A ilegalidade da prova e o direito da personalidade no direito do trabalho

1. Conceito de Prova Ilegal


O art. 5º, LVI, CF, assegura que são inadmissíveis no processo as provas obtidas por meios ilícitos. Pela influência da norma constitucional, de maneira geral a expressão “prova ilícita” abrange toda e qualquer prova inadmissível no processo.


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

No plano infraconstitucional, o art. 332, CPC, indica que todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados no código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.


Adotaremos a expressão “prova ilegal”[1] como gênero, abrangendo as espécies: a) prova ilícita, como aquela viola norma de direito material; b) prova ilegítima, a qual não respeita norma de cunho processual.[2]


A respeito da admissibilidade da prova ilegal no curso do processo, há três correntes doutrinárias:


a) obstativa: em hipótese alguma admite a prova que seja obtida por meio ilícito. Para essa corrente, temos a posição doutrinária quanto à teoria do fruto da árvore envenenada[3] (the fruit of poisonous tree), isto é, consideram-se ilícitas não só a prova diretamente obtida com a prática do ato ilícito como também as demais que sejam originárias desta prova;[4]


b) permissiva: a prova há de ser aceita visto que ilícito não é o seu conteúdo e sim o meio de sua obtenção. Portanto, quem deve ser punido é quem praticou o ato ilícito com o devido aproveitamento do seu conteúdo probatório;


c) intermediária: a prova ilícita há de ser combatida, mas, diante do caso concreto e de acordo com os interesses relacionados com a prova produzida. Admite-se a prova ilícita como forma de se valorar o interesse que mereça uma proteção mais adequada pela ordem jurídica. Trata-se da aplicação do princípio da proporcionalidade.[5] Diante dos interesses discutidos (a ilicitude da prova e os fatos que necessitam da prova ilícita para a demonstração da sua verdade), deixa-se de lado a ilicitude e entende-se por aplicável a prova ao caso concreto para a tutela do interesse. Exemplos: a conversa telefônica gravada por um dos interlocutores, sem a anuência do outro, quando se discutem fatos relacionados com a guarda dos filhos.


2. Direito da Personalidade e o Direito do Trabalho


O termo “pessoa”[6] pode ser visto em três acepções distintas: a) vulgar – sinônimo de ser humano; b) filosófica – o ente, dotado da razão, que realiza atos de forma consciente. Essa visão é aplicável ao homem ou a qualquer coletividade; c) jurídica, como sujeito de direito.


Os sujeitos de direito são os que participam da relação jurídica, como titulares de direitos e deveres, ou seja, as pessoas naturais e as pessoas jurídicas, grupos de pessoas ou de bens a quem o Direito atribui a titularidade jurídica. No Direito moderno, “todo ser humano é pessoa no sentido jurídico. Mas, além dos homens, são também dotadas de personalidade certas organizações ou coletividades, que tendem a consecução de fins comuns. Nessas condições, presente determinado direito, há de existir forçosamente um sujeito que lhe detenha a titularidade. Esse sujeito pode ser o homem, individualmente, ou um agrupamento mais ou menos numeroso de homens, animados ou inspirados por fins e interesses comuns. Duas, por conseguinte, as espécies de pessoas reconhecidas pela ordem jurídica: a pessoa natural, também chamada pessoa física (o homem, ou melhor, o ente humano, o ser humano), e a pessoa jurídica, igualmente denominada pessoa moral ou pessoa coletiva (agrupamentos humanos visando a fins de interesse comum).”[7]


Personalidade é a aptidão reconhecida pela ordem jurídica para que alguém exerça direitos e obrigações. Não se trata de um direito e sim de um conceito sobre o qual se apóiam os direitos e deveres que dela irradiam.


Ao discorrer sobre a personalidade, Maria Helena Diniz[8] afirma: “O direito objetivo autoriza a pessoa a defender sua personalidade, de forma que, para Goffredo Telles Jr., os direitos da personalidade são os direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a identidade, a liberdade, a sociabilidade, a reputação, a honra, a autoria etc. Por outras palavras, os direitos de personalidade são direitos comuns da existência, porque são simples permissões dadas pela norma jurídica, a cada pessoal, de defender um bem que a natureza lhe deu, de maneira primordial e direta.


Rubens Limongi França apresentou, cientificamente, a estrutura da especificação e classificação dos direitos da personalidade, assim formulada: os direitos de personalidade são direitos de defender: 1) a integridade física: a vida (a concepção e a descendência – gene artificial, inseminação artificial ou de proveta; o nascimento – aborto; o planejamento familiar – limitação de filhos; a proteção do menor pela família ou pela sociedade; a habilitação; a educação; o trabalho; o transporte adequado; a segurança física; o aspecto físico da estética humana; a proteção médica e hospitalar; o meio ambiente ecológico; o sossego; o lazer; o desenvolvimento vocacional profissional e artístico; a liberdade física; o prolongamento artificial da vida; a reanimação; a velhice digna), os alimentos, o próprio corpo vivo ou morto, o corpo alheio vivo ou morto, as partes separadas do corpo vivo ou morto (o espermatozóide; o óvulo; o uso do útero para procriação alheia; o exame médico; a transfusão ou a alienação de sangue; o transplante; a experiência científica; o transexualismo; a mudança artificial do sexo; o débito conjugal; a liberdade física; o ‘passe’ esportivo; o sepulcro; a cremação; a utilização científica do cadáver; a doação de órgãos do corpo morto; o culto religioso no enterro); 2) a integridade intelectual: a liberdade de pensamento, a autoria científica, artística, literária e a atuação de esportista participante ou não de espetáculo público; 3) a integridade moral: a honra, a honorificência, o recato, o segredo pessoal, doméstico, político, religioso e profissional, a imagem, a identidade pessoal, familiar e social (profissional, política e religiosa), a liberdade civil, política e religiosa; a segurança moral, a intimidade, o aspecto moral da estética humana, a identidade sexual, o nome, o título, o pseudônimo, a alcunha. Como se vê, destina-se a resguardar a dignidade humana, mediante sanções, que devem ser suscitadas pelo ofendido.”


3. Vida Privada e Intimidade


Do ponto de vista prático, as expressões “privacidade” e “intimidade” representam os direitos (art. 5º, X, CF) que a pessoa tem de se resguardar das intromissões de terceiros na sua vida.


Não se pode esquecer que o ser humano tem a vida privada e a intimidade.


A privacidade compreende todos os comportamentos e acontecimentos que o ser humano deseja que não sejam acessíveis a terceiros. Vale dizer, da sua vida privada somente participam as demais pessoas que o ser humano assim efetivamente o deseja, por manter com elas confiança ou por ter certa familiaridade. Portanto, privacidade englobaria a intimidade.


A intimidade relaciona-se com a existência de vínculos subjetivos de familiaridade e de amizade mais estreitos do ser humano. São os fatos e os acontecimentos mais íntimos, parte mesmo do que se denominam de segredos da vida particular e que são somente compartilhados com as pessoas mais chegadas.[9]


Diante da violação da privacidade ou da intimidade do empregado (e de qualquer trabalhador), tem-se a caracterização de um dano moral, o qual há de ser indenizado (art. 5º, X, CF; arts. 11 e 186, CC).


Como obrigação legal e contratual, no cotidiano da relação de trabalho, o empregador e o trabalhador devem ter o respeito mútuo, além de assegurar a não violação das respectivas privacidades. Mas, não se pode esquecer: a intimidade e a privacidade devem ser analisadas e respeitadas em cotejo com o poder diretivo do empregador.


Na gestão da atividade econômica, o empregador detém o que se denomina de poder diretivo, ou seja, o poder de dirigir, punir e fiscalizar a prestação de serviços de seus empregados.


Cabe ao empregador, como detentor dos meios de produção (a qual também é uma garantia constitucional – art. 5º, XXII)[10], planejar e estabelecer as metas quanto ao desempenho de sua atividade empresarial. Para tanto necessita disciplinar: como a função do sem empregado há de ser desempenhada; quais são as tarefas ou atribuições inerentes a uma determinada função; os horários de trabalho dos seus empregados etc.


Em várias situações ou condições, o empregado (mesmo tendo a garantia constitucional do respeito à sua vida privada ou a sua intimidade) tem que ceder para o poder diretivo do empregador. No desempenho de suas tarefas, o empregado há de ser pontual, assíduo, colaborador, diligente, atuar com boa-fé e com o espírito de colaboração.


No conflito de direito com proteção constitucional, diante do caso concreto, a proteção da privacidade e da intimidade pode sofre limitações quando se relacionarem com o desempenho profissional do empregado, não abrangendo em hipótese alguma, atos ou acontecimentos estranhos ao cotidiano da relação de trabalho.


Como a relação de emprego é uma relação calcada na confiança mútua entre o empregador e o empregado, o exercício do poder diretivo não pode extravasar os limites adequados e necessários para o bom gerenciamento da atividade empresarial. Se isso ocorrer, pela peculiaridade do extravasamento, poderá se ter à violação do direito do trabalhador quanto a sua privacidade ou intimidade.


Nos itens abaixo, analisaremos algumas situações concretas em que se tem a oposição do poder diretivo do empregador e o respeito à intimidade ou privacidade, como um dos direitos de personalidade do empregado, cotejando-se tais temas com as provas ilegais.


3.1. Seleção do Empregado


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Na admissão de empregados, várias práticas são adotadas, tais como: questionários, exames psicotécnicos e toxicológicos, testes grafológicos, astrologia etc.


O empregador tem o pleno direito de optar pelos meios de seleção que possam, de fato e de direito, avaliar as condições intelectuais do candidato para a função que vier a desempenhar e não, simplesmente, violentar sua privacidade ou sua intimidade. Vale dizer, os meios empregados haverão de ser adequados para a constatação da aptidão profissional do candidato (experiências anteriores, capacitação técnica, locais de trabalho anteriores etc.).[11]


Não é razoável que se tenha indagações ou perguntas relacionadas com a vida pessoal do trabalhador, a não ser que esteja vinculada com o cargo oferecido pela empresa, tais como: situação familiar, vida social, locais que procura para as suas diversões.


Por outro lado, há informações que não são admissíveis, sob pena de uma discriminação negativa (art. 7º, XXX): opção sexual, convicção religiosa, filiação sindical, origem étnica etc.


