A penhora parcial de salário como instrumento à efetiva prestação jurisdicional

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Resumo: Estudo da penhora parcial de salário por meio da aplicação da penhora eletrônica como instrumento de efetivação das execuções. Demonstra a dificuldade de realização dos créditos executivos, haja vista a presença constante de fraudes contra credores e à execução. Justifica sua aplicação em face da relação direta com os princípios da celeridade e instrumentalidade das formas. Fundamenta sua utilização por meio da tutela ao crédito, presente no direito obrigacional. Alia a sua aplicação utilizando-se o critério da proporcionalidade criado por Robert Alexy. Ressalta que não há violação aos ditames constitucionais da dignidade da pessoa humana, ao sigilo bancário e há o respeito ao devido processo legal.

Palavras-chave: penhora parcial de salário, penhora eletrônica, frustração, penhora efetivação, proporcionalidade.

Abstract: Study of the partial distrainment of wage by means of the application of the electronic distrainment as instrument of efetivation of the executions. It demonstrates the difficulty of accomplishment of the executive credits, has seen the constant presence of fraud against creditors and to the execution. It justifies its application in face of the direct relation with the principles of the celerity and instrumentality of the forms. It bases its use by means of the guardianship to the credit, gift in the contracts law. The criterion of the proportionality unites its application using itself created by Robert Alexy. She stands out that she does not have breaking to the order constitutional of the dignity of the person human being, to the secrecy banking and has the respect to due process of law.

Keywords: partial distrainment of wage, distrains electronics, frustration, distrainment efetivation, proportionality.

Sumário: Introdução. 1. A impenhorabilidade de salários no ordenamento jurídico brasileiro. 2.  Da relativização da impenhorabilidade salarial com vistas à efetividade da prestação jurisdicional. 2.1 Da vedação aos Projetos de Lei que trariam efetividade ao Processo de Execução. 2.2 Penhora Parcial de Salários como Instrumento à Efetiva Prestação Jurisdicional. 2.2.1. Penhora Parcial de Salário em outros ordenamentos jurídicos. 2.2.2. Fundamentação das Decisões que determinam a Penhora Parcial de Salário.  2.3. Créditos que dariam ensejo à Penhora Parcial de Salário. 2.4. Impenhorabilidade Absoluta Arguida pelo Devedor. 2.5. Penhora Parcial de Salários e a Tutela aos Direitos Fundamentais. Conclusão.

Introdução

Em nosso estudo abordaremos como a penhora parcial de salários constitui um instrumento que torna a prestação jurisdicional eficaz.

Mesmo possuindo um título executivo em suas mãos, em inúmeros casos o devedor não consegue satisfazer seu crédito devido à falta de bens de propriedade do executado, o que pode ser gerado por fraudes contra credores e à execução.

A penhora eletrônica surgiu como um instrumento para a efetividade do processo de execução, uma vez que possibilitou que o exequente tenha conhecimento se o devedor tiver numerários bancários de sua titularidade, havendo, por conseguinte a sua expropriação.

Este é o cerne da questão, muitas das contas encontradas são de recebimento de verba salarial, o que as tornaria impenhoráveis conforme previsão normativa presente em nosso ordenamento jurídico.

Assim, o presente trabalho vem demonstrar que a impenhorabilidade salarial deve ser relativizada para a prestação jurisdicional de forma efetiva.

1. A impenhorabilidade de salários no ordenamento jurídico brasileiro

No Brasil, a impenhorabilidade de salários é total, ou seja, não se admite penhora parcial de salários, com exceção de dívida alimentar. Qualquer rendimento da pessoa natural, qualquer salário, independentemente do valor, é protegido pelas normas de impenhorabilidade absoluta previstas no art. 649, inciso IV, do CPC combinado o art. 7 º, VI, da Constituição Federal, que prevê a irredutibilidade salarial.

Muitos doutrinadores entendem que esta impenhorabilidade não pode ser considerada de forma absoluta, principalmente quando há conflito entre regras e também entre princípios constitucionais vigentes em nosso ordenamento jurídico.

Anita Puchta (2008. p. 156) possui o seguinte entendimento sobre tais impenhorabilidades:

“As impenhorabilidades no Brasil constituem um sistema rígido, sem a flexibilidade necessária, sem uma ponderação, um equilíbrio necessário, tanto na elaboração de leis como nas decisões no caso concreto. Leis de impenhorabilidade excessiva possuem defeitos e vícios extrínsecos, de modo a macular a ordem jurídica, tornando-a fortemente injusta com quem busca o bem da vida. Em suma, é a própria ordem jurídica voltando-se contra si mesma.[…]

Nenhum direito no ordenamento é absoluto. Sempre há necessidade que se ceda em um direito para observar outro. As normas de impenhorabilidade sem a mitigação necessária, ou seja, rígidas, estão a ofender a dignidade humana e o direito fundamental de ação da vítima de ilícitos.”

