Autoridades na escola

No dia
08.04.2001, o jornal “O Estado de São Paulo”, no caderno “cidades”, veiculou
matéria com o seguinte título: “Nossos filhos correm mais perigo do que você
imagina”. A matéria abordou o consumo e o tráfico de drogas entre estudantes
nas proximidades e dentro das escolas públicas e particulares.

Entrevistado,
o diretor do Gape (Grupo de Apoio e Proteção à Escola), órgão da polícia civil
encarregado de reprimir o tráfico de drogas nas escolas públicas, declarou que:

“hoje não existe escola, nem particular nem
pública, que não tenha problema com drogas. As escolas particulares abafam o
problema, porque é complicado para a imagem delas”.

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Na
mesma matéria, há notícia de uma pesquisa informal feita no ano passado pelo
Sindicato de Especialistas de Educação do Magistério Oficial do Estado de São
Paulo (Udemo), entidade que representa os diretores das escolas estaduais,
segundo a qual das 496 escolas que responderam à pesquisa, 48% registram
problemas com tráfico e consumo de drogas em suas imediações e 24% acusam
tráfico e consumo dentro das escolas.

Na
mesma matéria, o diretor do Departamento de Investigações sobre Narcóticos
(Denarc) informou que na cidade de São Paulo existem 2.700 escolas públicas,
estaduais e municipais, e apenas 18 investigadores para fazer o serviço
operacional. A proporção é de um investigador para cada 150 escolas. O diretor
do Gape ainda revelou que entre janeiro e março houve 30 flagrantes e 44
prisões, entre elas a de 10 adolescentes, enquanto Alberto Angerami, delegado
de polícia, enfatizou que o “problema é mais grave do que se imagina”. Por fim,
o delegado Ivaney Cayres de Souza, que já atuou na Divisão de Investigação
Sobre Entorpecentes (Dise), afirmou que “o interesse dos traficantes pelas
escolas sempre foi muito grande porque a escola propicia clientes novos”.

É
preciso reconhecer de uma vez por todas, e não é de hoje, que as drogas estão
cada vez mais nas proximidades e dentro das escolas. Os responsáveis pela
repressão, e que fazem parte de órgãos especializados, reconhecem publicamente
que estão perdendo a guerra, principalmente porque o Estado não lhes asseguram
os recursos materiais, humanos e financeiros mínimos para prevenir e combater o
tráfico de entorpecentes nas escolas.

Ocorre
que junto com o tráfico e o consumo de drogas aparece a evasão escolar, a
violência e a indisciplina escolares, a formação de gangues, agressões, ameaças
e mortes de alunos. A violência chegou definitivamente à escola, assim como o
tráfico ilícito de substâncias entorpecentes.
Recentemente três alunos foram assassinados numa escola na cidade de
Campinas, interior do Estado de São Paulo. Em Mirassol e Rio Preto já houve
mortes. Gangues se formam e atuam nas escolas, espalhando medo, pânico e
terror. A droga sempre está no meio. Pais têm tirado os filhos da escola porque
eles já foram ou tiveram colegas vítimas da violência ou das drogas. Outros
pais levam e buscam seus filhos na escola, sacrificando o seu descanso. Há
notícia de que pais se revezam nas escolas para garantir a segurança dos filhos.

Diante
desta realidade, o que pode ser feito?

Em
primeiro lugar é preciso cumprir a lei. A Constituição Federal diz que é dever
do Estado e do Município, com absoluta prioridade, executar programas de
prevenção e atendimento especializados a crianças e adolescentes dependentes de
substâncias entorpecentes e drogas afins (art. 227, § 3º., VII). Noutras
palavras, o Estado e o Município têm a obrigação constitucional de realizar
campanhas preventivas e permanentes contra drogas.

Em
segundo lugar é necessário implantar a guarda escolar, já criada na capital e
no interior do Estado de São Paulo. A guarda deve ser feita pela polícia
militar e se houver omissão o Município pode criar sua própria guarda. A
criação da guarda se justifica porque nas escolas existem milhares de alunos,
mas sem proteção especial.

