A limitação dos efeitos temporais da decisão declaratória de inconstitucionalidade no controle difuso

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Resumo: Diante da necessidade de preservar princípios constitucionais relevantes, passou-se a admitir a relativização do dogma da nulidade da lei inconstitucional, mediante a limitação dos efeitos decorrentes dessa declaração. No Brasil, essa técnica de decisão foi expressamente prevista no art. 27 da Lei n. 9.868, de 10 de novembro de 1999, que permite ao Supremo Tribunal federal modular os efeitos temporais nas declarações de inconstitucionalidade manifestadas em sede de controle concentrado de constitucionalidade. Atualmente, discute-se a viabilidade da utilização dessa regra do artigo 27 também nas decisões proferidas no controle difuso de constitucionalidade. O presente trabalho visa, assim, demonstrar a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal limitar os efeitos da declaração de inconstitucionalidade também no modelo difuso-incidental.


Sumário: Introdução 1. Breves considerações sobre o controle difuso de constitucionalidade. 2. A possibilidade de modulação da eficácia temporal no controle difuso de constitucionalidade. 3. A modulação da eficácia temporal do controle difuso segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Conclusão. Referências.


Palavras-chave: Controle de constitucionalidade – modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade – art. 27 da Lei n. 9.868/99 – aplicação no modelo difuso-incidental.


INTRODUÇÃO


O presente trabalho tem como escopo analisar a possibilidade de modulação dos efeitos da decisão declaratória de inconstitucionalidade proferida em sede de controle difuso-incidental.


O tema ganha relevo em face do novo posicionamento do Supremo Tribunal Federal, que passou a admitir essa possibilidade também para o controle concreto, superando o velho dogma da nulidade da lei inconstitucional.


Conforme demonstraremos no decorrer deste trabalho, a limitação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade decorre da necessidade de se preservar outros princípios constitucionalmente relevantes, podendo ser utilizada em qualquer um dos modelos de controle de constitucionalidade adotados no Brasil.


Para o cumprimento do desiderato deste trabalho realizaremos, inicialmente, uma rápida análise do controle difuso-incidental. Após, com apoio na doutrina, discutiremos a possibilidade de modulação dos efeitos das decisões declaratórias de inconstitucionalidade, mesmo na hipótese de controle difuso. Por fim, faremos uma incursão na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a fim de observar a evolução do tema em nossa corte constitucional.


1. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE


O controle de constitucionalidade constitui mecanismo de garantia da Supremacia da Constituição[1], por meio do qual se realiza a atividade de verificação da conformidade dos atos ou omissões do poder público[2] em face da Constituição. Trata-se, assim, de uma relação de conformidade/desconformidade entre a lei e a Constituição, tendo como conseqüência (sanção) a invalidade do ato tido como inconstitucional[3] (TAVARES, 2003, passim).


Os países de constituições rígidas, em geral, prevêem dois modelos distintos de controle judicial de constitucionalidade, quais sejam: o controle difuso (jurisdição constitucional difusa) e o controle concentrado (jurisdição constitucional concentrada). No controle difuso, a tarefa de fiscalização da constitucionalidade das leis e atos do Poder Público é atribuída a qualquer órgão do Poder judiciário. Já no controle concentrado, esse trabalho compete a um órgão específico de natureza jurisdicional.


No Brasil, foi adotado o modelo jurisdicional misto, uma vez que pode ser exercido perante qualquer juiz ou tribunal (controle difuso), ou diretamente em face do Supremo Tribunal Federal (controle concentrado).


Para os fins do presente trabalho, nos interessa apenas o estudo do modelo difuso de fiscalização da constitucionalidade das leis, especialmente quanto aos seus efeitos.


O aparecimento dessa forma de controle (controle difuso) se confunde com o próprio surgimento da idéia de controle de constitucionalidade, a qual floresceu com a doutrina norte-americana da judicial review of legislation, a partir do célebre case Marbury v. Madison, julgado em 1803, pelo Chief Justice John Marshall (BULLOS, 2008, 113)[4].


Nesse julgamento, definiu-se o postulado da supremacia das normas constitucionais, bem como a idéia de que cumpre ao Poder judiciário o poder-dever de afastar a aplicação das leis contrárias à Constituição. Afirmou-se, com isso, que a interpretação e aplicação da lei constituem atividades próprias do Poder Judiciário, de modo que o juiz, ao analisar um caso concreto, deve deixar sempre de aplicar a lei que se mostre contrária à Constituição (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 267). Além disso, fixou-se que a Constituição é a lei suprema de um Estado, com a qual todas as demais leis ordinárias devem se compatibilizar, não se admitindo que o Poder Legislativo possa modificá-la ao seu talante[5].


Precisas, nesse sentido, as palavras de Luiz Roberto Barroso:


“Ao expor suas razões, Marshall enunciou os três grandes fundamentos que justificam o controle de constitucionalidade. Em primeiro lugar, a supremacia da Constituição: “Todos aqueles que elaboraram constituições escritas encaram-na como uma lei fundamental e suprema da nação”. Em segundo lugar, e como conseqüência natural da premissa estabelecida, afirmou a nulidade da lei que contrarie a Constituição: “Um ato do Poder Legislativo contrário à Constituição é nulo”. E, por fim, o ponto mais controvertido de sua decisão, ao afirmar que é o Poder Judiciário o intérprete final da Constituição: “É enfaticamente da competência do Poder Judiciário dizer o Direito, o sentido das leis. Se a lei estiver em oposição à Constituição a corte terá de determinar qual dessas normas conflitantes regerá a hipótese. E se a Constituição é superior a qualquer ato ordinário emanado do legislativo, a Constituição, e não o ato ordinário, deve reger o caso ao qual ambos se aplicam” (BARROSO, 2008, p. 08)


Referida decisão, como se vê, consagrou o sistema americano da judicial review, que se expandiu para quase todo o mundo, cedendo espaço apenas para outro modelo de jurisdição constitucional, originado na Áustria, que recebeu o nome de sistema “austríaco” ou “concentrado”, no qual a jurisdição constitucional é exercida exclusivamente perante uma corte constitucional especial.


