As Diretrizes Teóricas do Código Civil Brasileiro de 2002 e o Neoconstitucionalismo

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Resumo: O Direito Civil ocupou importante por muito tempo o papel central no direito privado, sendo o código civil considerado por muitos como o mais importante instrumento na resolução das questões intersubjetivas que não estivessem ligadas ao direito público. Está concepção teve sua concepção jus filosófica com o apogeu do positivismo. As diversas transformações humanas e sociais do último século levaram ao surgimento e crescimento de visão normativa prestigiando o “ser” ao invés do “ter”. Com este escopo solidarista, tendo em mira o culturalismo e o neoconstituciolnalismo com a adoção de princípios constitucionais servindo de moldura do direito privado é que foi construído o Código Civil Brasileiro.


Palavras chave: Direito Civil – Culturalismo – Neoconstitucionalismo


Abstract: TheCivil Lawhas heldfor a longtime themajorrole inprivate law, civil lawbeingconsidered by manyas the mostimportant toolin solvinginternot linkedto public law.This conceptionhad itsphilosophicalconceptionentitledtothe heydayof positivism.The varioushuman and socialtransformationsof the last centuryled to the emergenceand growth ofprestigenormative view”being”instead of”having”. Sympathizingwith this scope, aiming at the cultural andneoconstituciolnalismowith the adoption ofconstitutional principlesserving as aframe ofprivate lawis that it wasbuilt theBrazilian Civil Code.


Keywords : Civil law – culturalism–neoconstitutionality


Sumário: 1. Nota introdutória. 2. Antecedentes Históricos e Sociais do Código Civil de 2002. 3. A Decodificação e a Era dos Estatutos. 4. O Movimento de Constitucionalização do Direito Privado; 5. Diretrizes Teóricas do Código Civil de 2002. 6. A opção pela unidade e sistematização. 7. O Culturalismos como matriz filosófica do Código Civil Brasileiro de 2002. 8. O Princípio da Sociabilidade. 9. O Princípio da Eticidade.10.  O Princípio da Operabilidade. 11. As cláusulas abertas. 12. Nota conclusiva


1. Nota introdutória


O Direito Civil acompanhou uma série de alterações axiológicas desde o fenômeno da Codificação. Presenciou a consolidação das normas privadas que anteriormente eram estabelecidas de forma esparsas e pouco sistematizadase posteriormente na cultura pós-moderna que se aplicam ao Direito – a efetividade dos direitos sociais com a sobrevalorização ser sobre o ter foi abandonandooviés eminentemente patrimonialista e passou a perceber o Direito com o viés solidarista. Isto não quer dizer que o Direito Privado tornara-se em sua essência um Direito Social, mas a distinção público-privado de antes, atualmente possui contornos fluídos, em especial com as Constituições promulgadas em diversos recantos do globo terrestre, valorizando os aspectos sociais e a própria dignidade da pessoa humana. O Direito Civil deixou para trás a concepçãode que poderia, em uma única consolidação de normas, abranger todas as relações jurídicas com a edificação de vários diplomas legais que vieram ocupar as lacunas do Código Civil. Passamos à era dos Estatutos com forte decodificação, deixando o Código Civil de ser o centro do sistema jurídico privatista brasileiro, para concorrer com várias normas e até mesmo outros códigos, gerando os microssistemas ou polissistemas.Com o Código Civil Brasileiro de 2002,traçaram-se novas diretrizes na busca de um arcabouço de normas baseado no culturalismo. Buscou-se inovar a técnica redacional até então adotada, mas evitando uma ruptura abrupta com o sistema jurídico então vigente, adotou-se a técnica das cláusulas gerais, sempre que possível, permitindo ao aplicador da norma ser também seu intérprete, atendendo aos postulados da Sociabilidade, Eticidade e Operabilidade. Em sintonia com a Constituição Federal, não deixa de ser um instrumento eficiente na busca por um Direito para todos.


2. Antecedentes Históricos e Sociais do Código Civil Brasileiro de 2002


Após a proclamação da República, o Brasil continuou com a regência de normas originadas da ex-metrópole Portugal. Embora o Império tenha tido seu término em 1889, a sociedade brasileira continuava com sua estrutura social dominante nas mesmas bases, com espeque na aristocracia ruralista e de baixa influência burguesa, visto que as influências que operavam na Europa não chegavam àAmérica de forma robusta e célere.


