Breve análise das provas proceso penal

Resumo: Este artigo versa sobre o tema da prova no processo penal, apontando algumas peculiaridades necessárias para a distinção da prova científica entre as outras provas.


Sumário: 1. Da Prova 1.1 Da prova científica 1.2 Da prova ilícita e da prova ilegítima 1.3 Da coleta da prova 1.4 Da prova típica e atípica


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1 DA PROVA


O termo prova origina-se do latim probatio, que significa verificação, argumento ou confirmação. Também veio do latim o verbo provar – probareque significa ensaiar, verificar ou confirmar.


De acordo com Guilherme Nucci (2007, p. 359), existem três sentidos para o termo prova: a) ato de provar: é o processo pelo qual se verifica a exatidão ou verdade do fato alegado pela parte no processo; b) meio: é o instrumento pelo qual se demonstra a verdade de algo; c) resultado da ação de provar: é o produto extraído da análise dos instrumentos de prova oferecidos, demonstrando uma verdade daquele fato.


É importante frisar que a idéia de utilizar o conjunto probatório para encontrar “a verdade” resta superada pela doutrina, pois é impossível saber o que ocorreu, ou seja, remontar exatamente o que aconteceu no passado. As partes utilizam-se das provas para “convencer o Magistrado de sua noção de realidade” (NUCCI, 2007, p. 360), e não para mostrar precisamente o que ocorreu.


Aury Lopes Júnior (2009, p. 481) explica que existe um “paradoxo temporal ínsito ao ritual judiciário”, visto que o juiz julga, no presente, um homem por um fato ocorrido em um passado – às vezes distante – com base nas provas colhidas, em um passado menos remoto, e que projetará efeitos futuros: a pena.


Tal “verdade”, observada pelo Magistrado através do processo é limitada, e deve respeitar as regras do Ordenamento Jurídico vigente, que restringe o direito à produção da prova em face de direitos que são considerados mais importantes que esse pelo próprio Ordenamento, como o Direito à Vida e a Dignidade da Pessoa Humana.


1.1 Da prova científica


Com o avanço da tecnologia e sua posterior aplicação no Mundo Jurídico, as partes e o juiz, com o intento de formar sua convicção, deixam de depender exclusivamente da prova testemunhal e da confissão, que podem ser tendenciosas e não elucidarem corretamente os fatos, podendo, assim, utilizarem-se das chamadas “provas periciais”, entre elas o exame de DNA, para levar aos autos mais elementos que facilitem a verificação da materialidade e da autoria do suposto delito.


Carla Castro (2007, p. 19) define a prova científica como “critérios e métodos científicos na elaboração e na produção probatória”. Já Aury Lopes Júnior (2009, p. 551) afirma que “a perícia subministra fundamentos para um conhecimento comum às partes e ao juiz, sobre questões que estão fora da órbita do saber ordinário”.


Portanto, pode-se delimitar que a prova científica é toda prova que foi colida e produzida através de métodos técnicos por quem possui o conhecimento específico (perito) para isso, visto que a sua realização extrapola o conhecimento exigível do homem comum.


Importante destacar a função do perito para o Processo, que é analisar a prova de maneira científica, portanto, no caso do exame de DNA, cabe ao cientista somente afirmar, embasado na análise do material, qual a porcentagem de chance do vestígio analisado pertencer à determinada pessoa, e ao Magistrado caberá, além da verificação de licitude e legitimidade da prova, a sua aceitação ou não na formação no convencimento do mérito da ação, sendo sempre livre para não utilizar a prova científica.


O artigo 182 do Código de Processo Penal e o artigo 436 do Código de Processo Civil são claros em afirmar que o Magistrado não fica adstrito ao laudo, podendo utilizá-lo, total ou parcialmente, para formar a sua convicção e embasar a sua decisão.


Torna-se mais nítida a definição da prova científica quando se observa pelo prisma da diferenciação entre objeto e meio de prova.