No Brasil, esse modelo de controle foi introduzido, pela primeira vez, na Constituição Republicana de 1891, que em seu art. 59 estabelecia:


“Das sentenças das justiças dos stados em última instância haverá recurso para o Supremo Tribunal Federal (…) (b) quando se contestar a validade de leis ou de actos dos governos dos Estados em face da Constituição ou das leis Federaes, e a decisão do tribunal do Estado considerar válidos esses actos, ou essas leis impugnadas” (sic).


Antes disso, o Decreto n. 848, de 11 de outubro de 1890, já previa que “na guarda e aplicação da Constituição e das leis nacionais, a magistratura federal só intervirá em espécie e por provocação das partes” (art. 3). Do mesmo modo, a chamada Constituição provisória de 1890 também previa a fiscalização judicial da constitucionalidade das leis (art. 58, I, a e b).


Com a Lei Federal n. 221, de 1894, consagrou-se essa forma de controle por qualquer juiz ou tribunal, nos temos do art. 13, § 10, da Lei 221/1894: “Os juízes e Tribunais apreciarão a validade das leis e regulamentos e deixarão de aplicar aos casos ocorrentes as leis manifestamente incompatíveis com a lei ou Constituição”.


Esse modelo de controle incidental e difuso foi sendo recepcionado pelas constituições seguintes, e, hoje, encontra o seu fundamento no art. 102, III, da Constituição de 1988[6].


Tal modalidade de controle se realiza no curso de uma demanda judicial concreta, de forma incidental, por manifestação de qualquer membro ou órgão do Poder Judiciário[7]. Caracteriza-se, assim, pelo fato de a inconstitucionalidade ser decidida “incidenter tantum”, como antecedente lógico para o julgamento da lide posta em juízo.


Evidente, portanto, que “na via de exceção, a pronúncia do judiciário sobre a inconstitucionalidade não é feita enquanto manifestação sobre o objeto principal da lide, mas sobre questão prévia indispensável ao julgamento do mérito” (MORAES, 2008, p. 1395).


Daí afirmar-se que se trata de controle incidental (porque realizado incidentalmente), concreto (porque pressupõe uma questão concreta posta em juízo), difuso (porque confiado a qualquer juiz ou tribunal), e realizado por via de exceção ou defesa (porque o interessado está se defendendo de uma norma considerada inconstitucional).


Tratando-se de processo subjetivo, a decisão que reconhece incidentalmente a inconstitucionalidade do ato produz efeitos apenas entre as partes litigantes (efeito “inter partes”), e não está sujeita à autoridade da coisa julgada.


Quanto aos efeitos temporais, por sua vez, prevaleceu entre nós a tese de que todo ato inconstitucional é nulo, invalidando a norma desde o seu nascedouro. Assim, a decisão que reconhece a inconstitucionalidade de uma lei ou ato do poder público em um caso concreto possui natureza declaratória, retroagindo para declarar a nulidade do ato em sua origem. Trata-se do denominado efeito “ex tunc”.


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Referido dogma da nulidade da lei inconstitucional, entretanto, passou a ser bastante questionado pela comunidade jurídica, uma vez que a eficácia retroativa da decisão poderia afrontar outros valores constitucionais. Em face disso, iniciou-se discussão acerca da possibilidade de limitação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade, bem como sobre a aplicação dessa técnica em ambos os modelos de controle (concentrado e difuso).


2. A POSSIBILIDADE DE MODULAÇÃO DA EFICÁCIA TEMPORAL NO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE


Sempre prevaleceu entre nós, por influência da doutrina norte americana da judicial review of legislation, a teoria da nulidade da lei inconstitucional, segundo a qual o vício de inconstitucionalidade gera a nulidade absoluta da lei, invalidando-a desde o seu início (nulidade ab initio, ex origine ou a priori). O Supremo Tribunal Federal, aliás, já fixou o entendimento de que o princípio da nulidade das normas inconstitucionais possui envergadura constitucional [8].


A premissa lógica desse raciocínio está calcada no postulado da supremacia da Constituição, uma vez que o sistema constitucional não pode admitir a convivência de leis contrárias à Constituição. Como observa BARROSO (2008, p. 16), “a teoria constitucional não poderia conviver com essa contradição sem sacrificar o postulado em que se assenta. Daí porque a inconstitucionalidade deve ser tida como uma forma de nulidade, conceito que denuncia o vício de origem e a impossibilidade de convalidação do ato”.


Percebeu-se, contudo, que a aplicação da teoria da nulidade dos atos inconstitucionais poderia trazer alguns resultados insatisfatórios, causando mais dano do que a manutenção da lei inconstitucional. São hipóteses em que a declaração da nulidade da lei produziria uma situação mais ‘inconstitucional’ do que aquela provocada pela conservação temporária da validade da lei incompatível com a Constituição (BONAVIDES, 2008, 340).


De fato, “mesmos os atos praticados ao abrigo de normas declaradas inconstitucionais geram conseqüências jurídicas, pois se não gerassem não haveria a necessidade de nos preocuparmos com eles. A partir destes atos podem ter sido criadas relações jurídicas merecedoras de proteção, de modo que a sua invalidação causaria maiores afrontas à segurança jurídica e à boa fé” (CEZAROTTI, 2008, p. 149).


Desde a década de 1950, Lúcio Bittencourt já havia notado essa incompletude da teoria da nulidade, admitindo que o Poder Judiciário aplicasse temperamentos aos efeitos danosos da declaração de inconstitucionalidade.


“essa doutrina da ineficácia ab initio da lei  inconstitucional não pode ser entendida em termos absolutos, pois que os efeitos de fato que a norma produziu não podem ser suprimidos, sumariamente, por simples obra de um decreto judiciário. O professor O. P. Field, que estudou longamente o assunto, demonstra que o referido princípio corporifica a doutrina tradicional, mas não pode ser considerado regra universal de direito – it is not a universal rule of law. E os tribunais têm que encontrar meios –e os têm encontrado – para salvar certos efeitos de fato que a inconstitucionalidade não pode cancelar” (BITTENCOURT apud FERREIRA, 2007, p. 160).


O próprio Supremo Tribunal Federal, em alguns julgados anteriores, chegou a apontar a insuficiência da declaração de inconstitucionalidade com efeitos “ipso jure” e “ex tunc” para solução de certas controvérsias constitucionais, uma vez que cassação da norma resultava em um aprofundamento do estado de inconstitucionalidade [9].


Diante disso, foi criada uma nova técnica de julgamento, que permite ao Tribunal Constitucional, em cada caso, ponderar entre o Princípio da Supremacia Constitucional e o da Segurança Jurídica, com o fim de preservar situações sociais já consolidadas sob a égide da lei inconstitucional[10].


A modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade decorre, como se vê, de uma ponderação de interesses constitucionalmente protegidos, por meio da qual o órgão jurisdicional, utilizando-se do critério da proporcionalidade, resolverá entre aplicar o princípio constitucional implícito da nulidade das normas inconstitucionais ou outro princípio constitucionalmente relevante, como, por exemplo, o da segurança jurídica e da boa-fé (PIMENTA, 2008, p. 421). No conflito entre dois princípios constitucionais, os critérios tradicionais de solução não são suficientes para o deslinde da situação. Como não há hierarquia entre esses princípios, a solução do conflito deve ser determinada à luz do caso concreto, mediante a ponderação dos interesses em colisão.


Note que o afastamento do princípio da nulidade da lei assenta-se em fundamentos constitucionais e não em razões de conveniência. Não se admite, portanto, que o órgão de controle utilize essa técnica de forma discricionária, frustrando as expectativas do titular do direito violado.


A base constitucional dessa limitação reside na necessidade de proteção a outro princípio constitucional relevante, o qual possui força normativa própria. A preservação do princípio constitucional envolvido é, portanto, obrigatória, sob pena afronta à ordem constitucional.


No Brasil, por inspiração da constituição de Portugal[11], a possibilidade de equalização dos efeitos das decisões declaratórias de inconstitucionalidade foi expressamente prevista no art. 27 da Lei n. 9.868, de 10 de novembro de 1999, originalmente aplicável aos processos objetivos de controle (ações diretas)[12]. Segundo essa disposição, o Supremo Tribunal Federal pode, no controle concentrado, pelo voto de 2/3 (dois terços) de seus membros[13], desde que presentes razões de segurança jurídica e excepcional interesse social, proclamar a decisão com efeitos ex nunc ou pro futuro[14].


Logo, no entanto, surgiu controvérsia sobre a possibilidade de se utilizar essa técnica de modulação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade, prevista no art. 27 da Lei n. 9.868/99, também no controle difuso-incidental.


Para responder a esse questionamento é preciso, em primeiro lugar, analisar o direito norte-americano, que é o precursor do modelo difuso de controle de constitucionalidade.


Lá, após a grande depressão, a doutrina constitucionalista evoluiu para superar o velho dogma de que a lei inconstitucional não era sequer uma lei – the inconstitutional statute is not law at al (Mendes, 2004, p. 292).


O primeiro precedente que admitiu a restrição dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade foi o case “Linkletter v. Walker”, de 1965, no qual a Suprema Corte norte-americana fixou o entendimento de que a Constituição não proibia a declaração de inconstitucionalidade com efeitos retroativos, devendo se ponderar em cada caso os interesses envolvidos, o propósito e as conseqüências da limitação. Posteriormente, em “Stowall v. Denno”, de 1967, desenvolveu-se os critérios que devem ser seguidos para a aplicação da modulação de efeitos (MENDES, 2004, p. 293)..


Com isso, a jurisprudência norte-americana passou a admitir, dentro do sistema difuso-incidental tradicional, a declaração de inconstitucionalidade com efeitos retroativos limitados ou com efeitos pro futuro.


Entre nós, embora esse tema tenha maior complexidade devido ao sistema misto de controle, inexiste qualquer óbice para a utilização dessa técnica de modulação de efeitos no controle difuso-incidental.


Com efeito, não obstante as decisões proferidas em sede de controle difuso tenham caráter declaratório, já se assentou que “a eleição do modelo difuso ou concentrado não define os efeitos da decisão que decreta a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo, fulminando qualquer idéia que vincule uma regra de identificação ao regime sufragado. A circunstância de ser a inconstitucionalidade pronunciada na hipótese concreta não importa necessariamente em conceder efeito retrospectivo à declaração emanada.” (FERREIRA, 2007, p. 167).


Ora, os motivos que justificam a possibilidade de modulação dos efeitos no controle abstrato também estão presentes no controle incidental, uma vez que a retroatividade da decisão declaratória de inconstitucionalidade também pode conduzir a resultados graves, cabendo ao Poder Judiciário causar o menor sacrifício possível aos bens em colisão.


 Ademais, não se pode olvidar a crescente aproximação do modelo difuso de constitucionalidade com o modelo concentrado, surgida a partir da reinterpretarão do papel do Senado Federal, da aplicação da teoria dos motivos determinantes, da legitimação ampla para propositura de reclamação e do surgimento da repercussão geral[15]. Essa tendência de ampliar a feição objetiva do processo de controle incidental corrobora a possibilidade de utilização do art. 27 da Lei 9868/99 também no controle difuso-incidental.


Assim, não há dúvida de que “a limitação de efeito é um apanágio do controle judicial de inconstitucionalidade, podendo ser aplicada tanto no controle direto quanto no controle incidental” (MENDES, 2004, p. 298)


De qualquer forma, não se pode deixar de consignar que, mesmo no controle difuso, “a modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade pressupõe a inequívoca excepcionalidade do quadro em que se insere a prestação jurisdicional” (grifos nossos) [16].


Anota-se, outrossim, que diante do postulado da reserva de plenário, a modulação dos efeitos temporais da decisão de inconstitucionalidade é matéria afeta ao plenário do tribunal, não podendo ser realizada pelos órgãos fracionários, tendo em vista que “somente pode modular quem dispõe da prerrogativa de declarar a ilegitimidade constitucional de determinado ato do Poder Público”[17] 


Há que se observar, ainda, que a teoria da limitação temporal dos efeitos é inaplicável quando se estiver diante de mero juízo negativo de recepção, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal:


“A não-recepção de ato estatal pré-constitucional, por não implicar a declaração de sua inconstitucionalidade – mas o reconhecimento de sua pura e simples revogação (RTJ 143/355 – RTJ 145/339) -, descaracteriza um dos pressupostos indispensáveis à utilização da técnica da modulação temporal, que supõe, para incidir, dentre outros elementos, a necessária existência de um juízo de inconstitucionalidade. Inaplicabilidade, ao caso em exame, da técnica da modulação dos efeitos, por tratar-se de diploma legislativo, que, editado em 1984, não foi recepcionado, no ponto concernente à norma questionada, pelo vigente ordenamento constitucional”[18].


Por fim, recorda-se que, recentemente, a Lei 11.417/2006, em seu art. 4º, estabeleceu nova possibilidade de o Supremo Tribunal Federal restringir os efeitos de suas decisões, permitindo que a súmula vinculante só tenha eficácia a partir de outro momento, por razões de segurança jurídica ou excepcional interesse público.


Destarte, não há dúvida sobre a possibilidade de modulação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade no modelo difuso de controle, o que já foi reconhecido diversas vezes pelo Supremo Tribunal Federal, conforme demonstraremos a seguir.


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3. A MODULAÇÃO DA EFICÁCIA TEMPORAL NO CONTROLE DIFUSO SEGUNDO A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL


Não é de hoje que a comunidade jurídica se preocupa com a repercussão fática da declaração retroativa da inconstitucionalidade no controle difuso-incidental. O Supremo Tribunal Federal, por diversas vezes, teve oportunidade de analisar a matéria.


Nessas ocasiões, como veremos adiante, o pretório excelso acabou por não aplicar o princípio da nulidade das normas inconstitucionais em prol de outro princípio constitucionalmente relevante, como, por exemplo, o da segurança jurídica e da boa-fé.


O primeiro precedente encontrado é do ano de 1974, e teve como objeto uma lei do Estado de São Paulo (Lei n. 03 de dezembro de 1971), que autorizava os servidores públicos do Poder Executivo a atuarem como oficiais de justiça.


No caso, a norma em questão teve a sua inconstitucionalidade declarada pelo Supremo Tribunal Federal em 21 de março de 1973, quando do julgamento da representação de inconstitucionalidade n. 832. Posteriormente, uma determinada pessoa argüiu, em um caso concreto, a nulidade de penhora realizada por um servidor irregularmente investido na função de oficial de justiça. O ato processual havia ocorrido antes da declaração da inconstitucionalidade da lei pelo Supremo Tribunal Federal, mas argumentou-se que o ato seria nulo porquanto a inconstitucionalidade operaria efeitos ex tunc, liquidando a lei desde o seu início.


A questão foi levada ao Supremo Tribunal Federal pela via difusa, por meio do recurso extraordinário n. 78.209, julgado em 04 de junho de 1974, no qual os Ministros do Supremo, utilizando a teoria do funcionário de fato, consideraram válida a penhora realizada, em que pese a declaração da inconstitucionalidade da lei[19].


Com isso, os Ministros da Corte Suprema, pela primeira vez, mesmo que de forma indireta, modularam os efeitos da declaração de inconstitucionalidade na via difusa, evitando a aplicação retroativa da lei inconstitucional no referido caso concreto.


O mesmo tema foi enfrentado logo em seguida no julgamento do RE 78.594, realizado em 30/10/1974, chegando-se a conclusão de que os efeitos da declaração de inconstitucionalidade não poderiam ser aplicados de forma única para todos os casos[20]. Segundo o Ministro relator, Bilac Pinto, a inconstitucionalidade da lei deveria ser verificada em face dos princípios jurídicos do ramo de direito envolvido. Assim, diante da teoria do funcionário de fato, própria do direito administrativo, bem como pela inexistência de prejuízo ao administrado, foi reconhecida a validade dos atos jurídicos praticados sob a égide da lei inconstitucional.


Idêntica situação foi verificada no julgamento do RE 79.628, que também tinha como fundamento a referida lei paulista[21].


O tema foi novamente retomado no julgamento do RE n. 79.343, no qual o Relator, Leitão de Abreu, defendeu a natureza constitutiva da decisão de inconstitucionalidade, sendo possível a modulação de efeitos. Nesse julgamento, em que se discutiu mais profundamente a questão, o relator defendeu expressamente a revisão da teoria da nulidade da norma inconstitucional, adotando-se, em seu lugar, a teoria da anulabilidade, em que os efeitos são ex nunc, como se nota no trecho do voto abaixo indicado[22]:


Acertado se me afigura, também, o entendimento de que se não deve ter como nulo ab initio ato legislativo, que entrou no mundo jurídico munido de presunção de validade, impondo-se, em razão disso, enquanto não declarado inconstitucional, a obediência pelos destinatários dos seus comandos. Razoável é a inteligência, a meu ver, de que se cuida, em verdade, de ato anulável, possuindo caráter constitutivo a decisão que decreta a nulidade. Como, entretanto, em princípio, os efeitos dessa decisão operam retroativamente, não se resolve, com isso, de modo pleno, a questão de saber se é mister haver como delitos do orbe jurídico atos ou fatos verificados em conformidade com a norma que haja sido pronunciada como inconsistente com a ordem constitucional. Tenho que procede a tese, consagrada pela corrente discrepante, a que se refere o “Corpus Juris Secundum“, de que a lei inconstitucional é um fato eficaz, ao menos antes da determinação da inconstitucionalidade, podendo ter conseqüências que não é lícito ignorar. A tutela da boa-fé exige que, em determinadas circunstâncias, notadamente quando, sob a lei ainda não declarada inconstitucional, se estabelecerem relações entre o particular e o Poder Público, se apure, prudencialmente, até que ponto a retroatividade da decisão, que decreta a inconstitucionalidade, pode atingir, prejudicando-o, o agente que teve por legítimo o ato e, fundado nele, operou na presunção de que estava procedendo sob o amparo do direito objetivo.


Nova discussão veio a lume no julgamento dos Recursos Extraordinários n. 105.789 e 122.202. No caso, alguns magistrados do Estado de Minas Gerais, utilizando-se do disposto no art. 104 da Constituição daquele estado, obtiveram a averbação de tempo de serviço público prestado em sociedade de economia mista, para o fim de percebimento de determinada gratificação. Esse dispositivo constitucional, todavia, foi posteriormente julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, tendo a sua eficácia suspensa pela resolução senatorial n. 84, de 03 de outubro de 1973.


Diante disso, a referida gratificação deixou de ser paga aos magistrados mineiros que, inconformados, ingressaram com ações judiciais para impedir a devolução do que havia sido recebido, bem como para garantir a continuidade do pagamento. A questão chegou ao Supremo via Recurso Extraordinário, oportunidade em que se fixou o não cabimento da devolução dos valores recebidos, tendo em vista o princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos. Com isso, reconheceu-se o caráter prospectivo da declaração de inconstitucionalidade no controle difuso, uma vez que o reconhecimento da nulidade com efeitos retroativos aniquilaria outro princípio constitucional relevante.


Nesse ponto, vale observar que todos os julgamentos mencionados acima foram realizados em processos distintos daquele em que foi declarada a inconstitucionalidade da lei. Em outras palavras, a relativização dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade não foi efetivada no mesmo processo em que ela foi proferia.


Em tais casos, o Supremo Tribunal Federal, com base em artifícios meramente retóricos, acabou mitigando os efeitos da declaração de inconstitucionalidade ao julgar a irresignação de pessoas atingidas pela eficácia retroativa da declaração de inconstitucionalidade.


Sob a égide da Constituição Federal de 1988, a preocupação com a produção dos efeitos na declaração de inconstitucionalidade também foi manifestada pelo Min. Maurício Corrêa que, ao proferir seu voto em ação direta de inconstitucionalidade (ADI nº 1.102), assim se pronunciou:


Mesmo nos Estados Unidos, a Suprema Corte ao julgar o caso LINKLETTER v. WALKER, no ano de 1965, que se transformou em leading case, proclamou o entendimento de que a retroatividade ou prospectividade dos efeitos da declaração judicial relativa à inconstitucionalidade de lei não expressa um comando constitucional, o que significa dizer que os efeitos ex nunc ou ex tunc não têm origem na Constituição americana, senão uma questão do judicial policy, sujeita, por conseguinte, a livre valoração jurisdicional a ser feita em cada caso concreto. E que mesmo antes, já a Corte Americana não reconhecia aos contribuintes de impostos o direito de reaver importâncias que já haviam sido recolhidas ao Erário, até o instante da respectiva suspensão de sua eficácia, consoante demonstrado no texto clássico de O. P. Field, in The effects of na Unconstitutional Statue, Minneapolis, 1935, originariamente publicada na Harvard Law Review, vol. 45, 1932, sob o título The recovery of unconstitutional taxes.”(…)


Creio não constituir-se afronta ao ordenamento constitucional exercer a corte política judicial de conveniência, se viesse a adotar a sistemática, caso por caso, para a aplicação de quais os efeitos que deveriam ser impostos, quando, nesta hipótese, defluisse situação tal a recomendar, na salvaguarda dos superiores interesses do Estado e em razão da calamidade dos cofres da Previdência Social, se buscasse o dies a quo, para a eficácia dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, a data do deferimento da cautelar (…)[23].


Apenas em 2004, todavia, o Supremo Tribunal Federal, de maneira inédita, limitou os efeitos temporais da pronúncia de inconstitucionalidade no mesmo processo em que esta foi declarada. Isso ocorreu no julgamento do Recurso Extraordinário n. 197.917, realizado em 07 de maio de 2004, no qual se discutia a inconstitucionalidade da Lei Orgânica n. 226/90 do Município de Mira Estrela, que havia estabelecido o número de vereadores em desacordo com a regra constitucional expressa no art. 29, IV, da CF. Na decisão, o Supremo Tribunal Federal reduziu o número de vereadores do município de 11 (onze) para 9 (nove), mas determinou que a aludida decisão só atingisse a próxima legislatura, ou seja, atribuiu efeitos pro futuro à decisão.


No caso, o Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou ação civil pública com o fim de reduzir o número de vereadores do Município de Mira estrela, tendo em vista o disposto no art. 29, IV, da CF. O pedido foi acolhido pelo juízo daquela comarca, o qual determinou: a) a redução de 11 (onze) para 9 (nove) o número de vereadores do Município; b) a extinção do mandato do número de vereadores excedentes; c) a devolução ao erário os subsídios indevidamente recebidos na legislatura pelos vereadores excedentes. Em seguida, no julgamento da apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo reformou esta decisão, reconhecendo a constitucionalidade da aludida lei. O caso, então, foi levado ao Supremo Tribunal Federal pela via do Recurso Extraordinário, o qual se posicionou pela inconstitucionalidade da lei municipal. Em face de divergência levantada pelo Ministro Gilmar Mendes, no entanto, modulou-se os efeitos da declaração de inconstitucionalidade a fim de que os efeitos da decisão só atingissem a próxima legislatura (eficácia pro futuro).


Vislumbrou-se, na hipótese, “situação excepcional em que a declaração de nulidade, com seus normais efeitos ex tunc, resultaria grave ameaça a todo o sistema legislativo vigente”, Com isso, afirmou-se a “prevalência do interesse público para assegurar, em caráter de exceção, efeitos pro futuro à declaração incidental de inconstitucionalidade” [24].


A possibilidade da modulação dos efeitos é bem delimitada no voto-vista proferido pelo Ministro Gilmar Mendes, no Recurso Extraordinário nº. 197.917:


Nestes termos, resta evidente que a norma contida no art. 27 da Lei 9.868, de 1999, tem caráter fundamentalmente interpretativo, desde que se entenda que os conceitos jurídicos indeterminados utilizados – segurança jurídica e excepcional interesse social – se revestem de base constitucional. No que diz respeito à segurança jurídica, parece não haver dúvida de que encontra expressão no próprio princípio do Estado de Direito consoante, amplamente aceito pela doutrina pátria e alienígena. Excepcional interesse social pode encontrar fundamento em diversas normas constitucionais. O que importa analisar é que, consoante a interpretação aqui preconizada, o princípio da nulidade somente deve ser afastado se se puder demonstrar, com base numa ponderação concreta, que a declaração de inconstitucionalidade ortodoxa envolveria o sacrifício da segurança jurídica ou de outro valor constitucional materializável sob a forma de interesse social.


No mesmo voto-vista, o Ministro Gilmar Mendes arremata:


Portanto, o princípio da nulidade continua a ser a regra também no direito brasileiro. O afastamento de sua incidência dependerá de um severo juízo de ponderação que, tendo em vista a análise fundada no princípio da proporcionalidade, faça prevalecer a idéia de segurança jurídica ou outro princípio constitucionalmente relevante manifestado sob a forma de interesse social relevante. Assim, aqui, como no direito português, a não-aplicação do princípio da nulidade não se há de basear em consideração de política judiciária, mas em fundamento constitucional próprio


Posteriormente, em outros julgados, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a possibilidade de limitação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade proferida no controle difuso. È o caso do Agravo Regimental no RE nº 328.232, em que se reconheceu a inconstitucionalidade de lei do estado do Amazonas que conferia gratificações a servidores públicos, mas se determinou que os valores já recebidos não fossem devolvidos, uma vez que percebidos de boa-fé[25]. Outra decisão nesse sentido foi proferida no julgamento do RE nº 442.683, no qual se discutia a desconstituição de ato administrativo que havia promovido servidores públicos. Nesse caso, a corte entendeu que “os princípios da boa-fé e da segurança jurídica autorizam a adoção do efeito ex nunc para a decisão que decreta a inconstitucionalidade. Ademais, os prejuízos que adviriam para a administração seriam maiores que eventuais vantagens no desfazimento dos atos administrativos” [26].


Entre os julgamentos mais relevantes, contudo, está o proferido no HC nº 82.959, em que o Supremo Tribunal Federal, por maioria, em caráter incidental, declarou a inconstitucionalidade do art. 2º, parágrafo primeiro, da Lei n. 8.072/92, que veda a possibilidade de progressão do regime de cumprimento de pena dos crimes hediondos, uma vez que tal vedação viola o Princípio constitucional da individualização da pena (art. 5, LXVI, da CF). Na decisão proferida, o Supremo Tribunal Federal, modulando os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, explicitou que a declaração incidental de inconstitucionalidade do preceito legal não alcançava as penas já extintas, sem prejuízo da apreciação, caso a caso, pelo magistrado competente, dos demais requisitos pertinentes ao reconhecimento da possibilidade de progressão[27].


Mais recentemente, a Corte, no julgamento conjunto de diversos recursos extraordinários[28], proclamou a inconstitucionalidade, por ofensa ao art. 146, III, b, da Constituição Federal, dos arts 45 e 46 da Lei n. 8.212/91, que estabeleciam o prazo decenal de prescrição e decadência para a exigência das contribuições de seguridade social. Contudo, o STF considerou legítimos os recolhimentos efetuados pelos contribuintes nos prazos considerados inconstitucionais, ressalvadas as hipóteses em que houve impugnação antes da conclusão do julgamento. Assim, a Fazenda Pública não poderá exigir as contribuições sociais com o aproveitamento do prazo de 10 (dez anos), mas os contribuintes não poderão pleitear a repetição do que já foi pago, salvo naqueles casos em que já há impugnação da cobrança, na via judicial ou administrativa, até 11/06/2008.


Como se vê, a mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de se admitir, excepcionalmente, a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade proferida no controle difuso incidental.


CONCLUSÃO


Durante muito tempo, prevaleceu a idéia de que a lei inconstitucional não produzia nenhum efeito, uma vez que acarretava a nulidade do ato contrário à Constituição.


Por força da doutrina norte-americana, surgida no célebre caso “Marbury v. Madison” (1803), a inconstitucionalidade era tida como um vício que atacava a lei em sua origem, tornando inválidas todas as relações jurídicas constituídas desde o seu nascimento (efeito “ex tunc”).


Em tempos não tão recentes, percebeu-se a existência de situações que não permitiam a aplicação pura e simples da teoria nulidade da norma inconstitucional, sob pena de ferimento de algum princípio constitucional relevante.


Diante desse quadro, foi criada uma nova técnica de julgamento, que permite ao Tribunal Constitucional, em cada caso, ponderar entre o Princípio da Supremacia Constitucional e o da Segurança Jurídica, com o fim de preservar situações sociais já consolidadas sob a égide da lei inconstitucional.


Mesmo os atos praticados com base em normas inconstitucionais geram conseqüências jurídicas, as quais podem merecer proteção. Assim, possível a modulação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade, para que ela só tenha eficácia a partir do seu trânsito em julgado ou em outro momento que venha a ser fixado.


Entre nós, a Lei n. 9.868/99, pelo seu art. 27, previu expressamente a possibilidade de o Supremo Tribunal Federal, nas decisões proferidas em processos objetivos (controle abstrato), modular os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, pelo voto de 2/3 (dois terços) de seus membros, desde que presentes razões de segurança jurídica e excepcional interesse social.


Embora o referido artigo 27 tenha sido criado para os processos objetivos, os motivos que justificam a modulação dos efeitos no controle abstrato também estão presentes no controle incidental, uma vez que a retroatividade da decisão declaratória de inconstitucionalidade também pode conduzir a resultados graves e indesejados.


Observando essas situações, o Supremo Tribunal Federal, após lento amadurecimento jurisprudencial, finalmente se posicionou no sentido de admitir esta técnica de manipulação dos efeitos temporais também no modelo difuso-incidental de controle.


Assim, atualmente, resta consolidada a idéia de que a limitação de efeitos da declaração de inconstitucionalidade pode ser aplicada tanto no controle difuso quanto no controle incidental.


 


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Notas:

[1] A finalidade precípua do controle de constitucionalidade é a de resguardar a integridade e a supremacia da constituição, impedindo que atos incompatíveis com a lei maior permaneçam no sistema jurídico. Para realização dessa tarefa, a doutrina aponta alguns pressupostos que devem estar presentes para possibilitar a realização desse controle, quais sejam: a existência de uma constituição formal e escrita; rigidez constitucional e a existência de um órgão competente para o controle. As constituições rígidas são aquelas que exigem um processo especial de revisão, que lhes confere estabilidade bem superior àquela que as leis ordinárias desfrutam (BONAVIDES, 2008, p. 267). A constituição formal compõe-se de um conjunto de normas escritas, elaboradas de forma especial e solene, não importando o seu conteúdo. Exige-se, ainda, que a constituição outorgue competência para o controle a um órgão diverso daquele encarregado da produção normativa.

[2] Os atos praticados pelos particulares (privados) que contrariem as disposições constitucionais também devem ser declarados nulos, mas com a utilização de outros mecanismos de impugnação. Como observa MENDES (2008, p. 1004), “a violação da ordem constitucional por entes privados, embora relevantes sob o prisma do direito constitucional, não se enquadraria, segundo esse entendimento, à ofensa perpetrada pelos órgãos públicos, destinatários primeiros de seus comandos normativos”. 

[3] Segundo Mendes (2008, p. 1002) “a sanção decorrente da violação do texto da Constituição integra o próprio conceito de inconstitucionalidade. A ausência de sanção à contrariedade da norma com a constituição transforma o conceito de inconstitucionalidade em mera censura ou crítica”

[4] “O caso Marbury v. Madison, de 1803, favoreceu, finalmente os desígnios de Marshall. Trata-se de assunto de pequena importância, com origem na recusa dos republicanos de Jeferson de empossar modestos juízes de paz nomeados pelos federalistas de Adams. É conhecido o episódio histórico. Adams, nos últimos instantes de seu mandato presidencial, nomeou algumas dezenas de juízes de paz. No açodamento das providências finais, que antecederam à transmissão do cargo a Jefferson, eleito por partido adverso, o Secretário competente, na época o próprio Marshall, esqueceu-se, ou não teve tempo de providenciar o expediente necessário, deixando na mesa de trabalho os atos de nomeação. Ali os foi encontrar o Secretário Madison, sucessor de Marshall. Inteirado dos fatos, Jeferson ordenou que fossem expedidos apenas 25 atos, inutilizando os demais. Entre os prejudicados, figuravam Marbury e os três companheiros que recorreram à Suprema Corte, em 1801, (William Marbury, Denis Ramsay, Robert Townsend Hooe e William Harper), pleiteando um Writ of mandamus contra o Secretário Madison, para empossá-los nos cargos. Marshall admitiu a justiça da pretensão. Preocupava-o, entretanto, a resistência do executivo à decisão favorável da Suprema Corte. O caso, que não envolvia interesse material de monta, colocou mais à vontade o Chief Justice para firmar decisão de profundas conseqüências políticas. Entrando no exame do caso, Marshall invoca a inconstitucionalidade do art. 13, da Lei 1.789, no qual se basearam os recorrentes; artigo esse que deferia à Suprema Corte a faculdade de expedir, diretamente, writ of mandamus, em desacordo com o artigo III, seção II, do texto constitucional, que lhe conferiu, em princípio, jurisdição de apelação, contemplando expressa e excepcionalmente os casos de jurisdição ordinária. Inicialmente, os interessados deveriam postular seu direito .perante uma das Cortes de Distrito, para, em grau de recurso, se cabível, submeter o caso à apreciação da Suprema Corte. Lançado o princípio, Marshall realiza uma retirada estratégica, no bom sentido militar, invocando a incompetência da Suprema Corte para decidir o caso concreto. Obra de arte política, a sentença reconhecia o princípio do controle judiciário da inconstitucionalidade das leis, sem conferir efeitos práticos imediatos à declaração de inconstitucionalidade. O que interessava fundamentalmente a Marshall era aquele reconhecimento, que servia a dois objetivos de longo alcance: o de neutralizar possível reação desfavorável do Governo Federa e firmar valoroso precedente jurisprudencial para impedir, se necessário, as transformações esperadas em virtude do pleito de 1801. A eleição de Jeferson e da maioria republicana no Congresso equivaliam, no entender dos federalistas, a uma ampla delegação popular aos eleitos, para substituir o postulado federalista da supremacia do governo federal pelo postulado republicano da soberania dos Estados, agitado na campanha presidencial com os acenos aos Sates rights” (HORTA apud CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 267).

[5] Para corroborar tais afirmações, transcreve-se breve trecho da decisão de Marshall: “Se o ato legislativo, inconciliável com a constituição, é nulo, ligará ele, não obstante a sua invalidade, os tribunais, obrigando-os a executarem-no? Ou, por outras palavras, dado que não seja lei, substituirá como preceito operativo, tal qual se o fosse? Seria subverter de fato o que em teoria se estabeleceu; e o absurdo é tal, logo à primeira vista, que poderíamos abster-nos de insistir.

Examinemo-lo, todavia, mais a fito. Consistem especificamente a alçada e a missão do Poder Judiciário em declarar a lei. Mas os que lhe adaptam as prescrições aos casos particulares, hão de, forçosamente, explaná-la e interpretá-la. Se duas leis se contrariam, aos tribunais incumbe definir-lhes o alcance respectivo. Estando uma lei em antagonismo com a constituição e aplicando-se à espécie a constituição e a lei, de modo que o tribunal tenha que resolver a lide em conformidade com a lei, desatendendo a constituição, ou de acordo com a constituição, rejeitando a lei, inevitável será eleger, dentre os dois preceitos opostos, o que dominará o assunto. Isto é da essência do dever judicial.

Se, pois, os tribunais não devem perder de vista a constituição, e se a constituição é superior a qualquer ato ordinário do Poder Legislativo, a constituição e não a lei ordinária há de reger o caso, a que ambas dizem respeito. Destarte, os que impugnaram o princípio de que a constituição deve considerar, em juízo, como lei predominante, hão de ser reconduzidos à necessidade de sustentar que os tribunais devem cerrar os olhos à constituições, e enxergar a lei só. Tal doutrina aluiria os fundamentos de todas as constituições escritas. E equivaleria a estabelecer que um ato, de todo em todo inválido segundo os princípios e teorias do nosso governo, é, contudo, inteiramente obrigatório na realidade. Equivaleria estabelecer que, se a legislatura praticar o ato que lhe está explicitamente vedado, o ato, não obstante a proibição expressa, será praticamente eficaz” (BARBOSA, 1934, apud  CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 264)

[6] As maiores inovações da Constituição de 1988 foram direcionadas ao modelo de fiscalização abstrata (ampliação dos legitimados; introdução de instrumentos para reconhecimento da inconstitucionalidade por omissão; criação da ADPF, etc), fazendo com que essa forma de controle ganhasse mais ênfase e significado, diminuindo a importância do modelo concreto-incidental (MENDES, 2004, p. 209).

