a fase pela qual o inquérito civil ganha vida[121], podendo ser feita de ofício ou mediante representação. Dessa forma, o próprio Ministério Público pode instaurá-lo, como atividade ínsita às suas atribuições, bem como qualquer pessoa, seja física ou jurídica de direito público ou privado, que poderá representar à ele, sendo vedado o anonimato.
Uma vez instaurado, passa o inquérito civil para a fase de instrução. Essa fase nada mais é do que a colheita de provas pelo presidente do procedimento, a fim de serem apurados ou não os fatos que ensejam a propositura da Ação Civil Pública[122]. Nesta fase, dadas as prerrogativas conferidas ao Ministério Público, poderá ele notificar pessoas a comparecerem ao órgão inquisidor para prestar depoimento ou esclarecimentos. Além disso, poderá utilizar-se das requisições, que são ordens legais de apresentação de documentos, fornecimento de certidões ou realização de exames e perícias[123].
A última fase do inquérito civil é a sua conclusão. É nesta etapa que o Promotor de Justiça, ultimadas suas diligências, determina o arquivamento do feito ou se utiliza dele para instruir a Ação Civil Pública[124].
Outro instrumento importante da Lei das Ações Civis Públicas é a celebração do compromisso de ajustamento de conduta, que é uma espécie de transação[125] prevista no parágrafo 6º[126] do artigo 5º da Lei nº 7.347/85. A valia deste instrumento enquanto oportunidade de se reparar o dano sem se chegar ao extremo da via judicial é maciçamente comentada pela doutrina. Nas palavras de Isabella Franco Guerra[127] “o causador da lesão poderá reconhecer o seu erro e resolver usar a conduta que se revela nociva aos bens e interesses protegidos, restaurando a situação de equilíbrio, sem necessidade de chegar à via judicial”.
Ao contrário do inquérito civil, cuja legitimidade para instauração é exclusiva do Ministério Público, a legitimação para a realização do termo de ajustamento de conduta é estendida aos órgãos públicos legitimados, de modo que entidades como o IBAMA e as Secretarias Municipais de Meio Ambiente, por exemplo, poderão propor este mecanismo, coma propriedade de quem vivencia de forma mais direta o caso concreto.
Conforme Daniel Roberto Fink[128], o termo de compromisso de ajustamento de conduta deverá ser composto por alguns elementos mínimos, quais sejam: a) preâmbulo, em que deverão ser qualificadas as partes e mencionado expressamente que se trata de termo de ajustamento de conduta; b) identificação dos fatos e circunstâncias, como os danos ocorridos ou aqueles que se quer evitar; c) as obrigações e a forma de seu cumprimento; d) os prazos que determinam o vencimento da obrigação; e e) as cláusulas penais cabíveis.
Um fator de extrema relevância é a qualidade de título executivo extrajudicial conferido ao termo de ajustamento de conduta pelo parágrafo em questão. Assim, em caso de descumprimento deste pacto, tem-se um método mais célere na execução da obrigação, evitando-se o processo de conhecimento.
Por fim, há de se concordar com Daniel Fink[129] quando afirma a vantagem do ajustamento de conduta em relação ao processo judicial. Isso porque este instrumento viabiliza uma real possibilidade de se evitar o dano ou repará-lo sem que se precise lançar mão de um artifício moroso, desgastante e caro como é o processo judicial, no qual quem sairá perdendo é a humanidade como um todo.
Embora reconhecida como principal instrumento de tutela do meio ambiente, a partir do próximo capítulo será feita uma análise de situações fáticas, a fim de se verificar a eficácia da Ação Civil Pública no caso concreto.
3 A EFICÁCIA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA FRENTE AO DANO AMBIENTAL – ESTUDO DE CASOS OCORRIDOS NO MUNICÍPIO DE VIAMÃO
Feita a aproximação teórica em relação à responsabilidade civil ambiental e a Ação Civil Pública, é chegada a hora de se verificar até que ponto este instrumento processual de tutela do meio ambiente é eficaz. No entanto, cabe, preliminarmente, esclarecer acerca de qual o sentido de eficácia será abordado.