Dependendo do cargo a ser executado e das suas responsabilidades, torna-se razoável que o empregador faça os levantamentos de antecedentes criminais, como também de cartórios (protestos, distribuidor civil e criminal) do candidato.


“ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. POLICIAL MILITAR. VIDA PREGRESSA. AVERIGÜAÇÃO. VIABILIDADE. CONDIÇÕES DA AÇÃO. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. 1. Na seleção de candidatos ao cargo de policial militar lícita a apreciação de vida pregressa pela administração pública. Inteligência do artigo 11, da Lei nº 7.289/84. 2. Analisam-se as condições da ação pelos fatos narrados, não pelos provados. A impossibilidade jurídica do pedido, autorizadora da extinção do processo sem exame do mérito, corresponde à vedação absoluta, pela ordem jurídica, de acolhimento ao pleiteado pelo autor. A eventual inviabilidade de acatar-se o pleito, mercê de falha de pressupostos de natureza fática e isolada, implica improcedência da pretensão. Apelo não provido. Unânime” (TJDF – DF – 1ª T – APC 20020110491197 – Rel. Dês. Valter Xavier – DJU 17/12/2003 – p. 37).


Atualmente, na seleção de candidatos, as empresas têm adotado o polígrafo.[12] É muito discutível na ciência se o polígrafo, como aparelho, é confiável para a devida aferição se a pessoa que a ele é submetida está ou não dizendo a verdade.


A jurisprudência tem repudiado a adoção do polígrafo, seja como critério de seleção, seja como exigência para continuidade da manutenção do emprego.


“DANO MORAL. SUBMISSÃO DE EMPREGADO AO TESTE DO POLÍGRAFO. Configuração de violação da intimidade, da honra e da vida privada com perguntas sobre opção sexual, uso de drogas, prática de crimes e problemas com dependência alcoólica na família. Ofensa à imagem da pessoa com posteriores comentários em reuniões sobre o resultado desses exames. Caracterização de prática abusiva, gerando lesão ao ofendido passível de reparação pela via indenizatória. Recurso provido” (TRT – 2ª R – 6ª T – RO 01262-2002-316-02-00 – Rel. Rafael Pugliese Ribeiro – DOESP 13/1/2006).


 “DANO MORAL. USO DE POLÍGRAFO. TÉCNICA DE AVALIAÇÃO PARA FINS ADMISSIONAIS. CONSTRANGIMENTO PESSOAL. CARACTERIZAÇÃO. Uso de polígrafo, como instrumento técnico de avaliação, para fins admissionais de emprego. Configuração de dano moral. Por certo que o uso de meios técnicos, para fins de avaliação da idoneidade da pessoa, como critério inadequado e evidentemente falho, só por si, acaba por representar um ato de constrangimento pessoal – ainda que desprezado, aqui, o modus procedendi, de acoplagem de aparelhos capazes de identificar reações de sudorese, batimentos cardíacos e reações emocionais. Comprimido pela necessidade de um emprego, qualquer cidadão de melhor índole e sensibilidade, só pela certeza da falha desse critério e pelo receio de não vir a alcançar o objetivo perseguido, por certo que se encontra extremamente exposto a reações daquela ordem – sem que, nem por isso, as mesmas guardem qualquer relação com a meta da verdade perseguida. De tanto se pode concluir, pois, inequivocamente, tratar-se de método duplamente atentatório, contra a dignidade da pessoa: em si, como ato vexatório; e, quanto ao seu resultado, enquanto que eventualmente oposto à realidade examinada. A todos os títulos, portanto, afrontoso à privacidade da pessoa e que fere, frontalmente, a sua dignidade – substrato e fundamento do direito à reparação por ‘dano moral’, melhor dito dano não patrimonial” (TRT – 3ª R – 1ª T – RO 00298-2003-092-03-00-0 – Rel. Manuel Cândido Rodrigues – DJMG 30/4/2004 – p. 5).


CONTINUIDADE DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS CONDICIONADA A RESULTADO OBTIDO ATRAVÉS DE TESTE DE POLÍGRAFO (DETECTOR DE MENTIRAS). VIOLAÇÃO À INTIMIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. O polígrafo ou ‘detector de mentiras’ (lie-detector), máquina inventada no ano de 1.921, foi introduzida no Brasil nos anos sessenta e banida uma década depois. Registra, de forma simultânea, mudanças nos processos fisiológicos, através da medição de batidas do coração, respiração e pressão arterial. Parte-se da premissa de que, enquanto mentimos, sofremos alterações fisiológicas. Contudo, é sabido que indigitadas mudanças não derivam apenas de mentiras, mas também por causas diversas, como tristeza, timidez, angústia, entre outros. Fato concreto é que estudiosos do mundo todo são unânimes em asseverar que não há qualquer prova de que o polígrafo possa medir, de maneira inconteste, se o ser humano está mentindo ou sendo honesto, razão pela qual muitos países não têm admitido como meio de prova os resultados obtidos através de testes de polígrafos. Ademais, as perguntas formuladas pelo empregador não guardam qualquer relação com o vínculo empregatício mantido entre os litigantes e configuram notória violação aos termos expressamente consubstanciados pelo artigo 1º da Lei nº 9.029/95 e dispostos nos incisos do artigo 5º da Carta Magna vigente. Não se pode olvidar, outrossim, que a inserção da empregada no ambiente do trabalho não lhe retira os direitos da personalidade, dos quais o direito à intimidade constitui uma espécie. Portanto, não há dúvida de que o uso do polígrafo por parte da recorrente apresenta-se como ilegal e ao permitir essa lógica do mercado de aviação, é dizer, essa política equivocada de gerenciamento, estaríamos reduzindo a importância do Direito do Trabalho brasileiro e a força normativa de seus princípios, restringindo o trabalhador à condição de objeto. O empregador deve exercer seu poder diretivo, e esse exercício não lhe autoriza jamais dirigir a vida do empregado. Configurado o ilícito praticado pela reclamada, para atender exigência da empresa aérea ‘American Airlines’, a condenação ao pagamento de indenização por danos morais é medida que se impõe” (TRT – 2ª R – 6ª T – RO 01275-2003-311-02-00 – Rel. Valdir Florindo – DOESP 14/10/2005).


3.2. Monitoramento Audiovisual


O empregador tem o direito de proceder ao monitoramento audiovisual de seus empregados? As provas colhidas no monitoramento audiovisual são admissíveis para se comprovar uma justa causa do empregado?


O empregador, como detentor do seu poder diretivo, tem o direito de estabelecer a vigilância eletrônica nas dimensões espaciais dos setores de produção. É um desdobramento de sua qualidade de empregador (poder diretivo) e de preservação do seu direito de propriedade.


Para tanto, adotará o monitoramento por imagem e som, cujas razões são: o controle do acesso às dependências da empresa e trânsito de pessoas nas áreas comuns, além da proteção ao patrimônio – processos e produtos críticos.


Para que não haja a violação à privacidade ou a intimidade de seus empregados e ou colaboradores, o empregador deverá tomar alguns cuidados.


As câmeras não poderão estar em locais dentro da empresa que possam ser considerados como de violação a intimidade e a privacidade dos trabalhadores, tais como: vestiários, banheiros, restaurantes e áreas afins.


Além disso, a câmera não deve ficar enfocada apenas no posto de trabalho de um emprego e sim do ambiente, como um todo, sob pena de vulnerar o seu direito à intimidade.


A doutrina aponta: “A legislação brasileira não proíbe que o poder de direção conferido ao empregador se verifique através de aparelhos audiovisuais de controle de prestação de serviços, o que, aliás, é uma decorrência do avanço da tecnologia e poderá consistir em um instrumento probatório valioso na avaliação da conduta do empregado. Inadmissível é entender que o conjunto de locais do estabelecimento esteja sob total controle do empregador e autorizar a introdução de aparelhos audiovisuais indistintamente. Ora, há certos locais que são privados por natureza ou se destinam ao descanso do empregado, logo, não se pode permitir a instalação de um sistema de vídeo, por exemplo, em um banheiro, ou em uma cantina. A combinação de ameaças, à privacidade de dados, de invasão crescente da intimidade física e de maior vigilância de pessoal, a OIT atribui a denominação: ‘química de intrusão’. A vigilância eletrônica poderá ter um futuro promissor, desde que utilizada de forma humana, combatendo-se os abusos na sua utilização e permitindo-se o acesso do obreiro às informações que lhe digam respeito.”[13]


Na jurisprudência, encontramos:


“RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE. DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. Espécie em que demonstrada a existência de filmagens clandestinas no vestiário do local de trabalho da reclamante, sendo devido o pagamento de indenização por dano moral daí decorrente. Dou provimento ao recurso” (TRT – 4ª R – RO 00727-2005-003-04-00-7 – Rel. Carlos Alberto Robinson – j. 1/6/2006).


SITUAÇÃO VEXATÓRIA PASSADA PELA EMPREGADA. INSTALAÇÃO DE CÂMERA DE VÍDEO NO VESTIÁRIO FEMININO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. GARANTIA CONSTITUCIONAL. A todos é assegurado, por força de norma constitucional, o respeito à sua honra (art. 5º, incisos V e X). Exposta publicamente a empregada à situação vexatória em virtude do comportamento da empregadora, configura-se a ofensa ensejadora de reparação indenizatória” (TRT – 4ª R – 6ª T – RO 00078-2005-019-04-00-0 – Rel. Mário Chaves – DJRS 5/4/2006).


“DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. REDUÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. Acolhimento Comprovado nos autos que a reclamada, em reação aos atos de vandalismo praticado no interior de seu estabelecimento, promoveu várias reuniões com seus empregados, advertindo-os que aquele encontrado em falta, seria demitido, e, ao mesmo tempo, instalou câmeras filmadoras no vestiário, sem avisá-los, violando a intimidade dos seus empregados, deve responder pelo dano moral causado. Entretanto, o valor da indenização, neste caso, deve ser equivalente a um mês de salário percebido pelo reclamante, por ano trabalhado. Pedido de demissão homologado pelo Sindicato profissional, sem ressalvas – Validade do ato – Exclusão dos títulos rescisórios da condenação. O reclamante formulou, de próprio punho, pedido de demissão e desligamento do quadro de representantes da CIPA, sendo ambos homologados pelo Sindicato profissional, sem qualquer ressalva. Após mais de 10 meses, ingressou com esta ação alegando vício de consentimento. Ora, o normal seria que, logo após o recebimento da sua rescisão ingressasse em juízo buscando as reparações pertinentes, e não após mais de 10 meses. Além disso, confessou que rasurou o AVISO afixado no vestiário, conforme comprovado nos autos com a juntada do documento da fita de vídeo, o que permite concluir que preferiu desligar-se para não responder por seu ato. Assim, exclui-se da condenação todos os títulos rescisórios e indenizatórios deferidos, a exceção apenas da indenização por dano moral, mas no valor reduzido a dois salários. Recurso patronal parcialmente provido; recurso do reclamante não provido” (TRT – 21ª R – RO 02057-2004-003-21-00-0 – Rel. José Barbosa Filho – DJRN 10/2/2006).