[7] Desde o julgamento do precedente Marbury vs Madison, concluiu-se que cabe ao Poder Judiciário, dentro de sua atividade de aplicação e interpretação das leis, o poder-dever de solucionar a lide, verificando, se o caso, a compatibilidade da legislação ordinária com a Constituição, toda vez que necessário para o julgamento de uma determinada controvérsia jurisdicional. Nesse sentido: “Controle incidente de constitucionalidade: suscitada, no voto de um dos juízes do colegiado, a questão de inconstitucionalidade da lei a aplicar, deve o tribunal decidir a respeito; omitindo-se e persistindo na omissão, não obstante provocado por embargos de declaração, viola as garantias constitucionais da jurisdição e do devido processo legal (CF, art. 5, XXXV e LIV), sobretudo quando, com isso, obstruir o acesso da parte ao recurso extraordinário” (STF, RE 198.346-9/DF, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 5-12-1997, p. 63919).

[8]  “O ato inconstitucional, ensina tradicionalmente a doutrina, é nulo e írrito. Desde a decisão do juiz Marshall, no caso Marbury v. Madison, passando pela lição de Rui Barbosa, assentou-se que, nulo, o ato inconstitucional não obriga, não sendo de se aplicar o que, se aplicado, nula é esta aplicação. Tanto assim, que o efeito da declaração de nulidade retroage ex tunc, não sendo válidos os atos praticados sob o seu império” (Repr. 980/SP, Rel. Min. Moreira Alves, RTJ, 96.508, p. 1981). O mesmo posicionamento pode ser extraído do RE 103.619, Rel. Maurício Corrêa, RDA n. 60, p. 80.

[9] Essa discussão foi travada no julgamento do pedido de concessão de medida liminar na ADIn 526, em que se discutiu a omissão parcial de norma que concedeu aumento a uma parcela expressiva do funcionalismo público. A mesma questão foi novamente tratada no HC 70.514em que se admitiu que a lei que concedia prazo em dobro para a defensoria pública era constitucional enquanto esses órgãos não estivessem devidamente estruturados.

[10] “O direito, como tecnologia voltada para a decidibilidade dos conflitos, encara o tempo de um modo diferente. A ocorrência dos fatos jurídicos carrega a nota da irreversibilidade, porém, o sistema jurídico pode criar mecanismos para apagar os efeitos gerados por tais fatos. Assim, se por um lado os fatos, como eventos físicos, ocorrem em um determinado tempo irreversível, os seus efeitos poderão ser modificados, alterados, ou até mesmo expurgados do mundo do Direito. Em outras palavras, o tempo não é irreversível para o Direito (PIMENTA, 2008, p. 418).

[11] No Brasil, diferentemente da Constituição Portuguesa, não há previsão constitucional expressa para a utilização dessa técnica de limitação dos efeitos temporais da declaração de inconstitucionalidade.

[12] Como observa MENDES (2007, p. 333), “antes do advento da lei 9.968/1999, talvez fosse o STF, muito provavelmente, o único órgão importante de jurisdição constitucional a não fazer uso, de modo expresso, da limitação de efeitos da declaração de inconstitucionalidade. Não só a Suprema Corte americana (caso Linkletter e alker), mas também uma série expressiva de Cortes Constitucionais e Cortes Supremas adotam a técnica da limitação de efeitos (cf., v.g., a Corte Constitucional austríaca (constituição, art. 140), a Corte Constitucional alemã (Lei Orgânica, §§ 31, 2, e 79, I), a Corte Constitucional espanhola (embora não expressa na constituição, adotou, desde 1989, a técnica de declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia de nulidade), a Corte Constitucional Portuguesa (constituição, art. 282, n. 4), o Tribunal de Justiça da Comunidade Européia (art. 174, 2, do Tratado de Roma), o Tribunal Europeu de direitos Humanos (caso Markx, de 13.6.1979)”.

[13] “2/3 de 11 ministros equivale a (2 x 11)/3 = 7,33333333… Como o art. 27 da Lei n. 9.868/99 falou em quorum de 2/3, deve ser entendido no mínimo 2/3. Arredondando-se o resultado para baixo, teríamos o número inferior a 2/3. Logo, devemos arredonda-lo para cima e o quorum será de pelo menos 8 ministros, lembrando-se o quorum de instalação da sessão de julgamento, também de 8 ministros (art. 22 da Lei n. 9.868/99 (LENZA, 2007, p. 230).

[14] Vale lembrar que a constitucionalidade do art. 27 da Lei n. 9.868/99 está sendo questionada nas ADIns 2154 e 2258. Não obstante, a questão parece ter perdido a sua importância, uma vez que o Supremo Tribunal Federal tem utilizado a disposição contida no art. 27 em diversos julgados, tanto no controle concentrado quanto no difuso.

[15] STF, Pleno, Rcl n. 4335/AC, rel. Min Gilmar Mendes.

[16] STF, Segunda Turma, Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 513.234-0, Rel. Min. Joaquim Barbosa.

[17] STF, Segunda Turma, Embargos de declaração no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n. 490.875-8, Rel. Min. Celso de Mello.

[18] STF, Ag reg no AI n. 421.354, rel Min. Celso de Mello

[19] STF, RE n. 78.209, 1 turma, Rel. Min. Aliomar Baleeiro, publicado em 09/10/1974

[20] STF, RE n. 78.594, 2 turma, Rel. Min. Bilac Pinto, publicado em 30/10/1974

[21] STF, RE n. 78.628, 1 turma, Rel. Min. Aliomar Baleeiro, publicado em 11/12/1974

[22] STF, RE n. 79.343, 2 turma, Rel. Min. Carlos Madeira, publicado em 02/09/1987

[23] STF, ADI n. 1.102, Rel.  Min. Maurício Corrêa, publicado em 17/11/1995

[24] STF, RE n. 197.917, rel. Min. Maurício Corrêa, publicado em 07/05/2004.

[25] STF, Ag. Reg. No RE nº 328.232, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 14/06/2005.

[26] STF, RE nº 442.683, 2ª Turma, Rel. Min Carlos Velloso, DJ 24/03/2006.

[27] STF, HC 82.959, Rel. Min Marco Aurélio, DJ 01/09/2006

[28] STF, RE n. 560.626, 556.664, 559.882, Rel. Min. Gilmar Mendes, informativo do STF n. 510.


Informações Sobre o Autor

Daniel Ruiz Cabello

Graduado pela Instituição Toledo de Ensino de Bauru. Procurador da Fazenda Nacional. Pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil


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