A legitimidade ativa no processo falimentar: a Fazenda Pública e o credor com garantia real à luz da Lei 11.101/2005

Resumo: O advento da nova Lei de falências – Lei 11.101/2005 – trouxe a baila novamente discussões já freqüentes à luz do revogado Decreto-Lei 7.661/1945. Propõe-se o estudo detalhado do artigo 97 da Lei de 2005, ou seja, da legitimidade para requerer a falência do devedor. Mais especificamente, propõe-se a análise da possibilidade ou não de a Fazenda Pública e de os credores com garantia real ajuizarem ação de falência contra o devedor. O ponto principal do texto está na legitimidade das partes para a ação, tanto para a fazenda pública quanto para o credor com garantia real, ou seja, quais são os requisitos para eles poderem ajuizar o pedido de falência. O artigo analisa a doutrina e a jurisprudência sobre o assunto.


Abstract: The new Law of bankruptcy – Law 11.101/2005 – brought again discussions already frequents during the still revoked Law 7.661/1945. This task proposes the detailed study of article 97 of Law of 2005, in others words, the study of legitimacy to require bankruptcy of debtor. More specifically, suggests an analysis of possibility or not of Treasury and creditors that have a mortgage to require a bankruptcy against the debtor. The main point of the text is the legitimacy of the parties to the action, both to the Exchequer as to the creditor with collateral, that is, what are the requirements for them to judge the application for bankruptcy. The article examines the doctrine and jurisprudence on the subject.


Sumário: 1. Introdução; 2. A Fazenda Pública e o requerimento de falência; 2.1. A questão à luz do Decreto-Lei n.º 7.661/1945; 2.2 A questão à luz da Lei n.º 11.101/2005; 2.2.1 A Execução Fiscal; 3. O credor com garantia real e o pedido de falência; 3.1 A questão à luz do Decreto-Lei n.º 7.661/1945; 3.2 A questão à luz da Lei n.º 11.101/2005; 4. Conclusão; 5. Referências Bibliográficas.


1. Introdução


O crédito sempre teve papel fundamental na vida econômica. Talvez assim se explique a preocupação constante do legislador em criar mecanismos, em sua maioria judiciais, que tentem solucionar o problema do inadimplemento das obrigações creditícias, sejam eles direcionados a execuções singulares ou coletivas ou ainda a acordos entre devedor e seus credores.


O estado de crise econômico-financeira de uma empresa é merecedor de especial atenção, uma vez que nela se concentram relações socioeconômicas. A crise de uma empresa é capaz de causar repercussões não somente no campo econômico, visto que a produção e/ou circulação de bens e serviços, além de fonte de riquezas, também são imprescindíveis para a satisfação das necessidades sociais, seja através da geração de empregos ou de respeito ao consumidor, seja por meio da oferta de bens e serviços capazes de garantir a liberdade de escolha e a livre concorrência entre os agentes econômicos, propiciando, assim, o aperfeiçoamento dos bens postos no mercado e o bem-estar social,[1] segundo a teoria econômica.  São esses os fatores que justificam a intervenção do Estado na crise econômica e financeira das empresas, entendidas, à luz da teoria da empresa, como atividade econômica organizada para a produção e/ou circulação de bens e serviços.


Tratar-se-á no presente estudo a questão da legitimidade para ajuizar ação de falência no Brasil, mais especificamente a da Fazenda Pública e a dos credores com garantia real. Com a edição da Lei n.º 11.101/2005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência, a matéria que já esteve no foco de discussão entre os juristas quando da vigência do Decreto-Lei n.º 7.665/1945, voltou a suscitar vários questionamentos.


2. A Fazenda Pública e o requerimento de falência


2.1. A questão à luz do Decreto-Lei n.º 7.661/1945


Tal questionamento foi levantado na década de 70 pela Fazenda Pública de São Paulo, apoiada em pareceres de Fábio Konder Comparato e de J. Netto Armando,[2] que chegaram à conclusão de que seria possível o pedido de quebra pela Fazenda.


Segundo Comparato, pela realidade dos fatos, percebia-se que, por meio da execução fiscal, a Fazenda Pública não obtinha sucesso no recebimento de seu crédito. Era freqüente a inexistência ou a insuficiência de bens penhoráveis no patrimônio do devedor contribuinte, seja pelo pagamento de obrigações já vencidas, seja em decorrência do efeito de execuções anteriores ajuizadas por outros credores e já encerradas quando da constituição do crédito fiscal. A Fazenda via-se, assim, obrigada a defender seus interesses por meio de medidas processuais menos eficientes que a revocatória falimentar.[3]


O jurista, assim, enfatizava que a ação de falência poderia solucionar tais entraves.


“[…] a teimosia dos fatos vem patenteando, quotidianamente, que a perspectiva do imediato desapossamento e da indisponibilidade global do seu patrimônio, combinada com a ameaça de um inquérito judicial sobre sua atividade pregressa, como preliminar de ação penal por crime falimentar, representa formidável constrição à vontade do devedor inadimplente, malgrado o fato de se dizer e repetir – a meu ver irrefletidamente […] – que a falência não é meio de cobrança.”[4]


A legitimidade da Fazenda Pública para pedir a falência do contribuinte, no entendimento de Comparato, decorreria do fato de ser certa a possibilidade de ela reclamar seus créditos no processo falimentar. Como o art. 1º, § 2º, do Decreto-Lei n.º 7.661/1945 só estabelecia como ilegítimos para fundamentar requerimento de quebra os créditos que nela não podiam ser reclamados, restaria clara a legitimidade do Fisco para requerer a falência de seus devedores.


Outra preocupação levantada no referido parecer dizia respeito ao problema do interesse de agir. Questionava-se se a Fazenda Pública, ao preterir sua via executiva própria para requerer a falência de seu devedor, não estaria utilizando abusivamente a falência como meio de cobrança.[5]


Comparato salientou que as implicações da sentença de quebra iriam além do imediato “penhoramento” de todos os bens do devedor e da perda do direito deste de administrá-los e deles dispor. O hoje revogado Decreto-Lei n.º 7.661/1945 também previa medidas constritivas da liberdade pessoal do devedor e repressoras de sua atividade. Assim, quando o credor requeresse a quebra de seu devedor, estaria pedindo a abertura de um processo em que se aplicariam todas essas medidas protetivas de seu interesse creditício. Ou seja, para o jurista, o legislador brasileiro reconheceu que a ação de falência seria desenvolvida no interesse do autor. Assim, a ação provocada pela impontualidade do devedor configuraria uma forma de execução individual, se o devedor efetuasse o depósito elisivo, ou forma de execução concursal, caso a insolvência do devedor fosse reconhecida.[6]


O caráter privilegiado do crédito tributário não implicaria falta de interesse para requerer a falência do contribuinte. Naquele parecer, Fábio Konder Comparato defendeu que tal interesse é o processual, e não o legítimo interesse econômico ou moral, que seria aquele que se confundiria com o próprio direito material invocado. Por outro lado, o interesse processual relacionar-se-ia com a necessidade de o autor da ação valer-se de determinado provimento judicial para a satisfação do direito substantivo de que fosse titular.[7]


O privilégio do crédito fiscal não poderia ser confundido com garantia real, não se aplicando, assim, à Fazenda Pública o art. 9, III, b, do Decreto-Lei de 1945, que impedia o credor com garantia real de requerer a quebra de seu devedor se não renunciasse à garantia ou provasse que ela era insuficiente.  Eis a explanação do autor:


“A existência do privilégio não altera a natureza pessoal do crédito, e por conseguinte só se manifesta relativamente a outros créditos. Não comporta uma incidência direta e absoluta sobre os bens do devedor, mesmo tratando-se de privilégio especial, o que significa que não dá seqüela.”[8]


Concluiu Comparato que a Fazenda do Estado de São Paulo, sua consulente, tinha legitimidade processual para requerer a falência, nas hipóteses previstas no art. 2º do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, daqueles, até então, denominados de comerciantes. Para tanto, bastaria que o Fisco exibisse o título de seu crédito, ainda que não vencido. Afirmou, ainda, que a certidão de dívida ativa configuraria título hábil a ensejar o requerimento de quebra do devedor contribuinte nos termos do art. 1º do diploma falimentar até então em vigor (Decreto-Lei n.º 7.661), ou seja, o pedido baseado na impontualidade do pagamento de “obrigação líquida, constante de título que legitime a ação executiva”. A certidão de dívida ativa, por legitimar a execução fiscal, preencheria os requisitos exigidos no mencionado dispositivo.


A impontualidade do contribuinte não precisaria nem mesmo se referir ao crédito tributário, que poderia não estar vencido. O Fisco só precisaria, nessa hipótese, exibir a certidão de protesto de outro credor.


J. Netto Armando também se manifestou, em parecer resultante de consulta realizada pela coordenação da administração tributária da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, favoravelmente ao pedido de falência feito pelo Fisco. Para ele, o Decreto-Lei n.º 7.661/1945, em seu art. 9°, III, b, somente fazia referência ao credor com garantia real, de tal forma que nenhuma restrição era imposta ao pedido de quebra realizado pelos credores privilegiados, entre eles a Fazenda Pública. Assim, ela teria legitimidade ativa para dar ensejo à abertura da falência de seu contribuinte, sem para tanto precisar renunciar ao seu privilégio. Somente o credor com garantia real é que, quando do requerimento de falência de seu devedor, teria que renunciar à sua garantia ou provar que esta não seria suficiente para a satisfação de seu crédito.[9]


A Fazenda Pública, no entender de J. Netto Armando, teria legitimidade ativa para requerer a quebra do contribuinte, fosse ela baseada no art. 1°, caput, ou no art. 2°, ambos do Decreto-Lei de 1945.