Objeto de prova é o algo que se quer trazer ao processo, é o fato, a afirmação, a negativa etc. No caso do exame de DNA, o objeto de prova é se o vestígio encontrado é (ou não) do mesmo ser do qual se obteve o material para a comparação. Carla Castro (2007, p.3) afirma que objeto de prova é “o que deve ser provado no processo, podendo ser um fato, coisa, acontecimento ou uma ação ou omissão”.


Já o meio de prova é a maneira, o método utilizado para trazer a prova ao mundo jurídico, para produzir o convencimento que a prova pode ter no processo.


A diferenciação da prova científica em relação às outras provas começa no momento da coleta e da produção da prova, passando pelo meio de prova, que é realizado pelo perito, sendo o seu resultado, o objeto de prova, levado ao processo após a análise e a obtenção do resultado. Portanto, pode-se individualizar a prova científica pelo meio de prova a ser utilizado, que depende do trabalho técnico do perito para se ter um resultado fidedigno (CASTRO, 2007, p. 32).


1.2 Da prova ilícita e da prova ilegítima


Importante tema para a discussão sobre a prova pericial são as provas vetadas ou, conforme Aury Lopes Júnior (2009, p. 536), as provas ilegais. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LVI afirma que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.


A prova é considerada ilícita quando, na produção da prova, há violação de direito material (DEZEM, 2008, p. 121). Pode-se citar como exemplo a interceptação judicial sem permissão judicial[1]. Aury Lopes Júnior (2009, p. 536) afirma que a prova ilícita “é aquela que viola regra de direito material ou a Constituição no momento da sua coleta, anterior ou concomitante ao processo, mas sempre exterior a esse (fora do processo)”.


Já a prova ilegítima é obtida quando ocorre violação de regras de direito processual (DEZEM, 2008, p.171). Um exemplo de prova ilegítima se dá quando a prova juntada não respeitou o devido prazo processual ou a prova não foi submetida ao contraditório.


Grinover, Scarance e Magalhães (2006, p. 147), demonstram essa distinção de forma mais clara: “a proibição tem natureza exclusivamente processual quando for colocada em função de interesses atinentes à lógica e à finalidade do processo; tem, pelo contrário, natureza substancial quando, embora servindo imediatamente também a interesses processuais, é colocada essencialmente em função dos direitos que o ordenamento reconhece aos indivíduos, independentemente do processo.”


Também é possível distinguir as provas ilícitas das ilegítimas pelo momento de sua ocorrência. A prova ilícita (o fato em si que torna a prova ilícita), de um modo geral, ocorre em momento não-coincidente ao processo, fora do processo, podendo ser anterior, inclusive. Já a prova ilegítima, como decorre de infração de regra processual, se dá concomitante ao processo (DEZEM, 2008, p. 123).


Ponto importante sobre as provas ilícitas é a doctrine of the fruits of the poisonous tree (pode ser traduzida livremente para o português do Brasil como “Teoria dos frutos da Árvore Envenenada”). Teoria que se consolidou no direito norte-americano, no caso Silverthorne Lumber Co. Inc. v. Estados Unidos, e que afirma que qualquer prova advinda de uma prova ilícita (ou seja, quando se chega à outra prova através de uma prova ilícita) também será ilícita por derivação.


Tal teoria se encontra alicerçada no Direito Brasileiro no artigo 157, §1º do Código de Processo Penal: “São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.”


Guilherme Dezem (2008, p. 133/137) aponta exceções à teoria, criadas pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América, que limitam ou afastam a aplicação dessa doutrina, são elas a Teoria da Fonte Independente, a Exceção da Descoberta Inevitável e a Teoria do Nexo Causal Atenuado:


A Teoria da Fonte Independente entende que quando uma prova possui duas fontes, uma lícita e outra ilícita, a prova derivada deverá ser admitida e considerada.