Em
Mirassol, tanto a prevenção contra as drogas quanto a guarda escolar vêm sendo
discutidas em inquéritos civis, mas enquanto as soluções não aparecem em
definitivo idealizamos um projeto chamado “Autoridade na Escola”, com o
objetivo de auxiliar o combate à violência escolar, à indisciplina escolar, à
prevenção e combate ao uso e tráfico de drogas, à orientação contra exploração
sexual de crianças e adolescentes, à prevenção a gravidez precoce, à orientação
e envolvimento das famílias para uma ação conjunta no sentido de desenvolver o
potencial intelectual, físico e emocional do aluno, assim como para desenvolver
o seu espírito de cidadania e o exercício de direitos e deveres políticos,
civis e sociais.

Pelo
projeto, a autoridade tem de ir à escola mensalmente para fazer palestra sobre
temas que impliquem na formação da cidadania dos alunos, depois atender na
própria escola familiares dos alunos e pessoas da comunidade onde a escola está
situada.  Os temas objeto das palestras
devem ser trabalhados pelos professores durante o ano letivo.

Podem
participar do projeto promotores de justiça, delegados de polícia, juízes de
direito, conselheiros municipais, conselheiros tutelares, prefeito municipal,
vereadores, diretores de escola, professores, diretores de departamentos
municipais, militares, médicos, assistentes sociais, psicólogos, dentistas,
advogados, procuradores do estado etc.

Com as
Autoridades na escola a tendência é a diminuição da violência, o afastamento
das gangues e dos traficantes, o resgate da disciplina escolar, a redução de
atos infracionais, com repercussão principalmente nas áreas da segurança
pública, saúde, educação e cidadania.

Imaginem
a criança a partir de sete anos de idade tendo contato com as Autoridades do
seu município! Muito provavelmente aos doze anos será um adolescente bem
diferente, com noções de conhecimento sobre diversos assuntos. A comunidade
também é beneficiada, pois pode reclamar e pedir a solução de problemas
existentes nos seus bairros sem ter que se deslocar para os “gabinetes” das
Autoridades. O contato diminui o distanciamento existente entre Autoridades e
sociedade, já que aquelas saem de seus gabinetes e passam a conhecer de perto a
realidade das pessoas para quem seus serviços são destinados. E a realidade
fora dos “gabinetes” é bem diferente daquela existente na sociedade. Não
deveria ser, mas são dois mundos completamente distintos.

Este
projeto foi executado parcialmente no ano de 2.000 em Mirassol, sob a coordenação
do Departamento de Educação do Município de Mirassol, com a participação de
algumas Autoridades. Tornou-se, pois, uma realidade e já pode ser considerado
um programa. Os resultados foram imensamente satisfatórios. As gangues se
afastaram das escolas e os traficantes também, pois tiveram medo de ser presos.
Não obstante, dezenas foram presos e já estão condenados. Quase cinqüenta
adolescentes viciados e dependentes de drogas procuraram as autoridades e foram
encaminhados para tratamento. Ações civis públicas foram e ainda estão sendo
ajuizadas para garantir o tratamento deles. Com isso, o número de atos
infracionais diminuiu, Autoridades e sociedade se aproximaram etc.

É
possível, pois, contribuir para a segurança de nossos filhos na escola. Não
custa nada, nem um centavo, apenas o tempo e a boa vontade de cada um. A esta
altura, o leitor pode estar se perguntando: O programa ainda é realizado em
Mirassol? Não. Parou, assim que as eleições terminaram. Durou um ano,
justamente no ano eleitoral. Hoje é tão-somente um projeto, à espera de
Autoridades interessadas. Ah, as gangues e o tráfico voltaram, não obstante o
combate de todos nós.  O consumo de
drogas aumentou. Há mais adolescentes viciados. E nossos filhos? Ah continuam
correndo perigo e mais do que você imagina.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

José Heitor dos Santos

 

Promotor de Justiça no Estado de São Paulo; Mestre em direito público (Universidade de Franca); Professor de teoria geral de processo civil e direito processual civil na UNIP, no Estado de São Paulo; Sócio-fundador da AREJ, Academia Riopretense de Estudos Jurídicos.

 


 

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