Resumo: A Convenção sobre Diversidade Biológica estabeleceu um
marco jurídico global para a conservação, repartição dos benefícios e uso
sustentável da biodiversidade. A CDB afirma a soberania dos países sobre seus
recursos genéticos, busca a cooperação internacional para a conservação
biodiversidade e reconhece os direitos das comunidades locais e populações
indígenas com estilos de vida tradicionais. Todavia, o TRIPS, principal acordo
internacional que regula os direitos de propriedade intelectual ligados ao
comércio, traz regras sobre as patentes de produtos e processos referentes na
área da biotecnologia, desfavoráveis aos objetivos estabelecidos na CDB,
consideradas, inclusive como um incentivo à biopirataria. Este estudo visa
apresentar o cenário atual da regulação jurídica do acesso apropriação
intelectual sobre os recursos genéticos e conhecimentos tradicionais
associados, juntamente com as principais contradições e possibilidades de
superação das incoerências existentes entr e o sistema internacional de
propriedade intelectual e os esforços para conservação da diversidade
biológica.
Palavras-chave: recursos genéticos,
conhecimentos tradicionais, propriedade intelectual, biopirataria.
Abstact: The Convention
on Biological Diversity has established a comprehensive legal framework for the
conservation, distribution of benefits and sustainable use of biodiversity. The
CBD affirms the sovereignty of countries over their genetic resources, seeks
international cooperation to conserve biodiversity and recognize the rights of
local communities and indigenous peoples with traditional ways of life.
However, the TRIPS, the main international agreement governing intellectual
property rights related to trade, has rules on patents relating to products and
processes in biotechnology, adverse to the goals established in the CBD,
regarded even as an incentive to biopiracy. This study aims to present the
scenario of the current legal regulation of access to intellectual ownership on
genetic resources and associated traditional knowledge, together with the main
contradictions and possibilities to overcome the inconsistencies between the
international system of intellectual property a nd efforts to conserve
biological diversity.
Key
words:
genetic resources, traditional knowledge, intellectual property, biopiracy.
Sumário: Introdução. Valorizando a biodiversidade? TRIPS x CDB.
Revisão do artigo 27. 3 (b) do TRIPS e a possibilidade da criação de um sistema
sui generis de direitos intelectuais a partir dos termos da CDB. Considerações
finais
Introdução
Atualmente,
a diversidade biológica[1] ameaçada
pela aceleração do processo de extinção das espécies é reconhecida pela
sociedade internacional um bem escasso, cuja utilização desenfreada compromete
a qualidade da vida humana no planeta. Com o avanço da engenharia genética, a
biodiversidade passa a ser vista, também, como depositária de imensas
potencialidades desenvolvimento tecnológico, econômico e social para as presentes
e futuras gerações.
Essa
realidade tem gerado intensos debates no direito e nas as relações
internacionais sobre o acesso[2] e
apropriação intelectual dos recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais
associados[3].
Se for verdade que existem conflitos de interesses envolvendo Norte e Sul,
transnacionais versus populações marginalizadas, também pode se afirmar que
existe um campo aberto a possibilidades de formação de um regime jurídico
mundial que propicie a conservação da diversidade biológica, a utilização
sustentável de seus componentes e a repartição justa eqüitativa de seus
benefícios, conforme os objetivos da Convenção Sobre Diversidade Biológica
(CDB) assinada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,
realizada no Rio de Janeiro no período de 05 a 14 de junho de 1992.[4]
Entretanto,
observa-se hoje, a partir das negociações na OMC e OMPI, a formação de um
regime único de propriedade intelectual sobre as biotecnologias, sobre as
invenções concebidas a partir do acesso a biodiversidade e dos conhecimentos
tradicionais associados. Nota-se também, nas últimas décadas uma intensa
elaboração de leis nacionais e regionais sobre direitos de propriedade
intelectual, que atendem mais às pressões, principalmente, dos EUA e os demais
países desenvolvidos, que favorecem aos interesses das transnacionais de
biotecnologia e a biopirataria[5].
Diante dessa
realidade muitos atores da sociedade internacional têm protestado, discutido e
proposto ações concretas no sentido de dotar a legislação internacional e as
normas nacionais de mecanismos que conjuntamente regulem o acesso aos recursos
genéticos e aos conhecimentos tradicionais associados. Instrumentos que
favoreçam a conservação e o uso sustentável da diversidade biológica, bem como
inibam biopirataria e, inclusive, possibilitem a uma repartição mais justa
eqüitativa dos benefícios gerados seja pala comercialização ou da pesquisa
sobre os recursos genéticos e conhecimentos tradicionais associados.
Valorizando a Biodiversidade?
Atualmente nota-se um vertiginoso aumento nas pesquisas em
biotecnologia, muitas delas baseadas em conhecimentos tradicionais sobre as
espécies e sobre as formas de utilização das mesmas, desenvolvidos por estes
povos por centenas de anos. Tais recursos genéticos, componentes tangíveis,
diretamente relacionados aos conhecimentos tradicionais associados e
componentes intangíveis da diversidade biológica[6]
tornam-se cada vez mais valorizados economicamente, por diversos fatores entre
eles:
1) Há perspectiva de grades novidades tanto no que diz respeito a
descobertas de novas espécies, quanto, principalmente, de invenções
biotecnológicas na obtenção de novos produtos e novos usos a partir do acesso a
biodiversidade e suas propriedades. Os lucros que podem ser gerados da exploração do
patrimônio genético criam expectativa muito grande, tendo em vista que o
patrimônio genético ser pouco conhecido. Conforme Arnt apenas 5% da flora
mundial foi estudada até hoje e só 1% é utilizada como matéria prima[7].