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O leading case que definiu tal posicionamento foi o caso Murray v. United States (1988), no qual policiais haviam percebido atividade suspeita de tráfico de drogas em torno de um armazém e entraram no recinto ilegalmente encontrando drogas. Deixaram tudo como estava, requereram um mandado, sem informar a invasão utilizando outros elementos para justificar tal mandado e para entrar no armazém e, fazendo a busca legalmente, encontraram 270 “fardos” de maconha. A Corte confirmou entendimento de que tal prova não era ilícita, pois o mandado foi concedido com base em elementos lícitos.


O Supremo Tribunal Federal, inclusive, já se posicionou favoravelmente ao uso de tal teoria no Direito Brasileiro. Apesar dessa teoria estar positivada no parágrafo 1º (e limitada pelo parágrafo 2º) do artigo 157 do sistema Processual Penal Pátrio, deve-se utilizá-la com muita parcimônia, porque tal dispositivo pode gerar enormes distorções na produção de prova, levando a inúmeros desrespeitos aos Direitos e Garantias Fundamentais.


Guilherme Dezem (2008, p. 135) alerta que uma leitura literal de tal dispositivo poderia levar a crer que não há necessidade de efetivamente haver uma fonte independente de obtenção da prova, bastando que o Magistrado “imaginasse” tal meio para que se permitisse o uso da mesma. Portanto, deve-se analisar profundamente o plano do caso concreto para fim de evitar maiores danos aos Direitos Fundamentais de quem quer que seja.


Já a Teoria da Exceção da Descoberta Inevitável se aplica em casos em que, se a prova fosse ser encontrada independente da prova obtida de maneira ilícita, não ocorre contaminação.


Tal Teoria surgiu no caso Nix v. Williams, no qual após o desaparecimento de uma criança, o acusado estava sendo conduzido pela Polícia do local onde foi detido para a Comarca do delito e, durante a viagem, em uma conversa informal com os policiais, o réu confessou o crime e o local onde o corpo estava enterrado. Com a ajuda de voluntários da comunidade local, a Polícia já estava fazendo uma varredura do local apontado pelo assassino antes da confissão inválida, estando a algumas horas de encontrá-lo, mas, após obter a informação de onde se encontrava o corpo, os policias que custodiavam o acusado paralisaram a busca e foram ao local que este afirmava estar enterrado o cadáver, realmente o encontrando lá. No julgamento, a Defesa tentou excluir o corpo como prova no processo, alegando que a descoberta deste se deu através de uma prova ilícita – a confissão inválida, pois o acusado não havia sido comunicado de seus Direitos Constitucionais –  entretanto, o entendimento do Tribunal foi de que o corpo seria encontrado independente da confissão se a busca tivesse continuado, o que rompeu o nexo de causalidade entre o encontro da prova em questão com a confissão considerada ilícita, tornando, assim a primeira prova válida.


Para Dezem (2008, 136), essa é a Teoria apontada pelo nosso Código de Processo Penal nos parágrafos 1º e 2º (e não a primeira Teoria exposta), que se desenvolve através de análise hipotética do caso, quando, utilizando-se da observação dos fatos presentes, a lógica demonstra que o resultado em questão teria ocorrido de qualquer forma.


Também foi criada pela Supreme Court of the United States a Teoria do Nexo Causal Atenuado. Esta Teoria nasceu no caso Wong Sun v. United States (1963). Nesse caso, houveram várias prisões consideradas ilegais, por não possuírem mandado judicial e nem “probable cause” ou “reasonable grounds” (em tradução livre para o português do Brasil, “probable cause” equivaleria a “causa provável” e “reasonable grounds” a “motivos razoáveis”), mas, após ter sido liberado, semanas mais tarde, uma dessas pessoas confessou o delito de posse de drogas (pelo qual havia sido preso ilegalmente no primeiro momento, enquanto estava sendo interrogada na Polícia, de maneira legal. A Suprema Corte não considerou tal confissão ilícita porque não havia nexo causal entre a confissão e a anterior prisão ilegal.


Nosso regramento também consagra tal Teoria no artigo 157, parágrafo 1º, quando afirma que a prova ilícita por derivação deverá ser aceita quando “não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras”.