Seguimos tal entendimento, no sentido de que a impenhorabilidade de salários não pode ser considerada como absoluta quando está em jogo o direito do credor de ter o seu crédito satisfeito. Há uma visível colisão dos direitos do credor versus o do devedor, e considerar o salário impenhorável significa deixar de prestar jurisdição ao credor, na medida em que este pode ser o único meio de receber o que lhe é devido.

2. Da relativização da impenhorabilidade salarial com vistas à efetividade da prestação jurisdicional

A penhora parcial de salários é admitida em nosso ordenamento jurídico quando a natureza do crédito que gerou tal constrição é alimentar e também no caso de penhora quando o crédito foi utilizado para adquirir o próprio bem. É o que preceitua o art. 649, § 1º e 2º, do CPC, ambos acrescidos pela Lei 11.382/2006:

“§ 1º A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem.

§ 2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia.”

Estas são algumas exceções já presentes no Código de Processo Civil, e foram ali inseridas para viabilizar o recebimento do crédito pelo credor.

Cândido Dinamarco (2007, p. 245) entende que as impenhorabilidades devem ser relativizadas principalmente quando servem para proteger aquele devedor que não paga o seu credor e continua mantendo o mesmo padrão de vida:

“É preciso estar atento a não exagerar impenhorabilidades, de modo a não as converter em escudos capazes de privilegiar o mau pagador. A impenhorabilidade da casa residencial, estabelecida pela Lei do bem de Família (Lei n. 8009, de 29.03.1990), não deve deixar a salvo uma grande e suntuosa mansão em que resida o devedor, o qual pode muito bem alojar-se em uma residência de menor valor.”

O principal objetivo da impenhorabilidade salarial é a proteção da dignidade do devedor, para que não tenha a sua subsistência afetada em função de dívidas feitas sem a devida precaução. Ocorre que, tal proteção quando é absoluta faz com que o devedor se beneficie desta proteção e continue prejudicando inúmeros credores, os quais não terão o seu crédito adimplido porque sempre encontrarão como barreira a penhorabilidade salarial. O devedor, por sua vez, poderá contrair novas dívidas sem qualquer punição por tal ato.

Luiz Rodrigues Wambier (2003. p.124) entende que a impenhorabilidade total do salário torna a justiça desacreditada perante seus jurisdicionados:

“Há um grande desvirtuamento, uma afronta a valores de grande peso no ordenamento e à Constituição Federal, com promulgação de leis que potencializam o descrédito da justiça.”

Podemos entender que a penhorabilidade salarial se coaduna com o objetivo das regras presentes em nosso ordenamento jurídico, garantindo a dignidade do credor e também a prestação efetiva da jurisdição, levando-se em consideração que a proteção total do salário estimula principalmente o inadimplemento por parte do devedor.

2.1. Da vedação aos Projetos de Lei que trariam efetividade ao Processo de Execução

O Projeto de Lei (PL) 4.497/2004, que gerou a Lei 11.232/2006, tinha em seu texto a seguinte previsão quanto às penhorabilidades:

Art. 649 [Omissis]

§ 3o Na hipótese do inciso IV, será considerado penhorável até quarenta por cento do total recebido mensalmente acima de vinte salários mínimos, calculados após efetuados os descontos de imposto de renda retido na fonte, contribuição previdenciária oficial e outros descontos compulsórios. (NR)

Art. 650. Podem ser penhorados, à falta de outros bens, os frutos e rendimentos dos bens inalienáveis, salvo se destinados à satisfação de prestação alimentícia.

Parágrafo único. Também pode ser penhorado o imóvel considerado bem de família, se de valor superior a mil salários mínimos, caso em que, apurado o valor em dinheiro, a quantia até aquele limite será entregue ao devedor, sob cláusula de impenhorabilidade.”

Tais disposições foram vetadas pelo Presidente da República e não fizeram parte da reforma processual de 2006.

Observando o texto que foi vetado concluímos que houve um retrocesso em tal medida, tendo em vista que estes institutos trariam maior satisfatividade ao processo de execução.

Arenhart e Marinoni (2007, p. 367) possuem o mesmo entendimento, e não enxergam motivos para tal vedação dentro da sistemática constitucional do controle de leis pelo poder executivo:

Veto presidencial a projeto de lei só pode ocorrer em face de inconstitucionalidade ou por ser a regra contrária ao interesse público (art.66, § 1º da CF). Contudo as próprias razões do veto evidenciam que as regras não incidiam em nenhuma das hipóteses.

O veto adverte à razoabilidade das previsões, que corrigiriam decorrente da ilimitada aplicação dos dogmas da impenhorabilidade e do bem de família. (…)

Além disto, o veto viola frontalmente a cláusula da proibição de proteção insuficiente (untermassverbot). De fato, ao vedar a penhora sobre parcela de altos salários ou sobre bens de vulto, o executivo inviabiliza a proteção adequada do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.”

Entendemos que aqueles artigos poderiam contribuir para a efetividade jurisdicional e não contrariariam os princípios constitucionais, na medida em que o legislador estaria buscando meios para viabilizar o adimplemento, já que os atuais instrumentos têm sido falhos frente às fraudes à execução.