Ao se estudar a eficácia de instrumentos processuais, imediatamente reporta-se para a classificação da eficácia da sentença, e quem sabe, recordar os ensinamentos de Pontes de Miranda[130]. Contudo, o foco desta pesquisa visa identificar a eficácia social da Ação Civil Pública. José Afonso da Silva[131], ao falar sobre a aplicabilidade das normas constitucionais, ressalta que “a eficácia social designa uma efetiva conduta acorde com a prevista pela norma; refere-se ao fato de que a norma é realmente obedecida e aplicada”. Para o objetivo deste trabalho pode-se dizer que, o que se busca, é um olhar acerca dos resultados práticos, in loco, da sentença da Ação Civil Pública, e, fazendo-se uma analogia com a eficácia social da norma de Silva, pode-se dizer que este trabalho visa verificar a efetiva conduta de acordo a norma estabelecida para o caso concreto, e efetivamente sendo aplicada em favor do meio ambiente, alterando o mundo dos fatos.
Para tanto, tomar-se-á por base casos ocorridos no Município de Viamão, que deram origem ao ajuizamento de dezenas de Ações Civis Públicas.
Localizado há dez quilômetros de Porto Alegre, o Município de Viamão foi fundado em 1741, passando a ser sede do governo do Estado no período de 1763 a 1773. Possui uma área territorial de aproximadamente 1.500Km², um orçamento anual no valor aproximado de 230 milhões de reais[132], e, conforme o censo/2007, conta com uma população que ultrapassa os 250 mil habitantes[133].
O Município foi escolhido por apresentar uma vasta biodiversidade. Está dividido em três grandes bacias hidrográficas: do Lago Guaíba, do Rio Gravataí e da Laguna dos Patos; e possui desde morros graníticos até extensas áreas de banhado[134]. É sede do Parque Estadual de Itapuã e do Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos, guardando, inclusive, espécies em extinção. Em termos de patrimônio histórico conta com a Igreja Nossa Senhora da Conceição, que desde 1938 é tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (IPHAN)[135].
A problemática ambiental do município está em toda a sua extensão, seja nas áreas urbanas, seja nas áreas rurais. Consiste basicamente em contenção ou desvios de curso d’água para irrigação de lavouras, parcelamento irregular do solo, ocupação de áreas de preservação permanente e falta de infra-estrutura urbana, com grande percentual de residências lançando efluentes cloacais a céu aberto ou em recursos hídricos, servindo de fato gerador para diversas Ações Civis Públicas.
Atualmente, tramitam no foro de Viamão mais de quarenta Ações Civis Públicas cuja temática trata de dano ambiental, o que leva ao estudo por amostragem. Além disso, para melhor análise das diferentes situações, os casos selecionados estão agrupados conforme seu objeto e procedimento adotado.
3.1 PRINCIPAIS TEMAS ATACADOS EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA NO MUNICÍPIO DE VIAMÃO
Nesse primeiro momento do estudo de casos, a abordagem estará focada nos principais assuntos encontrados nas Ações Civis Públicas do município de Viamão. Isso porque se faz necessário a demonstração da realidade ambiental da cidade, bem como suas peculiaridades, uma vez que os danos ambientais têm, via de regra, as mesmas origens.
Nessa esteira pretende-se demonstrar nessa etapa os principais grupos temáticos, como parcelamento de solo irregular e despejo de efluentes cloacais em recursos hídricos, por exemplo, seguidos de casos-paradigma, com objetivo de ser verificado no caso concreto qual o procedimento adotado bem como qual a solução ao dano ambiental propriamente dito.
3.1.1 Danos em razão de parcelamento de solo sem licenciamento ambiental
A cidade de Viamão é caracterizada pela ocupação irregular do solo. Além de invasões em grande escala de propriedades privadas ou em áreas de preservação permanente, é comum o surgimento de empreendimentos clandestinos em forma de loteamentos.
Nesse sentido podemos citar vários desmembramentos irregulares, como os loteamentos denominados “Paraíso dos Coqueiros”[136], “Pomar da Estância”[137], “Condomínio Ferradura”[138], “Querência da Figueira”[139], “Bonanza”[140], “Itaparica do Sul”[141], “Rancho Califórnia”[142] e “Haras de Águas Claras”[143], além de muitos outros que não poderão ser abordados neste trabalho. Todos esses empreendimentos são objetos de Ação Civil Pública no foro de Viamão, e fundamentalmente têm igual fundamentação, causa de pedir e pedido, conforme será abordado na sequência.