No tocante ao art. 1°, caput, que previa a falência por impontualidade, o jurista defendeu que o Fisco preencheria todos os requisitos exigidos pelo dispositivo, quais sejam: 1) titularidade de obrigação líquida, certa e vencida; 2) obrigação que conste de título que legitime ação executiva e 3) impontualidade do devedor na satisfação de sua obrigação.[10]


A certidão de dívida ativa representaria obrigação líquida, pois, por expressa disposição legal, goza de presunção de certeza e liquidez. Ademais, a referida certidão proporcionaria ação executiva, estando, assim, satisfeitos os dois primeiros requisitos. Eis o posicionamento de Netto Armando:


“[…] a Fazenda Pública Estadual, para peticionar falência nos termos do art. 1°, “caput”, da Lei Falimentar (conjugado com o seu art. 11), satisfaz todos os requisitos legais: a sua dívida ativa regularmente inscrita representa “obrigação líquida”, a certidão dessa dívida constitui “título” e esse título legitima “ação executiva”.” [11]


E, por fim, para provar a impontualidade de seu devedor, bastaria à Fazenda proceder ao protesto de seu título, ou seja, da certidão de dívida ativa nos termos do art. 10 do Decreto-Lei n.º 7.661/1945.


Além da legitimidade do Fisco, para Netto Armando, também seria “incontrariável”[12] o seu interesse em peticionar a quebra do contribuinte devedor. Isso porque, apesar de a Fazenda Pública possuir o procedimento judicial da execução fiscal para cobrar seus créditos, não lograva êxito nessa cobrança por não conseguir efetuar penhora sobre os bens dos contribuintes, visto que, não raras vezes, tais bens eram insuficientes.


O jurista acentuou que, além de a Fazenda Pública não conseguir satisfazer seus créditos, ela também não conseguia fazer com que o contribuinte devedor parasse sua atividade, cessando, assim, a incidência de novos tributos e os efeitos negativos sobre o mercado com a concorrência desleal exercida. Claro, assim, estaria o interesse do Fisco:


“Conclui-se do exposto que apenas a completa cessação das atividades de tais pessoas seria o meio eficaz de combate ao seu inqualificável comportamento tributário para com o Estado.”[13]


Posteriormente, e mais recentemente, a Fazenda Pública de Minas Gerais submeteu a questão, mais uma vez, aos tribunais. Ajuizou vários pedidos de falência de seus contribuintes com base no inciso I do art. 2º do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, que ainda vigorava. Esse dispositivo estabelecia que estava também caracterizada a falência quando o comerciante executado não pagava, não depositava o valor devido nem nomeava bens à penhora, dentro do prazo legal, ou seja, na hipótese da tríplice omissão do devedor.


Uma dessas ações foi julgada pelo Superior Tribunal de Justiça, que reformou o acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, no sentido da admissão do requerimento pela Fazenda Pública. Veja-se a ementa do referido acórdão:


“FALÊNCIA. FAZENDA PÚBLICA. INTERESSE. NÃO HÁ EMPEÇO LEGAL A QUE FAZENDA PÚBLICA REQUEIRA A FALÊNCIA DE SEU DEVEDOR. A LEI DE QUEBRAS SOMENTE EXCLUI O CREDOR COM GARANTIA REAL, NOS TERMOS DO ART. 9., III, “B”. DIREITO REAL DE GARANTIA E PRIVILÉGIO CREDITÓRIO NÃO SE CONFUNDEM. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.” (REsp 10.660/MG, Rel. MIN.  COSTA LEITE, TERCEIRA TURMA, julgado em 12.12.1995, DJ 10.06.1996 p. 20319)[14]


No entanto, como aponta Paulo Penalva Santos, da leitura dos votos do Ministro Costa Leite, Relator, e do Ministro Cláudio Santos, percebia-se que a questão estava longe de se tornar pacífica.[15] O citado Recurso Especial, interposto pela Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais, como se pode notar da leitura da ementa colacionada, foi julgado procedente, mas não por unanimidade. O Ministro Relator Costa Leite, em seu voto, não se alinhou à posição do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, dando, assim, provimento ao recurso. Para tanto, apoiou-se no já mencionado pronunciamento de Fábio Konder Comparato. Por outro lado, o Ministro Cláudio Santos, em voto vencido, defendeu que a cobrança judicial de dívida ativa só poderia dar-se em execução fiscal, faltando à Fazenda Pública interesse econômico e moral para requerer a quebra do contribuinte.


Tanto é verdade que a questão estava longe da pacificação que, em 1998, o próprio Superior Tribunal de Justiça, em julgamento de recurso especial também interposto pela Fazenda Pública do Estado de Minas Gerais, manifestou, por unanimidade, posicionamento diametralmente oposto.[16]


 Em 2003, a questão foi mais uma vez submetida à apreciação do STJ por meio de outro recurso especial interposto pelo Fisco mineiro. A Quarta Turma confirmou o posicionamento da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que já havia deixado assentado que o Fisco não tinha interesse processual para pleitear a falência do contribuinte, ainda que possuidor de título líquido e certo (Certidão de Dívida Ativa), desacolhendo, assim, o recurso do Poder Público. Eis a ementa desse Recurso Especial:


PROCESSO CIVIL. PEDIDO DE FALÊNCIA FORMULADO PELA FAZENDA PÚBLICA COM BASE EM CRÉDITO FISCAL. ILEGITIMIDADE. FALTA DE INTERESSE. DOUTRINA. RECURSO DESACOLHIDO.


I – Sem embargo dos respeitáveis fundamentos em sentido contrário, a Segunda Seção decidiu adotar o entendimento de que a Fazenda Pública não tem legitimidade, e nem interesse de agir, para requerer a falência do devedor fiscal.


II – Na linha da legislação tributária e da doutrina especializada, a cobrança do tributo é atividade vinculada, devendo o fisco utilizar-se do instrumento afetado pela lei à satisfação do crédito tributário, a execução fiscal, que goza de especificidades e privilégios, não lhe sendo facultado pleitear a falência do devedor com base em tais créditos.” (REsp 164389/MG, Rel. Ministro  CASTRO FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro  SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13.08.2003, DJ 16.08.2004 p. 130)[17]


Mais uma vez, entretanto, o julgamento da questão não se deu por unanimidade. O Relator, Ministro Castro Filho, foi voto vencido, defendendo que a Fazenda poderia ter o fim não somente de satisfazer seus créditos, mas também de paralisar as atividades daqueles contribuintes que, apesar de constantemente autuados, não saldam sua dívida através de uma execução fiscal por faltar-lhes bens a serem penhorados. Assim, o Fisco poderia impedir esses fraudadores de exercerem concorrência desleal com aqueles contribuintes fiéis cumpridores de suas obrigações tributárias. A quebra, logo, teria também objetivo moralizante, apesar de esse não ser seu fim precípuo. Para finalizar, argumenta que não existiria nenhum óbice legal que pudesse impedir a Fazenda Pública de peticionar a quebra do contribuinte devedor.


Por outro lado, vale mencionar, de forma sintética, o posicionamento de alguns dos ministros que saíram vencedores no julgamento daquele recurso especial. Para Sálvio de Figueiredo Teixeira, a cobrança de tributo é atividade plenamente vinculada; por isso, o Poder Público deveria valer-se da execução fiscal para satisfazer seus créditos, sendo certo que a falência seria uma medida drástica demais. Ari Pargendler asseverou que “a sentença de falência não poderia resultar de uma mera certidão de dívida ativa no âmbito do processo administrativo controlado pela própria Fazenda Pública”. E Ruy Rosado de Aguiar ponderou: “Se ao Estado é dado requerer a falência, isso não é uma possibilidade, é um dever. Se o Estado requerer a falência de todos os seus devedores, será o caos; se tiver o direito de escolher uns devedores e não outros, será um caos pior”.


Em 2005, a questão foi mais uma vez apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do Recurso Especial n.º 287.824, também interposto pela Fazenda Pública de Minas Gerais. A questão, dessa vez, pareceu estar mais próxima da pacificação, pelo menos entre os membros da 1ª Turma daquele Egrégio Tribunal. Decidiu-se novamente – mas, desta feita, por unanimidade – pela ausência de legitimação do Fisco para promover a quebra do contribuinte.[18]  


Feitas essas considerações introdutórias, faz-se necessária a análise das correntes doutrinárias sobre a questão. Na vigência do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, havia duas correntes que discutiam a possibilidade ou não de a Fazenda Pública requerer a falência do contribuinte, sendo certo que uma a defendia, enquanto outra a refutava.


A corrente contrária à possibilidade de o Fisco pedir a falência do devedor sustentava os seguintes argumentos. O Código Tributário Nacional, em seu art. 187, estabelece que os créditos fiscais não estão sujeitos ao concurso de credores. Assim, não haveria razão para a Fazenda Pública requerer a falência do contribuinte, já que, após sua decretação, teria que informar ao juízo universal que seus créditos não estavam sujeitos ao concurso de credores. Além disso, o Código Tributário Nacional, que é lei complementar, estabelecia, em seu art. 186, outro privilégio à Fazenda Pública, qual seja: a preferência do crédito tributário sobre todos os outros, salvo os decorrentes da legislação trabalhista. 


