Alíquotas do SAT conforme Decreto nº 6.957/09

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Sumário: 1 Introdução. 2 Distinção entre enquadramento e reenquadramento. 3 Exame do Decreto nº 6.957/2009. 4 Conclusão.


1 Introdução


É propósito deste breve estudo demonstrar a sutil distinção entre definição de riscos leves, médios e graves e o re-enquadramento das atividades econômicas (CNAE) nos diferentes graus de riscos.


2 Distinção entre enquadramento e re-enquadramento


Três são as alíquotas do SAT: 1% para atividades que geram risco leve; 2% para atividades que geram risco médio; e 3% para atividades que causam riscos graves.


O § 3º, do art. 22, da Lei nº 8.212/91 prescreve que:


“O Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá alterar, com base nas estatísticas de acidentes do trabalho, apuradas em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da contribuição a que se refere o inciso II[1] deste artigo, a fim de estimular investimentos em prevenção de acidentes”.


Nenhum instrumento normativo – Lei, Decreto, Portaria ou qualquer outro ato complementar – por ora definiu os diversos graus de risco.


Por isso, escrevemos a respeito:


“Logo, só podemos considerar regularmente instituída a contribuição para o SAT no que concerne ao grau mínimo de risco. A aplicação das alíquotas de 2% e 3% depende de definição legal do que sejam riscos médios e graves, respectivamente. Do contrário, não haveria como o aplicador da lei aferir, em concreto, os dados e elementos para enquadramento de determinada empresa neste ou naquele grau de risco, para efeito de quantificação do tributo devido, matéria submetida ao princípio da reserva legal. Diferente seria se a norma primária tivesse explicitado em que condições os riscos são considerados médios e graves. Aí, o decreto poderia promover o enquadramento das empresas, bem como ulterior alterações nos limites e condições do § 3º, do art. 22, da Lei nº 8.212/91”.


Entretanto, não distinguindo o enquadramento do reenquadramento a jurisprudência de nossos tribunais vem decidindo que “o enquadramento, via decreto, das atividades perigosas desenvolvidas pela empresa – escalonadas em graus de risco leve, médio ou grave – objetivando fixar a contribuição para Seguros de Acidentes do Trabalho – SAT (art. 22, II, da Lei nº 8.212/91) não viola o princípio da legalidade” (Resp nº 389.297/ PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 26-5-2006). No mesmo sentido AgR no Resp nº 747508/ RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 11-3-2009).


Ora, na verdade, descabe cogitar de enquadramento sem prévia definição de riscos médio e grave. Não há definição de riscos, quer por meio de Lei, quer por intermédio de Decreto. O que há é apenas previsão de três níveis de risco, leve, médio e grave. Dispensável é apenas a definição de risco leve que resulta da exclusão das definições de riscos medio e grave, que devem ser feitas por algum tipo de instrumento normativo.


Aliás, o STF não dispensa a definição dos diferentes graus de riscos ainda que por meio de Regulamento, conforme se depreende da ementa abaixo:


“EMENTA – CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO: SEGURO DE ACIDENTE DO TRABALHO – SAT. Lei 7.787/89, arts. 3º e 4º; Lei 8.212/91, art. 22, II, redação da Lei 9.732/98. Decretos 612/92, 2.173/97 e 3.048/99. C.F., artigo 195, § 4º; art. 154, II; art. 5º, II; art. 150, I. I. – Contribuição para o custeio do Seguro de Acidente do Trabalho – SAT: Lei 7.787/89, art. 3º, II; Lei 8.212/91, art. 22, II: alegação no sentido de que são ofensivos ao art. 195, § 4º, c/c art. 154, I, da Constituição Federal: improcedência. Desnecessidade de observância da técnica da competência residual da União, C.F., art. 154, I. Desnecessidade de lei complementar para a instituição da contribuição para o SAT. II. – O art. 3º, II, da Lei 7.787/89 não é ofensivo ao princípio da igualdade, por isso que o art. 4º da mencionada Lei 7.787/89 cuidou de tratar desigualmente aos desiguais. III. – As Leis 7.787/89, art. 3º, II, e 8.212/91, art. 22, II, definem, satisfatoriamente, todos os elementos capazes de fazer nascer a obrigação tributária válida. O fato de a lei deixar para o regulamento a complementação dos conceitos de “atividade preponderante” e “grau de risco leve, médio e grave” não implica ofensa ao princípio da legalidade genérica, C.F., art. 5º, II, e da legalidade tributária, C.F., art. 150, I. IV. – Se o regulamento vai além do conteúdo da lei, a questão não é de inconstitucionalidade, mas de ilegalidade, matéria que não integra o contencioso constitucional. V. – Caso em que deve ser a agravante condenada ao pagamento de multa: C.P.C., art. 557, § 2º, redação da Lei 9.756/98. VI. – Agravo não provido”. (AI nº 499888 AgR/ SP, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 6-8-2004, p. 051).


Resta claro que o Executivo só poderá valer-se da faculdade prevista no § 3º, do art. 22, da Lei nº 8.212/91 após a prévia definição dos riscos por lei em sentido estrito como nós preconizamos, ou por meio de Decreto como autoriza a jurisprudência de nossos tribunais.


3 Exame do Decreto nº 6.957/2009


Animado pela imprecisão da jurisprudência o governo vem majorando, de forma ilegítima e inconstitucional, a alíquota dessa contribuição que tem o nítido caráter regulatório para diminuir os índices de acidentes do trabalho.