Sob óptica ambiental, os loteamentos devem ser precedidos de estudo prévio de impacto ambiental e seu respectivo licenciamento, uma vez que se trata de atividade potencialmente causadora de degradação do meio ambiente.
O artigo 10[144], caput e parágrafo 1º, da Lei n.º 6.938/81 já mencionava a necessidade do prévio licenciamento ambiental para implantação de loteamentos, o que mais tarde foi reafirmado pelo artigo 2º[145] da Resolução CONAMA n.º 237/97. Ademais, o Anexo 1[146] da referida resolução arrola os empreendimentos de parcelamento do solo como aqueles sujeitos ao licenciamento ambiental. No mesmo sentido, a Resolução CONSEMA nº 005/98 especifica a necessidade de licenciamento para o parcelamento de solo, tanto na modalidade residencial, quanto em sítios e condomínios uni ou plurifamiliares.
Toda esta normatização tem uma única razão de ser: proteger o meio ambiente do amadorismo e da ganância dos loteadores, para que não sejam provocados danos irreversíveis ou de difícil reparação. Vale destacar que o parcelamento de solo é uma atividade potencialmente causadora de degradação ambiental.
A fundamentação supracitada foi integralmente argüida pela Promotoria de Justiça responsável pela propositura das referidas Ações Civis Públicas. Inclusive, em preliminar, o Ministério Público deixou consignado como objeto do feito “a salvaguarda da legislação ambiental”. Entretanto, um fato deveras curioso: ao fazer o pedido na petição inicial em nenhum momento o meio ambiente é referido, seja como objeto de reparação, ou, pelo menos, como objeto de investigação de possível ocorrência de dano através de avaliação técnica.
Com relação aos loteamentos Paraíso dos Coqueiros, Pomar da Estância, Condomínio Ferradura, Querência da Figueira e Condomínio Bonanza, o pedido se restringiu a: a) declaração de nulidade dos contratos de compra e venda existentes; b) Abstenção dos réus em realizar vendas ou quaisquer outros negócios jurídicos que impliquem em venda ou alienação dos lotes ou frações idéias; receber prestações vencidas ou vincendas; praticar novos parcelamentos de solo ou transformação física dos imóveis; c) Indenização dos prejuízos causados aos adquirentes; d) Regularização integral do loteamento; e e) Pagamento de multa diária no caso de descumprimento da obrigação de não fazer, convertido ao Fundo Estadual de Reparação de Interesses Difusos Lesados.
Os pedidos concernentes aos empreendimentos Itaparica do Sul, Rancho Califórnia e Haras de Águas Claras, o pedido limitou-se a: a) comprovar a aprovação do projeto de loteamento; b) comprovar o registro do loteamento; c) executar itens de infra-estrutura urbana, no que tange a esgotamento pluvial e cloacal; pavimentação da via pública; guias das calçadas e sarjetas; coleta de lixo; iluminação pública; condições para o fornecimento de energia elétrica. d) que possíveis sanções pecuniárias sejam revertidas ao Fundo Municipal de Meio Ambiente.
Embora a regularização do loteamento pressuponha o licenciamento ambiental, não se pode esquecer que efetivamente o parcelamento do solo já fora executado, devendo então ser analisado o impacto ambiental gerado pelo empreendimento, o que deveria constar mais claramente na inicial, consolidando o objetivo de salvaguarda do meio ambiente. Ademais, trata-se de uma região rica em vegetação nativa, bem como recursos hídricos, e, a partir dessa premissa, se pode inferir que a possibilidade de degradação ambiental é considerável.
Mediante tais fatos não há sequer necessidade de verificar aspectos como andamento dos processos e lapso temporal entre a instauração dos inquéritos civis e decisão dos feitos. De plano, já se pode concluir que houve sim uma incompatibilidade entre o objeto a salvaguardar e o pedido, de modo que, se o intuito era tutelar o meio ambiente, tal eficácia não fora alcançada pela propositura destas ações.