Argumentava-se também que o Decreto-Lei n.º 7.661/1945 não fazia menção à Fazenda Pública no rol (arts. 8 e 9) dos sujeitos aptos a requerer a falência do devedor. Ademais, o art. 38 da Lei n.º 6.830/1980 inabilitaria o Poder Público a pedir a quebra do contribuinte, já que não elencava a falência entre os procedimentos previstos para a discussão judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública. Nos termos desse dispositivo, a discussão “só é admissível em execução, na forma desta lei, salvo as hipóteses de mandado de segurança, ação de repetições do indébito ou ação anulatória do ato declaratório da dívida”.


Como a decretação da falência não obstava o ajuizamento de execuções fiscais, acreditava-se, ainda, que à Fazenda Pública faltava interesse econômico e moral, requisito estabelecido pelo art. 76[19] do Código Civil na época em vigor – Código de 1916 – como necessário à propositura de uma ação. Nesse sentido, manifestou-se Rubens Requião:


De nossa parte, estranhamos o interesse que possa ter a Fazenda Pública no requerimento de falência do devedor por tributos. Segundo o Código Tributário Nacional os créditos fiscais não estão sujeitos ao processo concursal, e a declaração da falência não obsta o ajuizamento do executivo fiscal, hoje de processamento comum. À Fazenda Pública falece, ao nosso entender, legítimo interesse econômico e moral para postular a declaração de falência de seu devedor.


A ação pretendida pela Fazenda Pública tem, isso sim, nítido sentido de coação moral, dadas as repercussões que um pedido de falência tem em relação às empresas solventes”. [20]


Havia, no tocante a esse ponto, confusão entre o interesse substancial previsto no Código Civil e o interesse de agir. Aquele consistia no núcleo do direito material alegado em juízo, enquanto este, por sua vez, é sempre jurídico e processual. A falta de interesse jurídico manifesta-se, assim, na inexistência de uma das condições da ação: o interesse de agir, caracterizado pela utilidade e necessidade do processo como meio de solucionar um caso concreto.


O objetivo da Fazenda Pública era – e ainda é – receber seu crédito inscrito em dívida ativa, e não a falência do contribuinte. Porém, o Poder Público, para a satisfação desses créditos, coagia seus devedores a pagarem os tributos devidos sob a ameaça do pedido de quebra. Como pode ser notado, à Fazenda Pública faltava interesse de agir no requerimento de falência. Nesse diapasão, manifestou-se Wille Duarte Costa:


“Dessa forma, não há mesmo interesse processual da Fazenda Pública em requerer a falência do contribuinte, já que a legislação em vigor oferece-lhe todos os privilégios, assegurando mesmo que, “a competência para processar e julgar a execução da Dívida Ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro Juízo, inclusive o da falência, da concordata, da liquidação, da insolvência ou do inventário” (art. 5º da Lei n. 6.830/80). Depois disso, “a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda Pública não é sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata liquidação, inventário ou arrolamento” (art. 29 da Lei n. 6.830/80) e, finalmente, “nos processos de falência, concordata, liquidação, inventário, arrolamento ou concurso de credores, nenhuma alienação será judicialmente autorizada sem a prova de quitação da Dívida Ativa ou concordância da Fazenda Pública” (art. 31 da Lei n. 6.830/80).[21]  


Sacha Calmon, em artigo publicado no Estado de Minas em 7 de março de 1996 e republicado posteriormente em revista especializada, também encontrou impedimentos de ordem ética, política e jurídica. O primeiro dizia respeito à intimidação que era feita ao empresariado pela Fazenda Pública com a ameaça do requerimento de quebra. O segundo referia-se à impossibilidade de discussão do débito fiscal. Com a ameaça e a pressão que objetivavam atrair os devedores a um acordo, estes confessavam a dívida para fazer jus ao parcelamento e, assim, a possibilidade de discutir o débito restava prejudicada. E, por fim, o terceiro impedimento, de ordem jurídica, estava associado à Certidão de Dívida Ativa (CDA). Como se trata de título constituído unilateralmente, seria injusto requerer a falência daquele que não a emitiu. O jurista ainda nos atentava para o fato de o CTN dispor que o juiz separará bens da massa suficientes para a satisfação das execuções fiscais.[22] 


Outra argumentação que merece destaque foi a desenvolvida por Paulo Penalva Santos. O autor, baseando-se em argumentos de natureza constitucional, chegou à conclusão de ser impossível ao Fisco pedir a quebra do contribuinte. A Fazenda Pública, credora privilegiada, teria interesse jurídico e legitimidade ativa, mas seu comportamento de requerer a falência do devedor seria incompatível com, pelo menos, dois princípios constitucionais, quais sejam: o da razoabilidade e o da função social da propriedade e dos bens de produção.[23]


Por fim, defendia-se ainda que, em tese, a Fazenda Pública poderia requerer a falência do contribuinte. Porém, para tanto, teria que renunciar a seus privilégios, assim como os credores com garantia real, que, à luz do art. 9º, II, b, do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, tinham que renunciar à garantia ou provar que esta era insuficiente para a satisfação de seu crédito. Como isso não era possível, já que não havia previsão legislativa nesse sentido, acabava-se concluindo ser impossível ao Poder Público requerer a quebra do contribuinte. A impossibilidade da renúncia pela Fazenda Pública, em verdade, decorreria do próprio princípio da indisponibilidade do interesse público. Nesse sentido, vale trazer o posicionamento de Elias Bedran:


“[…] se o fisco, na reivindicação de sua dívida ativa, não tem nenhuma limitação, sendo expressa a lei ao dar-lhe essa imunidade, quer nos parecer que, então, só se a Fazenda Pública despisse de todo êsse resguardo, é que se lhe devia facultar o exercício de requerer a falência de um seu devedor. Assemelharia ao credor privilegiado (n.° 347). Mas, não lhe assiste o poder dessa desistência, que, em se tratando de direito público, só o legislativo através de lei especial, poderia autorizar. Logo, à Fazenda Pública não assiste direito de postular a falência de seu devedor comerciante.”[24]


A segunda corrente, por sua vez, em posicionamento oposto, defendia a possibilidade de a Fazenda Pública propor ação de falência. Essa faculdade decorreria do fato de a Certidão da Dívida Ativa (CDA) ser título executivo que, revestido de certeza e liquidez, preencheria todos os requisitos necessários para o requerimento da quebra. A certeza e a liquidez da CDA seriam expressamente conferidas por lei, ou melhor, pelo art. 204 do Código Tributário Nacional.


Amador Paes de Almeida compartilhou desse entendimento. No entanto, acreditava que o requerimento do Fisco era totalmente inconveniente, já que o objetivo da Fazenda era receber seus créditos para satisfazer interesses coletivos, e não ver decretada a falência do devedor.


De todo necessário ressaltar, porém, a total inconveniência de a Fazenda Pública requerer a falência de seu contribuinte-comerciante.


Não bastasse o fato de estarem as empresas, sobretudo as de pequeno porte, sobrecarregadas de tributação, não se pode olvidar a sua natureza institucional, cumprindo ao Poder Público zelar pela sua sobrevivência.”[25]


Para pedir a falência do contribuinte, a Fazenda Pública, entretanto, não precisaria se submeter às restrições do art. 9º, III, b, do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, que impunha ao credor com garantia real – para requerer a falência de seu devedor – a renúncia à garantia ou a prova de que ela não era suficiente para satisfazer o crédito. Isso porque não se poderia interpretar extensivamente o mencionado dispositivo. Além disso, defendia-se que não se poderia confundir privilégio pessoal, que é o conferido à Fazenda Pública, com garantia real, sendo que a lei somente dispõe sobre esse último.


Defendia-se, ainda, a possibilidade de o Fisco requerer a falência do devedor pelo fato de não existir impedimento legal, advindo seu interesse de agir do insucesso no recebimento de seus créditos pela via executiva individual. Tais argumentos foram expostos mais detalhadamente quando abordados os pareceres de Fábio Konder Comparato e J. Netto Armando.


2.2 A questão à luz da Lei n.º 11.101/2005


A Lei n.º 11.101/2005 perdeu a oportunidade de pôr fim à discussão sobre a possibilidade de a Fazenda Pública requerer a falência de seus devedores. A análise de seu art. 97 dá ensejo às mesmas discussões travadas durante a vigência do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, sobre a possibilidade ou não de o Poder Público pedir a quebra do sujeito passivo da relação jurídico-tributária.


Apesar de a sistemática da nova Lei não vedar o requerimento da falência pelo Fisco, mas, pelo contrário, conferir a ele legitimidade, nos termos do art. 97, IV, ao prever que “qualquer credor” pode pedir a quebra, entende-se que à Fazenda Pública continua faltando interesse de agir, uma das condições da ação que, se não atendida, como as demais, acarreta a extinção do processo sem resolução do mérito, ainda que a inexistência de tal condição só seja aferida no final do procedimento. O interesse processual surge da necessidade que a parte tem de obter proteção de seu interesse através de um determinado processo, que, ao mesmo tempo, tem que lhe ser útil. Ou seja, impõe-se a presença do binômio “necessidade-utilidade”, que engloba a adequação. Nesse sentido, as lições de Humberto Theodoro Júnior:


“O interesse processual, a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado, diante do conflito de direito material trazido à solução judicial.


Mesmo que a parte esteja na iminência de sofrer um dano em seu interesse material, não se pode dizer que exista o interesse processual, se aquilo que se reclama do órgão judicial não será útil juridicamente para evitar a temida lesão.”[26]


Logo, se o exercício de um direito não é necessário e proveitoso para seu titular, este não merece proteção. Para que o direito de ação possa ser regularmente exercido, é preciso que estejam presentes todos os elementos do interesse de agir, bem como das demais condições da ação. A falta da necessidade ou da utilidade, que também se desdobra na adequação, já implica a carência da ação por falta do próprio interesse de agir.