“DANO MORAL. CAPTURAÇÃO E OBSERVAÇÃO DE IMAGENS ÍNTIMAS. ILÍCITO COMETIDO POR OUTRO EMPREGADO. RESPONSABILIDADE DA EMPREGADORA. A observação da intimidade da empregada, mediante a instalação de câmera no banheiro feminino do local de trabalho, configura invasão da privacidade e lesa o direito à intimidade, impondo o reconhecimento do direito à indenização por dano moral. Praticado o ilícito por preposto da Reclamada, ressai tranqüila a sua responsabilidade pela reparação (CCB, art. 932, inciso II)” (TRT – 10ª R – 3ª T – RO 01167-2005-103-10-00-3 – Rel. Braz Henriques de Oliveira – j. 7/6/2006).


“PODER DE DIREÇÃO. USO DE APARELHOS AUDIOVISUAIS EM SANITÁRIOS. INVASÃO DA INTIMIDADE DO EMPREGADO. A legislação brasileira permite que o poder de fiscalização conferido ao empregador, em determinadas circunstâncias, se verifique, por meio de aparelhos audiovisuais, como decorrência do avanço tecnológico, desde que o empregado deles tenha ciência. Inadmissível é entender que o conjunto de locais do estabelecimento esteja sob total controle do empregador e autorizar a introdução desses aparelhos, indistintamente, como no banheiro, lugar que é privado por natureza. A utilização de câmera de vídeo nos sanitários gera compensação por dano moral, em face da flagrante violação ao direito à intimidade do empregado, assegurado por preceito constitucional (art. 5º, X) e conceituado como a faculdade concedida às pessoas de se verem protegidas ‘contra o sentido dos outros, principalmente dos olhos e dos ouvidos’. A vigilância eletrônica poderá ter um futuro promissor, desde que usada de forma humana, combatendo-se os abusos na sua utilização. Instalação de aparelho audiovisual no banheiro caracteriza o que a OIT denomina ‘química da intrusão’, comportamento repudiado pelo ordenamento jurídico nacional e internacional” (TRT – 3ª R – 2ª T – RO 00117-2004-044-03-00-3 – Relª Alice Monteiro de Barros – DJMG 25/8/2004 – p. 11).


Em relação ao monitoramento audiovisual e os demais tipos de controle eletrônico, ainda é necessário estudos científicos e uma maior discussão jurídica sobre os efeitos desses tipos de controle feito pelo empregador e seus reflexos na saúde mental do empregado. É inegável que as pessoas reagem de forma diversa em cada nova situação, sendo que a utilização dessa forma de controle, seja de forma abusiva ou não, poderá desencadear ou agravar patologias psíquicas nos empregados.


3.3. Captação de Comunicação Telefônica


O inciso XII do art. 5º, CF, enuncia que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.


Esse dispositivo constitucional assegura quatro objetos jurídicos distintos: a) correspondência; b) comunicações telegráficas; c) dados; d) comunicações telefônicas.


Para Luiz José de Jesus Ribeiro,[14] a vedação é absoluta para a correspondência e as comunicações telegráficas, enquanto que a vedação é relativa para as demais, ou seja, “em determinadas hipóteses, reguladas em lei, é possível a sua violação. Assim, podemos concluir, com segurança, que a violação das comunicações telefônicas e de dados prevista pela Constituição é exceção à regra de inviolabilidade para finalidade de investigação criminal e instrução processual penal.”


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, deve observar o disposto na Lei 9.296/96, havendo a necessidade de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça (art. 1º, caput, Lei 9.296).


Luis José de Jesus Ribeiro[15] argumenta que alguns entendem que “a Lei nº 9.296/1996 é inconstitucional por ter estendido, no parágrafo único do art. 1º, a interceptação ao fluxo de informações em sistemas de informática e telemática. Assim, para essa corrente, a interceptação deveria ficar restrita às comunicações telefônicas. Discorda-se dos que assim entendem e firma-se tal posicionamento com na base na interpretação gramatical. Dispõe o inciso XII do art. 5º da CF, que ‘é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo no último caso…’. O último caso cuida dos dados e das comunicações telefônicas.”


Na elucidação da captação da comunicação telefônica, não devemos confundir a interceptação e a gravação.


A interceptação representa a coleta de dados realizada por terceiro, de uma comunicação sem a ciência de nenhum ou de um só dos interlocutores.


Pode ser: a) telefônica: a captação ocorre pelo fato de o telefone estar grampeado. Por regra, a interceptação telefônica é ilícita (art. 5º, XII); b) ambiental: a captação da conversa efetuada por um terceiro por meio de um gravador. É a interceptação entre presentes. É ilícita (art. 5º, X).[16]


Gravação é a coleta de dados por um dos participantes da comunicação. Pode ser: a) consentida: todos têm a plena ciência de sua ocorrência, como é o caso de gravações efetuadas por empresas prestadoras de serviços, quando o consumidor ou o cliente reclama para a empresa solicitando os seus serviços ou para eventuais reclamações. É lícita; b) clandestina: um dos interlocutores não tem ciência da sua realização. Pode ser realizada por aparelho eletrônico ou telefônico (gravação clandestina propriamente dita) ou no próprio ambiente da conversação (gravação ambiental). Por regra, qualquer gravação clandestina é ilícita (art. 5º, X e XII).


Em alguns casos, no entanto, é admitida como meio de prova. Por exemplo, quando o interesse público deva prevalecer sobre a proteção da intimidade e da privacidade do interlocutor.


Nas relações de trabalho, diante de uma conversa telefônica entre o empregado e um cliente da empresa, não visualizamos qualquer ilicitude, se o cliente, como terceiro, tiver ciência prévia de que a comunicação será captada. Neste caso, o empregado representa a própria empresa que presta os serviços ou que vende os produtos. A nosso ver, trata-se de uma gravação consentida. Exceto tal situação, as demais conversas telefônicas não poderão ser captadas, mesmo que o empregado tenha ciência da gravação, já que o outro interlocutor não terá a ciência da captação. No mínimo, trata-se de uma gravação clandestina.


Importante destacar que na gravação de uma conversa do empregado com um cliente, temos um terceiro nessa relação: o cliente. Do ponto de vista do Direito, o cliente poderá concordar ou não com a gravação. Além disso, ele também passa a ter direito a uma cópia da gravação.


Por parte do empregador, existe o dever de comunicar previa e individualmente cada empregado sobre esse controle, esclarecendo a forma que se feita e sua finalidade.


Na doutrina, Alice Monteiro de Barros[17] acentua: “Quanto à possibilidade de o empregador escutar a conversa telefônica do empregado, a doutrina espanhola estabelece o critério mais correto, partindo da seguinte distinção: se o telefone é utilizado como meio de execução das tarefas, o empregador poderá intervir e controlar as chamadas, pois não é considerado terceiro a respeito da conversa; outra será a situação se o telefonema se verificar nos descansos e pausas ocorridos dentro do horário de trabalho; nesse caso, a interferência do empregador afetará o direito à intimidade do empregado.”


A jurisprudência declina:


“INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA NO AMBIENTE DE TRABALHO. ILICITUDE DA PROVA. DESCONSIDERAÇÃO. 1. A interceptação de comunicações telefônicas somente pode ser autorizada por juiz competente, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. 2. Apesar dos poderes subordinante, disciplinar e fiscalizatório, ao empregador não é dado o direito de violar garantia constitucional de seus empregados e nem mesmo no ambiente de trabalho o empregado fica sujeito à interceptação de suas conversações telefônicas. 3. A gravação em fita magnética de conversa telefônica, obtida clandestinamente, sem o conhecimento e consentimento dos interlocutores, não serve como prova em razão de sua flagrante ilicitude (ofensa aos arts. 332 e 383 do CPC, bem como ao art. 5°, X, XII e LVI da Constituição Federal). 4. Precedentes jurisprudenciais. 5. Decisão unânime” (TRT – 24ª R – RO 1072/2003-001-24-00-0 – Rel. Amaury Rodrigues Pinto Júnior – DJMS 24/11/2004).


“GRAVAÇÃO CLANDESTINA. PROVA ILÍCITA. INADMISSIBILIDADE. A gravação de conversa telefônica sem o conhecimento de um dos interlocutores consiste em prova obtida por meio ilícito, violadora do direito à intimidade do comunicador, inadmissível no processo, a teor do art. 5º, X e LVI, da CF” (TRT – 12ª R – 3ª T – RO-V 00833-2002-029-12-00-7 – Relª Gisele Pereira Alexandrino – j. 11/12/2003).


Convém ser dito que o ato do empregador em conferir o número chamado ou o tempo de duração das conversas ou simplesmente não permitir a utilização do telefone da empresa em serviço não representam atos de violação da privacidade ou da intimidade.


3.4. Monitoramento do e-mail


Tradicionalmente, encontramos duas espécies de endereço eletrônico, um e-mail pessoal e um e-mail corporativo.


O correio eletrônico particular (e-mail pessoal) é contratado por uma pessoa natural junto a um provedor de acesso, com a finalidade de criar um endereço eletrônico pessoal. O contratante é quem define: o codinome que adotará no seu endereço; fixação do próprio login e a respectiva senha de acesso. A comunicação é realizada através da conta privada do usuário, o qual detém a titularidade, suportando os custos da prestação de serviços de acesso e conexão.


O correio eletrônico corporativo (e-mail corporativo) é a correspondência eletrônica que passa pela rede privada de computadores do empregador, o qual suporta, na qualidade de proprietário dos equipamentos e da caixa postal, os custos com o acesso e conexão. O correio eletrônico é uma ferramenta de trabalho, logo, deve ser utilizada como instrumento de comunicação em face da prestação de serviços junto à atividade econômica do empregador.