3.1.2 Danos em razão de ocupação de área de preservação permanente
A falta de fiscalização por parte da municipalidade e a baixa renda de boa parte da comunidade viamonense[147] fazem com que a saga da ocupação desordenada e irregular do solo alcance as áreas de preservação permanente. É o caso da Rua das Rochas[148] e da Rua Gonçalves Dias[149].
O primeiro caso – Rua das Rochas[150], na vila Aparecida – trata de ocupações em áreas de morro, reconhecida como área de preservação permanente, onde dezenas de moradias estão construídas sobre talvegues[151], causando risco de desmoronamento, colocando em perigo a vida dos moradores do local.
Nos autos da Ação Civil Pública o próprio Município reconhece a irregularidade, e aponta como solução a retirada das famílias e sua realocação em locais seguros, para posteriormente recuperar os danos ambientais. Todavia, no mesmo ato em que admitiu o problema, negou a viabilidade financeira de colocar em prática aquilo que ele mesmo sugeriu. Destarte, não houve acordo com o Ministério Público, que optou pelo prosseguimento da ação.
A sentença neste caso foi proferida aproximadamente dois anos depois da propositura da ação – a propósito, tempo suficiente para a ocorrência de um sinistro de grandes proporções – onde o Município foi condenado a retirar as famílias do local num prazo de até dois anos, e a elaborar projeto de recuperação ambiental, cuja execução deveria ser iniciada imediatamente após a remoção das residências.
Até esta etapa, pode-se dizer que o diagnóstico ambiental é condizente com o pedido, bem como a sentença proferida.
Passado o período de dois anos em que o município teve de prazo para o cumprimento espontâneo da sentença, na data de 04 de setembro de 2009, mediante pedido do Ministério Público, a juíza mandou intimar a ré para comprovar as ações determinadas pela sentença, motivo pelo qual o processo continua em andamento.
Se no primeiro caso o risco era de desmoronamento, no caso da Rua Gonçalves Dias, na Vila Cinco Irmãos, o perigo é de inundação, dada a ocupação da área de preservação permanente adjacente ao recurso hídrico.
Segundo o relatório da Divisão de Assessoramento Técnico do Ministério Público nos autos da Ação Civil Pública, as residências construídas à margem do curso d’água estão situadas em local considerado de alto risco de alagamento, além de confirmar a ocupação de área de preservação permanente. Dessa forma, pediu a Promotoria que o Município fosse condenado a remover as famílias e reparar o dano ambiental ocorrido, uma vez que, além das construções, as economias despejavam seus efluentes cloacais diretamente no recurso hídrico. A sentença foi proferida em novembro de 2008, sendo reconhecida como procedente.
Contudo, tal investigação foi originada através do Inquérito Civil nº 028/2004, e hoje conta mais de cinco anos, sem que nada tenha sido modificado de fato no local.
Em sede de antecipação de tutela, o Ministério Público requereu a colocação de três placas informativas alertando a população que se trata de área de preservação permanente e de risco de inundação, bem como uma permanente fiscalização do município impedindo novas construções no local. Ora, se formos avaliar a questão objetiva do pedido, em termos ambientais podemos dizer que são medidas meramente paliativas.
Em conversa[152] com o Secretário Municipal de Gestão e Relações Institucionais do Município, o senhor Jussemar da Silva relatou a preocupação do executivo municipal com o meio ambiente, e que iriam utilizar verba do PAC – Programa de Aceleração do Crescimento, do Governo Federal – para a realização de diversas obras que visam “beneficiar” o meio ambiente. Contudo, quando perguntado sobre os casos específicos em que o Município fora condenado a remover famílias e recuperar áreas degradadas, os mesmos não estavam neste projeto, além de ser arguida a indisponibilidade financeira.
Destarte, podemos concluir que o Município se quer tem previsão de executar as sentenças, o que remeterá para uma nova fase processual, que demandará um tempo ainda maior para conclusão do processo, enquanto na Rua das Rochas e na Rua Gonçalves Dias as famílias continuam despejando seus efluentes domésticos nos recursos hídricos, transformando-os em grandes esgotos a céu aberto, promovendo o desmatamento da região, e ainda, sob a ameaça de morte por desmoronamentos ou inundações.