A necessidade está fundamentada na premissa de que as engrenagens do Poder Judiciário somente devem ser acionadas quando é a única forma de solução de um conflito. No pedido de falência feito pelo Fisco, não há dúvidas da presença desse requisito. Como esclarece Fredie Didier Jr., somente naquelas situações em que se pretende exercitar um direito através de um processo judicial, mas há possibilidade de cumprimento espontâneo da obrigação, é que se deve falar em ausência de necessidade.[27] Quando a Fazenda Pública inscreve um crédito em dívida ativa, constituindo uma CDA, o devedor já teve a oportunidade de, espontaneamente, cumprir sua obrigação, mas assim não fez. O recurso ao Judiciário é inevitável, não sendo, no entanto, o procedimento falimentar o apto a proteger os interesses do Poder Público.


Com o advento da Lei n.º 11.101/2005 e das respectivas alterações na ordem de classificação dos créditos na falência, a quebra passou a ser uma via menos útil ainda para que a Fazenda Pública receba seus créditos. Depois de pagos os créditos trabalhistas de até 150 salários mínimos e, principalmente, os credores com garantia real, dificilmente restarão valores suficientes para satisfazer os créditos fiscais.


Sob a vigência do revogado Decreto-Lei n.º 7.661/1945, o Fisco recebia seus créditos, no processo falimentar, logo após o pagamento daqueles decorrentes da legislação trabalhista sem limitação de valor. Hoje, como mencionado, só receberá após a satisfação dos créditos trabalhistas dentro da limitação imposta em lei e dos créditos com garantia real, cujos titulares são, em geral, os bancos. Resta, logo, extreme de dúvidas que a sistemática da nova Lei corrobora ainda mais para a inutilidade da falência como meio de satisfação dos interesses do Fisco.


A execução fiscal mostra-se mais eficaz para o Fisco. Ele não necessita da falência, procedimento muito mais confuso, para receber seu crédito. Pode e deve valer-se da via acima mencionada.


Assim, não pode prevalecer, em que pesem opiniões em contrário, a afirmação de que o requisito da utilidade surgiria do insucesso do Fisco em receber seus créditos através da execução fiscal. Se, nem mesmo por meio de uma execução individual, em que não concorre com outros devedores, o Poder Público consegue satisfazer seus créditos, o que dizer, então, de uma execução concursal, em que está submetido a uma ordem de pagamento, principalmente quando se considera que, nos termos da nova sistemática, não ocupa mais a segunda posição nessa ordem?    


A falência não é útil à satisfação dos interesses do Fisco, uma vez que a Fazenda não almeja a quebra de seu devedor, mas tão-somente o recebimento de seus créditos inscritos em dívida ativa. Nessa esteira, não se pode olvidar que a falência não é meio de cobrança ou de execução de crédito. Tanto isso é verdade que, para tentar coibir ou, ao menos, diminuir essa prática, o próprio legislador da Nova Lei de Falência impôs, por exemplo, valor mínimo necessário para que a falência seja decretada por impontualidade do devedor. Assim, o credor só poderá requerer a falência, na hipótese de impontualidade, quando for titular de obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados que perfaçam a quantia mínima de quarenta salários mínimos. Esse limite mínimo, no entanto, pode ser atingido pela reunião dos credores, o que não desvirtua a intenção do legislador.  Nesse sentido, os ensinamentos de Carvalho de Mendonça:


“Não é a falência o meio normal de obter o credor o cumprimento exato da obrigação assumida pelo devedor, se êste, por motivos atendíveis ou ainda por culpa, má fé ou fôrça maior, não a desempenha, nem se acha em condições de desempenhá-la, mas o remédio extraordinário, que institui o concurso dos credores sôbre o patrimônio realizável do devedor comum, manifestada que seja a impossibilidade de satisfazer pontualmente seus compromissos.”[28]


Humberto Theodoro Júnior aponta ainda duas outras inovações trazidas pela nova Lei que podem desestimular o pedido de falência que tem como objetivo a mera cobrança. Uma delas é a não-decretação da falência quando o devedor, no prazo de contestação, apresentar pedido de recuperação judicial. A outra medida inovadora diz respeito à dilação do prazo de contestação para dez dias, sendo certo que, sob a égide do revogado Decreto-Lei n.º 7.661/1945, esse prazo era de exíguas 24 horas. [29]


Além da confirmação da falta de interesse de agir, uma vez que ausente o elemento da utilidade, poderia parecer ainda desarrazoado que a Fazenda Pública, não se submetendo ao concurso de credores nem precisando se habilitar no processo falimentar, pudesse requerer a quebra de seu devedor. Apesar de o juízo falimentar ser universal e indivisível, tem-se que as causas fiscais, assim como as trabalhistas e aquelas não reguladas na Lei n.º 11.101/2005, em que o devedor falido figurar como autor ou litisconsorte ativo, são exceções a essa regra conforme estabelece o art. 76 da Nova Lei de Falências. Esse dispositivo está em total consonância com o previsto pela Lei n.º 6.830/1980, em seu art. 5º, segundo o qual “A competência para processar e julgar a execução da Dívida Ativa da Fazenda Pública exclui a de qualquer outro Juízo, inclusive o da falência, da concordata, da liquidação, da insolvência ou do inventário”.


Assim, decretada a falência, o Fisco pode prosseguir com as execuções fiscais já iniciadas e propor novas em seu juízo privativo, que as julgará, mas não poderá efetuar o pagamento da quantia devida à Fazenda Pública. O juiz competente, no processamento da ação fiscal, deverá comunicar o valor do crédito ao juízo falimentar e proceder à penhora no rosto dos autos, pois, apesar de o Fisco não se submeter ao concurso de credores nem precisar se habilitar, está sujeito à ordem de classificação dos créditos do art. 83 da Lei n.º 11.101/2005. Ou seja: a Fazenda terá que aguardar o momento próprio para receber seu crédito, que só será pago após os créditos extraconcursais, os decorrentes da legislação do trabalho, limitados a 150 salários mínimos, e os provenientes de acidente de trabalho, e, por fim, após os créditos com garantia real até o limite do bem onerado.


Se já houver constituição de penhora quando da decretação da falência, o bem penhorado irá à hasta pública, e o produto da alienação deve ser entregue ao juízo falimentar, incorporando-se ao monte a ser partilhado entre os credores, observada a ordem de preferência dos créditos. Por outro lado, se a Fazenda Pública ajuizar a execução fiscal após a decretação da quebra, não haverá constrição de bens determinados. A penhora se dará no rosto dos autos.


Fábio Ulhoa expõe posicionamento diametralmente oposto ao apresentado aqui. Para o autor, em decorrência do fato de o Fisco não se sujeitar ao concurso de credores, pode ocorrer hipóteses em que satisfaça seus créditos antes dos credores trabalhistas e dos credores com garantia real. Dependendo da tramitação da execução fiscal e da falência, isto é, do tempo de duração dos feitos, a ordem de preferência estabelecida pelo art. 83 da Lei n.º 11.101/2005 não será seguida. Essa ordem de pagamentos seria somente uma “série de comandos para o administrador judicial,[30] não reproduzindo, assim, necessariamente, a ordem de satisfação dos créditos.


“O administrador judicial não pode fazer nenhum pagamento para credor da falida sem observar estritamente as hierarquias e preferências entre as classes e subclasses, mas, se algum credor, por força das garantias de seu crédito, acaba recebendo em desacordo com essas hierarquias e preferências, a inversão não repercute na falência e não importa responsabilidade do administrador judicial”.[31]


No entanto, apesar de a Fazenda Pública não se submeter ao processo falimentar, ela sofre os efeitos materiais da Lei n.º 11.101/2005, ou seja, sujeita-se às normas materiais como, por exemplo, à norma que estabelece a ordem de pagamento dos credores (art. 83).


Não se poderia deixar de ressaltar que o art. 187, parágrafo único, do Código Tributário Nacional (CTN), que fixa que o concurso de preferências só ocorre entre pessoas jurídicas de direito público, está perfeitamente em consonância com o art. 83 da Nova Lei de Falência. O dispositivo do CTN estabelece subclasses entre os créditos fiscais. Assim, pagos os créditos trabalhistas e os que tiverem garantia real, serão satisfeitos os créditos fiscais observando-se, para tanto, a seguinte ordem, fixada pelo parágrafo único do art. 187: União; Estados, Distrito Federal e Territórios; e, por fim, Municípios. 


Tanto é verdade que a execução fiscal é o meio adequado para a satisfação de créditos tributários que, além de ser possível o prosseguimento da execução fiscal quando da decretação de falência do devedor, como já mencionado, ao Fisco ainda compete outra tentativa de satisfação do valor que tem a receber se ocorrer o encerramento da falência. Havendo o fim da execução concursal, a execução fiscal que prosseguia contra a massa falida, em princípio, deveria ser extinta, por inexistência de sujeito passivo. No entanto, antes de se operar tal extinção, deve ser conferida oportunidade ao exeqüente – a Fazenda Pública – de postular o redirecionamento da execução contra os sócios da sociedade falida, que agiram com dolo ou de forma fraudulenta.[32] Assim já julgou o Superior Tribunal de Justiça.[33]      


Não há, portanto, como sustentar a possibilidade da decretação de falência do devedor a pedido do Poder Público. Conclui-se que, apesar de o requisito da necessidade ser observado, o da utilidade, também essencial à configuração do interesse de agir, não está presente quando se fala em pedido de quebra pela Fazenda Pública, visto que há inadequação entre o procedimento falimentar e o interesse levado a juízo, qual seja, a satisfação de créditos fiscais. Essa inadequação acarreta a inutilidade da jurisdição.