É discutível se o empregador, diante dos direitos da personalidade (= respeito à vida privada do trabalhador), pode controlar ou ter acesso ao correio eletrônico do seu empregado, já que esse avanço tecnológico está presente nas empresas, em especial, como uma ferramenta de trabalho. Pondere-se: essa discussão é própria quanto ao correio eletrônico corporativo. Não se pode admitir, a nosso ver, a intromissão do empregador em relação ao correio eletrônico privado de seu empregado.


Os argumentos favoráveis são: a) a estrutura de utilização do correio eletrônico (e-mail) é de propriedade do empregador; b) o poder diretivo do empregador, o qual lhe permite dirigir, controlar e punir a prestação pessoal dos serviços de seus empregados; c) como a empresa é responsável pelos atos de seus empregados (art. 932, III, CC), torna-se razoável que faça a fiscalização e leitura das mensagens recebidas e emitidas nos computadores da empresa; d) a inocorrência da privacidade quanto ao conteúdo da mensagem eletrônica, pois, o administrador do provedor pode ter acesso ao mesmo.


Em sentido contrário: a) o direito de propriedade não é absoluto e deve ceder a garantia da privacidade das comunicações, que só pode ser elidida por ordem judicial; b) o poder de direção do empregador é relativo e não pode se sobrepor à intimidade e à privacidade do empregado; c) apesar da empresa responder pelos atos de seus empregados e prepostos, há meios de elidir essa responsabilidade, tais como: a adoção de programas impeditivos de envio de mensagens para endereços não cadastrados com a prévia ciência ao empregado; proibição de remessa de imagens não relacionadas com o desempenho das tarefas contratuais, por meio de código de conduta.


Adepto do monitoramento do e-mail pelo empregador, Mário Antônio Lobato de Paiva[18] coloca: “Os bens em jogo podem sofrer uma vulneração que permite denotar que nenhum direito é absoluto seja ele o de liberdade de organização da empresa, a titularidade na propriedade do correio eletrônico, a inviolabilidade sem restrições do sigilo de dados. … A palavra-chave para essas dúvidas concernentes ao modo de aplicação do direito chama-se equilíbrio, ou seja, a proporcionalidade de cada direito em virtude da falta de legislação existente somos chamados a aplicar normas gerais que não vislumbram de forma clara a limitação existente, por exemplo, no direito à intimidade. Daí a necessidade da interpretação responsável e coerente resguardando o poder diretivo do empregador para comandar a empresa sem que implique em lesão ao direito do empregado de acessar os serviços eletrônicos.


Muitas das vezes constatamos uma certa erronia na conceituação do direito a intimidade, pois, por exemplo, a funcionalidade do e-mail fornecido pelo empregador permite uma certa abstração de confidencialidade já que se olharmos, por esta ótica poderemos perceber que não se trata da privacidade do empregado e sim de mero ofício encaminhado ou proposta de venda. Daí pode assegurar que não se trata de uma correspondência íntima e sim de um mero expediente utilizável e aberto a todos os que trabalhem na empresa.


Este pode ser absolutamente profissional, e, portanto, não seria invocável o direito a intimidade, ou pode conter aspectos próprios daquilo que define intimidade: o âmbito privado das pessoas, inacessível aos demais. E neste último caso, naturalmente, o trabalhador tem que saber que este instrumento não tem o condão de proteger sua intimidade, mas sim de veicular produtos ou serviços da empresa.”


Como critérios de aferição do correio eletrônico e de outros meios de informática disponibilizados pelo empregador para o empregado, temos: “a) a utilização positiva, própria do funcionário pró-ativo. É aquele trabalhador que, além dos sites normais de busca de informações de dados, de interesse de sua função, ‘navega’ por sites afins, buscando descobrir mais informações em outras fontes, ampliando o universo de pesquisa. Esta atitude torna-se elogiável, pois aumenta as possibilidades de negócios da empresa com eventuais reduções de custos; b) a utilização negativa, própria do funcionário que usa Internet e o correio eletrônico, que estão à sua disposição, para finalidades estritamente pessoais, tais como jogos, pesquisas de lazer, compras pessoais, e-mails para amigos, etc.; c) a utilização neutra, própria do funcionário que acessa a Internet e o correio eletrônico para casos estritamente necessários, conquanto pessoais, como é o caso de consulta de saldo bancário; resultado de exames de laboratório, chamado para doação de sangue, etc.”[19]


Diante da não-utilização adequada pelo empregado, em face do poder diretivo sobre a prestação dos serviços, o empregador pode e deve tomar as medidas necessárias para coibir essa utilização negativa, contudo, pautando a sua ação com algumas cautelas.


Nesse sentido, concordamos com Mário Antônio Lobato de Paiva[20] quando afirma que o e-mail do trabalhador na empresa (e-mail corporativo) é uma ferramenta de trabalho, logo, “em determinadas circunstâncias e com determinadas políticas, é possível que o empresário possa conhecer o conteúdo desses e-mails em situações de abuso a respeito das quais haja indícios objetivos de que estão sendo perpetrado. Esses indícios devem ser baseados em critérios objetivos como, por exemplo, a freqüência no número de comunicações de caráter pessoal, ou o título próprio das mensagens no caso do correio eletrônico. Nesses casos, se o empresário tiver um indício objetivo de que está sendo produzida uma situação de abuso deverá ser permitido o controle, estabelecendo o mínimo de garantias exigíveis, por parte do trabalhador, a respeito de seus direitos.


Em primeiro lugar deverá existir uma comunicação prévia do afetado para essa vasculha; em segundo lugar, haverá de contar com a presença de um representante sindical, que tutele os direitos do trabalhador controlando as garantias de transparência; e por último, um procedimento que busque o nexo causal e a proporcionalidade entre a prática abusiva e a sanção aplicável ao fato.


Atualmente não existe um regime de sanções para faltas relacionadas com o uso das novas tecnologias, muito menos uma gradação da sanção, com qual se produz uma situação de arbitrariedade que provoca falta de defesa do trabalhador pela ausência do princípio da proporcionalidade.


O que não podemos aceitar é que este poder de controle do empresário autorize uma intromissão indiscriminada em qualquer caso ao conteúdo das comunicações de seus trabalhadores via e-mail. Há que ser estabelecido neste campo às regras do jogo, e a via para fazê-lo que pode ser por meio da lei, convenção ou acordo coletivo.


Defendemos que o empresário pode acessar o e-mail de seus empregados, porém não de uma forma indiscriminada e sistemática já que o trabalhador tem direitos que podem ser invocados legitimamente como o direito à inviolabilidade das comunicações e direito ao exercício de trabalho em condições dignas. E, portanto, o trabalhador tem direito a não sofrer intromissão em sua atividade.


Em todo o caso devem ser respeitados os princípios básicos a que regem qualquer contrato de emprego como, por exemplo, o da boa-fé, dentre outros pautados na exata consecução das relações de trabalho. Assim no que diz respeito aos limites para o uso profissional do correio eletrônico, seja no contrato de trabalho de forma individual ou nas convenções coletivas de trabalho, as partes têm que acordar as condições que regulem a utilização profissional do e-mail obedecendo às diretrizes legais e contratuais do direito do trabalho.


Não defendemos que os empregados fiquem isolados do mundo quando estiverem em serviço sem qualquer possibilidade de comunicação com a família e amigos. Esta deve ser comedida e de preferência restrita a outros meios menos dispendiosos até que em último caso se chegue ao e-mail. Assim deve o empregador salientar que o e-mail não é um meio idôneo para comunicação pessoal, e pôr outros meios, se possível à disposição do trabalhador para que este possa comunicar-se pessoalmente fora da vigilância e controle da empresa de forma razoável e desde que não traga prejuízos consideráveis à empresa”.


A jurisprudência declina:


“PRELIMINAR DE NULIDADE DO JULGADO POR CERCEAMENTO DE DEFESAPROVA ILÍCITA ACESSO PELO EMPREGADOR A CAIXA DE E-MAIL CORPORATIVO FORNECIDA AO EMPREGADO ÓBICE DA SÚMULA 126 DO TST. 1. Consoante a diretriz da Súmula 126 do TST, é incabível o recurso de revista para reexame de fatos e provas. 2. In casu, pretende o Reclamante modificar a decisão vergastada, ao argumento de que a prova acostada aos autos é ilícita, porquanto consubstanciada no acesso à sua conta de e-mail pessoal, quando o Regional, ao enfrentar a questão, entendeu que a prova era lícita, porque se tratava de acesso, pela Reclamada, ao conteúdo do e-mail corporativo fornecido ao Reclamante para o exercício de suas atividades funcionais, do qual se utilizava de forma imprópria, recebendo fotos com conteúdo que estimulava e reforçava comportamentos preconceituosos. Além disso, os e-mails continham conversas fúteis que se traduziam em desperdício de tempo. 3. Com efeito, as alegações obreiras esbarram no óbice do referido verbete sumulado, porquanto pretendem o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos. 4. Por outro lado, ainda que o presente recurso não ultrapasse a barreira do conhecimento, a controvérsia em torno da licitude ou não da prova acostada pela Reclamada, consubstanciada no acesso à caixa de e-mail corporativo utilizado pelo Reclamante, é matéria que merece algumas considerações. 5. O art. 5º, X e XII, da CF garante ao cidadão a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra, da imagem das pessoas, bem como o sigilo de suas correspondências, dados e comunicações telegráficas e telefônicas. 6. A concessão, por parte do empregador, de caixa de e-mail a seus empregados em suas dependências tem por finalidade potencializar a agilização e eficiência de suas funções para o alcance do objeto social da empresa, o qual justifica a sua própria existência e deve estar no centro do interesse de todos aqueles que dela fazem parte, inclusive por meio do contrato de trabalho. 7. Dessa forma, como instrumento de alcance desses objetivos, a caixa do e-mail corporativo não se equipara às hipóteses previstas nos incisos X e XII do art. 5º da CF, tratando-se, pois, de ferramenta de trabalho que deve ser utilizada com a mesma diligência emprestada a qualquer outra de natureza diversa. Deve o empregado zelar pela sua manutenção, utilizando-a de forma segura e adequada e respeitando os fins para que se destinam. Mesmo porque, como assinante do provedor de acesso à Internet, a empresa é responsável pela sua utilização com observância da lei. 8. Assim, se o empregado eventualmente se utiliza da caixa de e-mail corporativo para assuntos particulares, deve fazê-lo consciente de que o seu acesso pelo empregador não representa violação de suas correspondências pessoais, tampouco violação de sua privacidade ou intimidade, porque se trata de equipamento e tecnologia fornecidos pelo empregador para utilização no trabalho e para alcance das finalidades da empresa. 9. Nessa esteira, entendo que não se configura o cerceamento de defesa à utilização de prova consubstanciada no acesso à caixa de e-mail fornecido pelo empregador aos seus empregados. Agravo de instrumento desprovido” (TST – 7ª T – AIRR-1.542/2005-055-02-40.4 – Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho – DO 6/6/2008).