Ademais, o não cumprimento da sentença demandará astreintes, gerando uma questão intrigante: o município passa a pagar multas diárias até que se remova as famílias e recupere a área, medidas que o município ainda não adotou alegando indisponibilidade financeira.
3.1.3 Poluição sonora
Outro caso típico no Município de Viamão é a poluição sonora decorrente de atividades noturnas de bares, restaurantes e salões de baile. Como exemplo dessa atividade pode ser citada uma sociedade recreativa denominada “Clube Lomba do Sabão”[153], a qual promovia festas noturnas com som mecânico e música ao vivo sem os devidos licenciamentos, e, logicamente, sem o isolamento acústico do local, ferramenta esta que evitaria a poluição sonora.
Tais eventos foram denunciados por moradores lindeiros. O Ministério Público local chamou os responsáveis pela sociedade e firmou um compromisso de ajustamento de conduta, que restou ineficaz. Dessa forma, a Promotoria de Justiça Especializada postulou no ano de 2005 uma Ação Civil Pública com fulcro no artigo 3º, inciso II[154], da Lei nº 6.938/81, em razão da degradação da qualidade de vida em decorrência da poluição sonora.
No mês de novembro de 2006 foi proferida a sentença, sendo a mesma procedente no sentido de condenar o réu a abster-se de promover qualquer atividade que envolvesse música ao vivo ou som mecânico, até que se implementasse o projeto de isolamento acústico.
Embora o réu tenha interposto recurso de apelação, mais uma vez não obteve êxito, tendo sido ela improvida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Assim, em decorrência ou não do resultado negativo que obtivera, o proprietário decidiu encerrar as atividades do estabelecimento.
3.1.4 Dano ambiental decorrente de extração mineral irregular
A região de Itapuã em Viamão é rica em minerais como o granito ornamental. A abundância deste minério e seu bom valor comercial, fez com que alguns proprietários de imóveis da localidade denominada Horto das Oliveiras (na região de Itapuã) promovessem a extração destes recursos, porém, de forma ilegal, o que gerou a postulação de mais uma Ação Civil Pública[155].
No ano de 2002, o Batalhão de Polícia Ambiental realizou levantamento das explorações ilegais de recursos minerais em Itapuã, ocasião em que foi constatado que o réu estava fazendo extração de granito ornamental sem o devido licenciamento ambiental. Por esse motivo o requerido foi notificado para comparecer na Promotoria de Justiça Especializada de Viamão e, em junho de 2004, se comprometeu a recuperar as áreas degradadas, o que não foi cumprido. Novas tentativas de acordo foram realizadas, todas sem sucesso.
Não restou outra alternativa senão a postulação da Ação Civil Pública, na qual, em sede liminar foi requerida – e concedida – a proibição do réu de realizar qualquer exploração mineral no local descrito na inicial até que fosse apresentada a devida licença ambiental, sob pena de multa diária.
Após longa discussão judicial no dia 02 de outubro de 2009 do corrente ano foi proferida a sentença consubstanciada em: a) determinar, em caráter definitivo, a cessação das atividades de extração mineral, paralisando a retirada, o transporte ou a comercialização de substâncias minerais já extraídas ilegalmente, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), até o limite de R$ 100.000,00 (cem mil reais); b) promover a recuperação da área degradada indicada na inicial, mediante a apresentação e aprovação do projeto de recuperação, no prazo de 60 (sessenta) dias a contar do trânsito em julgado, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), até o limite de R$ 100.000,00 (cem mil reais); c) compensar os danos ambientais não passíveis de recuperação, mediante a doação de uma viatura ao Estado do Rio Grande do Sul.
Gize-se que tal sentença é bastante recente, e possivelmente demandará recursos, não havendo como precisar o final da lide processual e dificultando a constatação de sua eficácia.
3.2 A EFICÁCIA DAS AÇÕES CIVIS PÚBLICAS – DADOS ESTATÍSTICOS
Com a finalidade de apurar a eficácia das Ações Civis Públicas foi realizado um estudo estatístico por amostragem em um universo de trinta e cinco ações postuladas no Município de Viamão.