1.3 Da coleta da prova


Ponto que levanta divergências sobre as provas científicas que necessitam de material coletado é o procedimento, o modus operandi da coleta e exame da prova. Surgem questionamentos acerca de como deve ser colido o material, como este deve ser conservado, se questionando inclusive a seriedade do perito.


Por óbvio, questões sobre a idoneidade moral do cientista que está produzindo a prova não possuem espaço em um trabalho científico, cabendo a quem cometer ato ilícito ser responsabilizado por ele (artigo 186 do Código Civil Brasileiro).


Quanto ao procedimento de coleta do material, se utilizará de parâmetro no presente trabalho documento disponibilizado pela Corregedoria-Geral da Justiça de Santa Catarina, do projeto PRODNASC – Programa DNA em audiência em SC. Tal projeto visa a facilitar a utilização do exame de DNA como prova de reconhecimento da paternidade em procedimentos administrativos ou judiciais em que fique comprovada hipossuficiência de recursos das partes.


O projeto é muito bem desenvolvido e, apesar de não se aplicar à Justiça Criminal (foco desse trabalho), serve de modelo para qualquer Tribunal de Justiça do Brasil, além de ilustrar maneiras consideradas não atentatórias à Dignidade da Pessoa Humana.


Utiliza-se para a coleta de material genético um Kit, que é composto por:


– Uma caixa de coleta de material perfuro cortante;


– Cinco pipetas de transferência descartável (tipo Pasteur – embalagem individual);


– Um pacote de algodão (utilizado para assepsia antes da coleta e limpeza após a coleta);


– Três agulhas descartáveis estéreis, em embalagem individual e obrigatoriamente fechada.


– Um par de luvas de procedimento, para uso durante a coleta.


– Um manual de instruções de coleta de material genético (POP 01);


– Um envelope grande (A4) para cada caso, contendo:


a) 01 Cartão FTA para coleta de até 04 amostras de material genético e envelope pequeno (para retorno do cartão); e


b) 01 Ficha de identificação e autorização das partes envolvidas.”


A pessoa competente para efetuar a coleta do material é o profissional da enfermagem, enquanto ao escrivão cabe o preenchimento das fichas de identificação e da coleta de assinaturas das partes envolvidas e colocar, ao fim da coleta, o cartão FTA (no seu devido envelope) juntamente com as fichas e os documentos em um envelope para enviar para o laboratório conveniado.


O procedimento em si começa com a conferência do cartão FTA, o preenchimento das fichas de identificação e a autorização das partes envolvidas e das assinaturas, possibilitando-se, assim, o início da coleta. O documento informativo frisa o cuidado de evitar que qualquer um que não seja a pessoa em que se fará a coleta toque nos círculos do cartão FTA e evitar que tais círculos entrem em contato com qualquer superfície, para evitar a contaminação com outro DNA.


Para a coleta de sangue de recém nascido, deve se dar atenção especial a alguns detalhes. A coleta de sangue só pode ser realizada após o segundo dia de vida do infante. Deve-se manter o calcanhar da criança abaixo do nível do coração para manter a circulação do sangue satisfatória. Também se deve observar a posição em que a criança deve ser colocada (posição de arroto) enquanto o profissional que executará a coleta se posicionará próximo à criança. Abaixo, segue o procedimento em sua íntegra:


O documento também cita o procedimento de coleta de células salivares, salientando que para a realização de tal exame, a pessoa a ser submetida ao procedimento não pode ter fumado, bebido, se alimentado ou escovado os dentes. Tomados os devidos cuidados, coleta-se a saliva proveniente de raspagem da região entre a bochecha e os dentes, utilizando uma pipeta Pasteur de plástico (que consta no Kit). Após a realização da coleta, o profissional da enfermagem encarregado do ato deve pingar de três a quatro gotas de saliva pausadamente uma sobre a outra no cartão, devendo circular a mancha, identificando-a, pois a marca deixa de ser visível após secar.