O Decreto nº 6.957, de 9-9-2009 que alterou o Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/1999, trouxe em seu anexo V uma relação completa de atividades preponderantes e correspondentes graus de risco de conformidade com a classificação nacional de atividades econômicas – CNAE.


Promoveu o re-enquadramento na maioria das atividades para o risco de grau grave, tributada com a alíquota máxima de 3%, sem fundamento em estatísticas de acidentes de trabalho verificadas em inspeção regular, de forma absolutamente imotivada, incoerente e abusiva, com o manifesto propósito de aumentar a arrecadação, resultando na desvirtuação do tributo ordinatório e consequente desvio de finalidade.


Apenas a título ilustrativo apontemos alguns exemplos que dão a exata dimensão das arbitrariedades cometidas pelo legislador palaciano:


a) CNAE 1411-8/01- confecção de roupas intimas = 3% (risco grave); CNAE 1412-6/02 – confecção, sob medida, de peças do vestuário, exceto roupas íntimas = 2% (risco médio);


b) CNAE 3250-7/05- fabricação de materiais para medicina e odontologia = 3% (risco grave); CNAE 3250-7/06 – serviços de prótese dentária = 2% (risco médio); 3250-7/07- fabricação de artigos ópticos= 3% (risco grave);


c) CNAE 3299-0/01 – fabricação de guarda-chuvas e similares = 2% (risco médio); CNAE 3299-0/99 – fabricação de diversos não especificados anteriormente = 3% (risco grave);


d) CNAE 3811-4/00- coleta de resíduos não-perigosos = 3% (risco grave); CNAE 3812-2/00- coleta de resíduos perigosos = 2% (risco médio);


e) CNAE 4541-2/03- comércio a varejo de motocicletas e motonetas novas = 3% (risco grave); CNAE 4542-1/02- comércio sob consignação de motocicletas e motonetas = 2% (risco médio);


f) CNAE 4633-8/01- comércio atacadista de frutas, verduras, raízes, tubérculos, hortaliças e legumes frescos = 3% (risco grave); CNAE 4633-8/02- comércio de aves vivas e ovos = 2% (risco médio);


g) CNAE 4647-8/02- comércio atacadista de livros, jornais e outras publicações = 3% (risco grave); CNAE 4647-8/01- comércio atacadista de artigos de escritório e de papelaria = 2% (risco médio);


h) CNAE 4789-0/06- comércio varejista de fogos de artifício e artigos pirotécnicos = 2% (risco médio); CNAE 4789-0/05- comércio varejista de produtos saneantes domissanitários = 3% (risco grave);


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i) CNAE 6810-2/10- compra e venda de imóveis próprios = 3% (risco grave); CNAE 6810-2/02- aluguel de imóveis próprios = 2% (risco médio);


f) CNAE 7721-7/00- aluguel de equipamentos recreativos e esportivos = 2% (risco médio); CNAE 7722-5/00- aluguel de fitas de vídeo, DVDs e similares = 3% (risco grave);


g) CNAE 9609-2/02- Agências matrimoniais = 3% (risco grave); CNAE 9609-2/04- exploração de máquinas e serviços pessoais acionadas por moedas = 1% (risco leve).


h) Existem centenas de outras atividades econômicas cujas classificações em diferentes graus de risco não possuem fundamento em nenhum critério razoável, racional ou lógico.


Não encontra amparo no critério seletivo em função da essencialidade dos produtos ou dos serviços, muito menos nos diferentes graus de riscos representados pelas atividades econômicas mencionadas.


Confecção de roupas íntimas representa um risco grave, ao passo que a confecção, sob medida, de outras peças do vestuário representa um risco médio. E mais, coleta de resíduos perigosos apresenta um grau de risco menor do que a coleta de resíduos não-perigosos. A atividade de vender imóvel próprio e a atividade de alugar imóvel próprio apresentam graus de riscos diferentes. Comércio de livros e jornais apresenta um grau de risco maior que o comércio de artigos para escritório. A venda de fogos de artifício apresenta um grau de risco menor do que uma agência de matrimônio, classificada no grau máximo de risco, e assim por diante.


Para promover o reenquadramento das atividades econômicas há de existir estatísticas de acidentes de trabalho, apuradas em inspeção regular do Ministério da Previdência Social, conforme o § 3º, do art. 22, da Lei nº 8.212/91 de início transcrito. O simples fato de incluir nas CNAEs a atividade de alugar imóveis próprios, de vender livros e jornais, de vender frutos e verduras etc., apenados com a alíquota máxima de 3% revela a despreocupação do legislador com o fator risco em termos de acidente do trabalho.


4 Conclusão


Positivamente, não há como entender esse enquadramento que não tem pé, nem cabeça. É fruto exclusivo da imaginação criadora do legislador palaciano para, por meio indireto, promover o aumento da contribuição social sob análise. Importa esse comportamento arbitrário do legislador em ilegalidade e inconstitucionalidade, razão pela qual várias medidas liminares vêm sendo concedidas pela Justiça.


É de toda conveniência que um dos órgãos legitimados ingresse com a ADI para por cobro a tamanho abuso.
 
Nota:


[1] Contribuição para Seguros de Acidente do Trabalho.


Informações Sobre o Autor

Kiyoshi Harada

Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.


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