Nesse estudo todos os processos foram avaliados considerando os seguintes quesitos: a) objeto consubstanciado na salvaguarda da legislação ambiental; b) petição inicial coerente, compatibilizando fundamentação e pedido; c) partes, com o foco na Municipalidade como parte ré, individual ou em litisconsórcio; d) tempo de tramitação; e) eficácia da sentença in loco – eficácia social.
Do total de processos pesquisados, 49%[156] (quarenta e nove por cento) apresentaram falhas na petição inicial, de modo que, no objeto da peça ovo, foi ventilada a salvaguarda da legislação ambiental, e por ocasião do pedido nada constou em relação ao meio ambiente. É importante sublinhar que todas estas ações se referem a parcelamento irregular de solo, ou seja, loteamentos clandestinos. Conforme já mencionado no item 3.1 deste capítulo, os mesmos devem ser precedidos de licenciamento ambiental por serem atividades potencialmente degradadoras do meio ambiente.
Com relação aos agentes da lide, foi constado que em 63% (sessenta e três por cento) das Ações Civis Públicas o Município de Viamão é apontado no polo passivo. Na maior parte dos casos, o Município figura como réu por ter se omitido no seu poder de polícia administrativa, deixando de fiscalizar a execução de parcelamentos de solo, os estabelecimentos comerciais e a construção de edificações urbanas, bem como deixou de zelar pelas suas áreas de preservação permanente. Ademais, o Município firmou vários termos de ajustamento de conduta junto ao Ministério Público local, apenas postergando a solução dos problemas ambientais de Viamão, pois não cumprira a maior parte dos compromissos ora acordados. A propósito, o próprio município foi encontrado como agente causador direto do dano, removendo, em determinada ocasião, árvores imunes ao corte.
No quesito tempo de tramitação apenas foram avaliados os processos que ainda estão em andamento, ou seja, 29% (vinte e nove por cento) das Ações Civis Públicas pesquisadas. Destas, avaliando-se desde a instauração do inquérito civil, 80% (oitenta por cento) estão em trâmite há mais de cinco anos. Nesse período, os eventos danosos são continuados, posto que a maior parte trata de lançamento de efluentes cloacais em recursos hídricos ou ocupação de área de preservação permanente, o que agrava a situação a cada dia.
Tratando-se mais objetivamente da eficácia da Ação Civil Pública no local da ocorrência do dano ambiental, foi constado que em 14% (quatorze por cento) dos processos a petição inicial foi coerente, bem como a sentença foi procedente em favor da recuperação das áreas degradas, mas até o presente momento sem eficácia local. Isso porque são questões de recolocação de famílias em outras áreas para posterior restauração do meio ambiente, atividades para as quais governo municipal informa não possuir disponibilidade financeira. Assim, para que a eficácia destas ações seja alcançada, deverá ser interposta a execução judicial da sentença, o que não há como prever o tempo necessário para tal.
Por fim, o dado mais alarmante: apenas 9% (nove por cento) das Ações Civis Públicas pesquisadas foram consideradas como eficazes sob a perspectiva social, posto que alcançaram seu objetivo, fazendo cessar a ocorrência do dano e restaurar a qualidade ambiental. Numericamente, dos trinta e cinco processos pesquisados, apenas três foram eficazes, dois acerca de poluição sonora e um que tratava de maus tratos em animais.
Sob uma perspectiva mais ampla, pode-se inferir da pesquisa realizada que: a) 29% (vinte e nove por cento) dos casos podem ser considerados como inconclusivos, posto que ainda estão em andamento; b) 62% (sessenta e dois por cento) dos processos são ineficazes, considerando-se os processos com problemas na petição inicial, bem como aqueles que, embora tenham obtido êxito na sentença e a mesma tenha transitado em julgado, ainda dependem da sua execução judicial; c) apenas 9% (nove por cento) das Ações Civis Públicas podem ser consideradas eficazes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao falar na tutela processual de bens jurídicos logo remetemo-nos à busca do instrumento correto capaz de solucionar as adversidades encontradas. No entanto, pouco se pergunta se tal instrumento realmente cumpre com seu propósito.
Por outro lado, o meio ambiente ecologicamente equilibrado necessita utilizar-se da jurisdição, posto que, sem ele, em pouco tempo a humanidade se extinguirá, em razão da escassez dos recursos naturais básicos para sobrevivência do homem.