2.2. Penhora Parcial de Salários como Instrumento à Efetiva Prestação Jurisdicional

Em nosso estudo demonstraremos a viabilidade da aplicação da penhora parcial de salários nos julgamentos do poder judiciário, aliada à utilização da penhora eletrônica, com vistas a atribuir maior efetividade ao processo de execução.

Para discorrermos sobre a penhora parcial de salários, é preciso determinarmos quais os proventos natureza  salarial nos termos do art. 649, inciso IV, do CPC. Segundo interpretação dada por Daniel Neves (2005, p.89) , podemos interpretar a norma estudada da seguinte forma:

“Por vencimentos deve-se entender todos os valores que compõe a remuneração do funcionário público, sendo, portanto, desnecessária a indicação individualizada do juiz de direito, que também é funcionário público. Soldos são os vencimentos dos militares e salários incluem toda a remuneração advinda de uma relação empregatícia, incluindo-se os adicionais, percentuais, participações, verbas em atraso, etc.”

Atualmente encontramos alguns julgamentos que determinam a penhora parcial do salário quando o crédito tem natureza alimentar, geralmente os magistrados utilizam analogicamente a regra contida na Lei 8.009/1990 (Impenhorabilidade do bem de família) em seu art. 3°, incisos I e III:

Art. 3° A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciário, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

I. em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias; […]

II. pelo credor de pensão alimentícia.”

Com o passar dos tempos, a jurisprudência evoluiu no sentido de permitir a penhora parcial de salário, tendo utilizado como limite a porcentagem de 30% (trinta por cento) desta verba. É o que pode ser demonstrado no seguinte julgado do TJDFT de relatoria da Des. Ana Maria Duarte Amarante Brito:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PENHORA ON LINE. SISTEMA BACEN JUD. LEGALIDADE.

Nos termos do artigo 655-A do CPC, “para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.

Consiste o BACENJUD em um sistema de informática desenvolvido pelo Banco Central, o qual hoje possibilita aos magistrados darem efetividade ao artigo 655-A, solicitando, por meio eletrônico, informações acerca da movimentação financeira dos clientes das instituições financeiras e determinando, também por meio eletrônico, o bloqueio de contas-correntes ou qualquer conta de investimento.

A absoluta impenhorabilidade da verba salarial do executado diz respeito à vedação de desconto em folha. Depositado em conta-corrente, não continua intangível, podendo ser objeto de penhora on line, sobretudo se inexistirem outros meios para a satisfação do crédito. Entender de modo diverso equivaleria a fomentar o enriquecimento ilícito do devedor.

Contudo, a penhora integral de conta-salário mostra-se excessiva. Mais razoável é que a constrição recaia somente sobre o percentual de 30% (trinta por cento) dos valores decorrentes de salário, de forma a não acarretar onerosidade excessiva ao devedor, tampouco ofensa ao artigo 649, inciso IV, do Código de Processo Civil [grifo nosso].

Agravo conhecido e não provido.” (Processo nº 20090020042864 AGI, Relator ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, 6ª Turma Cível, julgado em 10/06/2009, DJ 17/06/2009 p. 84.)”

Quando é determinada tal constrição cabe ao executado demonstrar por meio de extratos bancários que o único valor contido naquela conta é absolutamente impenhorável. É o que demonstra a decisão interlocutória proferida pelo Juiz de Direito Dr. João Luís Fischer Dias, no processo n° 2006.01.1.014871-0, da 9° Vara Cível de Brasília-DF, uma das decisões precursoras da penhora eletrônica em nosso ordenamento:

DESPACHO

Traga a requerida aos autos extrato de sua conta corrente demonstrando que o bloqueio foi efetivado na mesma conta onde percebe os proventos de pensão. Após apreciarei o pedido de fls. 39/41.Brasília – DF, sexta-feira, 06/10/2006 às 15h24.”

Alguns entendem que se a conta localizada pelo sistema Bacen-Jud for necessariamente de recebimento de salário ou de outra forma de proventos do devedor, a quantia ali presente não poderá ser penhorada, de acordo com o que prevê o artigo 649, incisos, II, IV, VII, do CPC. Não concordamos com tal afirmativa tendo em vista que a impenhorabilidade contida naquele artigo não pode ser considerada como absoluta quando atinge diretamente o direito do credor de receber o que lhe é devido e propicia ao devedor o enriquecimento ilícito.

Conforme já mencionamos, via de regra, as penhoras ocorrem na ordem de dez a trinta por cento do salário do executado. Isso dependerá da análise de suas reais possibilidades financeiras, estabelecendo-se o critério de proporcionalidade entre o que é ganho e o que é devido pelo réu aos seus demais credores, de modo que a penhora não afete a sua subsistência.

2.2.1. Penhora Parcial de Salário em outros ordenamentos jurídicos

Em alguns ordenamentos jurídicos internacionais a penhora parcial de salário é aceita e se encontra inserida de forma expressa em leis processuais.

Podemos citar como exemplo o ordenamento jurídico da Bolívia que prevê o instituto do Benefício de Competência que trata diretamente do pagamento parcial da dívida pelo devedor quando seu pagamento total possa levá-lo a um estado de extrema dificuldade em sua sobrevivência. Assim, mantém-se com o devedor o mínimo para sua subsistência e suspende-se a cobrança do restante para um momento em que este apresente uma recuperação em sua condição econômica podendo cumprir a sua obrigação.

Esta é uma sugestão interessante, na medida em que possibilita ao credor um recebimento parcial do que é devido, e também ao devedor um tempo para a sua reestruturação econômica, fazendo com que a execução não lhe seja tão onerosa.

O Código de Processo Civil alemão (ZPO- Zivilprozessordnung), em seu art. 811, dispõe sobre determinados ativos móveis que não podem ser penhorados, com o objetivo de permitir que o devedor e sua família mantenham uma quantidade mínima de bens essenciais para uso pessoal ou o exercício de profissão.  No art. 811, n. 8, é considerado impenhorável somente o mínimo necessário para prover o tempo entre a penhora e o próximo pagamento.

Nas legislações estrangeiras também há casos em que se atribui um valor mínimo impenhorável, como no ordenamento polonês que prevê no art. 833, § 1º, a impenhorabilidade de dois salários mínimos e a partir daí permite-se a penhora de até um quinto dos vencimentos.  Há também disposição expressa no Código de Processo Civil, artigo 823, nº 1, letra “e”, sobre a penhora parcial de salário, admitindo-se somente a impenhorabilidade de 2/3 deste, podendo o restante ser livremente penhorado.

Outra legislação que também interessa ao nosso estudo é a da Espanha, que em sua Ley de Enjuiciamiento Civil (Lei de Julgamento Civil) determina um regime de penhora progressiva, de acordo com o valor do salário do executado. O art. 607 desta norma estabelece um mínimo, referente ao salário interprofissional, e o juízo procede da seguinte forma para penhorar a porcentagem salarial:

Salários, vencimentos, remunerações, retribuições ou pensões que sejam superiores ao salário mínimo interprofissional serão penhorados na seguinte escala:[grifo nosso]

Para a quantia adicional [o que excede ao valor do salário interprofissional] até ao dobro do salário mínimo interprofissional, 30%.

Para a quantia adicional até ao triplo do salário mínimo interprofissional, 50%.

Para a quantia adicional até ao quádruplo do salário mínimo interprofissional, 60%.

Para a quantia adicional até ao quíntuplo do salário mínimo interprofissional, 75%.

Para qualquer montante que exceda a anterior quantia, 90%.

Se o executado for beneficiário de mais de uma prestação, acumular-se-ão todas elas para deduzir de uma só vez a parte impenhorável. Serão igualmente acumulados os salários, vencimentos e pensões, retribuições ou equivalentes dos cônjuges quando o regime aplicável não seja o de separação de bens, e rendimentos de todo o tipo que deverão manifestar ao tribunal. [grifo nosso]

 Em atenção aos encargos familiares do executado, o tribunal poderá aplicar uma redução situada entre 10 e 15% das percentagens estabelecidas nos números 1, 2, 3 e 4 do n.º 2 do presente artigo.[grifo nosso]

Se os salários, vencimentos, pensões ou retribuições estiverem sujeitos a deduções permanentes ou transitórias de carácter público em razão da legislação fiscal ou da segurança social, o montante líquido que o executado receber, uma vez deduzidas aquelas, constituirá a referência para regular a penhora.

Os anteriores números deste artigo aplicar-se-ão às receitas provenientes de atividades profissionais e mercantis autônomas.

Em todo o caso, sem prejuízo de tomar em consideração a impenhorabilidade acima mencionada, deve sempre destacar-se que as medidas de execução devem ser proporcionais ao montante pelo qual a execução é ordenada, de forma que se forem excessivas pode decidir-se a sua redução e se forem insuficientes, o seu agravamento. [grifo nosso]”[1]

Completando a nossa exposição sobre as normas de penhora parcial de salário na legislação internacional, utilizaremos o pensamento do doutrinador português José Reis (2007, p. 356) ao manifestar-se sobre o nosso sistema executivo:

“O sistema brasileiro parece-nos inaceitável. Não se compreende que fiquem inteiramente isentos os vencimentos e soldos, por mais elevados que sejam. Há aqui um desequilíbrio manifesto entre o interesse do credor e do devedor; permite-se a este que continue a manter o seu teor de vida, que não sofra restrições algumas no seu conforto e nas suas comodidades, apesar de não pagar aos credores as dívidas que contraiu.” 

Acreditamos que é este tipo de pensamento que deve motivar as decisões que concedem a penhora parcial de salários, é a vontade de colocar o devedor na situação que estaria se tivesse cumprido de forma integral a obrigação pela qual se obrigou.

2.2.2. Fundamentação das Decisões que determinam a Penhora Parcial de Salário

Vários estudiosos entendem que a penhora parcial de salários já possui previsão expressa no ordenamento jurídico brasileiro.

Anita Puchta (2008. p. 189) entende que tais normas seriam o art. 655, inciso I, e 655-A, do CPC, e o art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, no que diz respeito à expressa determinação da duração razoável do processo, além de outras previsões tais como:

“O devido processo legal, como também o direito fundamental de ação que depende do meio executivo adequado.”

Esta fundamentação está pautada na idéia de que o dinheiro está em primeiro lugar na ordem de preferência legal na nomeação de bens à penhora, e que autorizar a penhora parcial de salário como medida excepcional seria o mesmo que violar tal ordem legal de preferência.

A “contrariu sensu” não concordamos com esta afirmativa, o art. 655-A do CPC, prevê que a penhora eletrônica deve ser utilizada de forma primordial àquela constrição feita por meio de ofícios via correio, e não autoriza de forma expressa a penhora parcial de salário, o que também se aplica às demais normas mencionadas.

A penhora parcial de salários ainda encontra entrave na disposição contida no art. 649, IV, do CPC, por ser interpretada a impenhorabilidade de forma absoluta.

Portanto, entendemos que ainda não existe norma expressa que autorize a penhora parcial de salários (salvo as exceções previstas naquele artigo), mas que o magistrado utilizando-se de sua livre convicção aliada ao princípio da proporcionalidade poderá determinar este tipo de expropriação.

2.3. Créditos que dariam ensejo à Penhora Parcial de Salário

Dentro deste tema cabe um questionamento: Quais os créditos que poderiam viabilizar a penhora parcial de salário?

O próprio art. 649, do CPC, em seus parágrafos primeiro e segundo, dispôs sobre a possibilidade de penhora de salário quando a natureza do crédito for originada para a aquisição do próprio bem e também no caso de prestação alimentícia.

Será que este tipo de penhora não poderia ser realizada em execuções de créditos de outras naturezas, desde que tal constrição não afetasse a sobrevivência do devedor?

Inicialmente não haveria esta possibilidade tendo em vista que o salário é impenhorável e segundo estudiosos estaríamos afetando a dignidade da pessoa humana, garantia esta já consagrada em nossa Constituição Federal.

Mas não havendo a efetiva prestação jurisdicional não estaríamos afetando a dignidade do credor que recebeu um titulo executivo cuja finalidade seria a garantia do cumprimento da obrigação? Será que as garantias só são cabíveis ao devedor e não ao credor?

Se refletirmos a respeito desses questionamentos veremos que o nosso ordenamento atribuindo demasiada proteção ao devedor acaba por ferir os direitos do credor e também a expectativa de aplicar-se ao caso concreto a ponderância necessária na utilização das normas. Daniel Neves (2005, p.08) possui discorre neste mesmo sentido:

“A impossibilidade de penhora na totalidade dos vencimentos, inclusive, é exceção em diversos outros países, que certamente se preocupam com a dignidade do executado, mas não se esquecem do exequente, que também tem direitos que devem ser respeitados.”

Entendemos que aqueles créditos que já possuem natureza alimentar já devem por sua natureza autorizar a penhora parcial de salários, é o caso, por exemplo, dos créditos provenientes de serviços prestados por profissionais liberais. A subsistência destes trabalhadores depende do recebimento de seus honorários, e nada mais justo do que penhorar o parcialmente o salário do devedor para garantir o recebimento do que lhe é devido.

Em referente decisão, o juiz do TJDFT Dr. Júlio Lérias Ribeiro, que durante o cumprimento de sentença já havia determinado a utilização do sistema Bacen-Jud para a constrição de numerários bancários do executado, o que foi ineficaz, autorizou o desconto em folha de pagamento do devedor por ser o crédito que originou aquela ação proveniente de honorários advocatícios. Segue a decisão interlocutória por ele proferida:

DECISÃO

Cuida-se de execução de título judicial.

Decretada a revelia do requerido, ele foi condenado, em 08.04.2008, a pagar à autora a quantia de R$ 6.000,00 (seis mil reais), mensalmente atualizada e acrescida de juros legais.

Desde então, embora tenha a credora feito várias tentativas para localização de bens do devedor passíveis de constrição, todas restaram infrutíferas (fls. 123-126). O mesmo ocorreu quanto à maioria das tentativas de penhora de dinheiro por meio eletrônico em conta bancária do devedor (fls. 162-163, 177-181, 183-184 e 208-212).

A credora requereu, por fim, a realização de desconto em folha de pagamento do devedor, limitado a 30% de seu salário, para pagamento da dívida (fls. 216-219).

DECIDO.

Entendo que a proibição a que se refere o artigo 649, IV, do CPC, refere-se apenas aos usos desproporcionais do processo de execução, ou seja, quando a expropriação de númerário torne insuportável o sustento próprio e/ou da família do devedor.

Assim, é plenamente possível o desconto razoável em salário do devedor para o cumprimento da obrigação líquida, certo e exigível, garantindo-se a efetividade do acesso à justiça, máxime como no caso dos autos, em que já foram excutidos todos os meios para localização de bens do devedor passíveis de constrição. […]

Diante desse contexto, o desconto no patamar mensal de 30% dos ganhos da executada se adequa à modicidade da lide executiva sem ferir o equilíbrio econômico financeiro entre as partes e os direitos creditícios e constitucionais envolvidos.

Nesses termos, considerando que o executado percebe salário mensal, cabível a retenção de 30% desse valor. Expeça-se mandado de PENHORA e ofício ao órgão pagador do devedor (PMDF – fl. 48), devendo o referido órgão proceder ao desconto mensal de 30% (trinta por cento) sobre a remuneração do executado, até atingir o valor total de R$ 7.606,37 (sete mil seiscentos e seis reais e trinta e sete centavos). Os valores descontados deverão ser depositados, mensalmente, na conta bancária informada pela credora à fl. 223, até o limite da dívida[grifo nosso].

Intimem-se as partes.” Samambaia – DF, sexta-feira, 20/02/2009 às 15h09.”[2]

Este é o tipo de decisão que torna efetiva a prestação jurisdicional, naquele caso o executado era servidor público e tinha inúmeras execuções que foram propostas por outros credores. Não existiam bens de sua propriedade e ele ainda conseguia burlar o sistema Bacen-Jud, a autorização pelo magistrado do desconto feito em sua folha de pagamento foi a única forma da credora receber o que lhe era devido.

No caso mencionado o crédito possuía natureza alimentar, conforme pronunciamentos anteriormente feitos pelo STF e pelo STJ, mas e em casos em que o crédito não tiver essa natureza? O credor deverá se contentar com a ineficácia dos instrumentos executivos?

Estes são questionamentos que devem ser respondidos para serem estabelecidas normas que autorizem a penhora parcial de salário.

Acreditamos que o direito de receber o que é devido não pode ser restringido somente àqueles que possuem créditos alimentícios ou decorrentes da aquisição do próprio bem, para nós este é um direito que deve abranger a todo o credor. O devedor quando se comprometeu a realizar o pagamento tinha consciência que em caso de inadimplemento poderia sofrer a diversas sanções legais, mas na prática a ineficiência dos instrumentos processuais contribui para a sensação de impunidade e estimula o progressivo inadimplemento.

É evidente que para aplicar a penhora parcial de salário o magistrado deverá utilizar analogicamente as máximas de proporcionalidade, podendo ter como parâmetro o art. 400, do Código Civil, que trata dos critérios para a fixação de alimentos, quais sejam a necessidade do credor e a possibilidade do devedor.

Assim acreditamos que qualquer crédito pode originar a penhora parcial de salário, devendo o magistrado observar qual a porcentagem que deveria ser aplicada a cada caso.

2.4. Impenhorabilidade Absoluta Arguida pelo Devedor

Nos termos do art. 655-A, § 2º, do CPC, compete ao executado comprovar que as quantias depositadas bloqueadas em conta corrente são impenhoráveis. O devedor que deve fazer este tipo de prova, porque somente ele poderia ter acesso aos extratos bancários de sua conta e também aos comprovantes de pagamentos de seu salário para provar que a quantia ali depositada é de verba salarial.

Além disso, mantida a penhora parcial de seu salário em percentual parâmetro de 30% (trinta por cento) e mesmo assim esta constrição afetar de modo significativo a sua subsistência, o devedor pode comprovar que as dívidas que possui com alimentação, vestuário básico, entre outras, fazem com que o desconto deve ser feito em percentual mensal inferior ao determinado.

Como afirma Leonardo Greco (2001, p.239) , se o devedor não comprovar que todo o valor bloqueado é destinado para fins alimentares não há que se falar em impenhorabilidade absoluta desta verba:

“Qualquer valor obtido a título de vencimentos, soldos e salários que não fossem integralmente utilizados pelo devedor em sua subsistência e na manutenção de sua família perderia automaticamente sua natureza alimentar. Sem necessidade daqueles valores para sua manutenção digna – tanto não foi necessário que nem ao menos foi utilizado pelo devedor – a penhora deve ser permitida.”

Como já mencionamos, o magistrado utilizando-se de sua livre convicção fará uso do critério da proporcionalidade e determinará qual a porcentagem que não afetará a subsistência do devedor e que também poderá satisfazer o crédito do credor.

Portanto, realizada a penhora eletrônica caberá ao devedor provar que o valor bloqueado é impenhorável, e o magistrado não precisará se ater ao percentual presente na jurisprudência, se entender necessário poderá reduzir o percentual a ser penhorado do salário do executado.