O documento se preocupa, por fim, com o período de espera para absorção do sangue e da saliva pelo material do cartão, sendo aconselhável entre 5 a 10 minutos.


Como fica evidenciado pelo material editado pela Corregedoria Geral da Justiça de Santa Catarina, existe sim possibilidade técnico-científica de obtenção do material genético de uma pessoa (que, inclusive, é ínfima a quantidade necessária) sem que se atinja a Dignidade da Pessoa ou se coloque em risco a saúde ou a integridade física dessa.


1.4 Da prova típica e atípica


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Interessante a obra de Guilherme Madeira Dezem, entitulada “Da Prova Penal: Tipo Processual, Provas Típicas e Atípicas sobre o tipo processual da prova”, estudos os quais se originaram no Direito Italiano, e que estuda as chamadas provas típicas e provas atípicas, diferenciando-as, inclusive, das provas nominadas e inominadas.


Inicialmente, cabe a diferenciação da prova nominada para a inominada: Provas nominadas são aquelas provas previstas expressamente no ordenamento jurídico. Já as inominadas são provas que não estão contempladas  no ordenamento jurídico. (LOPES JÚNIOR, 2009, p. 525.)


No processo penal, as provas nominadas estão elencadas entre os artigos 155 e 250 do Código de Processo Penal, já as provas inominadas não possuem o seu procedimento explicitado em Lei.


Uma parte da doutrina entende que o rol de provas expostos no Código de Processo Penal é taxativo.


Tal posicionamento nos parece equivocado, pois a referida Lei não se declara taxativa, e, se o tivesse feito ou fosse interpretada, teria sido um grande equívoco, pois impediria a norma processual de acompanhar os avanços sociais, tornando-a rapidamente obsoleta.


Para se ter um pleno entendimento das provas possíveis de se utilizar no processo e da liberdade probatória vigente no processo deve-se estudar as provas típicas e atípicas, sendo a prova típica um procedimento probatório que não só está apontado na regra processual, mas que também possui o seu procedimento (o como proceder) explicitado na norma processual.


Complicado fica quando se tenta definir a atipicidade da norma. Existem duas posições acerca do tema, uma posição ampliativa e uma posição restritiva. Tais teorias tratam acerca da amplitude da atipicidade da prova.


A posição restritiva atrela a atipicidade à ausência de previsão legal da fonte de prova, analisando especificamente, e apontando como atípica apenas os meios trazidos pela ciência e pela tecnologia. Importante é o esclarecimento acerca do que significa atipicidade para esta corrente:


Vale somente a pena determinar com precisão que a ‘atipicidade’ das provas em questão não deriva, então, de seu posicionamento fora da lista de provas, mas pelo fato de pertencer a uma ‘voz’ deste catálogo que compreende elementos atípicos enquanto não ‘tipificados’ pelo objeto ou estrutura, mas individualizados somente por sua idoneidade a constituir ‘fatos notados’ do qual o juiz, segundo o art. 2727 c.c., traz ao conhecimento os ‘fatos ignorados’ (DEZEM, 2008, p. 147)


A posição ampliativa, por sua vez, afirma que a prova é atípica em duas situações: a) quando ela é prevista no ordenamento, mas o seu procedimento não é; b) quando nem a prova e nem o seu procedimento são previstos em lei (DEZEM, 2008, p. 147).


No Direito Brasileiro existe pouca atenção a tal assunto, mencionando podendo-se citar Gomes Filho e Badaró, que afirmam que “o meio de prova atípico é aquele que não está previsto no ordenamento jurídico e para o qual não há um procedimento probatório específico.” (2007, apud DEZEM, 2008, p. 149)


Tal estudo leva a outros conceitos importantes para a análise da teoria da prova, que são as provas que não se enquadram nem entre as típicas e nem as atípicas.


A prova anômala é a prova típica utilizada para fins diferentes daquele para o qual foi criado.