Outra questão que merece ser debatida é o caráter moralizante, como sustentam alguns, do pedido de falência ajuizado pelo Fisco, que objetiva ver punidos os crimes falimentares que resultem em prejuízo para os credores e vantagem indevida para aquele que explora a atividade econômica ou para terceiro. Essa também não é a finalidade do processo falimentar. A punição a esse tipo de crime é uma conseqüência da quebra, e não o objetivo desta, que é a instauração da par condicio creditorum e a solução do problema da insolvência do devedor. Assim, a punição a esses delitos não pode ser o fator determinante para o requerimento de falência pelo Poder Público. Este pode punir o devedor pelo crime de sonegação fiscal. Pode também, entre outros meios de combate a tais práticas, requerer a desconsideração da personalidade jurídica se se tratar de sociedade empresária – para que sejam atingidos os bens dos sócios daquela sociedade que praticou atos que importaram no prejuízo dos credores -, bem como ajuizar ação de anulação de ato jurídico em fraude.


O fim que determinou a criação da norma que permite o requerimento de quebra do devedor insolvente por seus credores foi a preocupação com o estabelecimento da par condicio creditorum, ou seja, buscou-se garantir a perfeita igualdade entre os credores da mesma classe, uma vez que o patrimônio do devedor é a garantia dos credores. Se esse não fosse o fim da falência, o instituto tornar-se-ia inócuo, pois cada credor individualmente promoveria sua cobrança judicial, recebendo primeiro aqueles credores que, independentemente da classe a que pertençam, obtiverem, com mais rapidez, a prestação jurisdicional, seja por que motivo for. É essa a finalidade que deve ser observada ao se adotar a via falimentar.


A falência é um instrumento concebido para se enfrentar a insolvência jurídica[34] do devedor, quando esta, no entanto, atinge não apenas um ou outro credor, mas repercute no universo de credores da sociedade empresária ou do empresário individual inadimplente. E é para garantir a igualdade entre todos os credores da mesma classe que a sentença que decreta a quebra ordenará a suspensão das execuções singulares contra o devedor, ficando todos os credores sujeitos ao juízo universal da falência. Isso garante que todos os credores inseridos no quadro geral recebam seus créditos por meio do rateio do valor apurado na realização do ativo do devedor arrecadado. Nesse rateio, será observada a ordem de classificação dos créditos, estabelecida pela própria lei falimentar, e as preferências entre eles.


2.2.1 A Execução Fiscal


Na execução fiscal, a Fazenda Pública pode se valer da decretação de indisponibilidade de bens do devedor. Conforme estabelece o art. 185-A do Código Tributário Nacional, se o contribuinte devedor, após citação regular, não pagar nem apresentar bens à penhora ou se não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos até o limite necessário à satisfação do débito. Apesar de o art. 185-A ter sido introduzido no CTN só em 2005 pela Lei Complementar n.º 118/2005, o Fisco já dispunha de meio para garantir a eficácia da execução fiscal. A Lei 8.397, de 1992, já estabelecia a medida cautelar fiscal como instrumento para a decretação da indisponibilidade dos bens do contribuinte devedor. A indisponibilidade prevista pelo regime da Lei n.º 8.397/1992 está limitada aos bens do ativo imobilizado da pessoa jurídica, mas pode ser estendida, nos termos do § 1º do art. 4, aos bens do acionista controlador e daqueles que, por força do contrato social ou do estatuto, tenham poderes para fazer a sociedade cumprir suas obrigações fiscais. Assim, seja sob a vigência do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, seja sob a égide da Nova Lei de Falência, a execução fiscal sempre se mostrou, para a Fazenda, melhor alternativa que a quebra.


Hoje, com a penhora on line de dinheiro – medida que consiste no bloqueio de valores disponíveis em conta corrente e aplicações financeiras do executado -, a situação do Fisco nas execuções fiscais tornou-se ainda mais confortável. A constrição dos valores ocorre através do sistema Bacen Jud, ou seja, do sistema de transmissão de ordens judiciais e solicitações de informações sobre a existência de contas correntes e aplicações financeiras, e seus respectivos saldos, ao Sistema Financeiro Nacional e de ordens de bloqueio e desbloqueio de valores, por meio da internet. Também podem ser enviadas através do Bacen Jud comunicações de decretação e extinção de falências. Ou seja, com o sistema em questão, permite-se que ofícios, que antes eram enviados por papel, agora possam ser transmitidos através da rede mundial de computadores, agilizando a tramitação das determinações do juiz.[35]


A solicitação de informações ao Banco Central, bem como a ordem de penhora de dinheiro em conta corrente e/ou aplicação financeira, através de meio eletrônico, pode evitar que o devedor se antecipe e retire o valor antes mesmo do envio da solicitação de informações e bloqueio do dinheiro, prática essa possível quando da expedição de ordens judiciais por meio físico, ou seja, por meio de documento em papel. O devedor, tomando conhecimento da estratégia do credor, pode facilmente proceder à retirada do dinheiro constante das instituições financeiras ou transferi-lo a terceiros antes do encaminhamento do ofício aos membros do Sistema Financeiro Nacional. 


Com as alterações recentes do Código de Processo Civil (CPC) e, para alguns,[36] do Código Tributário Nacional (CTN), as objeções sobre a positivação da penhora on line foram afastadas. A positivação do instituto em questão, no CPC, ocorreu em 2006, com a Lei n.º 11.382, que inseriu no diploma o art. 655-A. Por outro lado, a positivação no CTN ocorreu um pouco antes, com a edição da Lei Complementar n.º118, de 2005, que inseriu no Código o art. 185-A. Restam, no entanto, problemas referentes às implicações práticas do sistema.


Um dos grandes problemas práticos do sistema Bacen Jud é o do excesso de penhora, que ocorre porque a ordem de bloqueio de valores do executado é transmitida automaticamente para todas as instituições financeiras que compõem o Sistema Financeiro Nacional. Assim, se houver recursos do executado em mais de uma instituição, todas elas efetuarão a penhora no valor ordenado pelo juiz sem ter informações de que outra instituição também conseguiu cumprir a ordem judicial, provocando, assim, excesso de penhora. Para Vanilda Fátima Maioline Hin, a possibilidade de a ordem de penhora de determinada quantia ser cumprida mais de uma vez, ainda que por instituições financeiras diversas, torna o sistema Bacen Jud incompatível com os princípios do devido processo legal e do direito de propriedade.


“O sistema que dá ensejo a que uma única ordem judicial determinando o bloqueio de quantia certa seja cumprida por tantas instituições financeiras quantas sejam depositárias de valores do executado é incompatível com o princípio do devido processo legal e com o direito de propriedade.”[37]


O excesso de penhora on line ocorre devido a uma falha do sistema, e não a uma ilegalidade do próprio instituto. O CPC, no art. 665-A, e o CTN, no art. 185-A, objetivam, através da possibilidade da constrição de bens por meio eletrônico, garantir a efetividade do processo de execução, e nisso não há nenhuma ilegalidade. O problema surge quando se institui um sistema, como o Bacen Jud, que é incapaz de impedir que uma mesma ordem judicial determinando a penhora de dado valor seja cumprida por mais de uma instituição financeira, gerando, assim, excesso de penhora.


Apesar dos problemas na aplicação da penhora on line e de inúmeras outras implicações negativas apontadas pela doutrina, inclusive sua inconstitucionalidade,[38] o instituto é legal. Assim, a Fazenda Pública, por expressa previsão no Código Tributário Nacional e no Código de Processo Civil, pode-se valer, na execução fiscal, do instituto em questão, que se mostra muito mais útil e rápido que a falência do devedor contribuinte na satisfação de seu crédito.


Por fim, vale ressaltar que o Fisco ainda goza, a seu favor, da presunção de fraude prevista no art. 185 do Código Tributário Nacional. Se o contribuinte tiver débito com a Fazenda Pública, inscrito como dívida ativa, e alienar ou onerar bens ou rendas, essas operações serão presumidas fraudulentas, salvo se restarem bens ou rendas suficientes para satisfazer integralmente o débito. Assim, serão ineficazes em relação à Fazenda a alienação ou oneração dos bens ou rendas, ou mesmo seu começo.


O Fisco, logo, não poderá argumentar que a falência lhe seria mais interessante devido ao termo legal de falência, fixado na sentença de quebra, pois já goza da presunção de fraude a seu favor, estabelecida pelo CTN. O termo legal de falência é o período anterior à decretação da quebra, que serve como ponto de referência da eficácia ou não, em relação à massa, do ato praticado pelo devedor, ou seja, corresponde ao período às vésperas da quebra, do pedido de recuperação judicial ou do primeiro protesto por falta de pagamento, no qual se investiga se houve alguma irregularidade nos atos do empresário. Essa investigação é necessária porque, como a falência não costuma surpreender o empresário, ele, na tentativa de continuar a exercer a atividade econômica, comete atos que frustram os objetivos do processo de execução concursal, favorecendo alguns credores em detrimento de outros. Assim, independentemente da prova de má-fé do devedor, presumem-se fraudulentos alguns atos praticados dentro de um período fixado pela sentença de falência.