2.5. Penhora Parcial de Salários e a Tutela aos Direitos Fundamentais

Alguns teóricos como Konrad Hesse e Robert Alexy entendem que não existem direitos fundamentais sem obrigações. Hesse (1991, p. 30) afirma que para a Constituição Federal preservar a sua força normativa deve se adequar às mudanças político sociais, devendo sempre haver uma ponderação entre os valores expressos pelos princípios nela contidos. Em suas palavras:

“Direitos fundamentais não podem existir sem deveres, a divisão de poderes há de pressupor a possibilidade de concentração de poder, o federalismo não pode subsistir sem uma certa dose de unitarismo. Se a constituição tentasse concretizar um desses princípios de forma absolutamente pura, ter-se-ia de constatar, inevitavelmente no mais tardar em momento de acentuada crise  que ela ultrapassou os limites de sua força normativa. A realidade haveria de pôr termo à sua normatividade; os princípios que ela buscava concretizar estariam irremediavelmente derrogados.”

Sob esta ótica podemos afirmar que a penhora parcial respeita às disposições constitucionais e mantém a sua normatividade, na medida em que promove a adequação dos instrumentos processuais aos fenômenos presentes no caso concreto.

Robert Alexy (1997, p. 367) entende que proteger o devedor de forma demasiada acaba por infringir as normas constitucionais:

“Um sistema que protege o devedor ao extremo chega a desestimular o pagamento pontual de débitos, porque se trata de precedente condenável, e o direito tem eficácia intimidativa e preventiva.”

A partir do momento em que o magistrado determina a penhora parcial de salários ele está preenchendo uma lacuna presente em nosso ordenamento jurídico. Luiz Marinone (2007, p. 84) possui esse entendimento:

 “De qualquer maneira, a teoria de que os direitos fundamentais têm função de mandamento de tutela (ou de proteção), obrigando o juiz suprir a omissão ou a insuficiência de tutela (ou da proteção) outorgada pelo legislador, facilita de forma extraordinária a compreensão da possibilidade de a jurisdição poder cristalizar a regra capaz de dar efetividade aos direitos fundamentais.”

Anita Puchta (2008, p. 47) descreve os direitos que são violados com a impenhorabilidade total de salários:

“Em suma, proteger altos salários com um instituto que visa tutelar os economicamente frágeis ofende o art. 3º, inciso III, da Constituição da República. As inconstitucionalidades encontradas na penhora absoluta de rendimentos da pessoa natural são inúmeras: ofende valores constitucionais como direito fundamental à tutela efetiva e adequada; ofende a dignidade da justiça; torna inoperante o princípio da inafastabilidade da jurisdição; também ofende a duração do processo em prazo razoável, porque dificulta a localização de bens para expropriação.

Impenhorabilidade excessiva também ofende os incisos V e X da Constituição Federal, que garante indenização por dano moral e material. Esses incisos constantes do art. 5º da CF também são violados com impenhorabilidades radicais, pois não há como ser indenizado sem uma penhora idônea.”

Podemos concluir que a penhora parcial de salários colabora para a tutela aos direitos fundamentais, porque a sua aplicação respeita às previsões constitucionais da prestação jurisdicional de maneira célere e eficaz, e ainda adéqua os atuais meios processuais a tais previsões.

Esse é o nosso entendimento acerca da penhora parcial de salários, não é justo que o credor que deu ensejo a uma ação de execução não receba da justiça uma efetiva prestação jurisdicional, em função das normas não corresponderem com a realidade das execuções no nosso país, protegendo devedores e favorecendo o crescimento das fraudes contra credores e à execução.

É nesse ímpeto que a utilização da penhora eletrônica juntamente com a penhora parcial de salários, contribui para uma justa e efetiva realização da justiça. Nos tempos modernos, dificilmente o executado não terá algum tipo de aplicação em instituições que compõem o sistema financeiro nacional.

Se for dado ao executado oportunidade para comprovar que o desconto deste valor afetará a sua subsistência é claro que a constrição não deverá ser realizada. Mas se não houver essa comprovação o desconto se daria de forma a proporcionar a equidade no julgado.

É necessário esclarecermos que defendemos a tese da penhora parcial de salários como medida a auxiliar à penhora eletrônica e à sua efetividade, de maneira que o juiz sempre utilize a livre convicção em suas determinações aliada a garantia constitucional da ampla defesa, evitando que estas medidas aqui utilizadas, sejam instrumentos processuais que contribuam para a fundamentação de arbitrariedades cometidas pelo poder judiciário, prejudiciais ao devedor ferindo os seus direitos já consolidados em nossa Constituição Federal.                                                        

Conclusão

Os títulos executíveis têm consolidado em sua natureza a manifestação de vontade presente na materialização de uma obrigação, assim funcionam como instrumentos garantidores de seu cumprimento, além disso, para que essa manifestação de vontade seja considerada válida não é possível que somente prevaleçam as normas de direito privado, sendo necessário que estejam de acordo com as normas de direito público (função social do contrato)

É de se notar que os títulos são utilizados como garantidores da obrigação firmada, quando presentes os requisitos da certeza, liquidez e exigibilidade, porém esta garantia só se consolida com a efetiva prestação jurisdicional.

Nos termos do art. 5°, inciso LXXVIII da Constituição Federal e do art. 612 do CPC, é garantida a efetiva prestação jurisdicional no processo execução, devendo esta ocorrer em tempo razoável, objetivando os seus instrumentos a celeridade dos procedimentos.