“PROVA ILÍCITA. E-MAIL CORPORATIVO. JUSTA CAUSA. DIVULGAÇÃO DE MATERIAL PORNOGRÁFICO. 1. Os sacrossantos direitos do cidadão à privacidade e ao sigilo de correspondência, constitucionalmente assegurados, concernem à comunicação estritamente pessoal, ainda que virtual (e-mail particular). Assim, apenas o e-mail pessoal ou particular do empregado, socorrendo-se de provedor próprio, desfruta da proteção constitucional e legal de inviolabilidade. 2. Solução diversa impõe-se em se tratando do chamado e-mail corporativo, instrumento de comunicação virtual mediante o qual o empregado louva-se de terminal de computador e de provedor da empresa, bem assim do próprio endereço eletrônico que lhe é disponibilizado igualmente pela empresa. Destina-se este a que nele trafeguem mensagens de cunho estritamente profissional. Em princípio, é de uso corporativo, salvo consentimento do empregador. Ostenta, pois, natureza jurídica equivalente à de uma ferramenta de trabalho proporcionada pelo empregador ao empregado para a consecução do serviço. 3. A estreita e cada vez mais intensa vinculação que passou a existir, de uns tempos a esta parte, entre Internet e/ou correspondência eletrônica e justa causa e/ou crime exige muita parcimônia dos órgãos jurisdicionais na qualificação da ilicitude da prova referente ao desvio de finalidade na utilização dessa tecnologia, tomando-se em conta, inclusive, o princípio da proporcionalidade e, pois, os diversos valores jurídicos tutelados pela lei e pela Constituição Federal. A experiência subministrada ao magistrado pela observação do que ordinariamente acontece revela que, notadamente, o e-mail corporativo não raro sofre acentuado desvio de finalidade, mediante a utilização abusiva ou ilegal, de que é exemplo o envio de fotos pornográficas. Constitui, assim, em última análise, expediente pelo qual o empregado pode provocar expressivo prejuízo ao empregador. 4. Se se cuida de e-mail corporativo, declaradamente destinado somente para assuntos e matérias afetas ao serviço, o que está em jogo, antes de tudo, é o exercício do direito de propriedade do empregador sobre o computador capaz de acessar à Internet e sobre o próprio provedor. Insta ter presente também a responsabilidade do empregador, perante terceiros, pelos atos de seus empregados em serviço (Código Civil, art. 932, III), bem como que está em xeque o direito à imagem do empregador, igualmente merecedor de tutela constitucional. Sobretudo, imperativo considerar que o empregado, ao receber uma caixa de e-mail de seu empregador para uso corporativo, mediante ciência prévia de que nele somente podem transitar mensagens profissionais, não tem razoável expectativa de privacidade quanto a esta, como se vem entendendo no Direito Comparado (EUA e Reino Unido). 5. Pode o empregador monitorar e rastrear a atividade do empregado no ambiente de trabalho, em e-mail corporativo, isto é, checar suas mensagens, tanto do ponto de vista formal quanto sob o ângulo material ou de conteúdo. Não é ilícita a prova assim obtida, visando a demonstrar justa causa para a despedida decorrente do envio de material pornográfico a colega de trabalho. Inexistência de afronta ao art. 5º, X, XII e LVI, da Constituição Federal. 6. Agravo de Instrumento do Reclamante a que se nega provimento” (TST – 1ª T – RR 613/00.7 – Rel. Min João Oreste Dalazen – DJU – 10/6/2005 – p. 901).


3.5. Sujeição à Revista


São admissíveis em juízo as provas colhidas nas denominadas “revistas íntimas” dos empregados, as quais tenham sido realizadas com agressão à dignidade do trabalhador?


Como se sabe, o objetivo da revista é evitar a prática de atos, os quais levam à dilapidação do seu patrimônio.


Na doutrina, a problemática da revista pode ser agrupada em três correntes distintas: a) posição favorável, já que a revista se funda na própria relação de emprego em face do poder diretivo do empregador; b) contrários à revista, na medida em que a sua realização é uma ofensa à privacidade do empregado, caracterizando, assim, o dano moral; c) admite-se a revista com ponderações, tais como a sua regulamentação e a prévia ciência ao empregado, como forma de se evitar abusos e discriminação.


Edilton Meireles[21] afirma que a “revista, por si só, sem qualquer justificativa ou genérica, é prática abusiva, pois viola o direito à intimidade e à vida privada, bem como fere o princípio do respeito à dignidade da pessoa humana. Submeter qualquer pessoa, indistintamente, sem maior grau de suspeita, mas, simplesmente, por demasiada cautela, à revista, de forma violenta, o direito á intimidade, além de constituir, em algumas circunstâncias, ato ofensivo à honra e desrespeito à dignidade da pessoa do trabalhador. Estará, assim, o empregador abusando do direito de contratar se impuser à obrigação do empregado se sujeitar à revista de forma genérica. A revista, porém, justifica-se em situações especiais, principalmente quando há forte suspeita de prática de ato de improbidade por parte do empregado. É preciso, no entanto, haver essa forte suspeita. Não basta mera desconfiança. Não concordamos com o entendimento de que a revista, para não ser considerada abusiva, deva previamente ser estabelecida em regulamento coletivo ou, mesmo, que seja realizada em caráter geral e impessoal. Data venia, é preciso, tão-somente, que haja fundada suspeita de que a pessoa a ser revistada esteja em conduta criminosa. … A revista pessoal do empregado, portanto, apenas pode ser realizada na forma estabelecida na lei processual penal, ou seja, mediante prévia ordem judicial, inclusive a requerimento da parte interessada (art. 242 do CPP), ou quando da prisão em flagrante, quando haja fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituem corpo de delito ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar, mas sempre realizada por uma autoridade policial ou pelo oficial de justiça. O empregador, portanto, data venia, em caráter particular jamais poderá realizar a revista pessoal de seus empregados. Querendo realizá-la, deverá, para tanto, requerer ordem judicial neste sentido ou solicitar à autoridade policial que assim proceda na hipótese de prisão em flagrante ou quando tenha fundada suspeita de que o empregado esteja na posse de objetos ou papéis que constituem corpo de delito. Qualquer cláusula contratual prevendo a revista pessoal particular, portanto, é abusiva.”


Alice Monteiro de Barros[22] entende que a “revista se justifica, não quando traduza um comodismo do empregador para defender o seu patrimônio, mas quando constitua o último recurso para satisfazer ao interesse empresarial, à falta de outras medidas preventivas; essa fiscalização visa à proteção do patrimônio do empregador e à salvaguarda da segurança das pessoas. Não basta a tutela genérica da propriedade, devendo existir circunstâncias concretas que justifiquem a revista; é mister que haja, na empresa, bens suscetíveis de subtração e ocultação, com valor material, ou que tenham relevância para o funcionamento da atividade empresarial. Ademais, a tecnologia também poderá ser utilizada para evitar ou reduzir os efeitos da revista na intimidade dos empregados. A título de exemplo, a colocação de etiquetas magnéticas em livros e roupas torna desnecessária a inspeção em bolsas e sacolas, nos estabelecimentos comerciais. Quando utilizada, a revista deve ser de caráter geral, impessoal, para evitar suspeitas, através de um critério objetivo (sorteio, numeração, todos os integrantes de um turno ou setor), mediante ajuste prévio com a entidade sindical ou com o próprio empregado, na falta daquela, respeitando-se, ao máximo, os direitos de personalidade (intimidade, honra, entre outros). A revista deverá ser realizada no âmbito da empresa, assim, entendido o local de trabalho, a entrada e saída deste. O exercício do poder diretivo conferido ao empregador, no caso, não se estende para fora do estabelecimento da empresa, ainda que hajam fundadas suspeitas contra o obreiro; nessa circunstância deverá o empregador recorrer às autoridades competentes. A revista deverá ser realizada, em geral, na saída; na entrada do trabalho ou durante a execução do serviço, justifica-se, excepcionalmente, não só em face da intensificação do fenômeno terrorista no mundo, mas também pelo fato de que, em determinadas atividades (minas, por exemplo), deverá ser evitada a introdução de objetos como explosivos ou outro objeto capaz de colocar em risco a segurança das pessoas ou o patrimônio empresarial. Sugere-se, para tal fim, o sistema automático de detecção de objetivos, não seletivo, geralmente usado nos aeroportos; a partir daí, pode-se justificar a revista individualizada de certos empregados, em relação aos quais funcionou o sinal de alarme, sempre com a menor publicidade possível, na presença de um colega de trabalho, dependendo da circunstância, de colega do mesmo sexo, e respeitando-se sua dignidade pessoal. A utilização desses controles, ainda que de maior custo econômico do que as revistas manuais impõem-se, em nome da tutela da dignidade do empregado. Logo, a revista individual só se justifica quando fundada em sérias razões. A revista efetuada em uma ou poucas pessoas, ainda que de forma superficial e respeitosa, poder-lhe-á ser altamente lesiva, pois elas tornar-se-ão suspeitas. Daí a inadmissibilidade de controles discriminatórios, arbitrários, dos quais advenha predisposição contra os empregados selecionados.”


É imperioso que, no ato da revista, o empregador respeite a dignidade do trabalhador, já que são invioláveis a intimidade, a vida privada e a imagem das pessoas, assegurando-se à vítima o direito à indenização material ou moral decorrente de sua violação (art. 5º, X, CF).


Atualmente, é vedado proceder ao empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias (art. 373-A, VI, CLT).