Serão declarados ineficazes em relação à massa falida, conforme estabelece o art. 129, em seus incisos I, II e III, da Nova Lei de Falência, os seguintes atos, desde que praticados no termo legal de falência: a) o pagamento de dívidas não vencidas; b) o pagamento de dívidas vencidas e exigíveis, por qualquer forma que não a prevista no contrato e; c) a constituição de direito real de garantia, quando de dívida contraída anteriormente. As demais previsões do art. 129, apesar de não submetidas ao termo legal de falência, gozam também da presunção de fraude.


 A presunção do art. 185 do Código Tributário Nacional pode ser mais proveitosa para o Fisco que a da Lei n.º 11.101/2005, pois, naquele diploma, a presunção de fraude dos atos de alienação ou oneração de bens ou rendas ocorre desde a inscrição do débito fiscal como dívida ativa, e não somente no período às vésperas da decretação da quebra ou do primeiro protesto, quando se tratar de falência requerida por impontualidade do devedor.


 Como, não raros os casos, o único débito do devedor é com o Poder Público, não há, assim, nenhum título protestado, o que reforça a afirmação de que a presunção de fraude do CTN é mais vantajosa para a Fazenda. Assim, o termo legal de falência, caso o Fisco pudesse requerer a quebra, seria computado a partir de sua decretação. Porém, se utilizasse da via da execução fiscal, a presunção de fraude não estaria limitada a tempo algum, como ocorre no regime da lei falimentar: o termo legal de falência não pode retroagir a período superior a noventa dias anteriores à decretação da quebra. Na sistemática do CTN, a presunção, como já dito, surge a partir da inscrição em dívida ativa, independentemente de quando ocorreu tal inscrição.  


Diante de todo o exposto, não há como sustentar que o Fisco precisa da decretação de quebra do contribuinte para que seu crédito seja pago. Além da falta de adequação do procedimento, pode-se também sustentar que a execução fiscal é meio muito mais benéfico, além de menos tormentoso, para a sociedade, ainda que no processo de execução, como querem alguns,[39] a indisponibilidade de bens ou a penhora on line, assim como a penhora de renda diária, devam recair somente sobre parcela dos recursos, para que a atividade econômica do devedor contribuinte não seja inviabilizada, ou, como preferem outros,[40] que a penhora on line só seja utilizada como medida excepcionalíssima, adotada somente quando o devedor, devidamente citado, não pagar nem nomear bens à penhora, e o oficial de justiça, em seqüência, não encontrar bens penhoráveis.


3. O credor com garantia real e o pedido de falência


3.1 A questão à luz do Decreto-Lei n.º 7.661/1945


Em relação ao credor com garantia real, não havia dúvidas, sob a égide do Decreto-Lei n.º 7.661/1945, quanto à sua legitimidade ativa para requerer a falência. O art. 9º, III, b, como já mencionado, estabelecia que, para tanto, o credor teria que renunciar a sua garantia ou provar que esta era insuficiente para a solução de seu crédito.


Como o Decreto-Lei n.º 7.661/1945 não exigia que a renúncia à garantia fosse expressa e, por outro lado, estabelecia que, para que esta fosse preservada, era preciso, quando o pedido de falência se fundasse na impontualidade do devedor, procedimento prévio para comprovar a insuficiência dos bens para a solução dos créditos, defendia-se que o credor que, dispensando tal procedimento, ajuizasse o pedido de falência do devedor, estava implicitamente renunciando a sua garantia real.


Por outro lado, parte da doutrina[41] defendia a necessidade de que a renúncia fosse expressa, uma vez que se trata de negócio jurídico unilateral e, como tal, as manifestações tácitas somente poderiam ser admitidas quando a lei se manifestasse expressamente nesse sentido.


Trajano de Miranda Valverde é enfático quanto à necessidade de o credor renunciar expressamente à sua garantia. A lei somente facultaria ao credor com garantia real a via falimentar se previamente renunciasse a sua garantia real ou, se desejasse conservá-la, provasse preliminarmente a insuficiência desta para satisfazer seu crédito.[42] Ora, se a renúncia deveria ocorrer previamente, não restaria facultada ao credor a possibilidade de fazê-la de forma tácita.  


A discussão era tão acirrada que nem mesmo o Superior Tribunal de Justiça conseguiu pacificar seu entendimento sobre a renúncia do credor com garantia real na deflagração do processo concursal. Encontram-se tanto julgados favoráveis à renúncia tácita como à expressa.[43]


“- FALÊNCIA. CREDOR COM GARANTIA REAL (DECRETO-LEI N. 7661/45, ARTIGO 9., III, B).– NO ATO DO CREDOR COM GARANTIA REAL QUE REQUER A FALÊNCIA DO DEVEDOR ESTÁ IMPLÍCITA A RENÚNCIA A ESSA GARANTIA, POIS A LEI DE REGÊNCIA (DL N. 7661/45, ART. 9., III, B) NÃO EXIGE QUE ELA SEJA EXPRESSA.– RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.” (REsp 23.103/RJ. Rel. Ministro ANTÔNIO TORREÃO BRAZ, QUARTA TURMA, julgado em 28.03.1994, DJ 09.05.1994 p. 10874) [44]DIREITO COMERCIAL. CREDOR COM GARANTIA REAL. CONCORDATA. HABILITAÇÃO. NECESSIDADE DE RENÚNCIA EXPRESSA À GARANTIA. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO.I – Nos termos do art. 147 da Lei de Falências, apenas os credores quirografários estão sujeitos aos efeitos da concordata. Destarte, o credor privilegiado, que objetiva ingressar nessa categoria, deve renunciar ao seu direito de garantia.II – Na linha de precedente da Turma e da boa doutrina, essa renúncia há de ser expressa e inequívoca.” (REsp 118042/SP, Rel. Ministro  SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 23.03.1999, DJ 11.10.1999 p. 72) [45]

Apesar da discussão sobre a necessidade de a renúncia ser expressa ou não, o legislador de 1945 andou bem ao estabelecer expressamente as condições a que está submetido o credor com garantia real no pedido de falência de seu devedor, visto que se encontra em uma situação privilegiada em relação aos demais credores. No caso de inadimplência do devedor, possui assegurado o pagamento de seu crédito através de um bem afetado para esse fim. A lei, ao estabelecer a necessidade de renúncia à garantia, assegurava a igualdade entre os credores e, em face da existência de outros meios de satisfação de seu crédito, impedia que a falência fosse utilizada por eles como meio de satisfação de caprichos.


3.2 A questão à luz da Lei n.º 11.101/2005


Com a entrada em vigor da Lei n.º 11.101/2005, nota-se que posições dissonantes surgiram sobre a questão da possibilidade de o credor com garantia real requerer a falência. Ricardo Negrão, por exemplo, entende que, como na sistemática da nova Lei todo credor pode requerer a falência do devedor, não haveria nenhuma restrição ou distinção à origem do título ou à garantia real conferida ao crédito que impedisse esse credor de pedir a quebra do devedor.[46] Por outro lado, Helena de Mello Franco acredita que falta ao credor com garantia real legítimo interesse, pois possui um crédito garantido, apesar de a lógica da lei não impossibilitar tal pedido.[47]


O que ocorre é que falta ao credor com garantia real interesse de agir no processo de falência, salvo se expressamente renunciar a sua garantia ou provar que esta não é suficiente, como na sistemática do revogado Decreto-Lei n.º 7.661/1945.


A Lei n.º 11.101/2005 confere legitimidade ao credor com garantia real ao estabelecer que “qualquer credor” pode requerer a quebra do devedor. No entanto, como ele se encontra em uma situação privilegiada em relação aos demais credores, que somente têm como garantia o patrimônio do devedor em concorrência com os demais credores,[48] não teria, logo, interesse em requerer a quebra do devedor. Basta que execute sua garantia individualmente.


Se, no entanto, esse credor renunciar à sua garantia ou provar que ela é insuficiente para a satisfação de seu crédito, igualando-se aos demais credores quirografários, seja na totalidade do crédito quando da renúncia, seja no saldo credor, tornar-se-ia legítimo seu interesse no requerimento de falência.


Ademais, não se pode esquecer do princípio norteador da nova Lei – o princípio da preservação da empresa viável. Assim, o credor com garantia real que, tendo outro meio de satisfazer seu crédito, requer a falência do devedor vai contra o princípio em referência. Esse credor deve usufruir de seu direito e promover a execução individual de sua garantia. O Judiciário, logo, não pode chancelar o pedido de quebra do devedor pelo credor com garantia real que não renunciou à sua garantia. A falência não pode se tornar mero instrumento de satisfação de capricho de credores que já têm seu crédito garantido por um bem.


A falência é medida extremada que deve ser utilizada somente em último caso. Não pode e não deve ser entendida como meio de cobrança de créditos individuais. Admitir que o credor com garantia real ajuíze pedido de falência de seu devedor, sem renunciar à sua garantia ou provar que ela é insuficiente, configuraria uma desproporção, visto que a falência acarreta repercussões em toda uma coletividade e o credor, através de uma simples execução, poderia satisfazer seu crédito. Permitir que postos de trabalho e fontes de produção de riquezas sejam extintos para atender à vontade injustificada de um único credor, que já tem uma garantia de seu crédito e meios eficazes de satisfazê-lo, contraria o próprio espírito da Nova Lei de Falência.


Ressalte-se que, apesar de o art. 140 da Lei n.º 11.101/2005 ter estabelecido uma ordem de preferência quanto às formas de realização do ativo do devedor, com o objetivo de tentar manter a exploração da atividade econômica até então desenvolvida pelo falido, o que se nota, não raras vezes, é sua extinção.