Quanto as milhões de espécies existentes é praticamente impossível ser exato
nos números, mas o certo é que há ainda muito para ser descoberto e isso passa
a ser interpretado como um potencial futuro. [8]
2) Cresce a consciência de conservar a diversidade biológica diante a
possibilidade de extinção de espécies de espécies motivados por uma perspectiva
instrumentalista onde os gastos em conservação estariam justificados pela
possibilidade e aproveitamento econômico direto e indireto pela indústria e
pela ciência. Por exemplo, o perigo de extinção de espécies endêmicas com
potencial uso econômico é justificativa suficiente para uma empresa de
biotecnologia investir da área onde é encontrada. Ou seja, maior raridade e
potencial econômico podem trazer recursos para a conservação. [9]
Outra perspectiva para a conservação da
diversidade biológica seriam somar ao valor instrumental da biodiversidade, já
reconhecido pela economia clássica, a seus valores intrínseco, ecológico,
genético, social, econômico, científico, educacional, cultural, recreativo e
estético, desconsiderados atualmente pela maioria dos atores do mercado
mundial, mas que vem ganhado adeptos em estudos acadêmicos e também tem
influenciado a legislação ambiental.[10]
3) A Bioprospecção[11],
quando orientada pelo estudo do conhecimento ancestral, torna os recursos
genéticos e suas propriedades mais acessíveis além de reduzirem o custo e o
tempo para a obtenção de novas substâncias, novos produtos (fármacos,
cosméticos, alimentos, sementes etc.).
Na bioprospecção
aleatória o percentual de êxito é muito baixo, diferentemente, da bioprospecção
racional, onde as espécies a serem estudadas já possuem suas propriedades
conhecidas. Principalmente através da etnobotânica[12],
há um aumento muito grande das possibilidades de êxito por amostra.[13]
“É a etnobioprospecção que reduz sensivelmente o tempo e o custo das despesas
em pesquisa e desenvolvimentos de produto comercializável, representando uma
incomensurável vantagem às indústrias.”[14]
Essas pesquisas em busca de novos recursos genéticos geralmente são
realizadas por instituições de países desenvolvidos, detentores de alta
tecnologia e de recursos financeiros, em países em desenvolvimento possuidores
de grande maioria diversidade biológica e dos conhecimentos tradicionais sobre
seus usos, onde são efetuadas, principalmente, a coleta e as primeiras etapas
da pesquisa envolvidas na bioprospecção. Hoje é notória a grande quantia de
espécies encontra-se conservadas ex situ,
já retiradas de seu habitat em bancos de germoplasma e jardins botânicos fora
de seu país de origem.
A exploração
dos conhecimentos tradicionais, na maioria das vezes sem contraprestação aos
verdadeiros detentores dos direitos intelectuais, tem sido um fator de grandes
ganhos para a indústria bioquímica, segundo Vandana Shiva[15]:
“Dos 120
princípios ativos atualmente isolados na medicina moderna, 75% têm utilidades
que foram identificadas pelos sistemas tradicionais. Menos de doze são
sintetizados por modificações químicas simples; o resto é extraído diretamente
de plantas e depois purificado. Diz-se que o uso do conhecimento tradicional
aumenta a eficiência de reconhecer as propriedades medicinais de plantas em
mais de 400%.”
4) O regime uniforme de propriedade intelectual ultimamente tem se
voltado à proteção de invenções da biotecnologia. Isso, por um lado tem gerado
um importante incentivo para inovações, no ramo das sementes, dos fármacos, das
fibras, dos bioindicadores etc. No entanto, tal sistema de propriedade
intelectual serve também como uma forma de proteção das intenções de expansão e
dominação do mercado por grandes empresas químicas e biotecnológicas sobre os
usos comerciais de derivados do patrimônio genético dos países do Sul e sobre
os conhecimentos tradicionais associados.
Segundo Jeremi Rifkin[16] estamos
vivendo o “século da biotecnologia”, uma revolução tecnológica, cultural,
social e econômica sem precedentes, decorrente dos atuais avanços advindos da
manipulação genética, do casamento entre as tecnologias desenvolvidas nas
ciências biológicas e a informática, potencializadas por suas diversas formas
de utilizações e comercialização e assegurados, principalmente, pelos direitos
de propriedade industrial, em especial as patentes[17].
O aumento da
importância dado à biodiversidade vai além de sua utilidade como fonte de
recursos materiais, pois é vista, atualmente, como depósito de informações que
representa imensas possibilidades de criação de novos produtos na área
químico-farmacêutica, de novas sementes e outros produtos dela derivados.
Além disso,
conforme Cristiane Derani[18]
na exploração do patrimônio genético, “a força incorporadora do mercado busca
os conhecimentos e as tecnologias desenvolvidos em atividades sociais
produtivas fora da dinâmica de mercado”. Os conhecimentos tradicionais sobre a
diversidade biológica, desenvolvidos de forma histórica por diversos povos
considerados tradicionais, resultado do convívio sustentável entre homem e
natureza, em nosso tempo de crise social e ambiental, passam a ter um valor
inestimável para o mercado.