Dezem (2008, p. 152) cita o exemplo da utilização da referida prova no Processo Penal Brasileiro na oitiva da testemunha pelo órgão da acusação no seu gabinete e a consequente introdução desta nos autos do processo como se fosse um documento. Tal tentativa atinge seriamente os Princípios Constitucionais do Contraditório e da Ampla Defesa, pois impede que o Magistrado e a Defesa façam o devido controle e também serve para burlar limites de admissibilidade de prova, pois um documento pode ser juntado a qualquer tempo, já a prova testemunhal deve ser requerida no começo da instrução, tendo momentos determinados para a sua produção dentro do processo.


Portanto, a prova anômala deve ser considerada nula, pois visa apenas burlar regras processuais, camuflando uma latente ilicitude ou ilegitimidade no manto de uma prova típica ou atípica.


A prova irritual, que também não pode ser confundida com a prova atípica, é uma prova típica colhida sem a observância do procedimento da lei. A diferença fundamental entre a prova atípica e a prova irritual se dá entre a existência do procedimento probatório no ordenamento jurídico. A prova atípica não está mencionada no ordenamento e/ou seu procedimento não está regulado na lei (posição ampliativa), já a prova irritual está tipificada na lei, só que, no caso concreto, não foram seguidos os cânones da norma(DEZEM, 2008, p. 153).


O resultado prático da utilização da prova irritual é a nulidade da prova. Se a autoridade competente não realizou a prova da maneira prevista em lei, independente do motivo, esta deve ser considerada ilícita, simplesmente por desrespeitar a norma. A prova atípica, em princípio não é nula, podendo ser legitimada se verificado que, no caso concreto, não houve desrespeito à regra Processual ou Constitucional (DEZEM, 2008, p. 154).


Também se deve incluir como prova atípica a prova nominada. Conceito esse que é confundido com a prova típica, mas nem sempre é o caso. A prova típica, como foi citado, é a prova que está mencionada no ordenamento jurídico e também está o seu procedimento probatório, mas existe ainda no regramento provas típicas que não possuem o seu procedimento explicitado, sendo essa uma prova nominada.


Guilherme Dezem (2008, p. 155) ensina que a” prova nominada é aquela que se encontra prevista em lei, com ou sem procedimento probatório previsto. Há, aqui, apenas a previsão do nomen júris do meio de prova. Pense-se, assim, no caso da reconstituição: está prevista no art. 7º do Código de Processo Penal, mas não está previsto seu procedimento. Daí porque se tem, então, caso de prova nominada, mas atípica.”


Por fim, o estudo de tal doutrina permite elucidar de forma mais ampla a questão da prova que não se encontra expressa e/ou não possui o seu procedimento regrado no Ordenamento Jurídico, diferenciando possibilidades de provas ilícitas que possam tentar camuflar em procedimentos atípicos.


  


Bibliografia:

CASTRO, Carla Rodrigues Araújo de. Prova Científica: Exame Pericial do DNA. Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2007.

DEZEM, Guilherme Madeira. Da Prova Penal: Tipo Processual, Provas Típicas e Atípicas: (atualizado de acordo com as Leis 11.689, 11.690/08 e 11.719/08). Campinas: Ed. Millennium Editora, 2008.

LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal e Sua Conformidade Constitucional. Porto Alegre: Ed. Lumen Juris. 2º. Ed. 2009.

NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais. 3º. Ed. 2007.


Nota:

[1] Interessante analogia utilizada por Américo Bedê Júnior, no livro “Princípios do Processo Penal: Entre o garantismo e a efetividade da sanção”, que demonstra um paralelo com o antigo princípio de Direito Civil, que afirma que “quem paga errado paga duas vezes”: aquele que prova pelo meio errado no processo penal nada prova.


Informações Sobre o Autor

Rodrigo Vaz Silva

Mestre em Ciências Criminais pela PUC/RS Pós-Graduado em Direito Constitucional pela Anhanguera-Uniderp Graduado em Direito pela Furg Professor de Direito na Universidade do Contestado Campus Concórdia Policial Rodoviário Federal.


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