Não restam dúvidas de que as hipóteses dos incisos I e II, quais sejam, “a alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos em bloco” e “alienação da empresa, com a venda de suas filiais ou unidades produtivas isoladamente”, prezam a não-interrupção da atividade e, conseqüentemente, a geração de empregos e riquezas, atendendo-se, assim, ao princípio da preservação da empresa, consagrado pela Nova Lei de Falência.


Como o caput do dispositivo fixa uma ordem de preferência, somente será possível a alienação de filiais ou unidades produtivas isoladamente se, por ausência de interessados, não se realizar a venda dos estabelecimentos em bloco, bem como só se não se realizarem essas opções é que será admitida a alienação em bloco dos bens que integram o estabelecimento. Da mesma maneira, somente se a realização dessa última opção não for possível é que poderão ser alienados os bens isoladamente.


No entanto, conforme estabelece o § 1º do mesmo dispositivo, nada impede, desde que atendido o princípio da maximização do ativo, que se adote concomitantemente mais de uma forma de realização dos bens do devedor. Assim, essa previsão legal, aliada às dificuldades práticas da venda do estabelecimento em bloco, ainda que reduzidas pela inovação legislativa que extinguiu a configuração da sucessão tributária e trabalhista do arrematante (art. 141, II), só contribui para que a decretação da falência implique a extinção da empresa, ou seja, da atividade econômica.


Assim, ainda que a Lei n.º 11.101/2005 tenha conferido legitimidade ativa para o credor com garantia real, falta a ele interesse de agir, outra condição da ação, que impede o juiz de apreciar o mérito da ação. E mais, mesmo que a nova Lei não tenha imposto restrições, como a renúncia da garantia real ou a prova de sua insuficiência para solucionar o crédito, permanecem os fundamentos fáticos e jurídicos da condição imposta pelo Decreto-Lei n.º 7.661/1945 ao credor com garantia real. Com essa restrição, o revogado diploma buscava desencorajar o credor com garantia real a pedir a quebra do devedor, uma vez que dispunha de outros meios para satisfazer seu crédito. Esse objetivo permanece hoje, principalmente, com o princípio norteador da nova Lei. 


Diante de todo o exposto e da conclusão de que falta interesse de agir ao credor com garantia real para instaurar o procedimento da execução concursal, salvo se renunciar a sua garantia ou provar que ela não é suficiente para solucionar seu crédito, também sob a vigência da Lei n.º 11.101/2005 é relevante a discussão sobre a necessidade de tal renúncia ser expressa ou tácita. Quanto à prova da insuficiência da garantia, não há o que se questionar, uma vez que tal demonstração não pode ocorrer tacitamente. 


A renúncia expressa é a que mais se coaduna com o princípio da segurança jurídica. Evitam-se com ela futuros contratempos. Ademais, para que a renúncia pudesse ser tácita, a lei deveria manifestar-se nesse sentido. Uma vez que a lei assim não fez, a renúncia deve ser expressa.


4. Conclusão


Hoje, com a positivação na Lei n.º 11.101/2005 do princípio da preservação da empresa, os argumentos de ordem principiológico-constitucional ganham reforço. Todo raciocínio acerca das questões atinentes aos institutos do referido diploma legal deve ser no sentido de buscar sempre a superação da crise econômico-financeira e a reestruturação das empresas viáveis.


Especificamente no que tange à questão abordada, vale destacar a incidência dos princípios da razoabilidade/proporcionalidade[49] e da isonomia.


Concretizam o princípio da razoabilidade/proporcionalidade a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. Por adequação, pode-se entender a relação entre o meio utilizado e o fim a ser alcançado, ou seja, o meio deve ser o adequado ao fim almejado. Assim, como o objetivo do Fisco e do credor com garantia real é somente a satisfação de seus créditos e a via falimentar não é meio de cobrança, ausente está o elemento “adequação” no pedido de quebra realizado por esses credores. Além dessa necessidade de adequação, o meio ainda deve ser o menos gravoso possível à consecução do fim objetivado. Só assim estaria presente o requisito da necessidade ou da menor ingerência possível.


Tanto no caso da Fazenda Pública, bem como no do credor com garantia real, não se apresenta razoável a possibilidade de tais credores efetivarem o pedido de quebra. Como ambos se encontram munidos de meios individuais e específicos de satisfação do crédito em relação aos demais credores, eventual requerimento de falência apresentar-se-ia inadequado, desproporcional e desnecessário. Conforme já demonstrado, a falência seria um meio extremamente gravoso para a tutela dos interesses desses credores.


Por fim, a proporcionalidade em sentido estrito pode ser vista como a relação entre o custo e o benefício da medida adotada, ou seja, é preciso que o benefício seja maior que o ônus, sob pena de desproporcionalidade.


E não se diga que o princípio da razoabilidade/proporcionalidade aplica-se apenas em relação à Fazenda Pública. No tocante ao Fisco, essa aplicação é clara, pois, como é consabido, o excesso não milita em favor da Administração Pública, que deve agir sempre de maneira proporcional e na busca do interesse público. Todavia, também devem observância a esse e a outros princípios constitucionais os particulares – no caso, os credores com garantia real –, sobretudo em uma época em que se tem aceitado a eficácia horizontal dos direitos fundamentais.


O juiz, ao se pronunciar sobre o deferimento ou indeferimento do pedido do Fisco ou do credor com garantia real, não pode, assim, afastar-se da análise desse princípio, incidente justamente na aplicação da norma ao caso concreto ou, como quer Eros Grau,[50] no momento da norma de decisão.


Saliente-se ainda e por fim que, para o credor com garantia real pedir, eventualmente, a falência de seu devedor, impõe-se a renúncia expressa da respectiva garantia, e isso em decorrência do próprio princípio da isonomia. Ora, enquanto dotado seu crédito de garantia real, restou demonstrada a impossibilidade da formulação do pedido de quebra. No entanto, na medida em que essa garantia é renunciada, o credor, que antes se diferenciava dos demais, iguala-se a eles e, por imperativo de isonomia, passa a ter interesse de agir na deflagração do processo falimentar. Ressalte-se, todavia, que esse raciocínio não se aplica à Fazenda Pública, pois a indisponibilidade do interesse público, por si só, impede a renúncia dos privilégios a ela conferidos.


Conclui-se, então, que, da falta de interesse de agir, somada às questões principiológico-constitucionais correlacionadas, restam evidenciados os óbices à Fazenda Pública e ao credor com garantia real ao requerimento de falência do devedor.


Ressalte-se, no entanto, que, com isso, não se defende a preservação de toda e qualquer empresa indistintamente. Aquelas que não apresentam perspectivas de superação da crise econômico-financeira, ou seja, que não são viáveis, devem realmente ser retiradas do mercado, ainda que esse não seja o objetivo, nem deveria ser, da legislação falimentar. Porém, não é por esse motivo que a Fazenda Pública e o credor com garantia real poderão, por todos os motivos já apresentados, requerer a falência do devedor.


 


Referências Bibliográficas

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Notas:

[1] SZTAJN, Rachel. Teoria jurídica da empresa: atividade empresária e mercados. São Paulo: Atlas, 2004. p. 47.

[2] COSTA, Wille Duarte. Falência requerida pela Fazenda Pública. Revista da Faculdade de Direito Milton Campos. Belo Horizonte: Del Rey, v. 3, n. 3, 1996, p.254.

[3] COMPARATO, Fábio Konder. Falência – legitimidade da fazenda pública para requerê-la.  Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 442, agosto, 1972, p. 49.

[4] COMPARATO, Fábio Konder. Falência – legitimidade da fazenda pública para requerê-la.  Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 442, agosto, 1972, p. 49.

[5] COMPARATO, Fábio Konder. Falência – legitimidade da fazenda pública para requerê-la.  Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 442, agosto, 1972, p. 51.

[6] COMPARATO, Fábio Konder. Falência – legitimidade da fazenda pública para requerê-la.  Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 442, agosto, 1972, p. 52.

[7] COMPARATO, Fábio Konder. Falência – legitimidade da fazenda pública para requerê-la.  Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 442, agosto, 1972, p. 52.

[8] COMPARATO, Fábio Konder. Falência – legitimidade da fazenda pública para requerê-la.  Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 442, agosto, 1972, p. 53.

[9] ARMANDO, J. Netto. Falência de contribuinte a requerimento do fisco. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 451, maio, 1973, p. 50.

[10] ARMANDO, J. Netto. Falência de contribuinte a requerimento do fisco. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 451, maio, 1973, p. 53.

[11] ARMANDO, J. Netto. Falência de contribuinte a requerimento do fisco. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 451, maio, 1973, p. 53.

[12] ARMANDO, J. Netto. Falência de contribuinte a requerimento do fisco. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 451, maio, 1973, p. 55.

[13] ARMANDO, J. Netto. Falência de contribuinte a requerimento do fisco. Revista dos Tribunais. São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 451, maio, 1973, p. 56.

[14] Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em: 18 jul. 07.

[15] SANTOS, Paulo Penalva. Falência requerida pela Fazenda Pública. Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, v. 343, julho/agosto/setembro, 1998, p.167.

[16] FALENCIA. LEGITIMIDADE. FAZENDA PUBLICA.- A FAZENDA PUBLICA NÃO TEM LEGITIMIDADE PARA REQUERER A FALENCIA. RECURSO CONHECIDO MAS IMPROVIDO.

(REsp 138.868/MG, Rel. Ministro  RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 17.02.1998, DJ 30.03.1998 p. 74).   Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em: 19 jul. 07.

[17] Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em: 19 jul. 07.