TRIPS X CDB
Observa-se,
nos últimos anos, a expansão das normas comerciais em direção aos direitos
intelectuais, operada de forma rápida e eficiente pela OMC (Organização Mundial
do Comércio). O TRIPS[19],
celebrado em 1994 no âmbito da OMC trouxe
grandes modificações no sistema de propriedade intelectual mundial[20],
com repercussões no desenvolvimento tecnológico e econômico dos países, para
muitos, aumentando a concentração tecnológica e econômica mundial nos países do
Norte e suas poderosas transnacionais.
Além de
impor uma homogeneização das leis nacionais de propriedade intelectual, o TRIPS
exige mudanças na legislação internas dos países para cumprir com os padrões
mínimos de proteção da propriedade intelectual por ele determinadas[21].
O TRIPS conta também com um sistema internacional de solução de controvérsias
no âmbito da OMC, para solucionar os conflitos envolvendo comércio
internacional, abarcando as questões relativas à propriedade intelectual. Ao
colocar os direitos de propriedade intelectual sob a égide da OMC e submetê-los
a seu procedimento vinculante para a solução de controvérsias, os defensores de
um regime forte de direitos de propriedade intelectual tornaram possível à
imposição de sanções comerciais. Ou seja, quando os países membros não
cumprirem, no âmbito nacional, com as normas de regras mínimas sobre
propriedade intelectual encontradas nas disposições do TRIPS, poderão sofrer a
sanções decididas na OMC.
No que diz
respeito as patentes foram estabelecidos dentre outras disposições à extensão
da matéria patenteável que apresenta importantes repercussões nas formas de
apropriação imaterial dos seres vivos, em especial dos microorganismos e das
espécies vegetais. O artigo 27.3 (b)[22]
estabelece as opções que os países podem adotar para a proteção intelectual em
matéria de patentes, o que estes podem excluir do seu sistema, mas abre a
possibilidade da concessão de direitos de propriedade intelectual sobre seres
vivos.
Numa leitura
preliminar do parágrafo 3, b, do artigo supra, entende-se que o TRIPS permite
aos países membros excluir da patenteabilidade plantas e animais e os
procedimentos “essencialmente biológicos”. No entanto, os Estados devem
proteger mediante patentes aos microorganismos e aos “processos não biológicos
e microbiológicos”. O parágrafo prevê, também, a proteção a variedades vegetais
por meio de patentes, por um sistema "sui
generis" eficaz, ou pela combinação de ambos. É importante ressaltar
que não há uma vedação expressa ao patenteamento de plantas e animais, o TRIPS
apenas faculta esta exclusão. Existem países como os EUA, onde já foram
concedidas diversas patentes sobre partes, ou sobre animais e plantas inteiras.
Na verdade, o principal efeito do artigo 27, 3 (b) do TRIPS é limitar a
possibilidade dos países excluírem totalmente o patenteamento incidente sobre
recursos genéticos, pois estes devem obrigatoriamente conceder patente para
processos não biológicos e microbiológicos. Os Estados parte também estão
obrigados, em suas leis nacionais, a conceder proteção para as variedades
vegetais, seja por meio de patentes, seja por meio de um sistema "sui generis”, como por exemplo, o
sistema de cultivares[23] ou
por ambos.
Conforme Geoff Tansey[24] existem
quatro opções coerentes com as obrigações estabelecidas no parágrafo 3, b) do
artigo 27 do TRIPS, que podem ser seguidas pelos seus Estados partes:
“1. Permitir patentes para todo, y no aprovechar la
opción de excluir las plantas, los animales y los procedimientos esencialmente
biológicos.
2. Excluir las plantas, los animales y los
procedimientos esencialmente biológicos de la concesión de patentes, pero no
excluir las obtenciones vegetales de la patentabilidad.
3. Excluir las plantas, los animales y los
procedimientos esencialmente biológicos de la concesión de patentes, e introducir
un derecho especial sui generis para
la protección de las obtenciones vegetales.
4. Excluir las plantas, los animales y los
procedimientos esencialmente biológicos de la concesión de patentes, pero no
las obtenciones vegetales, y establecer, además, un derecho sui generis (“combinación de ambos”).”
Nota-se, uma
tendência recente por parte dos países industrializados, como os EUA, os países
nórdicos e também a União Européia, que consiste na negociação de acordos de
livre comércio de tipo bilateral com paises em desenvolvimento sobre
propriedade intelectual. Através destes são impostas obrigações de
suplementares em relação ao reconhecimento de patentes, como, por exemplo,
permitir e aumentar a proteção de variedades vegetais por patentes[25].
Muitos entendem
que o TRIPS traz uma série de contradições com o principal tratado
internacional relativo à conservação da biodiversidade, a Convenção Sobre
Diversidade Biológica.
As
principais contradições entre o TRIPs e a CDB podem ser resumidas neste quadro
elaborado por María Isabel Manzur e Carolina Lasén Díaz[26]:
C D B |
TRIPS |
Los Estados tienen derechos soberanos sobre sus |
Los recursos biológicos deben (microorganismos) o
|
Su objetivo es la conservación, el uso sustentable
|
Promueve la propiedad intelectual de las |
Reconoce el valor del conocimiento tradicional, las |
Sólo reconoce como inventivo y digno de la
|
El uso de recursos genéticos debe implicar un |
No se contempla el reparto de benefícios entre el tradicional utilizados.
|
El acceso a los recursos biológicos debe efectuarse
|
No hay disposición que exija el consentimiento
|
Figura 1: Contradições entre o TRIPS e a CDB
As normas de
direitos de propriedade intelectual, estabelecidas pelo TRIPS, são omissas
quanto à proteção dos conhecimentos tradicionais e o respeito à soberania sobre
os recursos genéticos. O TRIPS possibilita a apropriação imaterial sobre
produtos e processos derivados dos usos da diversidade genética e dos
conhecimentos tradicionais associados, sem exigir comprovação de sua origem e a
participação nos resultados das populações locais e indígenas, envolvidas de
alguma forma na obtenção de novas tecnologias e produtos industriais da
diversidade genética. Muitos defendem que o referido tratado estimula a
biopirataria, pois não há nenhuma vedação contundente contra esta prática no
plano jurídico internacional.
Atualmente,
nota-se uma série de resultados negativos decorrentes da apropriação imaterial
do conteúdo informacional da diversidade genética, através do registro indevido
de direitos de propriedade intelectual por pessoas físicas e jurídicas. Elas se
valem da possibilidade de obter tais direitos de exclusividade sobre esse bem,
a partir de uma mera transformação operada pela ciência e tecnologia modernas,
sem respeitar os direitos e as formalidades exigidos pelas leis nacionais e os
preceitos estabelecidos na CDB.
Em diversos
casos, a concessão de direitos de propriedade, ligados à diversidade genética e
aos conhecimentos tradicionais, sem a anuência e a participação nos resultados
das comunidades locais ou indígenas, representa uma ofensa aos direitos destes
povos. Nesse sentido, é importante destacar que o detentor da patente ou do
registro da cultivar ao apropriar-se de processos para a obtenção de novas
características de um recurso biológico, ou de componente deste (substância
química ou informação genética), o faz somente porque tais recursos tornaram-se
disponíveis à ciência e à tecnologia modernas por decorrência da conservação,
do melhoramento e das informações, originados das práticas culturais das
populações tradicionais e indígenas.
Existem aqueles que entendem ser o potencial econômico dos recursos
genéticos um importante instrumento de barganha nas relações internacionais dos
países megadiversos (em sua maioria os desenvolvidos). Esta postura está
baseada nos termos da Convenção dobre Diversidade Biológica, que afirmou a
soberania dos países de origem sobre os seus recursos genéticos e a
possibilidade destes regularem em sua legislação interna o acesso a estes a aos
conhecimentos tradicionais associados.
Estes vêem com bons olhos a possibilidade de acordos e contratos de
acesso e distribuição de benefícios, através da exploração da propriedade
intelectual, envolvendo como partes países de origem dos recursos genéticos e
conhecimentos tradicionais com países detentores da biotecnologia e dos
recursos financeiros. Pensam que seria melhor tentar estruturar meios de
regular o acesso e repartir benefícios, do que deixar livre o acesso aos
recursos genéticos e aos conhecimentos tradicionais, o que até o momento só tem
gerado benefícios às grandes empresas multinacionais da “bioeconomia”.
As tecnologias geradas pelo acesso aos recursos genéticos são pensadas
com um meio para trazer recursos para a proteção da biodiversidade, valorizar
as culturas tradicionais e para geração de desenvolvimentos sustentável em
regiões megadiversas. Argumento que baseou inclusive parte do texto da
Convenção sobre Diversidade Biológica. Para isso, devem ser estabelecidos
contratos de acesso à diversidade biológica e aos conhecimentos tradicionais e
repartição de benefícios envolvendo governos, empresas, instituições de
pesquisa (inclusive universidades) comunidades locais e indígenas. Tais
contratos poderiam representar incentivos econômicos à conservação da
diversidade biológica, gerar melhora da qualidade de vida local, além do aporte
de recursos financeiros e da transferência de tecnologia, resultados
importantes para alcançar desenvolvimento sustentável, especialmente em regiões
megadiversas.
A regulação jurídica e formação dos contratos de acesso devem levar em
conta os direitos soberanos dos países de origem dos recursos genéticos, assim
como os direitos territoriais, coletivos e patrimoniais das populações sobre os
recursos biológicos encontrados em suas terras e os conhecimentos tradicionais
desenvolvidos por sua cultura[27].
Aliás, essa
é a orientação que predomina no texto da CDB, que propõe instrumentos jurídicos
de controle ao acesso e à apropriação da biodiversidade como: os “termos de
comum acordo”, o “consentimento prévio fundamentado” e a “repartição justa e
eqüitativa dos benefícios”.
Para esta proposta ter chances de êxito é muito importante promover
alterações no sistema de propriedade intelectual internacional, em especial no
TRIPS, para que este se harmonize com as exigências da CDB.
De modo contrário existem os que s não aceitam sequer a proposta de
adequar o TRIPS aos temos da CDB. Criticam o sistema de Direitos de Propriedade
Intelectual como um todo. Afirmam que com o atual sistema de direitos de
propriedade intelectual a humanidade corre o risco de ver extinção de muitas
das culturas tradicionais (autóctones) “engolidas” pela sociedade de mercado.
Para estes não há possibilidade de contratos de acesso aos recursos genéticos e
transferência de tecnologia justa entre populações tradicionais e países em
desenvolvimento e grandes empresas, com um poder de barganha e capacidade
técnica, inclusive jurídica, para impor seus interesses.
Alertam, também, para erosão genética e erosão cultural devido à
concentração de pesquisa e desenvolvimento sobre algumas espécies mais
lucrativas, em detrimento das demais. Ou seja, alguns povos, locais e espécies
teriam valor para o mercado, como por exemplo, tribos indígenas da Amazônia que
vivem em locais de grande diversidade biológica e possuem vastos conhecimentos
e usos para a biodiversidade local. Outros estariam excluídos dessa
possibilidade como as comunidades locais e povos indígenas que ao mesmo tempo
vivem em locais com reduzida diversidade biológica e com pouco ou nenhum
conhecimento sobre ela de relevância para as pesquisas e para o mercado.
A expansão propriedade intelectual sobre os recursos genéticos agrícolas
também traz o risco da uniformização da cultura agrícola e o domínio do mercado
por poucas empresas, através dos direito de propriedade intelectual sobre as
sementes, sejam eles pelas patentes ou pelo sistema de proteção de cultivares.
Isso traz maiores riscos para a segurança alimentar e prejudica a autonomia dos
povos que dependem dessa diversidade agrícola para a sua subsistência e para
soberania dos países “megadiversos”.
Tais
críticos ao sistema de DPI se opõem a qualquer possibilidade de concessão aos
direitos de propriedade intelectual incidentes sobre os recursos genéticos
vegetais. A propriedade intelectual representa segundo estes, uma ameaça ao
livre fluxo de material fitogenético entre os povos e ao melhoramento das
sementes e conservação da diversidade de sementes agrícolas, hoje livremente
trocada entre as comunidades de agricultores que dependem disso para a sua
subsistência. São ONGs como GRAIN, Food First, e organizações de comunidades
locais como a Via Campesina que defendem a diversidade genética de plantas
deveria voltar a ser considerada “patrimônio comum da humanidade”[28]
e, por isso, deveria ser de livre acesso para todos, como uma forma de impedir
o monopólio das empresas sobre as sementes resultante dos direitos de
propriedade intelectual.
Entretanto, esta proposta apresenta-se favorável aos interesses dos EUA
que não reconhecem a soberania sobre os recursos genéticos. Argumentam os
norte-americanos que a informação genética é um “patrimônio da humanidade”, portanto, res communes omnium,
coisa comum a todos. Na opinião de Joseph Henry
Vogel, devido à possibilidade de apropriação imaterial do recurso genético,
informação genética, por meio de patentes ou outra forma de direitos
intelectuais, os recursos genéticos e seus derivados, estariam sendo tratados
pelos EUA como propriedade de ninguém (res
nullius), até o momento em que seja descobertas na natureza e seja dado a
estes um valor por meio de investigação científica e tecnológica, do desenvolvimento
de algum produto comercializável e seu registro como propriedade intelectual.
Este é justamente o “ponto fraco” da doutrina do patrimônio comum da
humanidade. O “livre acesso” aos recursos genéticos, da forma como é defendido
pelos EUA, só protege os interesses das empresas que não desejam ver empecilhos
às suas atividades de bioprospecção, desenvolvimento e apropriação intelectual
do patrimônio genético[29].
Embora seja
difícil a aceitação por parte dos países desenvolvidos, a proposta de vincular
o TRIPS às diretrizes previstas pela CDB parece ser a pretensão mais factível
no esforço evitar que os direitos de propriedade intelectual continuem a ser
mais um incentivo a biopirataria do que um mecanismo de incentivo econômico
para a conservação da biodiversidade.
Revisão do Artigo 27. 3 (b) do TRIPS e a possibilidade da criação de um
sistema sui generis de direitos
intelectuais a partir dos termos da CDB
Em junho de 2002 a Misão Permanente do
Brasil na OMC em nome deste país e das delegações de Cuba, China, Ecuador,
India, Pakistão, República Dominicana, Tailândia, Venezuela, Zâmbia y Zimbabwe,
submeteu ao “Consejo de los Aspectos de los Derechos de Propiedad Intelectual
relacionados con el Comercio” da OMC, o comunicado intitulado “Relación entre el
acuerdo sobre los ADPIC y el Convenio sobre la Diversidad Biológica
y la protección de los conocimientos tradicionales” (IP/C/W/356), propondo
importantes modificação no texto do TRIPS para que este estipule aos Estados
membros a obrigação de exigir ao solicitante de uma patente relativa a
materiais biológicos ou conhecimentos tradicionais como condição para adquirir os direitos de
patentes os seguites requisitos:
“i) la divulgación de la fuente y el país de origen
del recurso biológico y de los conocimientos tradicionales utilizados en la
invención;
ii) pruebas del consentimiento fundamentado previo
mediante la aprobación de las autoridades en el marco de los regímenes
nacionales pertinentes; y
iii) pruebas del reparto justo y equitativo de los
beneficios conforme al régimen nacional del país de origen.”[30]
Tais medidas
de modificação do TRIPS, segundo os proponentes, impediriam conflitos com a
CDB. Segundo tal solicitação, do ponto de vista prático, para impedir a
biopirataria seria mais rentável estabelecer uma solução aceitada
internacionalmente através de uma revisão do artigo 27.3 (b) do que destinar
recursos nacionais em custosos processos judiciais com objeto de revogar as
patentes que incluam recursos genéticos ilegais[31].
Os países em desenvolvimento e suas comunidades locais e indígenas, que
representam à imensa maioria dos expropriados pela biopirataria, não dispõem
dos recursos necessários para combater judicialmente a cada patente concedida
sobre o uso de seus recursos concedidos fora de seu território.
Conforme defendem
estes países, a divulgação de origem dos recursos e do conhecimento
tradicionais associados, das provas do consentimento prévio fundamentado
servirá para o propósito de: a) reduzir os casos de patentes indevidas; b)
permitir à oficina de patentes a confirmação mais eficaz a “atividade
inventiva”, reivindicada em uma determinada solicitação de patente; c) melhorar
o cumprimento de suas leis nacionais sobre o consentimento prévio fundamentado
e a distribuição justa e eqüitativa dos benefícios relativos aos usos dos
conhecimentos tradicionais e a biodiversidade.
Considerações Finais
Após mais de uma década da abertura para a ratificação
da Convenção sobre Diversidade Biológica, observam-se poucos avançou na criação
de uma estratégia global de conservação da diversidade biológica, bem como
ainda são incipientes as normas nacionais de acesso aos recursos genéticos e de
proteção dos direitos das populações indígenas e locais sobre os seus
conhecimentos associados à biodiversidade. Afora isso, já se passaram mais de 5
anos da revisão prevista no próprio texto do TRIPS, referente ao seu artigo
27.3 (b), sem que nada de concreto tenha sido feito, no sentido da modificação
do seu texto, como pretende grande parte dos países em desenvolvimento.
Numa analise
breve sobre o atual sistema jurídico internacional percebe-se que estão mais
bem protegidos os direitos de propriedade industrial do que os direitos sobre
os conhecimentos tradicionais ou os direitos relativos à conservação da
diversidade biológica. Fato este que leva a uma situação muito desfavorável às
pretensões da CDB de valorizar o conteúdo informacional do acesso aos recursos
genéticos, o que é tido nesta convenção como uma importante forma de gerar
recursos, incentivos e novas tecnologias para a conservação e o uso sustentável
da diversidade biológica.
O futuro da regulação jurídica dessa disputa ainda é
incerto. Contudo, o que deve ser reconhecido e seguido na formação e aplicação
das leis ambientais e de propriedade intelectual é a necessidade da proteção
integrada da biodiversidade e dos sistemas de saberes e práticas culturais das
populações indígenas e comunidades locais, como ações imprescindíveis para
garantir a qualidade de vida das presentes e futuras gerações, na busca do desenvolvimento
sustentável.
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Notas:
[1]
Sinônimo de Biodiversidade, o termo diversidade biológica foi definido pela
Convenção sobre Diversidade Biológica em seu art. 2º como sendo: “a
variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre
outros, os ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte;
compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies e de ecossistemas.” No
mesmo artigo também estão conceituados recursos biológicos e recurso genéticos.
“Recursos biológicos compreende recursos genéticos, organismos ou parte destes,
populações, ou qualquer outro componente biótico de ecossistemas, de real ou
potencial utilidade ou valor para a humanidade”, “recursos genéticos significa
material genético de valor real ou potencial.” Desta conceituação da CDB
pode-se compreender que “os recursos biológicos dizem respeito aos organismos
em si, enquanto que os recursos genéticos referem-se ao material genético
presente nesses organismos.” ALBAGLI, Sarita. Geopolítica da Biodiversidade. Brasília: IBAMA, 1998. p.63.
[2] O acesso ao patrimônio
genético conforme o artigo 7º, II da Medida Provisória n.º.186-16 de 2001 é a
“obtenção de amostra de componente do patrimônio genético para fins de pesquisa
científica, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, visando a sua
aplicação industrial ou de outra natureza”.
[3] A
terminologia “conhecimentos tradicionais associados” será utilizada neste texto
para designar os conhecimentos sobre a biodiversidade pelas “comunidades locais
e populações de vida com estilos de vida tradicionais” a que se refere a CDB
que seriam “conhecimentos transgeracionais” acumulados por gerações.
[4] A
CDB está em vigor no âmbito internacional a partir de 29 de dezembro de 1993,
internalizada em nosso ordenamento jurídico pelo Decreto nº. 2.519, de 16 de
março de1998. Um dos principais documentos internacionais decorrentes Rio-92,
assinada por 175 países e ratificada por 168 deles. O Brasil, na condição líder
dos países megadiversos foi o primeiro a assiná-la e internalizou seu texto em
nosso ordenamento jurídico pelo Decreto nº. 2.519, de 16 de março de 1998. O
país tem buscado a adequação de suas políticas públicas às diretrizes de
utilização e conservação dos recursos biológicos preconizadas pela CDB. A
principal norma infraconstitucional neste sentido é a Medida Provisória
n.º.186-16, de 23 de agosto de 2001, regulamenta dispositivos da Constituição
Federal e da Convenção sobre a Diversidade Biológica e dispõe sobre o acesso ao
patrimônio genético, a proteção e o acesso ao conhecimento tradicional
associado, a repartição de benefícios e o acesso à tecnologia e transferência
de tecnologia para sua conservação e utilização. Também merecem destaque o
Decreto nº. 4.339/2002 que institui os princípios e diretrizes para
implementação da Política Nacional da Biodiversidade, e o Decreto nº.
5.459/2005, que disciplina as sanções aplicáveis às condutas e atividades
lesivas ao patrimônio genético ou ao conhecimento tradicional associado.
[5] O termo "biopirataria”
foi lançado em 1993 pela ONG RAFI (hoje ETC-Group) para alertar sobre o fato
que recursos biológicos e conhecimento indígena estavam sendo apanhados e
patenteados por empresas multinacionais e instituições cientificas e que as
comunidades que durante séculos usam estes recursos e geraram estes
conhecimentos, não estão participando nos lucros. De modo geral, biopirataria
significa a apropriação de recursos genéticos e dos conhecimentos tradicionais
de comunidades de agricultores e comunidades indígenas instituições que
procuram o controle exclusivo do monopólio sobre os produtos e processo
derivados do acesso e da pesquisa da biodiversidade através de patentes ou
outras formas de direitos intelectuais como os cultivares.
[6]
Utiliza-se neste estudo a noção de biodiversidade, conforme o entendimento
apresentado pela publicação conjunta entre WRI, UICN e PNUMA, intitulada “A
Estratégia Global da Biodiversidade”, na qual a biodiversidade representa o
total de genes, espécies, ecossistemas e suas interações, somadas à diversidade
cultural por reconhecer a sua influência no meio, bem como o inverso. “Tal como
a diversidade genética ou de espécies, alguns atributos das culturas humanas
(como o nomadismo ou rotação de culturas) representam ‘soluções’ aos problemas
de sobrevivência em determinados ambientes. (…) como outros aspectos da
biodiversidade, a diversidade cultural ajuda as pessoas a se adaptarem a novas
condições” WRI, UICN, PNUMA. A
Estratégia Global da Biodiversidade. Diretrizes de Ação para Estudar,
Slavar e Usar de Maneira Sustentável e Justa a Riqueza Biótica da Terra.
Fundação O Boticário de proteção à Natureza, 1992. p. 2-3
[7]
ARNT, Ricardo. Tesouro verde, In: Exame,
ano 35, nº 9, 2/5/2001. p.54
[8]
Ibid. p. 54
[9] Um dos exemplos mais conhecidos de contrato
envolvendo a negociação em dinheiro do acesso aos recursos naturais foi o
contrato firmado entre o Instituto Nacional de la Biodiversidad de Costa
Rica (INBio) e a empresa Merk, uma das maiores corporações farmacêuticas do
mundo. Com validade de dois anos, este acordo tratava-se de um contrato para a
colaboração em matéria de pesquisa, onde a empresa Merck se comprometeria a
pagar à INBio 1 milhão de dólares para ter acesso a todas as plantas, insetos e
amostras de solo que o Instituto pudesse coletar neste período em uma área
determinada. O contrato também previa
que um percentual dos lucros obtidos como qualquer produto farmacêutico
desenvolvido pela Merck a partir das mostras e coleções proporcionadas pela
INBio.
[10] A
Convenção sobre Diversidade Biológica esta baseada em grande parte pela
perspectiva da economia ambiental. C.f. TOLEDO, Alejandro. Economía de la biodiversidad. Serie
Textos Básicos para la Formación Ambiental. n.º 2. México: PNUMA,
1998.
[11]
Segundo o artigo 7º, VII da Medida Provisória nº 2.186-16, bioprospecção
corresponde a “atividade exploratória que visa identificar componente do
patrimônio genético e informação sobre conhecimento tradicional associado, com
potencial de uso comercial”.
[12]
Conhecimentos das propriedades medicinais de plantas e ervas, ancestralmente
adquiridos pelas populações locais.
[13]
“A etnobotânica se reveste de tal importância na atualidade que Marck J.
Pltkin, no seu livro Tales of a Shamans”s
Apprentice: na Etnobotanist Searches for a New Medicines in the Amazon Rain
Forest, chega a comparar a morte de um curandeiro de uma tribo indígena com
um incêndio de toda uma biblioteca, lamentando ainda mais aquele incidente, uma
vez que os conhecimentos que o curandeiro possuía, diferentemente da biblioteca
encontrar-se-ão perdidos para sempre”. BASTOS JUNIOR, Luiz Magno Pinto. A convenção sobre diversidade Biológica e
os instrumentos de controle das atividades ilegais de bioprospecção, in:
Revista de Direito Ambiental, nº 23, ano 6. São Paulo: RT, 2001. p. 208
[14]
Ibid. p. 208
[15] Shiva, Vandana. Biopirataria : a
pilhagem da natureza e do conhecimento. Petrópolis: Vozes, 2001.p.101
[16] Rifkin, Jeremi. O século da
Biotecnologia. São Paulo: Makron Books, 1999.
[17] Patente
é um título propriedade temporário, outorgado pelo Estado a criadores ou
inventores de novos produtos, processos ou aperfeiçoamentos que tenham cumpram
os seguintes requisitos: novidade, aplicação industrial e atividade inventiva.
Ao titular da patente (seja ele o próprio inventor ou a instituição
depositante), é concedido o direito de impedir terceiros de explorar, usar,
comercializar, colocar à venda, etc., a sua criação. Ao titular da patente
(seja ele o próprio inventor ou a instituição depositante), é concedido o
direito, relativo a sua criação, de impedir terceiros de explorar, usar,
comercializar, colocar à venda, etc. Existem dois tipos de patentes: o Modelo de Utilidade (MU) e a Patente de
Invenção (PI).
[18] DERANI, Cristiane. Patrimônio Genético e Conhecimento
Tradicional Associado, Considerações Jurídicas Sobre o Acesso. In: LIMA, André.
