A terceirização no Brasil e a Súmula 331 do TST

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Resumo: Monografia destinada ao estudo do fenômeno da terceirização de mão-de-obra, mormente no que se refere às atividades do setor privado. Para o estudo, pontuou-se acerca das evoluções do Direito do Trabalho, bem como flexibilização das normas trabalhistas que impulsionaram o aumento da utilização do trabalho terceirizado. A busca incessante pelo lucro máximo com o gasto mínimo propulsiona a contratação de empresas terceirizadas para realizar as tarefas principais das empresas, abusando da lacuna da lei para esquivar-se dos encargos trabalhistas. A ausência de regulamentação legislativa acerca dos serviços que podem ser terceirizados aumenta a prática da terceirização na forma ilícita, contrariando o entendimento consolidado pela jurisprudência através do enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que pode ser considerada como a única ferramenta do empregado para garantia dos seus direitos. Foram analisados os projetos de lei que hoje tramitam no Congresso Nacional que pretendem por um fim à utilização da terceirização na sua forma ilícita. Ponderou-se que não se trata de proibir a prática da terceirização, mas sim de instituir regras com base em critérios práticos, a fim de destacar a sua finalidade de redução de custos e especialização de serviços das empresas submetidas à concorrência nos dias atuais, sem, contudo, infrigir os princípios básicos do Direito do Trabalho.


Palavras-chave: Direito do Trabalho. Terceirização. Princípios. Precarização.


Abstract: Monographic paper destined to study of manpower outsourcing phenomenon, particulary related to private sector activities. For the study it was pointed out the evolution of Labor Law, as well as relaxations of labor regulamentations have spurred the increased use of outsourced work. The incessant search for maximum profit with minimum spending drives the hiring of subcontractors to perform the company’s main tasks, abusing of the law lack to avoid labor charges. The absence of legislative regulation on the services that can be outsourced increases the practice of illegally outsourcing, contrary to the agreement of jurisprudence bounded by enunciated 331 of the Superior Labor Court, which can be considered as the only employee tool used to guarantee their rights. It was analyzed the bills in course in National Congress that intend to end the use of outsourcing in a unlawful manner. It was pondered that it is not about banishing the practice of outsourcing, but to establish rules based on practical criteria in order to highlight its purpose of cost reduction and service specialization for firms submitted to competition today, without, however, violate the basic principles of labor law.


Keywords: Labor Law. Outsourcing. Principles. Precariousness.


Sumário: 1. Introdução. 2. Evolução do Direito do Trabalho e a flexibilização. 3. Terceirização.  3.1 Conceito . 3.2 Princípios do direito do trabalho e a terceirização. 3.2.1 Princípio da proteção. 3.2.2 Princípio da primazia da realidade. 3.2.3 Princípio da irrenunciabilidade. 3.2.4 Princípios da boa-fé e dignidade da pessoa humana. 4. A terceirização no Brasil. 4.1 A súmula 331 do TST. 4.2 Atividade-fim e atividade-meio. 5. Proposições legislativas. 5.1 Projeto 5.439/2005. 5.2 Projetos 1.621/2007 e 6.832/2010. 6. Considerações finais. Referências bibliográficas.


1. Introdução


Atualmente verifica-se a necessidade das empresas em criar alternativas que sejam capazes de amenizar as dificuldades de manutenção dos negócios no país. É necessário criar e sustentar vantagens competitivas entre as empresas, a fim de reduzir os custos da produção para alcançar o lucro e se manter no mercado.


Os esforços estão cada vez mais focados na realização da atividade principal da empresa, sendo necessário que toda a capacidade produtiva seja redirecionada para acumular valores à produção. No final, não restam energias a serem direcionadas nas atividades que, embora necessárias ao produto final, não estejam necessariamente ligadas a este.


Estas atividades são denominadas atividades-meio, ou seja, são dispensáveis a realização do produto principal da empresa, ou seja, a atividade-fim. É perfeitamente possível o repasse destas tarefas a outras empresas, o que significa reduzir imediatamente o custo com mão-de-obra. Assim, a empresa pode focar-se apenas no indispensável, aumentando a competitividade e a especialização e, por conseqüência, os lucros.


Surge, então, a terceirização em meio a este contexto, com o fim principal de reduzir custos e acelerar a economia. A terceirização pode e deve ser defendida como um meio de desverticalização, fixação de esforços gerenciais no produto principal, busca de melhoria contínua da qualidade, produtividade e competitividade, que, é claro, considerada a redução de custos.


Porém, não se pode ficar alheio e inerte quanto aos efeitos maléficos que este processo pode causar aos trabalhadores, tais como desemprego, redução salarial, perda de benefícios, sonegação de encargos sociais, entre outros. Assim, a repercussão toma forma contundente no Direito do Trabalho, posto promover grande alteração na definição bilateral típica da relação de emprego, podendo resultar em grave precarização das condições de trabalho no Brasil.


Alerta-se ainda para o grande impasse que é gerado pela omissão legal acerca do assunto, visto que a legislação não estabelece quais as atividades podem ser alvo do processo, nem quais procedimentos devem ser observados pelas empresas que fazem uso do instituto. Ante a omissão legislativa, os trabalhadores podem contar apenas com o enunciado 331 do Tribunal Superior do Trabalho como apoio na hora de reclamar os direitos trabalhistas.


Diante de todo o exposto, indaga-se a respeito da legalidade da utilização da terceirização trabalhista e quais seriam estas situações, acreditando-se na hipótese de que é possível o uso do instituto, porém, apenas em sua forma lícita.


Este trabalho foi desenvolvido com base na pouca legislação existente sobre o tema, jurisprudências e doutrinas, e tem o objetivo de estudar a terceirização da mão de obra laboral, que será investigada mais a fundo, principalmente no tocante à atividade-fim das pessoas jurídicas, quando é considerada ilegal. Para tanto, será necessário pontuar sobre as evoluções do direito do trabalho, bem como a flexibilização das normas trabalhistas, além de ser fundamental a análise dos projetos de lei que hoje tramitam no Congresso Nacional com o objetivo de regular o assunto.


2. Evolução do direito do trabalho e a flexibilização


A Relação de trabalho, influenciada pelas transformações sociais, passou por várias mudanças ao longo da história. A escravidão, a servidão e as corporações de ofício foram algumas das formas de trabalho adotadas antigamente. Porém, o marco principal para a evolução do Direito do Trabalho está intimamente ligado à Revolução Industrial do século XVIII, que impôs uma nova relação entre trabalho e capital. (FERRAZ, S/D, on line).


Com o nascimento das grandes indústrias e o advento das máquinas, as formas e condições de trabalho foram intensamente modificadas, passando os trabalhadores das fábricas a vender sua força de trabalho em troca de um salário. Devido ao rápido crescimento econômico, a população foi atraída para os grandes centros em busca de trabalho nas fábricas. Esse deslocamento de camponeses e artesãos contribuiu para o grande aumento da população nas cidades, gerando o desemprego. (FERRAZ, S/D, on line).


O desemprego avassalador, juntamente com o Liberalismo Econômico da época, foi determinante para que os trabalhadores se sujeitassem a um regime desumano de trabalho. Como se pregava uma intervenção mínima do Estado na economia e nas relações sociais, os trabalhadores ficaram sujeitos à lei da oferta e da procura, ou seja, à mercê da vontade dos empregadores que eram o pólo mais forte da relação de trabalho. Surge então a figura do proletariado. O proletário é o trabalhador que enfrenta jornadas de até 16 horas por dia em troca de baixíssimos salários e condições vexatórias de trabalho.


A precariedade da situação despertou a reação dos trabalhadores, que impulsionados por idéias socialistas de combate ao capitalismo e ao liberalismo, passaram a se associar em classes de operários em prol da defesa de seus interesses, originando, assim, os sindicatos. (FERRAZ, S/D, on line).


A sociedade como um todo passou a cobrar do Estado uma ação firme de regulamentação das relações de trabalho. Esse, por sua vez, começou a intervir e proporcionar proteção jurídica e econômica ao trabalhador por meio de leis que regulamentassem minimamente as condições do trabalho e melhorias sociais.


Exemplos marcantes de conquistas para o direito trabalhista foram a Constituição do México, em 1917, denominada de Constituição Social; A declaração Russa dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado, em 1918; A Constituição de Weimar, em 1919; A criação da OIT (Organização Internacional do Trabalho) após a primeira guerra; a “Carta Del Lavoro”, de 1927, documento italiano fundamental para o direito do trabalho, dentre outros. O Direito do Trabalho, portanto, representa uma conquista da classe trabalhadora e estas positivações significaram um grande avanço na esfera social. (FERRAZ, S/D, on line).


Porém, ao final do século XX surgem os fenômenos da globalização e do neoliberalismo, representando um novo e grande impacto no Direito do Trabalho e nos Direitos Sociais.


A globalização da economia, fruto do capitalismo, implantou uma nova concepção entre o capital e o trabalho, pois as questões econômicas se tornaram o ápice dos interesses globais. O desenvolvimento econômico, tecnológico, principalmente das telecomunicações, transformaram algumas empresas em grandes potências, expandindo seus mercados na busca de acumulação de capital, aproveitando principalmente a mão-de-obra barata dos países subdesenvolvidos e o baixo custo para a produção. Essa nova dinâmica de internacionalização dos mercados gerou também uma internacionalização de bens e serviços, possibilitando uma livre circulação de trabalhadores.  O mundo se tornou refém dos interesses econômicos e as tentativas de frear o capitalismo, para preservar o equilíbrio social, fracassaram. (SANTOS, 2005, on line).


Nos países desenvolvidos, os trabalhadores perderam postos de trabalho devido à informatização do mercado e à migração das empresas para países subdesenvolvidos. Os países subdesenvolvidos, por sua vez, ficaram ‘nas mãos’ dos interesses das grandes empresas, pois dependiam delas para se desenvolver. Assim, o poder estatal começou a perder força para a economia de mercado cedendo às pressões do capitalismo e recuando nas conquistas sociais alcançadas ao longo de muitas décadas.


A crise econômica da década de 70 agravou ainda mais a situação dos trabalhadores, fazendo com que as idéias neoliberais tomassem força. O capitalismo passou a ser a justificativa para o crescimento, cortando-se gastos para a recuperação das empresas, afastando o Estado das questões trabalhistas e aumentando a produção. O argumento neoliberal pregava que o recuo do Estado nas questões sociais e trabalhistas aumentaria a demanda de emprego e ajudaria as empresas a diminuir os custos com os respectivos encargos trabalhistas. (SANTOS, 2005, on line).


Nasce assim, uma política flexibilizadora das normas trabalhistas, que se deu para atender às determinações de um processo globalizador que prometeu prosperidade econômica e a abertura de diversos postos de trabalho com diminuição dos encargos trabalhistas. Portanto, o neoliberalismo promoveu um enxugamento do Estado, nascendo a doutrina da desregulamentação e da flexibilização dos direitos trabalhistas; relaxando as normas trabalhistas para que haja uma adequação capaz de atender a dinâmica do mercado, enquadrando a relação de trabalho ao novo cenário mundial de concorrência.  (SANTOS, 2005, on line).


A complexidade do tema e a falta de uma regulamentação do mesmo vêm gerando impactos nas relações de trabalho e debates extremistas sobre seus benefícios ou prejuízos.


Alguns autores acreditam que a flexibilização da legislação trabalhista representa um retrocesso, uma supressão nos direitos conquistados a duras penas ao longo da história. Entendem ser a lei capaz de solucionar todos os problemas sociais e que a flexibilização viria agravar as condições dos hipossuficientes. Acreditam que os argumentos a favor da flexibilização são apenas uma justificativa empresarial para precarizar as relações de trabalho e desonerar os custos. Busca-se, assim, a redução dos direitos e garantias dos trabalhadores, com o argumento de que a interferência estatal rígida prejudica as empresas, agravando a situação de desemprego.


Para outros, essa flexibilização vem como uma mudança necessária, trazendo progresso e criando novos postos de trabalho. Defendem que as normas trabalhistas estiveram, por muito tempo, sobre uma forte intervenção estatal, e que esta só faz frear o crescimento mundial. Como hoje os problemas são diferentes, o modo de combatê-los também é diferente. Não pode o Direito do Trabalho desempenhar o mesmo papel que desempenhou, com sucesso, antigamente. O Direito deve acompanhar o progresso os usos e costumes, sofrendo mutações e adequações aos novos tempos.


Os debates sobre o tema são acalorados e as opiniões sobre ele, bem divergentes. Cada setor quer defender seus próprios interesses e a base de argumentação deles é muito consistente. Apesar do esforço protecionista, a prática da flexibilização das normas trabalhistas é uma realidade que, querendo ou não, vem sendo utilizada.


Amauri Mascaro do Nascimento acredita que a flexibilização pode ser conveniente para alguns fins, sem perda do sentido do direito do trabalho, mas devem ser respeitadas rigidamente algumas normas a fim de evitar a perda do ponto de equilíbrio das relações jurídicas do trabalho. (NASCIMENTO, 2004, p. 153).


O professor Mário Antônio Lobato de Paiva ensina:


“[…] Na importante questão que envolve a definição do papel do Estado nas relações trabalhistas da sociedade contemporânea, parece fundamental admitir que a redução do tamanho do Estado não pode torná-lo incapaz de mediar os conflitos, sob pena de deixar a grande maioria dos trabalhadores sem qualquer defesa, completamente dominados pelos grandes grupos econômicos e financeiros, que têm no lucro o único objetivo de suas ações.Esses fenômenos (desregulamentação e flexibilização) correspondem apenas, a um novo espírito do Estado menos centralizado, mais aberto aos grupos naturais e mais preocupado com a eficácia e bem estar da comunidade como um todo e não apenas de um parcela de privilegiados.


Temos, assim, a firme convicção de que a flexibilização e a desregulamentação apresentam-se como mecanismos úteis de desenvolvimentos das relações laborais e que precisam ser bem utilizados e compreendido por todos os atores sociais. Estes referidos mecanismos deverão assim, ter de prioridade política, associada a opção por executar um conjunto de políticas e ações capazes de aliar a estabilidade com crescimento e inclusão social.” (PAIVA, 2001, on line).


Interessante o que diz, a respeito do tema, o professor Antônio Álvares da Silva:


“[…] o debate sobre a flexibilização foi travado com muita emoção e conteúdo ideológico, sindicatos e governo perderam-se em troca de acusações recíprocas, que se distanciaram da realidade e se transpuseram para o campo político. […] o esforço a de ser na direção de se construir um Direito Flexível, que se adapte às necessidades dos novos tempos, mas que também, por outro lado, não prejudique o trabalhador”. (SILVA, 2002, p. 85 -6).


No Brasil, é possível observar a aplicação destes institutos, tanto em caráter constitucional, quanto em caráter infraconstitucional.


A Advogada Rosalba Maria Barros Perez em seu trabalho: “A Flexibilização das normas trabalhistas no Brasil à Luz da Globalização” cita como formas de flexibilização da constituição: a redução do salário, art. 7º VII; a redução da jornada de 8 horas diárias, art. 7º XIII e a redução da jornada de 6 horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, art. 7º XIV, cabendo às partes determinar as normas que passarão a reger suas relações de acordo com seus interesses, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho. (PEREZ, S/D, on line).


No plano infraconstitucional as formas de flexibilização são muitas, mas as que chamam mais a atenção é a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho, que regulou o instituto da terceirização, que é uma contratação de trabalhadores através de uma empresa interposta e a lei 6.019, de 1974, que tratou do Trabalho Temporário, (uma forma de terceirização), que consiste em colocar trabalhadores à disposição de outras empresas, temporariamente, objetivando atender a necessidade transitória de substituição de seu pessoal. 


Como visto, a rigidez das normas trabalhistas vêm sendo minimizadas. A maior parte da doutrina, no entanto, alerta para que, ao se flexibilizar as normas, sejam respeitados os direitos mínimos do trabalhador e que as negociações coletivas se façam mais presentes.


3. Terceirização


3.1 Conceito


Conforme já mencionado, a terceirização hoje é uma realidade nas relações de trabalho, originada das mudanças no sistema econômico e da flexibilização das normas.


No entanto, não existe legislação que defina a terceirização, cabendo apenas à doutrina a tarefa da conceituação. O autor Paulo Douglas Almeida de Moraes enumera vários conceitos acerca do fenômeno da terceirização, retirados de doutrinas administrativas e jurídicas. Vejamos alguns conceitos de doutrinas administrativas.


Segundo Lívio Giosa, terceirização é


“[…] um processo de gestão pelo qual se repassam algumas atividades para terceiros, com os quais se estabelece uma relação de parceria, ficando a empresa concentrada apenas em tarefas essencialmente ligadas ao negócio em que atua.” (GIOSA apud MORAES, 2003, p.64).


Para Ciro Pereira da Silva, o fenômeno da terceirização pode ser definido como:


“[…] a transferência de atividades para fornecedores especializados, detentores de tecnologia própria e moderna, que tenham esta atividade terceirizada como sua atividade-fim, liberando a tomadora para concentrar seus esforços gerenciais em seu negócio principal, preservando e evoluindo em qualidade e produtividade, reduzindo custos e ganhando competitividade.” (SILVA apud MORAES, 2003, p. 65).


Já os juristas evidenciam o fenômeno a partir de outro ponto de vista. Segundo Paulo Moraes, enquanto os administradores estudam a terceirização com o fim da eficácia empresarial, a comunidade jurídica analisa o instituto a partir da dinâmica instalada nas relações entre as pessoas jurídicas terceirizantes e terceirizadas. (MORAES, 2003, p. 66).


Patrícia Catharino ainda observa que existe grande polêmica acerca das atividades que podem ou não ser terceirizadas, sendo que grande parte concebe o processo de terceirização apenas quando relacionado à atividade-meio ou complementares. (CATHARINO, 2005, p. 39).


Para Alice Monteiro de Barros, terceirização é um fenômeno “que consiste em transferir para outrem atividades consideradas secundárias, ou de suporte, mais propriamente denominadas de atividades-meio, dedicando-se a empresa à sua atividade principal, isto é, à sua atividade-fim.” (BARROS apud MORAES, 2003, p. 67).


Já Sergio Pinto Martins ensina que é a possibilidade de contratação de terceiros para realização de atividade-meio da empresa, isto é, aquelas atividades que não constituam seu objeto principal, sua atividade essencial.” Segundo o autor, existem terceirizações de atividades-fim, como por exemplo, na indústria automobilística, por aquela empresa que reúne as peças fornecidas por diversos fornecedores e monta uma parte do veículo. (MARTINS apud MORAES, 2003, p. 67)


Em outras palavras, a terceirização significa repassar uma atividade que não esteja relacionada com o objetivo principal da empresa a uma outra empresa, para que esta contrate seus próprios funcionários, mantendo com eles o vínculo empregatício. A empresa terceirizada figura como intermediária na relação, que se torna trilateral, conforme nos ensina Maurício Godinho Delgado:


“Por tal fenômeno insere-se o trabalhador no processo produtivo do tomador de serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente. A Terceirização provoca uma relação trilateral em face da contratação de força de trabalho no mercado capitalista: o obreiro, prestador de serviços, que realiza suas atividades materiais e intelectuais junto à empresa tomadora de serviços; a empresa terceirizante, que contrata este obreiro, firmando com ele os vínculos jurídicos trabalhistas pertinentes; a empresa tomadora de serviços, que recebe a prestação de labor, mas não assume a posição clássica de empregadora desse trabalhador envolvido”. (DELGADO, 2002, p. 417).


Segundo Mariangela Leal Cherchglia, as principais formas de aplicação da técnica de terceirização são (CHERCHGLI, 2002, on line):


– Desverticalização: consiste em repassar funções a um fornecedor especializado, que atua em suas próprias instalações, fabrica partes e componentes solicitadas pelo tomador de serviços;


– Prestação de serviços: a mais utilizada das formas, ocorre quando um terceiro pratica atividade-meio do tomador, executando-a nas instalações deste ou em local determinado;


– Franquia: ocorre quando determinada empresa concede a terceiro o uso de sua marca ou comercializa seus produtos em condições preestabelecidas;


– Compra de serviços: acontece quando uma empresa de capacidade saturada necessita aumentar suas atividades e buscam parceiros para que estes complementem a capacidade produtiva;


– Nomeação de representantes: incide quando uma empresa contrata outras para a representação nas vendas em geral;


– Concessão: ocorre quando uma empresa atua em nome de outra, que condiciona o uso da sua marca e comercialização dos seus produtos;


– Permissão: utilizada tipicamente na terceirização de serviços públicos, a permissão ocorre quando a exploração de um serviço público é repassada a uma permissionária para que esta, exclusivamente, explore o serviço;


– Alocação de mão-de-obra: compra ou aluguel de horas de trabalho, podendo se desenvolver como o trabalho temporário ou o sindicalizado;


Ainda segundo a autora, demais formas de aplicação da técnica, como desintegração, facção, corporação, descentralização integrada, são específicas de determinado ramo da economia ou ainda incipientes. (CHERCHGLI, 2002, on line).


Conclui-se que a empresa tomadora pode focar-se apenas na produção do objeto principal, aumentando a qualidade e a produtividade, aliada à redução dos custos de produção. Ou seja, enquanto no modelo tradicional o empregado presta serviços diretamente ao empregador, com o qual possui vínculo empregatício (art. 2º, caput, CLT), na terceirização a relação é trilateral, onde o empregado presta serviços ao tomador, embora não seja seu empregado efetivo. A relação de emprego é estabelecida com outro sujeito, a empresa interveniente ou fornecedora. 


3.2 Princípios do direito do trabalho e a terceirização


O art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil diz que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”. Deste artigo, depreende-se que, aos magistrados, cabe o desenvolvimento do direito no caso de haver lacuna na legislação, na tentativa de alcançar a decisão mais favorável ao caso concreto.


Diante da falta de legislação que tutele o assunto em tela, procuramos solução com a interpretação sistemática do nosso ordenamento jurídico, principalmente nos princípios contidos em nossa Constituição e na CTL.


Os princípios são considerados como estrutura jurídica, que tem como finalidade viabilizar a aplicação das normas nos casos concretos. Os mesmos possuem grande relevância no ordenamento jurídico por serem considerados como norteadores do direito e possuírem características informadoras, interpretativas e normativas no direito.


No direito do trabalho, o artigo 8º da CLT traz uma função essencial aos princípios, dispondo que os mesmo deverão ser aplicados em caso de omissão legal ou contratual, in verbis:


“Art. 8º – As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.


Parágrafo único. O direito comum será fonte subsidiaria do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.”


Sendo assim, o direito do trabalho, como direito autônomo que é, possui princípios próprios que constituem fundamentos específicos do ordenamento jurídico trabalhista, não se confundindo com outros ramos do direito.


Nesta esteira, Américo Plá Rodriguez ressalta a importância dos princípios desse ramo do Direito, afirmando que eles constituem o fundamento do ordenamento jurídico trabalhista, e, conseqüentemente, entre os mesmos e os preceitos legais não pode haver contradição. Ademais, é certo afirmar que tais princípios estão acima do direito positivo, na medida em que servem como elemento inspirador, não podendo, porém, tornar-se independentes do sistema, visto que se influenciam mutuamente. (PLA RODRIGUEZ apud JOHNSTON, 2002, on line).


Passemos à análise dos princípios basilares do Direito do Trabalho que possuem pertinência temática com o presente trabalho monográfico.


3.2.1 Princípio da proteção


Este princípio se desdobra em três outros princípios que visam garantias de condições mais benéficas aos trabalhadores, bem como, aplicação das normas mais favoráveis, com o propósito de corrigir desigualdades diante da posição de hipossuficiência do empregado.


O fundamento do princípio da proteção decorre do propósito de equilibrar as relações havidas entre o capital e a força de trabalho, eis que são flagrantemente desiguais. A desigualdade entre os homens já se manifesta logo na origem da humanidade, onde o mais forte, apesar de igual ao mais fraco, sempre se manteve em posição privilegiada quando da ocupação das terras, do aproveitamento da propriedade e no prenúncio da manifestação do trabalho subordinado.


Porém, acerca do alcance deste princípio, extrai-se a seguinte lição de Plá Rodrigues:


“[…] este princípio não dá direito de fazer qualquer coisa em nome da proteção do trabalhador, e muito menos a substituir-se ao criador das normas. Tem um campo de aplicação limitado e, mantendo-se dentro dele, não conspira contra a segurança, porém assegura a eficaz e adequada aplicação da norma.” (AMÉRICO, 2004, p. 39).


O princípio do “In dúbio pro operário” visa proteger a parte mais fraca da relação de trabalho, qual seja, o trabalhador. O princípio reza que havendo dúvida quanto a interpretação da norma, deverá ser aplicada aquela que for mais benéfica ao trabalhador. Por óbvio, este princípio deve ser aplicado com razoabilidade evitando afrontar a verdadeira vontade do legislador.


A natureza deste princípio é considerada como hermenêutica, pois havendo um dispositivo de lei ou de um contrato que enseje interpretação em sentido dúbio, a regra é que será adotada a interpretação mais benéfica ao trabalhador.


O princípio da “Aplicação da norma mais favorável” será aplicado sempre que houver uma pluralidade de normas, devendo-se optar por aquela mais favorável ao trabalhador.


É sabido que existem diversas normas que regulam as relações laborais, como por exemplo, acordos coletivos, sentenças normativas, convenções, regulamentos internos empresariais, entre outros.  Ressalta-se que, diante da aplicação deste princípio não haverá hierarquia de normas, mas sim, a aplicação daquela que for mais benéfica ao trabalhador.


Já, com relação ao princípio da “condição mais benéfica”, sua essência está intimamente ligada ao princípio da norma mais favorável. No entanto, neste caso, a finalidade do princípio é manter os direitos e privilégios alcançados pelo trabalhador no decorrer do contrato de trabalho.


Reza o art. 10 da CLT: “Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados”.


No mesmo raciocínio tem-se o art. 468 da CLT que dispõe:


“Art. 468. Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.”


Nesta esteira, já se encontra pacificada a aplicação deste princípio, de acordo com a súmula 51 do TST, in verbis:


“I- As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento.


II – Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do sistema do outro”. (ex-OJ nº 163 da SBDI-1 – inserida em 26.03.1999).


Portanto, o que se pode extrair da simples leitura da súmula supracitada é que não poderá ser feita qualquer alteração no contrato de trabalho que importe em prejuízos ao obreiro. Havendo alteração que acarrete em diminuição de benefícios, a mesma só atingirá os trabalhadores contratados posteriormente.


Sendo assim, ficam garantidos ao trabalhador os benefícios e garantias previstos no contrato de trabalho, não podendo o empregador revogar ou abster essas garantias de forma unilateral e em detrimento do obreiro.


3.2.2 Princípio da primazia da realidade


Este princípio é também conhecido como primazia sobre a forma, que prevê no caso de dissonância entre a realidade fática e os documentos ou contratos existentes, prevalece o primeiro, com base na verdade real, pois a realidade dos fatos é insuscetível de adulteração pela vontade humana e os documentos podem exprimir sem exatidão a vontade das partes, além de poderem revestir-se de vícios de formação que prejudicam a sua validade.


Nas palavras do autor Aldem Johnston: “a relação objetiva evidenciada pelos fatos define a verdadeira relação jurídica estipulada pelos contratantes, ainda que sob capa simulada, não correspondente à realidade”. (JOHNSTON, 2002, on line).


Primazia da Realidade surge, por exemplo, da regra do art. 9º, da CLT: “Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.


O que se pode extrair a partir deste princípio é que no direito do trabalho sempre prevalecerá o “contrato realidade” como denomina parte da doutrina, ou seja, independente de qualquer contrato ou documentos que dê aparência de regularidade, sendo o fato controvertido, prevalecerá a realidade. Inclusive, a CLT prevê a possibilidade de haver contratação de empregados até mesmo de forma tácita, ou seja, independente de contrato.


3.2.3 Princípio da irrenunciabilidade


A prevalência da autonomia da vontade nos contratos em geral não se aplica aos contratos de trabalho em face da vigência do princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, impedindo, portanto, que o empregado renuncie a direitos decorrentes da relação de emprego que lhe foram conferidos pelo Estado. Por este motivo, em regra, o silêncio ou a concordância do empregado com a supressão de algum direito seu decorrente da relação de emprego não produzirão qualquer efeito, pois o Estado não lhe concede a faculdade de abdicar dos mesmos.


Se a regra é a irrenunciabilidade, a exceção somente ocorre quando a norma jurídica expressamente conceda ao empregado a faculdade de praticar o ato. Plá Rodrigues conceitua este princípio como sendo “a impossibilidade jurídica de privar-se voluntariamente de uma ou mais vantagens concedidas pelo Direito Trabalhista em benefício próprio”. (AMÉRICO, 2004, p. 66). E acrescenta que a “renúncia equivale a um ato voluntário pelo qual uma pessoa se desliga de um direito reconhecido a seu favor e o abandona.” (AMÉRICO, 2004, p. 67).


3.2.4 Princípios da boa-fé e dignidade da pessoa humana


A boa-fé não é uma norma, mas um princípio jurídico fundamental. Pode ser crença, que é uma conduta legítima sem prejudicar terceiras pessoas, ou lealdade, no sentido de honestidade, que é o vigorante no Direito do Trabalho, apresentando-se por dois ângulos: subjetivo, que é a estima, e jurídico, que é a sua conduta exteriorizada. Deve existir entre ambas as partes e representa o valor ético do trabalho.


A nossa Constituição traz como um de seus fundamentos o princípio base de todo o ordenamento jurídico: a dignidade da pessoa humana:


“Art.1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: […]


III – a dignidade da pessoa humana.”


Sobre a importância deste principio, ensina Alexandre de Morais:


“[…] concede unidade aos direitos e garantias fundamentais, sendo inerente às personalidades humanas. Esse fundamento afasta a idéia de predomínio das concepções transpessoalistas de Estado e Nação, em detrimento da liberdade individual. A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos”. (MORAES, 2007, p. 16).


Também é conhecido como o princípio do valor humano, que consiste na humanização do trabalho, em considerar o trabalhador como um ser humano e não como mercadoria ou elemento de produção.


O homem trabalhador deve ser visto como sujeito-fim e não o objeto-meio do desenvolvimento. Não é necessário que se crie mais direitos, mas sim, dar garantias para a eficácia dos que já existem, pois o problema fundamental em relação aos direitos do homem, não são o de justificá-los, mas o de protegê-los. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual a sua natureza e seu fundamento, se são absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro de garanti-los para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados.


Afinal, os direitos sociais, não podem simplesmente ser atribuídos aos cidadãos. Eles requerem do Estado um amplo e complexo rol de programas de ação e de políticas públicas dirigidas a segmentos específicos da sociedade, políticas essas com o objetivo de fundamentar esses direitos e atender às expectativas por eles geradas com sua positivação. E não só do Estado, mas de todos os operadores do Direito.


4. A terceirização no Brasil


De acordo com Maurício Godinho Delgado, a terceirização assumiu clareza estrutural no país apenas a partir da década de 70. Segundo o autor, quando a CLT foi elaborada (1940), o fenômeno não tinha a abrangência assumida nos últimos trinta anos do século XX, nem sequer merecia atenção especial:


“Em fins da década de 1960 e início dos anos 70 é que a ordem jurídica instituiu referência normativa mais destacada ao fenômeno da Terceirização (ainda não designado por tal epíteto nessa época, esclareça-se). Mesmo assim tal referência dizia respeito apenas ao segmento público (melhor definindo: segmento estatal) do mercado de trabalho – administração direta e indireta da União, Estados e Municípios. É o que se passou com o Decreto-Lei n. 200/67 (art. 10) e Lei n. 5.645/70.” (DELGADO, 2002, p. 418-419).


O cenário começou a mudar quando o próprio Estado adotou a terceirização, como parte da descentralização administrativa. A partir do Decreto-Lei 200/67, as tarefas executivas passaram a ser executadas indiretamente, via contrato de intermediação de mão-de-obra.


Diante da necessidade de especificar quais serviços públicos poderiam ser terceirizados, foi publicada a Lei 5.645/70, que previa que “as atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas” seriam objeto de execução mediante contrato, conforme determinado pelo Decreto-Lei 200/67.


Em 09 de dezembro de 1985 foi publicada a súmula 239 do TST que dispunha: “É bancário o empregado de empresa de processamento de dados que presta serviço a banco integrante do mesmo grupo econômico”. Desta forma, entende-se como ilícita a contratação como terceiro de empregado de empresa de processamento de dados que presta serviços a banco integrante do mesmo grupo econômico, sendo bancário este trabalhador. A súmula foi editada pois era necessário coibir as fraudes que estavam ocorrendo no setor. (MARTINS, 2009, p. 14).


Mais adiante foram criadas normas específicas de terceirização, como o trabalho temporário (Lei 6.019/74), serviços de vigilância bancária (Lei 7.102/83), serviços de telefonia (Lei 9.472/97) e nas concessionárias de serviço público, na forma definida na Lei 8.987/95.


A Lei 8.863/94 ampliou a hipótese de terceirização para toda a área de vigilância patrimonial, pública ou privada, inclusive para as pessoas físicas. Assim, na esfera privada, apenas estes dois tipos de terceirização (trabalho temporário e vigilância patrimonial) eram permitidas pela lei.


Já a lei 8.949/94 introduziu o parágrafo único do art. 442 da CLT, estimulando as terceirizações por meio de cooperativas, determinando que “qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela”. Esta autorização abriu margem para a fraude, visto que haveria intermediação de mão-de-obra sem o enquadramento da lei do trabalho temporário.


Assim, a prática extrapolou rapidamente as duas possibilidades permitidas pela legislação e passou a incorporar diversas atividades econômicas, independente de autorização legal. Isso fez com que houvesse um aumento significativo de reclamações trabalhistas envolvendo a matéria, e a jurisprudência trabalhista, dividida, decidia as controvérsias com multiplicidade de interpretações jurisdicionais.


Esse contexto de desordem e insegurança jurídica fez com que o Tribunal Superior do Trabalho editasse a súmula 256, em 1986, a fim de orientar as decisões sobre a matéria: “Salvo nos casos de trabalho temporário e de serviço de vigilância, previsto nas leis 6.019 e 7.102, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços.”


No entanto, apesar da súmula, as controvérsias continuaram envolvendo as empresas prestadoras de serviço. Assim, surge uma nova regulamentação para o assunto.


4.1 A súmula 331 do TST


Em 1993, o TST editou nova súmula, a 331, que até hoje é a única orientação sobre a Terceirização:


“IA contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário.  (Lei n. 6.019, de 03.01.1974).


II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional. (art. 37, II, da CF/1988).


III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20-06-1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.


IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993).” (Alterado pela Res. 96/2000, DJ 18.09.2000)


A súmula 331 buscou esclarecer o contraponto entre terceirização lícita e ilícita e dispôs sobre os quatro casos, excepcionais, em que é possível terceirizar o serviço, quais sejam, o trabalho temporário para atender necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente da empresa tomadora ou necessidade resultante de acréscimo extraordinário de serviços dessa empresa, ou seja, a terceirização na atividade-fim da empresa é ilegal, sendo excepcionalmente permitida no caso do trabalho temporário; serviços de vigilância; serviços de conservação e limpeza; e serviços especializados, ligados a atividade-meio do tomador do serviço.


A empresa que realizar a prestação de serviços especializados, quais sejam, vigilância, conservação e limpeza e ligados à atividade-meio, deve ser realmente especializada naquele tipo de serviço e tem que ter capacitação específica. Isto significa que não pode ser uma simples locação de mão-de-obra, ela deve ser especializada.


Neste sentido, mister se faz trazermos os ensinamentos do Eminente Jurista e Juiz do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais:


“Excluídas as quatro situações-tipo que ensejam a terceirização lícita no Direito brasileiro, quais sejam, a) contratação de trabalho temporário; b) atividades de vigilância; c) atividades de conservação e limpeza; d) serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, não há na ordem jurídica do país preceito legal a dar validade trabalhista a contratos mediante os quais uma pessoa física preste serviços não-eventuais, onerosos, pessoais e subordinados a outrem (arts 2º, caput e 3º,caput, CLT) sem que esse tomador responda juridicamente, pela relação laboral estabelecida.” (GODINHO, M. Delgado. Curso de Direito do Trabalho. 4º ed. P.442)


A ausência de subordinação jurídica (direta) e pessoalidade dos trabalhadores com o tomador do serviço é um dos pressupostos para a licitude da terceirização. Os trabalhadores terceirizados devem manter esses vínculos com a empresa prestadora de serviços, e não com a tomadora. Se ficar caracterizado a subordinação jurídica ou a pessoalidade com a empresa tomadora, é estabelecido o vínculo empregatício com ela e irão incidir sobre o contrato de trabalho todas as normas pertinentes à categoria do trabalho.


Segundo Paulo Moraes a exigência de serviços especializados é justamente para evitar o mero fornecimento de mão-de-obra:


“A exigência de serviços especializados impõe-se justamente para coibir a fraude. Dela decorre que a prestadora de serviços tem que ser uma empresa especializada naquele tipo de serviço; que tenha uma capacitação e uma organização para a realização do serviço que se propõe e, no caso de contratação indireta bipolar, que seja o prestador de serviços um especialista naquele mister. Disto decorre que o objeto do ajuste é a concretização de alguma atividade material especializada e não o mero fornecimento de mão-de-obra”. (MORAES, 2003, p.101).


O Ministério do Trabalho e Emprego, considerando a necessidade de se uniformizar o procedimento de fiscalização do trabalho, após o advento da súmula 331, editou Instrução Normativa n° 3 de agosto de 1997, dispondo sobre a fiscalização do trabalho nas empresas, a fim de evitar fraudes na terceirização.


De acordo com a instrução, empresa terceirizante é:


“A empresa de prestação de serviços a terceiros a pessoa jurídica de direito privado,  de natureza comercial, legalmente constituída, que se destina a realizar determinado e específico serviço a outra empresa fora do âmbito das atividades-fim e normais para que se constitui essa última.”


Já a empresa tomadora é conceituada como “a pessoa física ou jurídica de direito público ou privado que celebrar contrato com empresas de prestação de serviços a terceiros, com a finalidade de contratar serviços”.


Fica determinado ainda que a tomadora e a contratada devem desenvolver atividades diferentes e ter finalidades distintas, bem como que os empregados da empresa de prestação de serviços a terceiros não estão subordinadas ao poder diretivo, técnico e disciplinar da empresa contratante, nem podem prestar serviço diverso ao qual foi contratado.


Apesar do instituto estar regulamentado no enunciado 331 do TST, ele é utilizado de forma irregular, com o intuito de fraudar os preceitos contidos na súmula, em diversos casos, agravando a situação dos trabalhadores ligados a ele.


Segundo Alice Monteiro de Barros, vários são os malefícios da terceirização ilegal, na atividade-fim da empresa, dentre eles: violação ao princípio da isonomia, impossibilidade de acesso pelo trabalhador ao quadro de carreira da empresa usuária do serviço terceirizado, além do esfacelamento da categoria profissional. (BARROS, 2006, p. 428).


Se a intermediação for utilizada de forma irregular, com o objetivo de desvirtuar a legislação trabalhista, esta será declarada nula para efeitos trabalhistas e será configurado o vínculo empregatício diretamente com o tomador do serviço, segundo o art. 9° da CLT.  Este artigo da CLT traduz um dos princípios basilares do direito do trabalho, qual seja, princípio da primazia da realidade.


Ocorre que os empregadores, muitas vezes, tentam mascarar a relação empregatícia direta, ou seja, a realidade.  A má-fé dos empregadores ao utilizar a terceirização com o propósito de se escusar dos encargos trabalhistas, representa uma distorção ao princípio da primazia da realidade.  Essa prática fraudulenta é ilícita e precariza as condições do trabalho.


Para a maior parte da doutrina, a edição de uma legislação que trate detalhadamente sobre a matéria se faz plenamente necessária, porque o Enunciado 331 do TST não a disciplina de forma pormenorizada, razão pela qual ocorrem lacunas que têm ocasionado muitos prejuízos e lesões ao trabalhador. 


4.2 Atividade-fim e atividade-meio


A CLT, em seu artigo 581, § 2º dispõe que se entende por atividade-fim a que caracterizar a “unidade do produto, operação ou objetivo final, para cuja obtenção todas as demais atividades convirjam exclusivamente em regime de conexão funcional”. Contudo, a distinção entre atividade-meio e atividade-fim é complicada, justamente pela ausência de definição detalhada do conceito de cada uma.


O procurador do trabalho, Maurício Correia de Melo explica que as atividades meio e fim podem ser comparadas com o corpo humano. Algumas partes do nosso corpo são mais essenciais do que outras.  O cérebro, por exemplo, é imprescindível, não é possível “terceirizá-lo”, porém uma pessoa pode perfeitamente sobreviver sem um dedo ou uma parte da mão. Para o procurador, as empresas também possuem atividades que são essenciais, aquelas que definem a empresa e outras atividades que são de apoio, que então podem ser terceirizadas. (MELO, 2010, on line).


Na prática, a verificação da atividade-fim da empresa é feita através da análise do seu contrato social. Se o empregado realiza alguma atividade que contribua para a produção do objeto social da empresa, este não presta serviço terceirizado e poderá ter o vínculo empregatício com o tomador de serviços reconhecido, conforme determinado pela Súmula 331 do TST.


Dora Maria de Oliveira Ramos ensina que é essencial para a legalidade do processo que a contratada tenha uma atividade definida. Segundo a autora, “se uma infinidade de objetos aparece no contrato social, há indícios de mera intermediação ilegal ou tráfico de mão-de-obra, especialmente se houver finalidade lucrativa”. (RAMOS apud MORAES, 2003, p.100).


E, em se tratando de atividade-fim, a terceirização é ilegal. De acordo com o TST, se a atividade é parte principal do cotidiano do trabalhador, não pode ser considerada como mera atividade-meio. Vejamos:


“(…) Na realidade, não se pode dizer que a atividade de digitação é apenas meio no setor bancário, pois constitui ela, para os que laboram em caixas e compensação de cheques, a atividade primordial. Daí, por exemplo, a grande incidência da LER entre empregados de Bancos. Ora, se constitui essa atividade parte principal do cotidiano do bancário, não se pode considerá-la mera atividade-meio. Assim, por se tratar de atividade-fim, a terceirização permanente de mão-de-obra revela-se ilegal, quer segundo o ordenamento constitucional de 67, quer perante a Novel Carta Política.” (ROAR – 804604-93.2001.5.05.5555 , Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 20/08/2002, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: 27/09/2002).


A jurisprudência é quase uníssona nesse sentido:


“EMENTA: TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. EMENTA: TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. UNICIDADE CONTRATUAL. Demonstrado nos autos que a autora foi contratada por empresa terceirizada para prestar serviços vinculados à atividade-fim da tomadora de serviços, a fraude perpetrada é evidente. Deve, pois, ser mantida a decisão que reconheceu a unicidade contratual e declarou a solidariedade entre as empresas demandadas, a qual se encontra fundada na prática de ato tendente a impedir e fraudar a aplicação dos preceitos trabalhistas (art. 9° da CLT), com a formação do vínculo de emprego com a tomadora dos serviços, nos moldes do inciso I da Súmula 331 do TST. (TRT 3ª Região – Sétima Turma – 02309-2006-136-03-00-0 RO – Relator Convocada Wilméia da Costa Benevides – p. 12/04/2007 – grifo nosso).


EMENTA: TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. FRAUDE ÀS NORMAS DE TUTELA AO TRABALHO. CARACTERIZAÇÃO – Comprovando-se que a instituição financeira recorrente promoveu a terceirização ilícita de sua atividade-fim com o objetivo de burlar a aplicação da legislação trabalhista, impõe-se o reconhecimento do contrato de trabalho diretamente com a tomadora dos serviços (Súmula nº. 331, item I, do Tribunal Superior do Trabalho – TST), pois incide, na hipótese, o art. 9º da CLT, o qual estabelece que o ajuste entre empregadores com o intuito de impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos da Consolidação são nulos de pleno direito. Recurso ordinário provido parcialmente. (TRT 6ª Região – Primeira Turma – RO – 00746-2009-005-06-00-9 – Relator Bartolomeu Alves Bezerra – p. 13/05/2010 – grifo nosso).


EMENTA: TERCEIRIZAÇÃO – BANCÁRIO – FRAUDE. Considerando que as instituições bancárias executam, entre outras, operações de financiamento, investimentos, preparação de contratos, movimento de contas correntes, é nítido que elas não se limitam ao mero contato ou relacionamento com clientes, sendo certo que para a realização dessas operações torna-se indispensável o desenvolvimento de tarefas simples e rotineiras, mas de crucial importância para a dinâmica empresarial. Visto que não se admite que a falta de uma atividade-meio coloque em risco a sobrevivência de estabelecimentos financeiros, não há dúvidas de que o Reclamante desempenhava funções inerentes à atividade-fim da CEF, razão por que devem ser estendidos a ele os direitos da categoria dos bancários, por isonomia, ainda que contratado por meio de terceirização, aplicando-se à espécie o art. 5º., caput, da Constituição da República. O Poder Judiciário trabalhista deve reprimir atos fraudulentos que objetivam retirar do empregado a condição de bancário para eximir o empregador dos respectivos ônus (art. 9º. da CLT)”. (TRT 3ª Região – 0068200-49.2009.5.03.0062 RO – RO – Quarta Turma – Relator Des. Luiz Otávio Linhares Renault – p. 30/11/2009 – grifo nosso).


O relator ainda evidenciou que é necessário observar o princípio constitucional da isonomia, in verbis:


“Com efeito, na intermediação da mão-de-obra, o enquadramento sindical do empregado deve obedecer à atividade preponderante da empresa tomadora de serviços, porquanto a aplicação do princípio isonômico é fruto da justiça e da necessidade de tratamento igual aos que se encontram na mesma situação fática.


Na hipótese vertente, restou comprovado que o Autor laborava para a primeira Reclamada nas dependências da Caixa Econômica Federal, em atividades relacionadas às tarefas bancárias. 


Assim sendo, andou bem a r. decisão recorrida ao reconhecer a condição de bancária da Reclamante, fazendo jus a Autora aos benefícios assegurados aos empregados da CEF, deferidos na origem. 


Na hipótese vertente, restou comprovado que o Autor laborava para a primeira Reclamada nas dependências da Caixa Econômica Federal, em atividades relacionadas às tarefas bancárias. 


Assim sendo, andou bem a r. decisão recorrida ao reconhecer a condição de bancária da Reclamante, fazendo jus a Autora aos benefícios assegurados aos empregados da CEF, deferidos na origem.


Segue ainda outras decisões:


“EMENTA: TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. RELAÇÃO DE EMPREGO COM A TOMADORA DOS SERVIÇOS. FRAUDE. […]


O contrato de natureza civil entre prestadora e tomadora de serviços não vincula terceiros, como o reclamante, que não participou do negócio jurídico. Flagrantemente nulo o contrato de trabalho do reclamante com a prestadora de serviços, vez que consubstanciou terceirização ilícita de mão-de-obra utilizada na atividade-fim da tomadora, evidenciando a precarização dos serviços daquele, cujo piso salarial e vantagens da categoria são sensivelmente inferiores aos dos empregados da tomadora dos serviços. Caracterizada a fraude (art. 9o., da CLT), não se admite a alegação de que houve ato jurídico perfeito, pelo menos no que toca ao reclamante. A terceirização de mão de obra é instituto que visa flexibilizar as relações sociais se utilizada de forma lícita, contudo, não pode servir como forma de burlar as normas trabalhistas, acirrando a desigualdade social de categorias profissionais em nome da contenção de custos com mão-de-obra. Não se admite que trabalhadores, nas mesmas funções, tenham direitos diversificados, em nome de ilícita terceirização. (TRT/MG – 3ª Região, RO 00463-2005-103-03-00-5 , Rel. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 5ª Turma, Publicação 09/07/2005).


EMENTA: TERCEIRIZAÇÃO IRREGULAR – ATIVIDADE-FIM PREPARADOR DE PANELAS DA AÇOMINAS – DECLARAÇÃO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO DIRETO […]


A contratação de trabalho humano por empresa interposta não
encontra qualquer acolhida no nosso ordenamento jurídico (exceto
as disposições especiais das Leis 6.019/74 e 7.102/83). É
princípio basilar do Direito do Trabalho que os atos praticados
com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos
seus preceitos são nulos de pleno direito (art. 9o. da CLT). A
idéia contida neste dispositivo celetista vai além do ato
ilícito; alcança também o ato que, embora lícito, desvirtue os
preceitos protetores da parte hipossuficiente na relação de
emprego. Assim, a rigor, a terceirização de serviços não passaria
de uma tentativa de burlar a legislação trabalhista, pois o
tomador se beneficia da prestação laboral como se empregador
fosse, mas esquiva-se dos ônus respectivos, acobertando-se
através de um contrato de natureza civil (este era o entendimento
expresso no antigo Enunciado 256/TST). Contudo, em face das
mudanças sociais ocorridas após a edição da CLT, a cujo respeito
o Judiciário não pode ficar insensível, a jurisprudência passou a
admitir a terceirização em se tratando de atividade-meio (inciso
III do Enunciado 331)
, numa interpretação amplamente favorável
aos empresários, que assim passaram a utilizar maciçamente deste
tipo de contratação. Em contrapartida, permanece a proibição
quando se trata da atividade essencial da empresa, pois do
contrário a ordem jurídica estaria compactuando com a
precarização em massa das condições de trabalho, às quais os
trabalhadores se sujeitam não porque assim o escolhem, mas por
força das contingências da vida.
Entendimento contrário não
encontraria guarida nos princípios constitucionais de tutela à
valorização do trabalho (artigos 1o, IV, 6o, 170, “caput”, e 193
da CR/88). No caso, o reclamante trabalhou nas dependências da
tomadora por longos 17 anos, ocupando ultimamente a função de
preparador de panelas, atividade diretamente ligada à produção do
aço, conforme restou elucidado pelo conjunto probatório.”


(TRT/MG – 3ª Região, RO 00176-2004-088-03-00-6, Rel. Paulo Roberto Sifuentes Costa , 3ª Turma, Publicação 18/12/2004).


Assim, tem-se que a terceirização é admitida apenas nas atividades-meio, sendo terminantemente proibida nas atividades-fim, aquelas essenciais a determinada empresa.


5. Proposições legislativas


Em vista do grande impasse que hoje tumultua os Tribunais do Trabalho, várias proposições legislativas tramitam hoje no Congresso Nacional a fim de regulamentar a questão.


A maioria dos projetos em trâmite pretende alterar a lei 8.666/93, para regulamentar a terceirização dos serviços no setor público, como por exemplo os projetos 1.292/1995, 1.587/2003, 6.420/2005 e 6.894/2006.


Em se tratando do setor privado, destaca-se o projeto 5.439/2005 que proíbe a utilização de mão-de-obra interposta e os projetos 1.621/2007 e 6.832/2010, que pretendem regulamentar a terceirização proibindo sua utilização em atividades-fim das empresas.


5.1 Projeto 5.439/2005


Este projeto foi apresentado pela Deputada Ann Pontes, do PMDB/PA, e pretende adicionar à CLT o seguinte dispositivo:


“Art. 442-A Salvo nos casos de trabalho temporário, serviços de vigilância, conservação e limpeza, é vedada a contratação de trabalhador por empresa interposta, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços.


Parágrafo único. O inadimplemento das obrigações trabalhistas, previdenciárias e tributárias por parte do empregador, implica a responsabilidade solidária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, desde que este tenha participado da relação processual e conste do título executivo judicial.”


Segundo a proposta, a proibição poderia efetivamente contribuir para diminuição da precarização do trabalho e as fraudes hoje regulamentadas apenas pela Súmula 331 do TST.


Em junho de 2005, o projeto foi apensado ao 4.330/2004, que prevê a total inexistência de vínculo empregatício entre a empresa contratante e os empregados da empresa contratada, determinando que as relações entre as empresas devam ser regida pelas normas de Direito Civil.


Ambos os projetos estão sem movimentação desde agosto/2009, quando foram remetidos à Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados e designado relator o Deputado Eudes Xavier, do PT/CE.


5.2 Projetos 1.621/2007 e 6.832/2010


O projeto o nº 1.621/2007, de autoria do deputado Vicentinho do PT foi formatado com as propostas apresentadas pela CUT – Central Única dos Trabalhadores em julho de 2007. Em síntese, o projeto prevê a proibição da terceirização em atividades-fim, a responsabilidade solidária da empresa tomadora do serviço e da terceirizada. Além de regulamentar o setor privado, a proposição também dispõe sobre a prestação de serviços terceirizados nas sociedades de economia mista.


O projeto traz os conceitos tão almejados pela comunidade jurídica. Se aprovado, trará a definição de terceirização como “a transferência da execução de serviços de uma pessoa jurídica de direito privado ou sociedade de economia mista para outra pessoa jurídica de direito privado”, e atividade-fim como “o conjunto de operações, diretas e indiretas que guardam estreita relação com a finalidade central em torno da qual a empresa foi constituída, está estruturada e se organiza em termos de processo de trabalho e núcleo de negócios”.


Este projeto prevê a igualdade de condições de trabalho aos empregados de ambas as empresas, inclusive aquelas de proteção à saúde, de salário e da jornada de trabalho. A empresa tomadora deverá também prestar controle mensal do pagamento aos empregados, do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e de contribuição previdenciária à empresa prestadora.


Existe ainda o direito à informação prévia do sindicato da categoria. Antes de qualquer projeto de terceirização a empresa é obrigada a informar ao sindicato quais os setores serão terceirizados e atender a uma série que critérios. O sindicato deverá ter acesso a tais informações sob pena de multa. A fiscalização e a aplicação das penalidades ficam a cargo do Ministério do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho.


Já o projeto n. 6.382/2010 foi apresentado pelo Deputado Paulo Delgado, do PT/MG, e, por ser menos completo do que o anterior foi ordenado a sua tramitação em conjunto. O projeto não conceitua a atividade de terceirização, remetendo os casos às demais leis já existentes:


“A contratação de prestação de serviços terceirizados com empresa não especializada configura locação e fornecimento de mão-de-obra, importando na existência de relação de emprego entre os empregados contratados e a contratante, salvo nos casos de serviços terceirizados regidos por lei própria.”


Comentando o projeto 6.382/2010, o então ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi ressalta a importância da regulamentação da terceirização para a proteção dos empregados que trabalham nesta condição. Segundo entrevista concedida no início do ano de 2010, “estamos dando mais um importante passo para melhorar a vida dos trabalhadores brasileiros. Estamos há um ano e meio lutando para conseguir esta regulamentação, e, junto com as centrais sindicais, em unidade, conseguimos concluir este Projeto de Lei”, afirmou o ministro[1].


A última movimentação dos projetos ocorreu em março de 2010, quando foi enviado juntamente com o projeto 6.832/2010 à Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio, tendo como relator o deputado Miguel Corrêa, do PT-MG.


Para as centrais sindicais, os projetos significam um marco na proteção dos trabalhadores que atualmente são tratados como “segunda categoria”. Porém, como não poderia deixar de ser, os projetos são alvos de fervorosas críticas dos empresários, o que faz o trâmite dos projetos ser ainda mais lento.


Segundo avaliação da Confederação Nacional da Indústria – CNI – a alteração legislativa é absolutamente inadequada, pois não há como distinguir atividade meio e atividade-fim. “Não há como distinguir, de forma segura, o que é atividade fim e meio. Na construção de um prédio, por exemplo, há várias etapas: fundação, parte elétrica, hidráulica. O que é fim e meio em uma obra?”, opina Emerson Casali, gerente-executivo de Relações do Trabalho da CNI. Para ele, “terceirizar significa buscar redução de custos e mais qualidade para tornar a empresa competitiva, protegendo os trabalhadores.[2]


6. Considerações finais


O fenômeno da terceirização surgiu para especializar os serviços empresariais, possibilitando maior qualidade aliado com redução de custos. No entanto, a falta de regulamentação do instituto tem permitido que empresas sejam criadas com o único intuito de reduzir o custo, através da fuga do pagamento de encargos sociais aos empregados.


Por mais que seja benéfica a terceirização como técnica administrativa e otimização dos serviços, certo é que, quanto mais se terceiriza, mais os direitos dos trabalhadores são precarizados e os princípios basilares do Direito do Trabalho são desrespeitados por empresários que se beneficiam dos trabalhadores que se submetem às condições precárias por temerem o desemprego e a competitividade do mercado de trabalho.


O único instrumento regulamentador da questão é a súmula 331 do TST, que passou a considerar a legalidade da terceirização de mão-de-obra, desde que esta não atinja a atividade-fim da empresa. O impasse surge porque não há consenso doutrinário sobre o que seriam tais atividades, dificultando a aplicação da regra e estimulando a contratação de empresas criadas apenas para reduzir custos de produção às expensas dos trabalhadores.


Assim, conclui-se a terceirização deve ser utilizada unicamente em suas formas lícitas, ou seja, quando se tratar de atividades-meio das empresas, ou nos casos em as atividades forem especificamente regulamentadas por lei, como é o exemplo dos vigilantes. Qualquer forma de terceirização que fuja destas hipóteses deve ser ferozmente atacada e banida do mundo jurídico.


Certo é que o legislador não pode permanecer inerte diante dessa situação. E mesmo assim o que se verifica é que os projetos de lei tramitam no Congresso Nacional há vários anos sem que nenhuma mudança significativa ocorresse em termos de legislação. E a inércia do legislativo infelizmente teve que ser suprida pelo Judiciário, que lida com a questão baseado no princípio geral do Direito do Trabalho, a proteção ao trabalhador.


Percebe-se que, apesar da pressão do desemprego e da busca incessante da iniciativa privada pelo lucro a qualquer custo, a fiscalização do trabalho e a justiça do trabalho estão empenhadas numa luta para preservar os direitos dos trabalhadores. Porém é preciso lembrar que o Poder Judiciário deve ser provocado pelos empregados para que se possa coibir o abuso da ausência de regulamentação para utilizar a terceirização na forma ilícita.


De outro lado, há de ser lembrado o importante papel dos sindicatos das categorias, que devem pressionar o Poder Legislativo a regulamentar a questão para admitir a terceirização dos serviços, sem, contudo, limitar direitos fundamentais dos trabalhadores, considerados pela nossa Constituição como um dos pilares para o Estado Democrático de Direito.


 


Referências  bibliográficas:

AMERICO, Plá Rodrigues. Os princípios do direito do trabalho. LTr, 2004.

BARROS, Alice Monteiro. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006.

BRASIL, Consolidação das leis trabalhistas. Decreto-Lei nº 5.452, de 1° de maio de 1943.

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Notas:

[1] Concluído o projeto de lei que regulamenta tercerização. Notícia publicada no periódico “Nota Dez”, em 06/01/2010. Disponível em: <http://www.notadez.com.br/content/default.asp>. Acesso em: 05 jan 2011.

[2] Empresários criticam novo projeto para terceirização. Notícia veiculada no site Jus Brasil, em 07 de janeiro de 2010. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/noticias/2048146/empresarios-criticam-novo-projeto-para-terceirizacao>. Acesso em: 02 jan 2011.


Informações Sobre o Autor

Rogerio Geraldo da Silva

Bacharel em Direito pela Faculdade Pitagóras de Administração Superior.