Declina a jurisprudência:


“AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVISTA ÍNTIMA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DESPROVIMENTO. É de ser mantida a V. Decisão recorrida que entendeu, com base na prova, ser devida indenização, porque configurado o dano moral, em face da conduta adotada pela reclamada, ao exigir que o empregado se desnudasse, perante vigilantes armados, com o fim de realização de revista íntima. Incidência da Súmula nº 126 do TST a inviabilizar a reforma pretendida” (TST – 6ª T – AIRR 325/2005-005-03-40.5 – Rel. Min. Aloysio Corrêa da Veiga – DJU 2/2/2007).


“RECURSO DE REVISTA. DANOS MORAIS. REVISTA ÍNTIMA. Constitui fundamento do estado brasileiro o respeito à dignidade da pessoa humana, cuja observância deve ocorrer na relação contratual trabalhista; o estado de subordinação do empregado e o poder diretivo e fiscalizador conferidos ao empregador se encontram em linha de tensão, o que não pode levar à possibilidade de invasão da intimidade e desrespeito ao pudor do trabalhador. A comercialização, pela empresa, de produtos que lhe exigem maior vigilância sobre os estoques, apesar de ensejar a adoção de revista do empregado, ao término da jornada, não afasta o dever de que ela seja feita segundo meios razoáveis, de modo a não causar constrangimentos ou humilhação, cuja ocorrência configura dano moral a ser reparado. Recurso de revista conhecido e provido” (TST – 1ª T – RR 533.770/99 – Relª Juíza Conv. Maria do Perpétuo Socorro Wanderley de Castro – DJU 7/12/2006).


“DANO MORAL. REVISTA ÍNTIMA. EXPOSIÇÃO DO EMPREGADO. CONFIGURAÇÃO. Configura ato ilícito do empregador, balizador de indenização por dano moral, a realização de revista íntima obrigatória e na presença de vários colegas de serviço, cujo ato expõe o empregado a constrangimento e à situação vexatória em flagrante violação à intimidade, à vida privada, à honra e/ou à imagem da pessoa, a teor do preceituado no art. 5º, X, da CF. Indenização devida à luz dos arts. 186 e 927 do CC” (TRT – 4ª R – RO 01292-2003-001-04-00-3 – Rel. Milton Varela Dutra – j. 1/6/2006).


“DANOS MORAIS. REVISTA ÍNTIMA. CONDUTA OFENSIVA À HONRA E À DIGNIDADE DOS EMPREGADOS. INDENIZAÇÃO. VIOLAÇÃO A PRECEITOS CONSTITUCIONAIS. O poder fiscalizador do empregador proceder revista em seus empregados encontra limite na garantia de preservação da honra e intimidade da pessoa física do trabalhador, conforme preceitua o inciso X do artigo 5º, da Constituição da República. A realização de revista sem a observância de limites impostos pela ordem jurídica acarreta ao empregador a obrigação de reparar, pecuniariamente, os danos morais causados” (TRT – 14ª R – RO 00744.2005.091.14.00-2 – Relª Vania Maria da Rocha Abensur – DOJT 22/12/2005).


4. Honra


A prova colhida pelo empregador com violência à honra do trabalhador poderá ser considerada ilegal. Não se pode esquecer que a honra é um dos direitos de personalidade do empregado (art. 5º, X, CF).


Do ponto de vista do Direito, a honra pode ser objetiva ou subjetiva. A primeira é caracterizada pela sua reputação, ou seja, tudo aquilo que os outros pensam a respeito do cidadão, quanto aos seus atributos físicos, intelectuais, morais etc. A segunda reflete o sentimento de cada um a respeito de seus atributos físicos, intelectuais, morais etc. É a avaliação que o indivíduo faz de suas qualidades como ser humano.


Em princípio, a prática pelo empregador ou seus prepostos, contra o empregado ou pessoas de sua família, de ato lesivo da honra e boa fama envolve as hipóteses de injúria, calúnia e difamação, podendo ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho. A ocorrência da legítima defesa exclui a justa causa do empregador (art. 483, CLT).


O termo “injúria” deriva do latim injuria, de in + jus: injustiça, falsidade. Injúria é o fato típico que ofende a honra, a dignidade ou o decoro da vítima, podendo ser verbal, por escrito ou física (injúria real). A injúria pode ser concretizada por meio de palavras, como também por gestos e, em algumas circunstâncias, por meio de atos físicos (bofetadas, empurrões etc.).


Na calúnia, atribui-se à vítima a prática de um crime, porém, de forma falsa.


Por fim, o termo “difamação” deriva do latim, diffamare, de fama, desacreditar. O objeto jurídico a ser tutelado é a honra objetiva, a reputação da vítima. Na difamação, o sujeito procura imputar à vítima fatos que atinjam os seus atributos morais. Não se confunde com a calúnia. Nesta, o que se procura imputar são fatos que atinjam os seus atributos morais, porém, que são indicadores de falsa notícia de crime. É a atribuição falsa à vítima de fato definido como crime.


Na calúnia e difamação são atribuídos fatos à vítima, enquanto na injúria o que se atribui é uma qualidade negativa com a ofensa a sua honra subjetiva. As seguintes afirmações confirmam as distinções: “Fulano é um peculatário!” (calúnia); “Beltrano é um depravado!” (difamação); “Sicrano é um boçal!” (injúria).Além da justa causa do empregador, a prática de atos que violem a honra objetiva e subjetiva do empregado implicará na indenização por dano moral (art. 5º, X, CF; art. 186, CC).


Assim, a injúria ataca a honra subjetiva, ferindo a sua dignidade ou o seu decoro (art. 140, CP), enquanto a calúnia e a difamação (artigos 138 e 139, CP) atingem a honra objetiva.


5. Imagem


O direito à imagem é um dos direitos de personalidade (art. 5º, X, CF). Sua violação pelo empregador irá importar no direito à percepção de indenização por danos morais para o empregado e a imediata suspensão prática do ato danoso.


No direito à imagem há duas variações: a) direito relacionado à reprodução gráfica (retrato, fotografia, imagem etc) da pessoa natural. Trata-se da imagem-retrato; b) direito relacionado ao conjunto de atributos cultivados pelo homem e reconhecidos pela sociedade. É o que se denomina de imagem-atributo.  


A jurisprudência revela:


 “DANO MORAL. DIREITO À IMAGEM. PUBLICAÇÃO DE FOTOGRAFIA EM JORNAL SEM AUTORIZAÇÃO. VIOLAÇÃO DE DIREITO DA PERSONALIDADE. PREJUÍZOS PRESUMIDOS. INDENIZAÇÃO DEVIDA. VALOR DA CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. VERBA HONORÁRIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. INOCORRÊNCIA. A publicação de fotografia em jornal de ampla circulação sem a prévia e indispensável autorização do autor constitui ofensa ao direito de imagem, gerando o dever de indenizar os prejuízos morais presumidamente sofridos. Conforme Súmula de jurisprudência do STJ, na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca” (TJRO – 2ª CC – AC 100.001.2003.018563-6 – Rel. Roosevelt Queiroz Costa – j. 16/8/2006).


“INDENIZAÇÃO. DIREITO DE IMAGEM. ANUÊNCIA TÁCITA. TRABALHO FOTOGRÁFICO DESPROVIDO DE CARÁTER DEPRECIATIVO. Em que pese configurar-se, a princípio, dano moral a divulgação pelo empregador da imagem de seu empregado sem prévia autorização deste (artigos 5º, X, CF, e 18 e 20, CC), a falta de prova da proibição da exibição de fotografia inserida em material comercial da empresa presume anuência tácita do obreiro, sendo descabida a quitação indenizatória correspondente, notadamente se o trabalho fotográfico se insere em contexto desprovido de objetivo exploratório da imagem pessoal, sem qualquer caráter depreciativo de sua reputação” (TRT – 15ª R – 6ª T – RO 000662-2004-039-15-00-9 – Relª Maria Cecília Fernandes Álvares Leite – DJSP 17/6/2005 – p. 44).


“APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO. PUBLICAÇÃO DE FOTOGRAFIAS EM FOLHETO PUBLICITÁRIO SEM EXPRESSA AUTORIZAÇÃO DAS PESSOAS EXPOSTAS. VIOLAÇÃO AO DIREITO DE IMAGEM. DANO MORAL CONFIGURADO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DEVER DE INDENIZAR. APELO IMPROVIDO. APELAÇÃO ADESIVA. PRETENSÃO DE MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. VALOR ARBITRADO MODERADAMENTE. DESCABIMENTO. RECURSO IMPROVIDO. 1. A utilização de fotos de terceiros em matéria publicitária de grande circulação, sem a sua expressa autorização, caracteriza, sem dúvida, violação ao direito de imagem, que é uma das espécies de dano moral lato senso, rendendo ensejo à reparação. 2. Revela-se justo o quantum arbitrado a título de indenização por danos morais, quando obtido de forma criteriosa, com base nas circunstâncias que ornam a ilicitude, as condições pessoais e econômicas dos envolvidos e o grau da ofensa” (TJBA – AC 27666-1/2003 – Rel. Jerônimo dos Santos – DJU 14/12/2004).


“DIREITO DE IMAGEM. Fotografias. Catálogos promocionais. Reutilização depois de expirado o prazo contratual. Indenização devida. Artigo 5º, X, da CF. Danos materiais e morais, estes derivados de violação a direitos que decorrem daqueles essenciais da personalidade, explorados sem autorização e para fins de satisfazer apenas um interesse comercial – Locupletamento ilícito – Caracterização – Prejuízo moral considerado ínsito na própria violação do direito de imagem, esta não reproduzida em cenário público ou com o fito de informar, ensinar, esclarecer ou atender a interesses públicos ou culturais – Recurso provido em parte” (TJSP – 9ª CDPriv – AC 141.865-4/0 – Rel. Des. Oliva – j. 23/12/2003).


6. O Código Civil e o Direito da Personalidade. As Irradiações no Direito do Trabalho


Em seus artigos 11 a 21, o Código Civil trata dos direitos da personalidade.


Como destaques, temos: a) toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome (art. 16). O nome é a forma pela qual o ser humano é individualizado e reconhecido, não só no âmbito de sua família, como no da sociedade. O nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória (art. 17). Sem autorização, não se pode usar o nome alheio em propaganda comercial (art. 18). O pseudônimo adotado para atividades lícitas goza da proteção que se dá ao nome (art. 19); b) salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderá ser proibida, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem para fins comerciais (art. 20, caput). Em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requerer essa proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes (art. 20, parágrafo único); c) a vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma (art. 21).


Os direitos da personalidade estão presentes nas relações jurídico-trabalhistas.


Pela aplicação dos artigos 16 a 20 do CC, o empregador não poderá: a) utilizar o nome do seu empregado em publicações ou representações que o exponham ao desprezo público, mesmo que não tenha a intenção difamatória; b) usar o nome do empregado ou o seu pseudônimo, sem sua autorização, para propaganda comercial; c) a imagem do empregado sem autorização para fins comerciais. Nessas hipóteses, além de exigir que cesse a lesão ao seu direito de personalidade, poderá exigir a indenização moral e a material cabível (art. 12, CC).


Em relação à vida privada do trabalhador (art. 21, CC), o empregador não pode violá-la, não devendo, por exemplo, transmitir a terceiros as informações que constam do prontuário pessoal e médico do empregado, ou ainda, de seu desempenho (conduta, freqüência ao trabalho, o valor de sua remuneração etc.).


Declina a jurisprudência:


“JUSTA CAUSA. INFORMAÇÕES DESABONADORAS. INOCORRÊNCIA. DANOS MORAIS INDEVIDOS. Não se pode considerar desabonadora a informação verídica do ocorrido. No caso da ex-empregadora ser solicitada do motivo da dispensa de ex-empregado, não poderá a mesma omitir de que a dispensa ocorreu por justa causa, ainda mais sem adentrar em detalhes meritórios, hipótese dos autos. Tal omissão levaria a engano o solicitante, podendo, o informante, inclusive, incorrer em crime de falsidade ideológica – Art. 299 do CP. Danos morais indevidos” (TRT – 15ª R – 5ª C – RO 2325-1999-109-15-00-4 – Relª Ana Paula Pellegrina Lockmann – DOESP 12/12/2005 – p. 28).


“Dano moral. Informações desairosas. Responde pelo pagamento de indenização por dano moral a empresa que afasta o obreiro com mais de 20 anos de atividade para o grupo econômico, por força de auditorias que nada apuraram, permitindo que informações desairosas fossem propaladas entre os colegas de serviço, inclusive frustrando a oportunidade de emprego em empresa congênere” (TRT – 12ª R – 1ª T – Ac. 133/00 – Rel. Godoy Ilha – DJSC 18/1/2000 – p. 53).


“Indenização. Dano moral. Não emergindo da publicação feita pelo empregador, imputações ofensivas e infundadas à pessoa do obreiro, impossível a configuração do ato ilícito ensejador da responsabilização por dano moral sofrido” (TRT – 3ª R – 5ª T – RO 6496/97 – Rel. Marcos Torres – DJMG 10/1/1998 – p. 4).


 


Bibliografia

BARROS, Alice Monteiro de. Proteção à Intimidade do Empregado. São Paulo: LTr, 1997.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 16ª ed, v. 7.

FINATI, Cláudio Roberto. “As Relações de Trabalho na Era da Informática”, in Revista do Direito Trabalhista, versão CD-rom.

JORGE NETO, Francisco Ferreira; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Direito do Trabalho. 4ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. 33ª ed. São Paulo: Saraiva, v. 1.

MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 15ª ed. São Paulo: Atlas, 2004.

MEIRELES, Edilton. O Novo Código Civil e o Direito do Trabalho. 2ª ed. São Paulo: LTR, 2003.

NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal. 5ª ed. São Paulo: 1999.

OLIVEIRA, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal. 9ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

PAIVA, Mário Antônio Lobato de. “A Privacidade do Trabalhador no Meio Informático”, in Revista do Direito Trabalhista, ano 9, nº, 4, abr./2003.

RIBEIRO, Luis José de Jesus. A Prova Ilícita no Processo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2004.

 

Notas:

[1] “As provas ilícitas não se confundem com as provas ilegais e as ilegítimas. Enquanto, conforme já analisado, as provas ilícitas são aquelas obtidas com infringência ao direito material, as provas ilegítimas são as obtidas com desrespeito ao direito processual. Por sua vez, as provas ilegais seriam o gênero do qual as espécies são as provas ilícitas e as ilegítimas, pois, configuram-se pela obtenção com violação de natureza material ou processual ao ordenamento jurídico” (Moraes, Alexandre. Direito Constitucional, 15ª ed., p. 126).

[2] “Conceituar prova obtida ilicitamente é tarefa da doutrina. Há alguma confusão reinando na doutrina a respeito do tema, quando se verifica o tratamento impreciso que se dá aos termos prova ilegítima, prova ilícita, prova ilegitimamente admitida, prova obtida ilegalmente. Utilizando, entretanto, a terminologia de prova vedada, sugerida por Nuvolone, tem-se que há prova vedada em sentido absoluto (quando o sistema jurídico proíbe sua produção em qualquer hipótese) e em sentido relativo (há autorização do ordenamento, que prescreve, entretanto, alguns requisitos para a validade da prova). Resumindo a classificação de Nuvolone, verifica-se que a prova será ilegal sempre quando houver violação do ordenamento como um todo (leis e princípios gerais), quer sejam, de natureza material ou meramente processual. Ao contrário, será ilícita a prova quando sua proibição for de natureza material, vale dizer, quando for obtida ilicitamente” (Nery Junior, Nelson. Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 5ª ed., p. 155).

[3] “A teoria dos fruits of the poisonous tree, ou teoria dos frutos da árvore envenenada, cuja origem é atribuída à jurisprudência norte-americana, nada mais é que simples conseqüência lógica da aplicação do princípio da inadmissibilidade das provas ilícitas. Se os agentes produtores da prova ilícita pudessem dela se valer para a obtenção de novas provas, a cuja existência somente se teria chegado a partir daquela (ilícita), a ilicitude da conduta seria facilmente contornável. Bastaria a observância da forma prevista em lei, na segunda operação, isto é, na busca das provas obtidas por meio das informações extraídas pela via da ilicitude, para que se legalizasse a ilicitude da primeira (operação). Assim, a teoria da ilicitude por derivação é uma imposição da aplicação do princípio da inadmissibilidade das provas obtidas ilicitamente” (Oliveira, Eugênio Pacelli. Curso de Processo Penal, 9ª ed., p. 301).

[4] “PROVA PENAL. BANIMENTO CONSTITUCIONAL DAS PROVAS ILÍCITAS (CF, ART. 5º, LVI). ILICITUDE (ORIGINÁRIA E POR DERIVAÇÃO). INADMISSIBILIDADE. BUSCA E APREENSÃO DE MATERIAIS E EQUIPAMENTOS REALIZADA, SEM MANDADO JUDICIAL, EM QUARTO DE HOTEL AINDA OCUPADO. IMPOSSIBILIDADE. Qualificação jurídica desse espaço privado (quarto de hotel, desde que ocupado) como ‘casa’, para efeito da tutela constitucional da inviolabilidade domiciliar. Garantia que traduz limitação constitucional ao poder do Estado em tema de persecução penal, mesmo em sua fase pré-processual. Conceito de ‘casa’ para efeito da proteção constitucional (CF, art. 5º, XI, e CP, art. 150, § 4º, II). Amplitude dessa noção conceitual, que também compreende os aposentos de habitação coletiva (como, por exemplo, os quartos de hotel, pensão, motel e hospedaria, desde que ocupados): necessidade, em tal hipótese, de mandado judicial (CF, art. 5º, XI). Impossibilidade de utilização, pelo Ministério Público, de prova obtida com transgressão à garantia da inviolabilidade domiciliar. Prova ilícita. Inidoneidade jurídica. Recurso ordinário provido. Busca e apreensão em aposentos ocupados de habitação coletiva (como quartos de hotel). Subsunção desse espaço privado, desde que ocupado, ao conceito de ‘casa’. Conseqüente necessidade, em tal hipótese, de mandado judicial, ressalvadas as exceções previstas no próprio texto constitucional. Para os fins da proteção jurídica a que se refere o art. 5º, XI, da Constituição da República, o conceito normativo de ‘casa’ revela-se abrangente e, por estender-se a qualquer aposento de habitação coletiva, desde que ocupado (CP, art. 150, § 4º, II), compreende, observada essa específica limitação espacial, os quartos de hotel. Doutrina. Precedentes. Sem que ocorra qualquer das situações excepcionais taxativamente previstas no texto constitucional (art. 5º, XI), nenhum agente público poderá, contra a vontade de quem de direito (invito domino), ingressar, durante o dia, sem mandado judicial, em aposento ocupado de habitação coletiva, sob pena de a prova resultante dessa diligência de busca e apreensão reputar-se inadmissível, porque impregnada de ilicitude originária. Doutrina. Precedentes (STF). Ilicitude da prova. Inadmissibilidade de sua produção em juízo (ou perante qualquer instância de poder). Inidoneidade jurídica da prova resultante da transgressão estatal ao regime constitucional dos direitos e garantias individuais. A ação persecutória do Estado, qualquer que seja a instância de poder perante a qual se instaure, para revestir-se de legitimidade, não pode apoiar-se em elementos probatórios ilicitamente obtidos, sob pena de ofensa à garantia constitucional do due process of law, que tem, no dogma da inadmissibilidade das provas ilícitas, uma de suas mais expressivas projeções concretizadoras no plano do nosso sistema de direito positivo. A Constituição da República, em norma revestida de conteúdo vedatório (CF, art. 5º, LVI), desautoriza, por incompatível com os postulados que regem uma sociedade fundada em bases democráticas (CF, art. 1º), qualquer prova cuja obtenção, pelo Poder Público, derive de transgressão a cláusulas de ordem constitucional, repelindo, por isso mesmo, quaisquer elementos probatórios que resultem de violação do direito material (ou, até mesmo, do direito processual), não prevalecendo, em conseqüência, no ordenamento normativo brasileiro, em matéria de atividade probatória, a fórmula autoritária do male captum, bene retentum. Doutrina. Precedentes. A questão da doutrina dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree): a questão da ilicitude por derivação. Ninguém pode ser investigado, denunciado ou condenado com base, unicamente, em provas ilícitas, quer se trate de ilicitude originária, quer se cuide de ilicitude por derivação. Qualquer novo dado probatório, ainda que produzido, de modo válido, em momento subseqüente, não pode apoiar-se, não pode ter fundamento causal nem derivar de prova comprometida pela mácula da ilicitude originária. A exclusão da prova originariamente ilícita – ou daquela afetada pelo vício da ilicitude por derivação – representa um dos meios mais expressivos destinados a conferir efetividade à garantia do due process of law e a tornar mais intensa, pelo banimento da prova ilicitamente obtida, a tutela constitucional que preserva os direitos e as prerrogativas que assistem a qualquer acusado em sede processual penal. Doutrina. Precedentes. A doutrina da ilicitude por derivação (teoria dos ‘frutos da árvore envenenada’) repudia, por constitucionalmente inadmissíveis, os meios probatórios, que, não obstante produzidos, validamente, em momento ulterior, acham-se afetados, no entanto, pelo vício (gravíssimo) da ilicitude originária, que a eles se transmite, contaminando-os, por efeito de repercussão causal. Hipótese em que os novos dados probatórios somente foram conhecidos, pelo Poder Público, em razão de anterior transgressão praticada, originariamente, pelos agentes da persecução penal, que desrespeitaram a garantia constitucional da inviolabilidade domiciliar. Revelam-se inadmissíveis, desse modo, em decorrência da ilicitude por derivação, os elementos probatórios a que os órgãos da persecução penal somente tiveram acesso em razão da prova originariamente ilícita, obtida como resultado da transgressão, por agentes estatais, de direitos e garantias constitucionais e legais, cuja eficácia condicionante, no plano do ordenamento positivo brasileiro, traduz significativa limitação de ordem jurídica ao poder do Estado em face dos cidadãos. Se, no entanto, o órgão da persecução penal demonstrar que obteve, legitimamente, novos elementos de informação a partir de uma fonte autônoma de prova – que não guarde qualquer relação de dependência nem decorra da prova originariamente ilícita, com esta não mantendo vinculação causal –, tais dados probatórios revelar-se-ão plenamente admissíveis, porque não contaminados pela mácula da ilicitude originária. A questão da fonte autônoma de prova (an independent source) e a sua desvinculação causal da prova ilicitamente obtida. Doutrina. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Jurisprudência comparada (a experiência da Suprema Corte americana): casos ‘Silverthorne Lumber Co. v. United States (1920); Segura v. United States (1984); Nix v. Williams (1984); Murray v. United States (1988)’” (STF – 2ª T – ROHC 90.376/RJ – Rel. Min. Celso de Mello – DJU 18/5/2007)

[5] “Segundo o princípio da proporcionalidade, também denominado de ‘lei da ponderação”, na interpretação de determinada norma jurídica, constitucional ou infraconstitucional, devem ser sopesados os interesses e direitos em jogo, de modo a dar-se à solução concreta mais justa. Assim, o desatendimento de um preceito não pode ser mais forte e nem ir além do que indica a finalidade da medida a ser tomada contra o preceito a ser sacrificado” (Nery Junior, Nelson. Ob. cit., p. 152).

[6] Washington de Barros Monteiro afirma que a palavra pessoa “advém do latim persona, emprestada à linguagem teatral na antiguidade romana. Primitivamente, significa máscara. Os atores adaptavam ao rosto uma máscara, provida de disposição especial, destinada a dar eco às suas palavras. Personare queria dizer, pois, ecoar, fazer ressoar. A máscara era uma persona, porque fazia ressoar a voz da pessoa. Por curiosa transformação no sentido, o vocábulo passou a significar o papel que cada ator representava e, mais tarde, exprimiu a atuação de cada indivíduo no cenário jurídico. Por fim, completando a evolução, a palavra passou a expressar o próprio indivíduo que representa esses papéis” (Curso de Direito Civil, v. 1, 33ª ed., p. 55). 

[7] Monteiro, Washington de Barros. Ob. cit., p. 56.

[8] Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v. 7, 16ª ed., p. 67.

[9] “No âmbito da esfera privada estão compreendidos todos aqueles comportamentos e acontecimentos que o indivíduo não quer que se tornem de domínio público. Paulo José da Costa Júnior, ao abordar o tema, faz observar que: ‘… No bojo da esfera privada está contida a esfera da intimidade (Vetrauenphãre) ou esfera confidencial (Vertrulichkeitssphãre). Dela participam somente aquelas pessoas nas quais o indivíduo deposita certa confiança e com as quais mantém certa intimidade. Fazem parte desse grupo, conversações ou populo, com muitos membros que chegam a integrar a esfera pessoal do titular do direito à intimidade. Vale dizer, da esfera da intimidade resta excluído não apenas o público em geral, como é óbvio, bem assim determinadas pessoas, que privam com o indivíduo num âmbito mais amplo. Por derradeiro, no âmbito da esfera privada está aquela que deve ser objeto de especial proteção contra a indiscrição: a esfera do segredo (Gehemsphãre). Ela compreende aquela parcela da vida particular que é conservada em segredo pelo indivíduo do qual compartilham uns poucos amigos, muito chegados. Dessa esfera não participam sequer pessoas da intimidade do sujeito. Conseqüentemente, a necessidade de proteção legal, contra a indiscrição nessa esfera, faz-se sentir mais intensa’.” (Ribeiro, Luis José de Jesus. A Prova Ilícita no Processo do Trabalho, p. 93).

[10] Na legislação infraconstitucional, o art. 2º, CLT, traz o direcionamento do poder diretivo, ao indicar que é considerado empregador, a empresa que, individualmente ou coletivamente, assume os riscos da atividade econômica, admitindo, assalariando e dirigindo a prestação pessoal de serviços dos seus empregados.

[11] “Imprescindível à sua legitimidade que a investidura em cargo ou emprego público dependa de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em Lei (art. 37, II, da CR/1988), almejando com isso o Constituinte assegurar o valor democrático a todos aqueles que preencham, em potencial, os requisitos, o direito a concorrerem a vagas no serviço público, cercando-se o seu procedimento de regras objetivas, imparciais e transparentes, até para ser objeto de controle jurisdicional ou popular acerca de sua legalidade. No entanto, a despeito de todo um aparato formal de ingresso, não o observou a reclamada. No processo de escolha instaurado, inovou o critério do mérito aferível por concurso público que deve revelar-se, no mínimo, através de provas ou de provas e títulos, criando uma figura espúria de análise de título e entrevista, no qual, além de fugir ao atual figurino constitucional, não resguarda os valores máximos de nossa Constituição” (TRT – 22ª R – RORORXOF 0988-2001-002 – Rel. Arnaldo Boson Paes – j. 4/12/2002).

[12]  “Aparelho que faz traçados simultâneos sobre uma folha de papel, registrando a tensão arterial, o ritmo respiratório, a pulsação apical e o pulso jugular, possibilitando averiguar se a pessoa está dizendo a verdade ou não” (Diniz, Maria Helena. Dicionário Jurídico, 1ª ed., v. 3, p. 626). 

[13] Barros, Alice Monteiro de. Proteção à Intimidade do Empregado, p. 80.

[14] Ribeiro, Luis José de Jesus. Ob. cit., p. 96.

[15] Ribeiro, Luiz José de Jesus. Ob. cit., p. 95.

[16] “As gravações sub-reptícias de conversas entre presentes, efetuadas por terceiros, com o desconhecimento de todos os interlocutores ou de um deles, embora sejam interceptações em sentido técnico, não se enquadram na dicção do art. 5º, XII, da Constituição Federal, que cuida somente da quebra do sigilo das comunicações telefônicas e de dados. As conversas confidenciais interceptadas, no entanto, infringem o direito à intimidade, também assegurado pela Constituição, no inciso X do mesmo artigo. O direito à intimidade é o direito de estar só. É o direito do indivíduo, querendo, de ser deixado em paz, sem ser importunado por terceiros. É, como bem expressa Carlos Bittar, direito que ‘reveste-se das condições fundamentais dos direitos da personalidade, devendo-se enfatizar a sua condição de direito negativo, ou seja, expresso exatamente pela não exposição a conhecimento de terceiro de elementos particulares da esfera reservada do titular. A Lei nº 9.296/96 não tratou de regulamentar as interceptações ambientais. Na falta de tratamento específico, afirmam Grinover, Scarance e Gomes Filho que, normalmente, a ‘prova obtida mediante interceptação ambiental será ilícita, por infringir o art. 5º, X, da Constituição da República, pelo menos enquanto não houver lei que, razoavelmente, discipline a matéria. Esta, no entanto, deverá resguardar devidamente, as declarações espontâneas do suspeito ou acusado, sub-repticiamente gravadas, em face da prevalência da garantia constitucional do direito ao silêncio” (Ribeiro, Luis José de Jesus. Ob. cit., p. 99).

[17] Barros, Alice Monteiro de. Ob. cit., p. 84.

[18] Paiva, Mário Antônio Lobato de. “A Privacidade do Trabalhador no Meio Informático”, in Revista do Direito Trabalhista, ano 9, nº, 4, abr./2003, p. 12.

[19] Finati, Cláudio Roberto. “As Relações de Trabalho na Era da Informática”, in Revista do Direito Trabalhista, versão CD-rom.

[20] Paiva, Mário Antônio Lobato de. Ob. cit., p. 13.

[21] Meireles, Edilton. O Novo Código Civil e o Direito do Trabalho, 2ª ed., p. 19.

[22] Barros, Alice Monteiro. Ob. cit., p. 74.


Informações Sobre os Autores

Francisco Ferreira Jorge Neto

Desembargador Federal do Trabalho (TRT 2ª Região). Coordenador e Professor da Pós-Graduação Lato Sensu do Pró-Ordem em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho em Santo André (SP). Professor Convidado: Curso de Pós-Graduação Lato Sensu da Escola Paulista de Direito. Mestre em Direito das Relações Sociais – Direito do Trabalho pela PUC/SP. Autor de livros, com destaques para: Direito do Trabalho (5ª edição) e Direito Processual do Trabalho (4ª edição), publicados pela Lumen Juris, em co-autoria com Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante

Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante

Advogado. Professor da Faculdade de Direito Mackenzie. Ex-coordenador do Curso de Direito da Faculdade Integrada Zona Oeste (FIZO). Ex-procurador chefe do Município de Mauá. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Integração da América Latina pela Universidade de São Paulo (USP/PROLAM). Autor de várias obras jurídicas em co-autoria com Francisco Ferreira Jorge Neto, com destaques para: Direito do Trabalho (4ª ed., no prelo) e Direito Processual do Trabalho (3ª ed., 2007), todos pela Lumen Juris.


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!
logo Âmbito Jurídico