[18] TRIBUTÁRIO E COMERCIAL. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. PROTESTO PRÉVIO. DESNECESSIDADE. PRESUNÇÃO DE CERTEZA E LIQUIDEZ. ART. 204 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. FAZENDA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO PARA REQUERER A FALÊNCIA DO COMERCIANTE CONTRIBUINTE. MEIO PRÓPRIO PARA COBRANÇA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. LEI DE EXECUÇÕES FISCAIS. IMPOSSIBILIDADE DE SUBMISSÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO AO REGIME DE CONCURSO UNIVERSAL PRÓPRIO DA FALÊNCIA. ARTS. 186 E 187 DO CTN.

(REsp 287824/MG, Rel. Ministro  FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20.10.2005, DJ 20.02.2006 p. 205). Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em: 08 nov. 07.

[19] Art. 76 Para propor, ou contestar uma ação é necessário ter legitimo interesse econômico, ou moral.

Parágrafo Único. O interesse moral só autoriza a ação quando toque diretamente ao autor, ou à sua família.

[20] REQUIÃO, Rubens. Curso de direito falimentar. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 1998, v, 1, p. 109.

[21] COSTA, Wille Duarte. Falência requerida pela Fazenda Pública. Revista da Faculdade de Direito Milton Campos. Belo Horizonte: Del Rey, v. 3, n. 3, 1996, p. 262-263.

[22] COELHO, Sacha Calmon Navarro. Fazenda Pública pedir falência? Eficaz: Revista de Legislação Tributária e Administrativa – Jurisprudência e Economia. 2º decêndio, março, 1996, p.5.

[23] SANTOS, Paulo Penalva. Falência requerida pela Fazenda Pública. Revista Forense. Rio de Janeiro: Forense, v. 343, julho/agosto/setembro, 1998, p.176-177.

[24] BEDRAN, Elias. Falências e concordatas no direito brasileiro: comentário, doutrina, jurisprudência e legislação. Rio de Janeiro: Alba, 1962, v.5, p. 1255.

[25] ALMEIDA, Amador Paes. Curso de falência e concordata. 20. ed. ver e atual. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 61.

[26] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 40ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. 1, p. 52.

[27] DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 7 ed. Salvador: Edições Jus Podivm, 2007, v. 1, p. 177.

[28] MENDONÇA, José Xavier Carvalho sw. Tratado de direito comercial brasileiro. 5 ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1954, v. 7, p. 19-20.

[29] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Alguns aspectos processuais da nova lei de falência. Revista IOB de Direito Civil e Processo Civil. Porto Alegre: Síntese, n. 39, janeiro/fevereiro, 2006, p. 39.

[30] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 5 ed., revista e atualizada de acordo com o novo Código Civil e a nova Lei de Falências. São Paulo: Saraiva, 2005, v. 3, p. 369.

[31] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 5 ed., revista e atualizada de acordo com o novo Código Civil e a nova Lei de Falências. São Paulo: Saraiva, 2005, v.3, p. 369.

[32] CUNHA, Leonardo José Carneiro da. A fazenda pública em juízo. 5 ed. revista, ampliada e atualizada. São Paulo: Dialética, 2007, p. 298.

[33] PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. DESARQUIVAMENTO POR ATO DO JUÍZO. PROCESSO DE FALÊNCIA. ENCERRAMENTO. INTIMAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA. ARTS. 25 E 40 DA LEI 6.830/80. NECESSIDADE. POSSIBILIDADE DE REDIRECIONAMENTO.

1. A Fazenda Pública deve ser intimada do ato de desarquivamento da execução fiscal promovido de ofício pelo juízo da causa.

2. No desarquivamento da execução fiscal, o art. 40 da Lei 6.830/80 não pode ser interpretado isoladamente, devendo ser observado o disposto no art. 25 da LEF.

3. Ao magistrado não é dado extinguir o processo sem julgamento do mérito deixando de ouvir a Fazenda Pública sob o argumento de que, encerrada a falência da pessoa jurídica, não deve prosseguir a execução fiscal contra a massa falida, por inexistência de sujeito passivo, pois deve ser facultado à credora exeqüente a oportunidade de postular o redirecionamento contra os sócios – art. 134, VII, do CTN.

4. Recurso especial provido.

(REsp 608198/RS, Rel. Ministro  CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 14.09.2004, DJ 25.10.2004 p. 307). Disponível em: <www.stj.gov.br>. Acesso em: 07 nov. 2007.

[34] Fábio Ulhoa assim se manifesta sobre a insolvência, pressuposto da instauração do procedimento falimentar:

Para se decretar a falência da sociedade empresária, é irrelevante a “insolvência econômica”, caracterizada pela insuficiência do ativo para solvência do passivo. Exige a lei a “insolvência jurídica”, que se caracteriza, no direito falimentar brasileiro, pela impontualidade injustificada (LF, art. 94, I), pela execução frustada (art. 94, II) ou pela prática de ato de falência (art. 94, III). (COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 5 ed., revista e atualizada de acordo com o novo Código Civil e a nova Lei de Falências. São Paulo: Saraiva, 2005, v. 3, p. 251)

[35] As informações aqui apresentadas sobre o Bacen Jud foram obtidas no site do Banco Central do Brasil: <http://www.bcb.gov.br/?BCJUDINTRO>. Acesso em 17 jan.2008.

[36] Como o art. 185 – A do CTN utiliza a expressão “indisponibilidade de seus bens e direitos”, há aqueles que defendem que o dispositivo não estaria se referindo à penhora on line, mas sim a um momento anterior, ou seja, preparatório à penhora, em que há somente o bloqueio dos bens e/direitos. (HIN, Vanilda Fátima Maioline. Responsabilidade tributária na falência e na recuperação judicial e a lei complementar nº 118/2005. In: SANTOS, Paulo Penalva (coord.). A nova lei de falências e de recuperação de empresas – Lei nº 11.101/05. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 486).

[37] HIN, Vanilda Fátima Maioline. Responsabilidade tributária na falência e na recuperação judicial e a lei complementar nº 118/2005. In: SANTOS, Paulo Penalva (coord.). A nova lei de falências e de recuperação de empresas – Lei nº 11.101/05. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 486.

[38] Alega-se que as requisições e ordens judiciais, realizadas por meio eletrônico, às instituições financeiras nas quais o devedor mantem conta corrente e/ou aplicações financeiras implicaria violação ao direito de privacidade constitucionalmente protegido, bem como ao devido processo legal e suas garantias.

[39] HIN, Vanilda Fátima Maioline. Responsabilidade tributária na falência e na recuperação judicial e a lei complementar nº 118/2005. In: SANTOS, Paulo Penalva (coord.). A nova lei de falências e de recuperação de empresas – Lei nº 11.101/05. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 493.

[40] BICHARRA, Luiz Gustavo; FALCÃO, Manuella. Medida atentatória da ordem jurídica. Revista Jurídica Consulex. Brasília, v. 9, n.202, jun. 2005, p. 27.

[41] Dentre eles: PACHECO, José da Silva. Processo de falência e concordata: comentários à lei de falências: doutrina, prática e jurisprudência. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997; VALVERDE, Trajano de Miranda. Comentários à lei de falências: decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945. Rio de Janeiro: Forense, 1948, v.1.

[42] VALVERDE, Trajano de Miranda. Comentários à lei de falências: decreto-lei n. 7.661, de 21 de junho de 1945. Rio de Janeiro: Forense, 1948, v.1, p. 104.

[43] Apesar de a ementa colacionada trata hipótese de habilitação de créditos na concordata, vale a análise de seus argumentos.

[44] Disponível em: <www.stj.gov >. Acesso em: 30 jan. 2007.

[45] Disponível em: < www.stj.gov.br>. Acesso em: 31 jan. 2007.

[46] NEGRÃO, Ricardo. Aspectos objetivos da lei de recuperação de empresas e de falências: lei n. 11.101, de 9 de fevereiro de 2005. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 11.

[47] SOUZA JÚNIOR, Francisco Satiro de; PITOMBO, Antônio Sérgio A de Moraes (coords.). Comentários à lei de recuperação de Empresas e Falência: Lei 11.101/2005. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 405.

[48] REQUIÃO, Rubens. Curso de direito falimentar. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 1998, v. 1, p. 106.

[49] A maioria da doutrina e da jurisprudência brasileiras não diferenciam o princípio da razoabilidade do princípio da proporcionalidade. A variação terminológica varia de acordo com a influência de cada autor. Autores de influência germânica adotam a terminologia proporcionalidade. Por outro lado, autores de influência anglo-saxã se valem da razoabilidade. Mas, há aqueles que procedem à uma distinção quanto ao conteúdo: proporcionalidade exigiria uma relação de meio e fim e razoabilidade exigiria um conflito entre o geral e o individual, a norma e a realidade por ela regulada ou critério e medida. (NOVELINO, Marcelo. Teoria da constituição e controle de constitucionalidade. Salvador: Juspodivm, 2008, p. 125)

[50] GRAU, Eros Roberto. Eqüidade, razoabilidade, proporcionalidade e princípio da moralidade. Revista do Instituto de Hermenêutica Jurídica. Porto Alegre: Instituto de Hermenêutica Jurídica, v. 1, n. 3, 2005, p. 20.


Informações Sobre os Autores

Aline França Campos

Mestre em Direito Privado pela PUC/ MG. Professora.
Advogada.

Rodrigo Almeida Magalhães

Mestre e Doutor em Direito pela PUC Minas. Professor nos cursos de graduação e pós-graduação em Direito da PUC Minas. Advogado


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