Associando-se os questionamentos acerca da eficácia dos instrumentos processuais à necessidade da proteção ambiental é que se formulou o presente trabalho, que procurou analisar a eficácia da Ação Civil Pública frente ao dano ambiental, uma vez que tal instrumento tem sido o mais utilizado na atualidade para tutelar o meio ambiente, através da responsabilidade civil.
Para isso, no primeiro capítulo se ocupou de apresentar os principais conceitos acerca da responsabilidade civil pelo dano ao meio ambiente, quais sejam, responsabilidade objetiva e obrigatoriedade de reparação do dano de forma in natura, por compensação ou indenização, como forma de dar suporte ao tema principal.
No segundo capítulo foi exposta a Ação Civil Pública, suas influências internacionais, história e aspectos processuais. A Ação Civil Pública adveio do clamor por uma tutela processual capaz de concretizar os direitos e obrigações consignados na Lei nº 6.938/81 – da Política Nacional do Meio Ambiente. Dessa forma, no ano de 1985 surgiu a tão esperada Lei das Ações Civis Públicas – Lei nº 7.347/85 – com o objetivo de salvaguardar interesses metaindividuais.
Segundo alguns autores este instrumento tornou-se o mais utilizado na tutela jurisdicional do meio ambiente, através da responsabilização civil pelo dano ambiental, sendo, também, o mais eficiente. No entanto, faz-se necessária a reavaliação deste instrumento, a fim de ser verificada a sua eficácia, e este foi o objeto do terceiro capítulo.
Destarte, o terceiro capítulo partiu da premissa na qual as Ações Civis Públicas não alcançariam sua eficácia social frente ao dano ambiental, tanto pela difícil reparação desta categoria de danos, quanto pela (de)mora processual. Para tanto, desenvolveu-se um estudo de casos ocorridos no Município de Viamão, no Rio Grande do Sul, onde no primeiro momento foram verificados os principais assuntos judicializados em termos ambientais, para, em seguida, apresentar um estudo estatístico dos referidos processos. Pelo grande volume de Ações Civis Públicas tramitando no foro da Comarca de Viamão, as análises tiveram que ser feitas por amostragem, cingindo-se a um universo de trinta e cinco ações.
No estudo temático foi verificado que os principais assuntos das Ações Civis Públicas com o objeto de salvaguarda da legislação ambiental consistem em: a) parcelamento de solo irregular; b) danos em razão de ocupação de áreas de preservação permanente; c) poluição sonora; e d) dano ambiental decorrente de extração mineral irregular.
Na verificação estatística a hipótese ora ventilada – qual seja, a ineficácia na Ação Civil Pública frente ao dano ambiental – pode ser confirmada, bem como puderam ser complementadas as suas causas.
Mais de 60% (sessenta por cento) das Ações Civis Públicas pesquisadas foram consideradas ineficazes, podendo ser apontadas as seguintes razões: a) difícil reparação do dano; b) (de)mora processual; c) falha do Ministério Público local na interposição da ação; d) negligência do governo municipal, consubstanciado em omissão no cumprimento das sentenças; e) ação danosa por parte da própria gestão municipal.
Ante tal diagnóstico, faz-se necessário o aprofundamento nesse estudo, bem como o apontamento de soluções, posto que, tal como tem se apresentado, nem a população em geral, nem o Estado têm cumprido com o dever intergeracional de preservação do meio ambiente. Contudo, pela relevância de tal estudo, é preciso que tal tema seja abordado em trabalho com maior abrangência.
A permanência da vida humana na Terra depende de um conjunto de condições essenciais para que a natureza possa cumprir seu ciclo, e os seres que sobre o Planeta habitam possam coexistir. Para isso, é necessária a preservação de uma biosfera saudável com todos os seus sistemas ecológicos, sendo o ser humano entendido como parte dela.
Assim, a busca do equilíbrio ambiental é uma obrigação de todos, e o homem, como ser racional que é, tem o dever de responsabilizar-se pelas presentes e futuras gerações, não só como um dever legal, mas também como um dever moral, pela dignidade da vida terrestre e pelo seu compromisso com o Criador.
Informações Sobre o Autor
Ana Laura Lima Gomes
Acadêmica de Direito na pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul