A terceirização trabalhista no serviço público

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Resumo: O presente artigo retrata os mandamentos impostos pela Constituição da República Federativa do Brasil, seus princípios e regras inerentes à admissão em concursos públicos de provas e de provas e títulos. Focar-se-á na necessidade de aprovação em concurso para o ingresso no serviço público. Junto também será feita a exposição do referido na Lei 13.429/17, a qual não faz restrição à atividade terceirizada em cargo público, autorizando a prestação do serviço tanto na atividade meio como na atividade fim. Será indagado aqui a contraditoriedade do disposto na referida Lei com relação à Carta Magna, comparando-as. Utilizou-se o método dedutivo e concluiu-se que o disposto na nova lei de terceirização de nº 13.429/17 não propicia tratamento igualitário aos cidadãos, não oportunizando a todos a possibilidade de ingresso em cargos de carreira pública, colocando o interesse público subsidiário ao interesse privado e ferindo desta forma os princípios constitucionais da Administração Pública impostos no artigo 37. [1]

Palavras-chave: concurso público; administração pública; terceirização.

Abstract: This article portrays the commandments imposed by the Constitution of the Federative Republic of Brazil, its principles and rules inherent to admission to public examinations of evidence and evidence and titles. It will focus on the need for approval in competition for entry into the public service. Also mentioned will be the exposition referred to in Law 13.429 / 17, which does not restrict the outsourced activity in public office, authorizing the provision of the service both in the middle activity and in the end activity. The contradiction of the provisions of said Law with respect to the Magnum Letter will be investigated, comparing them. The deductive method was used and it was concluded that the provisions of the new law of outsourcing nº 13.429 / 17 do not provide equal treatment to citizens, not allowing everyone the possibility of entering public career positions, placing the public interest subsidiary to the private interest and thus injuring the constitutional principles of the Public Administration imposed in Article 37.

Keywords: public tender; public administration; outsourcing.Sumário: Introdução. 1 Basilares Do Direito Do Trabalho. 2 Terceirização Trabalhista. 3 Atividade Fim e Atividade-Meio. 4 Terceirização Na Administração Pública Do Brasil. 5 Princípios da Administração Pública. 5.1 Princípio da Legalidade. 5.2 Princípio da Impessoalidade. 5.3 Princípios da Moralidade. 5.4 Princípio da Publicidade. 5.5 Princípio da Eficiência. 6 Concurso Público. 7 Nova Lei de Terceirização e a Constituição Federal. Conclusão. Referências.

 Introdução

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 37, I e II dispõe que cargos empregos e funções públicas da Administração Públicas são acessíveis à todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei. E estabelece que a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, excetuando-se as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

Veja-se que qualquer outra forma de ingresso no serviço público sem a instituição igualitária de realização de concurso vai de contra com o proposto na Carta Magna.

Em outra vertente há a chamada terceirização, que permite a alocação de servidores sem a realização de concurso. Até o presente ano, o serviço terceirizado só era permitido na prestação de serviços na atividade meio e não para cargos públicos. Entretanto em 31 de março de 2017 foi instituída a Nova Lei de Terceirização de nº 13.429, a qual não limitou a área de atuação do serviço terceirizado, abrangendo desta forma até no ingresso do serviço público.

Essas questões aqui expostas deixam clara a necessidade de se discutir sobre esse tema, apresentando os conteúdos propostos pela Constituição Federal e o que é disposto pela Lei nº 13.429, com suas respectivas divergências.

1 Basilares do Direito Do Trabalho

Para Maurício Godinho Delgado: “O direito do trabalho é ramo jurídico especializado, que regula certo tipo de relação laborativa na sociedade contemporânea. ’’ (DELGADO, 2015, p.45)

O direito do Trabalho se divide em Direito Individual do Trabalho e Direito Coletivo do Trabalho. O primeiro pode ser definido como o conjunto de princípios, regras e institutos jurídicos que regem sobre pessoas e matérias relacionadas à relação empregatícia de trabalho; e o segundo como também um complexo de princípios, regras e institutos jurídicos que regem sobre as relações laborais de empregados e de outros grupos jurídicos e sua ação é considerada coletiva.

Os sujeitos da relação de emprego são o empregado e o empregador. A figura do empregado é definida pelo artigo 3º da CLT: “considera-se empregado toda pessoa física que presta serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário”. Observa-se que empregado é toda pessoa natural que prestará serviços ao tomador, com pessoalidade, onerosidade, não eventualidade e subordinação.

A figura do empregador é definida no artigo 2º da CLT: “empregador é a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal do serviço.’’ Complementado pelo parágrafo 1º do mesmo artigo equiparam-se a figura do empregador: ‘’os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas e outras instituições sem fins lucrativos que admitirem trabalhadores como empregados.” Percebe-se que o empregador é tratado como empresa, sendo ele definido como pessoa física, jurídica ou ente despersonificado que irá dirigir essa prestação pessoal do serviço na forma de contrato de emprego com uma pessoa física, também de forma pessoal, onerosa, não eventual e sob sua subordinação.

O que une as duas figuras apresentadas acima é o contrato de trabalho, este definido por Maurício Godinho Delgado como: “o acordo tácito ou expresso mediante o qual ajustam as partes pactuantes direitos e obrigações recíprocas” (DELGADO, 2015, p. 542.) Pode-se notar que este contrato ocorrerá de forma expressa ou tácita, no qual as partes, estas capazes, através de um objeto lícito obrigam-se uma perante a outra de modo não eventual, oneroso, e com subordinação ao tomador mediante o pagamento de salários.

Diverso desse modelo clássico bilateral de contrato de trabalho entre empregado e empregador, surge o modelo trilateral de relação sócio econômica, a chamada de terceirização. Nesta inserem-se o obreiro; o prestador de serviços, que realiza suas atividades juntamente a empresa tomadora de serviços; e a empresa terceirizante que terá vínculo jurídico apenas com o obreiro e vice-versa, ela que o contratará.

2 Terceirização Trabalhista

A terceirização é definida como uma organização do processo produtivo em que se é contratado um terceiro para a realização de uma atividade periférica da empresa. Segundo Maurício Godinho Delgado terceirização:

“Resulta de neologismo oriundo da palavra terceiro, compreendido como intermediário, interveniente. Não se trata, seguramente, de terceiro, no sentido jurídico como aquele que é estranho a certa relação jurídica entre duas ou mais partes. O neologismo foi construído pela área de administração de empresas, fora da cultura do Direito, visando enfatizar a descentralização empresarial de atividades para outrem, um terceiro à empresa.” (DELGADO, 2015, p. 473).

Por ter surgido nas ultimas três décadas no Brasil, é considerado um fenômeno relativamente novo. Somente a partir de 1970 houve a incorporação de norma que tratava da terceirização, instituindo-se através da Lei do Trabalho Temporário (lei n. 6.019/74), que tratava do campo privado da economia. Esta autorizava a prestação de serviço apenas na atividade-meio das empresas tomadoras de serviço.

Nos anos de 1980 e 1990, em vista da frequente utilização desse modelo trilateral, o Tribunal Superior do Trabalho editou duas súmulas de jurisprudência uniforme, a de número 256 de 1896 e a de número 331, de dezembro de 1993, tratando sobre esse tema.

Súmula de número 256 do TST: ‘’salvo os casos previstos nas Leis nº. 6.019, de 3.01.74 e 7.102, de 20.6.1983, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresa interposta, formando-se o vinculo empregatício diretamente com o tomador dos serviços. ’’

Com as exceções constantes existentes na referida súmula e junto ao posterior advento da Constituição Federal de 1988, que vetou de forma expressa a contratação de servidores sem a realização de concurso público, veio a revisão da mesma na forma Súmula 331 do TST:

’’CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011 
I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974). 
II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988). 
III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. 
IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. 
V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. 
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.’’

Nota-se que a súmula veio para cobrir as lacunas da antiga súmula 256, e fixar as hipóteses de terceirização vindas do Decreto lei nº 200/67 e da Lei nº 5.645/70 (conservação e limpeza e atividades-meio). Além de ter deixado explícito a vedação constitucional de contratação de servidores sem a formalidade do concurso público.

Surgida na década de 70 a Lei n 5.645/70 tratava sobre o trabalho temporário: “As atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de execução mediante contrato, de acordo com o art. 10, § 7º do Decreto-lei n. 200 (Lei n. 5.645/70, art 3º parágrafo único.)

DECRETO-LEI Nº 200, DE 25 DE FEVEREIRO DE 1967 Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada.  § 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e contrôle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução.

Observa-se que todas as autorizações para serviço temporário só referem-se à atividade-meio. Posteriormente veio o advento da Lei 6.019 e da Lei n. 7.102/83 que tratava de trabalho temporário e de vigilância bancária, respectivamente. Ambas as leis trataram sobre a terceirização apenas no mercado privado, sem estender para o âmbito público.

Nos anos 90, surge a Lei 8.949, que acrescentou um parágrafo único ao artigo 442 da CLT, somando uma nova hipótese de terceirização: “qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviço daquela”.

Em março deste ano entrou em vigor a Lei 13.429, que veio para alterar dispositivos da Lei no 6.019. Lei essa que em seu parágrafo 3º do artigo 9º não mais faz restrição à terceirização só para a atividade-meio e faz regulamento aprovando também sobre a atividade-fim:

‘’Art. 9º  O contrato celebrado pela empresa de trabalho temporário e a tomadora de serviços será por escrito, ficará à disposição da autoridade fiscalizadora no estabelecimento da tomadora de serviços e conterá:[…]

§ 3o  O contrato de trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços’” (NR)’’ 

Nota-se que, com exceção a lei 13.429 acima referida, as demais leis anteriores e decretos restringiam o âmbito da terceirização, não permitindo a sua efetivação em ingresso de cargos públicos indo de acordo com o proposto pela Constituição.

3 Atividade fim e Atividade-meio

A doutrinadora Carla Teresa Martins Romar define atividade-meio como: ‘’atividade-meio — é toda aquela que dá suporte à execução da atividade- -fim. Não é essencial na constituição da própria empresa e nem definidora de sua manutenção ou continuidade, mas contribuem para o funcionamento do empreendimento. Como exemplos de atividades-meio, podem ser citados os serviços de conservação e limpeza, de vigilância patrimonial, de fornecimento de refeições, de manutenção de máquinas e equipamentos, de transporte de empregados, de processamento de dados, de distribuição, entre outros.’’ (ROMAR, 2015 p.134)’’

Atividade-meio refere-se às atividades periféricas a essência da dinâmica empresarial. Tarefas essas não essenciais a empresa, não relacionadas a atividade núcleo da mesma. São elas, com base no antigo texto da Lei n. 5.645 de 1970 e juntamente com o decreto nº 2.271 de 1987: transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhada, somadas a atividades meramente instrumentais, de apoio ao empreendimento, tais quais de serviço de alimentação aos empregados do estabelecimento, etc.

A atividade-fim é definida por Carla Teresa Martins Romar como: ‘’aquela que se encaixa como essencial na finalidade para a qual a empresa foi constituída, coincidindo com seu objetivo social. São, portanto, as atividades principais, nucleares, desenvolvidas pelo prestador de serviços’’. (ROMAR, 2015, p. 134).

Contemplada pelo decreto lei nº 200/67 a atividade fim é definida por funções e tarefas essenciais, nucleares, principais, é o fim pela qual uma determinada empresa exerça seu trabalho.

4 Terceirização na Administração Pública do Brasil

A atividade terceirizada na administração pública no Brasil sempre existiu, porém a sua regulamentação só veio com o advento da Reforma Administrativa em 1967, na forma de Decreto Lei n º 200, o qual tratava das hipóteses de descentralização administrativa.

A chamada descentralização administrativa ocorre quando o Estado delega suas atividades para que uma pessoa realize e não diretamente pelos seus órgãos (União, Estados, Distrito Federal, e municípios).  Esta ocorre por outorga ou delegação. Outorga ocorre quando o Estado transfere a função pública para uma pessoa jurídica e precisando obrigatoriamente da existência de uma lei que a institua. E a descentralização por delegação é quando há a transferência por ato unilateral ou por contrato à uma pessoa física, em que a mesma irá atender diretamente a população, praticando o serviço publico sob fiscalização do Estado. Este tipo de descentralização não é regido por lei e sim por contratos e atos administrativos.

Em sentido material dentro da administração pública existe a polícia administrativa, o fomento, a intervenção, e o serviço público, que vai ser um dos objetos materiais principais de estudo trabalhados ao longo deste artigo. Serviço Público é aquele prestado para a população, praticados através da administração pública formal ou por pessoas delegadas sob o regime jurídico de direito público.

Aqueles que praticam o serviço público são chamados de servidores públicos. Servidores Públicos são agentes administrativos sujeitos ao regime jurídico-administrativo do Estado. Estes estão inseridos em cargos públicos. Sua regulamentação é elencada pela Constituição Federal de 1988, do artigo 37 a 44, especificamente no artigo 37, inciso II que trata da exigência do concurso de provas e títulos para a introdução dos mesmos em cargos públicos:

‘’Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […]   

II- A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.’’

É constatado no referido artigo a exigência de concurso público de provas, ou de provas e títulos juntamente com a proibição da contratação através de análise de títulos ou de currículos, ou as demais formas de seleção que não sejam através da realização de prova. Friza-se que o que rege o disposto nesse artigo são os princípios administrativos de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. E para que se tenha um basilar dos princípios que o artigo 37 rege, eles serão retratados a seguir.

5 Princípios da Administração Pública

Os princípios então elencados no artigo 37 merecem exposição de seus significados por tamanha importância, e desta forma será exposto os mesmos seguidos de suas definições:

5.1 Princípio da Legalidade

Definido como princípio base é elencado genericamente no artigo 5º da Constituição Federal, que trata de direitos e garantias fundamentais: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.” Entretanto para o direito administrativo a legalidade é muito mais restrita e especifica que a geral imposta pela Constituição. Marcelo Alexandrino Vicente Paulo diz em suas palavras que:

‘’Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello: o princípio da legalidade representa a consagração da ideia de que a administração pública só pode ser exercida conforme a lei, sendo a atividade administrativa conseguinte, sublegal ou infralegal, devendo restringir-se à expedição de comandos que assegurem a execução da lei.’’ (PAULO & ALEXANDRINO, 2013 p. 190)

5.2 Princípio da Impessoalidade

Segundo Marcelo Alexandrino Vicente Paulo:

‘’A impessoalidade da atuação administrativa impede que o ato administrativo seja praticado visando a interesses do agente ou de terceiros, devendo ater-se a vontade da lei. Dessa forma, impede perseguições ou favorecimentos, discriminações benéficas ou prejudiciais aos administrados. Qualquer ato praticado com o objetivo diverso da satisfação do interesse público será nulo por desvio de finalidade.’’ (ALEXANDRINO & VICENTE, 2013 p.192)

Entende-se que o princípio da impessoalidade significa dizer que os atos praticados pelo Poder Público não irão priorizar interesses individuais, mas sim o interesse da coletividade, realizando o tratamento igualitário a todos.

5.3 Princípios da Moralidade

Segundo Fernanda Marinela o princípio da moralidade:

‘’Exige que a Administração Pública e seus agentes atuem em conformidade com princípios éticos aceitáveis socialmente. Esse princípio se relaciona com a ideia de honestidade, exigindo a estrita observância de padrões éticos, de boa-fé, de lealdade, de regras que assegurem a boa administração e a disciplina interna na Administração Pública.’’ (MARINELA, 2015 p.73 e 74)

O exposto acima é o entendimento de que os atos públicos devem seguir uma moral, uma regra de conduta, uma boa-fé. E todo ato praticado com a intenção maliciosa violará a conduta proposta por este princípio.

5.4 Princípio da Publicidade

Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira o princípio da publicidade:

‘’Impõe a divulgação e a exteriorização dos atos do Poder Público (art. 37 da CRFB e art. 2.o da Lei 9.784/1999). A visibilidade (transparência) dos atos administrativos guarda estreita relação com o princípio democrático (art. 1.o da CRFB): o povo, único e verdadeiro titular do poder, deve conhecer os atos dos seus representantes. Quanto maior a transparência pública, maior será o controle social sobre os atos da Administração Pública e das entidades privadas que exercem atividades delegadas ou de relevância pública.’’ (OLIVEIRA, 2013 p. 101, 102)

Significa que todo ato administrativo deve ser exposto publicamente, para que sem restrições, e de forma transparente todos tenham o direito de visualizá-lo.

5.5 Princípio da Eficiência

Segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira o princípio da eficiência:

‘’Foi inserido no art. 37 da CRFB, por meio da EC 19/1998(…)A ideia de eficiência está intimamente relacionada com a necessidade de obter os resultados elencados pelo texto constitucional de maneira célere. Os agentes públicos têm o dever-poder de desempenharem a função pública de forma eficiente, com o intuito de satisfazerem as necessidades da população. ‘’(OLIVEIRA, 2013, página 112,113)

Perceba que o princípio acima, tem a sua função de demonstrar que a máquina pública deve prestar seus serviços com qualidade, empenho, buscando não realizar gastos desnecessários do dinheiro público, e procurar sempre satisfazer o interesse público.

6 Concurso Público

O processo realizado pelo concurso público caracteriza-se por seleção aberta a todos, em que candidatos preenchendo os requisitos pré-dispostos no edital podem se inscrever. E se atingirem a pontuação proposta para a aprovação, tomarão posse do cargo. Com relação aos títulos do concurso publico, pode-se dizer que não se deve por um peso maior nesse quesito, dando preferência à pessoas que já estavam temporariamente contratadas ou terceirizadas.

A forma de seleção realizada pelo Concurso Público é o maior representante do sistema de mérito (meritocracia), fundamentados em princípios administrativos aqui já expostos.

Fora as exceções constitucionais e doutrinárias, não realizado o concurso e adentrando alguém de qualquer outra forma para a função de servidor público, nulo será a sua nomeação ou a contratação. Na ocorrência da nulidade, será conservado os salários que já estiverem sido pagos para que não haja enriquecimento ilícito da Administração em casos de nomeados de boa-fé.

Qualquer tratamento diverso e satisfatório a um ser em detrimento de todos, fere o princípio da isonomia. Este previsto no artigo 5º da Constituição Federal o qual dispõe: ‘’Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza.’’ Aplicar esse princípio é representar a democracia, a igualdade no tratamento aos cidadãos.

Como é disposto pela doutrinadora Maria Sylvia Zanella:

‘’Pelo mesmo fundamento, o STF tem decidido serem inconstitucionais medidas previstas em leis de reclassificação de cargos, como o acesso, a transformação ou o aproveitamento de servidores em cargo de nível superior àquele para o qual prestou concurso. Ainda que a legislação utilize terminologia variada, existe o objetivo de permitir que o servidor que prestou concurso para determinado cargo passe a ocupar outro, de nível de escolaridade mais elevado. Tal procedimento contraria o artigo 37, II, da Constituição.’’ (DI PIETRO, 2017, p. 770).

Na mesma linha o STF considerou inconstitucional o instituto da transferência previsto nos artigos 8o, IV, e 33 da Lei no 8.112, de 11.12.90, ambos suspensos pela Resolução no46, de 23.05.97, do Senado Federal e revogados pela Lei no 9.527, de 10.12.97. Além de também considerar inconstitucionais as medidas previstas em lei de reclassificação, casos que ocorrem quando servidores tem o acesso, transformação, ou aproveitamento para um cargo de nível acima do qual ele prestou concurso. Para Maria Sylvia Zanella: 

‘’Ainda que a legislação utilize terminologia variada, existe o objetivo de permitir que o servidor que prestou concurso para determinado cargo passe a ocupar outro, de nível de escolaridade mais elevado. Tal procedimento contraria o artigo 37, II, da Constituição. O entendimento do STF só tem sido abrandado em hipóteses em que as atribuições são semelhantes e desde que os servidores tenham prestado concurso público em cargo da mesma natureza.42 Pela Súmula Vinculante nº 43, ficou pacificado o entendimento de que “é inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”.(DI PIETRO, 2017, p.770)

Precedente representativo da Súmula vinculante de número 43:

‘’Ação direta de inconstitucionalidade. Ascensão ou acesso, transferência e aproveitamento no tocante a cargos ou empregos públicos. – O critério do mérito aferível por concurso público de provas ou de provas e títulos e, no atual sistema constitucional, ressalvados os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração, indispensável para cargo ou emprego público isolado ou em carreira. Para o isolado, em qualquer hipótese; para o em carreira, para o ingresso nela, que só se fará na classe inicial e pelo concurso público de provas ou de provas títulos, não o sendo, porém, para os cargos subsequentes que nela se escalonam até o final dela, pois, para estes, a investidura se fara pela forma de provimento que é a 'promoção'. Estão, pois, banidas das formas de investidura admitidas pela Constituição a ascensão e a transferência, que são formas de ingresso em carreira diversa daquela para a qual o servidor público ingressou por concurso, e que não são, por isso mesmo, ínsitas ao sistema de provimento em carreira, ao contrário do que sucede com a promoção, sem a qual obviamente não haverá carreira, mas, sim, uma sucessão ascendente de cargos isolados. – O inciso II do artigo 37 da Constituição Federal também não permite o 'aproveitamento', uma vez que, nesse caso, há igualmente o ingresso em outra carreira sem o concurso exigido pelo mencionado dispositivo. (…)’’ (ADI 231, Relator Ministro Moreira Alves, Tribunal Pleno,p. 35 e 36)

Jurisprudência posterior ao disposto pela súmula de número 43: ‘’Inconstitucionalidade: investidura via remoção ou permuta

Com o advento da Constituição de 1988, o concurso público é inafastável tanto para o ingresso nas serventias extrajudiciais quanto para a remoção e para a permuta (dupla remoção simultânea). Precedentes.  2. Reconhecida a ilegitimidade do ato, não é lícito que o agravante permaneça como titular da serventia para a qual se removeu por permuta." (MS 32123 AgR, Relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgamento em 24.2.2017, DJe de 14.3.2017)

Inconstitucionalidade: investidura em cargo por meio de transferência de servidores

"Em síntese, aduz o requerente que os dispositivos impugnados são inconstitucionais, por violarem o princípio do concurso público (…). (…). (…) as normas impugnadas autorizam a transposição de servidores do Sistema Financeiro BANDERN e do Banco de Desenvolvimento do Rio Grande do Norte S.A – BDRN para órgãos ou entidades da Administração Direta, autárquica e fundacional do mesmo Estado (…). 3. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido da inconstitucionalidade das normas que permitem a investidura em cargos ou empregos públicos diversos daqueles para os quais se prestou concurso. (…) 5. Vale ressaltar que os dispositivos impugnados não se enquadram na exceção à regra do concurso público, visto que não tratam de provimento de cargos em comissão, nem contratação por tempo determinado para suprir necessidade temporária de excepcional interesse público. 6. Portanto, a transferência de servidores para cargos diferentes daqueles nos quais ingressaram através de concurso público, demonstra clara afronta ao postulado constitucional do concurso público." (ADI 3552, Relator Ministro Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgamento em 17.3.2016, DJe de 14.4.2016.)

No mesmo sentido a Súmula de no 685 do Supremo Tribunal Federal , dispõe ser  inconstitucional qualquer modalidade de provimento que proporcione ao servidor investir-se em concurso público, sem ter antes prévia aprovação destinada ao seu provimento em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente havia investido. Percebe-se aqui a exigência e a importância da realização de concurso para o preenchimento do cargo público.

7 Nova Lei deTerceirização e a Constituição Federal

A terceirização na Carta Magna é tratada com restrições, e as suas atuações fora dos seus limites impostos não estariam de acordo com a ordem jurídica brasileira. Em seu artigo 37 XXI, e em seu artigo 175 retrata:’Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:[…]

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.’’

Tal qual a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal julgou como indispensável a admissão em concurso para exercer função na Administração Pública:

‘’ […] É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido.’’ (STF. ADI nº 2.949. Relator(a): Min. Joaquim Barbosa, p. 04).

Semelhantemente, a ADI 242 declarou inconstitucional o provimento de cargos públicos sem a feitura de concurso:

‘’ […] O § lº do art. 97 da Carta de 1969 exigia concurso público para a "primeira investitura" no serviço público, e não para cargo inicial de carreira, além de ressalvar outros casos indicados em lei; permitia, pois, o provimento derivado de cargos públicos pelo acesso, transferência, aproveitamento e progressão funcional. Precedente: Repr. nº 1.163-PI.

O art. 37, II, da Constituição exige concurso público para investidura em qualquer cargo público, salvo para os cargos em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração e para os cargos subseqüentes da carreira, cuja investidura se faz pela forma de provimento denominada "promoção". Não permite, pois, o provimento por ascenção ou acesso, transferência e aproveitamento de servidor em cargos ou empregos públicos de outra carreira, diversa daquela para a qual prestou concurso público. Precedente: ADIn nº 231-RJ (STF. Tribunal Pleno. ADI-242.Rel. Min. Paulo Brossard, p.01)

Tanto é que já foi retirada da Constituição a forma de ascensão. Era disposto na Carta Magna de 1969:

Art. 97. Os cargos públicos serão acessíveis a todos os brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei.

§ 1º A primeira investidura em cargo público dependerá de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, salvo os casos indicados em lei.