(Coordenador) O Direito para o Brasil Socioambiental. SAFE. 2002. p151
[19] Na atualidade, a Propriedade Intelectual apresenta-se como um
direito altamente especializado, complexo e internacionalizado, onde a
Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), e principalmente a OMC
(Organização Mundial do Comércio). O TRIPS tem exercido papel central resolução
de conflitos e nas discussões referentes à unificação das leis nacionais e
regionais que envolvem direitos intelectuais relacionados ao comércio. TRIPS (Agreement on Trade-Related Aspects of
Intellectual Property Rights), ratificado pelo Brasil e em vigor no Brasil
através do decreto nº. 1.355 de 1994, traduzido para o português como “Acordo
sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao
Comércio”. Tal abrange regras relativas a: direito do autor e direitos conexos,
marcas, indicações geográficas, desenhos industriais; patentes, topografias e
circuitos integrados, proteção de informação confidencial e controle de
práticas de concorrência desleal em contratos de licenças.
[20] A
Convenção de Paris e a Convenção de Berna anteriores ao TRIPS não traziam
imposição aos Estados partes na formação de leis nacionais em torno de regras
uniformes de direitos de propriedade industrial e dos direitos autorais,
diferentemente do TRIPS que prevê padrões mínimos à uniformização dos direitos
intelectuais e possui mecanismos de coerção para tanto.
[21] No
Brasil em decorrência da ratificação do TRIPS e da pressão exercida pelos
páises desenvolvidos, em especial os EUA entrou em vigor no ano de 1996 a Lei nº 9.279,
conhecida como “Lei da Propriedade Industrial”.
[22] Prescreve o artigo 27 do
TRIPS que trata da Matéria Patenteável:
1 – Sem prejuízo do disposto
nos parágrafos 2º e 3º abaixo, qualquer invenção, de produto ou de processo, em
todos os setores tecnológicos, será patenteável, desde que seja nova, envolva
um passo inventivo e seja passível de aplicação industrial.[…] 3 – Os Membros
também podem considerar como não patenteáveis: […] b) plantas e animais,
exceto microorganismos e processos essencialmente biológicos para a produção de
plantas ou animais, excetuando-se os processos não biológicos e
microbiológicos. Não obstante, os Membros concederão proteção a variedades
vegetais, seja por meio de patentes, seja por meio de um sistema "sui
generis" eficaz, seja por uma combinação de ambos. O disposto neste subparágrafo
será revisto quatro anos após a entrada em vigor do Acordo Constitutivo da OMC.
[23] A
proteção intelectual de Cultivar trata-se de um direito intelectual específico
para a proteção de novas variedades de plantas. Conferem direitos aos
melhoramentos convencionais de plantas sobre as variedades que sejam novas,
distintas, uniformes e estáveis. Trata-se de uma forma de propriedade
intelectual mais branda pois que as patentes pois os direitos de exclusividade
concedidos, em geral, não impedem o uso, pela pesquisa, da cultivar protegida
para obtenção de novas cultivares por terceiros, mesmo sem autorização do
detentor do direito, como o que geralmente ocorre nas legislações sobre
patentes.
[24] Tansey, Geoff. Comercio, propiedad intelectual, alimentación y
biodiversidad: Cuestiones clave
y opciones de cara al examen del párrafo 3 b) del artículo 27 del Acuerdo sobre
los ADPIC, previsto para 1999. Londres: Quaker Peace & Service, 1999. p. 9
[25] DIÁZ,
Carolina Lasén; MANZUR, María Isabel. Acceso a recursos genéticos: Chile em el
contexto mundial. Santiago: Fundacion Sociedades Sustentables, 2003. p.13
[26]
Ibid. p.12.
[27]
ZAMUDIO, Teodora. Hacia un Régimen de
Derechos Comunitarios Sobre Biodiversidad. Revista do Direito, Santa Cruz
do Sul, n14, p. 135-156, jul./ dez. 2000.
[28] Antes
da CDB era consagrada noção da diversidade genética como um patrimônio da
humanidade, noção afirmada pela FAO e pela doutrina internacional da época, que
garantia o livre acesso aos recursos genéticos para obtenções científicas e
tecnológicas.
[29]
VOGEL, Joseph Henry. El cártel de la
biodiversidad: tranformacion de conocimientos tradicionales en secretos
comerciales. Quito: CARE, Proyecto SUBIR, 2000. p. 6
[30]
OMC. Consejo de los Aspectos de los Derechos de Propiedad Intelectual
relacionados con el Comercio. Comunicacíon Misión Permanente del Brasil, 24 de
junio de 2002. Relación entre el acuerdo sobre los ADPIC y el Convenio sobre la Diversidad Biológica
y la protección de los conocimientos tradicionales (IP/C/W/356). p.10
[31]
Como tem ocorrido, por exemplo, com o governo a índia e com os países da Região
Amazônica, andina e da América Central na tentativa de impugnar patentes
registradas no exterior sobre recursos genéticos e conhecimentos tradicionais
acessados em seu território sem o consentimento das autoridades locais e das
populações detentoras destas informações e recursos.
Informações Sobre o Autor
Airton Guilherme Berger Filho
Advogado Professor de Direito Internacional e Direito Ambiental da Universidade de Caxias do Sul – RS. Mestre em Direito pela Universidade de Caxias do Sul