Ocorre que, atualmente os instrumentos utilizados no processo de execução não garantem ao exequente a satisfação do crédito inadimplido. Resta clara a presença de constantes fraudes contra credores e também à execução, em decorrência da ineficiência dos instrumentos executivos frente à demasiada proteção ao devedor presente na legislação pátria.

Há de se compreender que as normas protetivas surgiram durante a evolução do processo de execução ao longo da história da humanidade, em função de na antiguidade a execução forçada ter gerado extrema violência, o que pode ser observado nas regras presentes no direito romano, em especial na Lei da XII Tábuas, que previa a responsabilização pessoal, onde eram dadas como garantias partes dos corpos dos devedores, chegando até ao extremo da morte dos executados.

A humanização do processo de execução possibilitou que o devedor, agindo de má-fé, burlasse os instrumentos garantidores da execução, em especial a penhora de bens. Isso começou a ocorrer, principalmente, porque os meios executivos são insuficientes para a constatação destas fraudes.

Nestes eventos em que o devedor não possui bens passíveis de penhora, o juízo encontra como possíveis alternativas a suspensão do processo (art.791, III, CPC).

Acreditamos que a penhora eletrônica é um instrumento eficaz , porque na atualidade, com a vigência da informática, as pessoas que não possuem aplicações bancárias estão em número reduzido.

Além disso, o bloqueio do valor presente em conta bancária, por se tratar num primeiro momento de uma medida considerada extrema, faz com que o executado proponha em juízo outra forma para o pagamento do crédito inadimplido.

Acreditamos que esta medida pode ser mais eficaz se no processo de execução o bloqueio fosse feito aliado à concessão de cautelar como medida urgente.

Imaginemos que na propositura da execução o exeqüente comprove que o executado já possui o seu nome inscrito nos órgãos de proteção ao crédito, ou mesmo que já existem outras execuções tramitando contra a mesma pessoa, isso certamente poderia comprovar que o devedor usualmente tem fraudado seus credores, o que impossibilitaria o sucesso deste processo de execução. Assim, se o magistrado determinar cautelarmente a utilização do sistema Bacen-Jud as chances de satisfação do crédito seriam aumentadas.

No nosso estudo também incluímos como fator determinante do sucesso da penhora eletrônica a penhora parcial de salários. Atualmente o nosso ordenamento jurídico não aceita este tipo de constrição, salvo nos casos do crédito ter origem alimentar. Cremos que a impenhorabilidade absoluta da verba salarial para créditos de origem diversa é uma afronta ao direito do credor e a efetiva prestação jurisdicional.

Como já dispusemos anteriormente, a proteção do devedor no processo de execução ocorre em virtude da humanização presente na evolução do processo executivo. Porém, nos dias atuais essa proteção ocorre de forma excessiva, tendo em vista que o direito deve acompanhar às mudanças político-sociais.

Num primeiro momento a ideia que surge quando dispomos sobre impenhorabilidade absoluta é a de subsistência. É claro que não estamos defendendo que a penhora de parte do salário do devedor afete a sua sobrevivência. O que almejamos é que o magistrado utilizando-se de sua livre convicção adote o critério da máxima proporcionalidade, observando a possibilidade do devedor e a necessidade do credor no processo expropriatório, para a deliberação do “quantum”  a ser adstrito pela penhora eletrônica.

Adotamos esse critério de proporcionalidade porque hoje em dia o crédito expresso em um título executivo também pode ter caráter alimentar para o credor. Um exemplo clássico ocorre com o credor que vive na informalidade e necessita do pagamento daquela quantia para a sua subsistência.

Se a única conta a ser rastreada pelo sistema Bacen-Jud for de recebimento de salário e este num valor que possibilite uma mínima restrição mensal. Será que não seria justo a penhora parcial desta verba já que o credor também necessita daquele valor para sobreviver?

Como podemos notar, quando analisamos os casos concretos há uma demasiada proteção do devedor frente aos direitos do credor, e cabe ao magistrado na aplicação da lei possibilitar uma justa e eficaz prestação jurisdicional. O que ao nosso entendimento pode ser alcançado com o emprego da penhora eletrônica aliada à penhora parcial de salários, sendo esta utilizada  da forma mais adequada ao caso concreto.

 

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Notas:
[1] Ley de Enjuiciamiento Civil, disponível em  http://noticias.juridicas.com/base_datos/Privado/l1-2000.html.
[2] Esta decisão foi proferida no 2º Juizado Especial Cível da Circunscrição Judiciária de Samambaia-DF, Processo nº 2007.09.1.019459-9.


Informações Sobre o Autor

Priscila Ramos de Moraes Rego Agnello

Orientadora do PIBIC-EM (Educação jurídica popular para a concretização dos direitos sociais”) financiado pelo CNPQ. Advogada. Professora de Direito do Instituto Federal de Brasília. Especialista em Direito e Jurisdição, Mestranda em Direito e Políticas Públicas (Uniceub)