Observa-se o emprego da palavra ‘’primeira’’ tratava o concurso como promoção, o qual o servidor a partir da primeira investidura em cargo público poderia ascender para outro cargo público superior ao que prestava, apenas por já ser concursado no primeiro. Na Constituição de 1988 isto foi corrigido, retirando-se o vocábulo ‘‘primeiro’’ do parágrafo referido, passando a admitir o ingresso em qualquer cargo público seja ele superior ou inferior, apenas através da realização de prova de concurso.

Mais adiante, Maria Sylvia Zanella di Pietro afirma:

“Quando a Constituição fala em concurso público, ela está exigindo procedimento aberto a todos os interessados, ficando vedados os chamados concursos internos, só abertos a quem já pertence ao quadro de pessoal da Administração Pública. Daí não terem mais fundamento algumas formas de provimento, sem concurso público, previstas na legislação ordinária anterior à Constituição de 1988, como a transposição (ou ascensão) e a readmissão.’’ (DI PIETRO, 2017, p.748)

É instituído a aprovação prévia em concursos públicos de provas ou de provas e títulos como requisito necessário para a investidura em cargo público. Tornando explícito que o interesse individual sempre estará subordinado à coletividade, e não vice-versa.

Não obstante nova lei 13.429/17 amplia a atuação da terceirização, podendo admiti lá em todo tipo de serviço, ela não restringe ao âmbito da administração público e em seus efetivos cargos público, o qual a Carta Magna estabelece explicitamente que só podem adentrar nesses serviços quem realiza o concurso público.

A terceirização na atividade-fim beneficia seres individuais e deixa a oportunidade para a sociedade em segundo plano, instigando o retorno do nepotismo por meio das empresas terceirizadas.

Nepotismo que ocorre quando o agente público utiliza de seu poder para favorecer parentes, sejam eles por afinidade ou por consanguineidade, o que é vetado pelo Decreto nº 7.203, de 04 de junho de 2010, que dispõe sobre a vedação do nepotismo no âmbito da administração pública federal, excetuando em casos em que essas contratações vierem de seguidas aprovações em processo seletivo, que assegure o princípio da isonomia entre os concorrentes.

Especificamente em seu artigo 7º, vem tratar de nepotismo na terceirização. É estabelecido que o edital de licitação para contratação de empresas prestadoras de serviços terceirizados bem como os convênios e instrumentos equivalentes para contratação de entidade que desenvolva projeto no âmbito de órgão ou entidade federal, devem estabelecer vedação de que familiar de agente público preste serviço no órgão ou entidade em que este exerça cargo ou função de confiança.

Além da Súmula Vinculante de nº 13 do Supremo Tribunal Federal que vem a vedar a pratica do nepotismo:

‘‘A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.’’ (STF, Súmula nº 13,

Diante do que foi exposto, nota-se que a administração pública está em prol do interesse da sociedade e não é justo para o individuo que realiza o concurso, e é aprovado não assumir o cargo devido ser alocado em seu lugar um servidor terceirizado.

E o que é disposto na lei 13.429/17, vai de contra os mandamentos constitucionais por permitir o serviço terceirizado tanto na atividade meio quanto na atividade fim.

Desta forma se vê a necessidade de concursos públicos de provas e títulos com seguida aprovação do candidato para que este assuma o cargo público, sendo esta a forma mais justa de admissão de emprego. Obedecendo ao princípio do interesse público e os de igualdade, impessoalidade e legalidade.

 CONCLUSÃO

Vimos que a Administração Pública e seus efetivos cargos públicos têm em sua forma de ingresso preceituado pela Constituição Federal a realização do concurso público de provas ou de provas e títulos, e que essa forma de ingresso rege-se através da obediência dos princípios constitucionais já expostos.

Essa forma de admissão dá oportunidade a todos que queiram ingressar no serviço público, de uma forma igualitária e sem qualquer preferência, como é elencado pelo princípio da igualdade disposto na Constituição.

Diante do exposto conclui-se a que a terceirização sem qualquer forma de restrição, possibilitando então sua efetivação na atividade meio e atividade fim como preceitua a Lei 13.429/17, pode acarretar a volta do nepotismo precedendo-se pela desigualdade entre os cidadãos, e que a forma de admissão por concurso público é constitucional e deve ser obedecida.

 

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Notas

[1] Artigo orientado pela Profa. Karine Alves Gonçalves Mota Professora do Curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins; mestre em Direito pela Universidade de Marília e doutoranda em Tecnologia Nuclear IPEN/USP.

Informações Sobre o Autor

Tainá Belo Paz Da Silva