Na verdade, como explicita Orlando Gomes,[1]Embora Portugal em seu Código Civil tenha absorvido as influências dos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade da revolução francesa com escopo liberal, o Brasil uma república nova contemplava antigos valores, mantendo a filosofia impregnada pelas Ordenações Filipinas.


Teixeira de Freitas teve a missão de sistematizar a legislação brasileira e foi o responsável pela criação de um Código Civil Brasileiro, que não chegou a ser aprovado, mas inspirou vários países na América do Sul, em especial a Argentina que teve seu Código Civil erigido sob a influência do esboço de Teixeira de Freitas.


Já no inicio do século XX, tendo o Brasil experimentado profundas mudanças sociais com as várias leis abolicionistas, com o surgimento de uma classe burguesa ainda tímida face ao grande poderio ostentado pelos Coronéis, vislumbrou-se o início de um movimento de Codificação no Brasil, desta vez com a influência do Código de Napoleão e do Código Civil Alemão, o BGB (BürgerlichesGesetzbuch), embora a tradição oitocentista oligárquica atenuasse os ideais liberais praticados na Europa.


O Código Civil Brasileiro de 1916 teve como pontos, como marcos teóricos: a propriedade e a família patriarcal, ideais socializantes não se verificam nesse ordenamento, mas sim, uma hierarquização social que se refletia, como não poderia deixar de ser no  próprio Código Civil.


Socialmente, o Brasil foi marcado por ser um país de dimensões continentais e de grandes contradições sociais e profundas desigualdades. Com o fim da escravidão a extensa mão de obra agora liberta, porém de baixíssima qualificação, trilhava a seguinte bifurcação, permanecia no campo trabalhando para os fazendeiroscomo escravos libertos ou caminhavam para os pólos urbanos, em regra sem grande estrutura urbanística capaz de absorvê-los de forma digna. Diante de tal situação sujeitavam-se a empregos que não exigiam grande qualificação.


Neste sentido Orlando Gomes[2] explicita


“Nos primeiros trinta anos da República – 1889 a 1919 – a contradição resultante do desenvolvimento desigual do capitalismo do país, que, grosso modo, pode ser expressa no contraste entre o litoral e o interior, não provocou crises profundas, porque o setor mais ponderável da camada social superior – o dos fazendeiros – utilizou, em proveito próprio, a classe média urbana, que por sua vez, adstrita ao serviço burocrático e militar, por falta de desenvolvimento industrial, a ela se submeteu docilmente, para alargar as suas possibilidades. Esses interesses coincidiam, por outro lado, com os da burguesia mercantil, agindo todos em detrimento da massa rural, cujas condições de vida não permitiam, sequer tivesse consciência de sua miserável situação”.


O modelo do Código Civil de 1916 é edificado sobre a valorização do individualismo e busca em movimento de Codificação alçar o Código Civil à norma máxima na esfera privatista, buscando dentro da dicotomia público-privado uma das justificativas teóricas da supremacia do Código Civil para as relações privadas.


Eugênio Facchini Neto[3], sobre a valorização do individualismo, afirmou que


“É nesse contexto que o individualismo é visto como valor a ser prestigiado, como reação ao período estamental que caracterizou a era medieval, em que o valor do indivíduo estava ligado não às suas características físicas e méritos pessoais, mas ao estamento social no qual se encontrava integrado. Assim contextualizado, entende-se a enfática defesa que A. de Tocqueville faz desse novo valor”.


O movimento de Codificação representou o desenvolvimento dos ideais liberais na busca de monossistema, protegendo a propriedade, buscando a idéia de subsunção do fato à norma em que o Código Civil seria capaz de tutelar todos os fatos sociais. Nesse sistema normativo, o magistrado tem um papel de menor importância, pois deve limitar-se a aplicar a norma ao fato concreto. Foi através dessa diretriz que o magistrado passou a ser reconhecido como o aplicador da norma. O indivíduo tem a possibilidade de prosperar independentemente das amarras encontradas nas sociedades estamentais.


Os ideais liberais que nortearam o Código de Napoleão[4] e o próprio Código Civil Brasileiro de 1916 representaram uma busca pela chamada segurança jurídica, considerando que a tendência neste momento era a do primado do Privado sobre o Público. O Contrato e as Leis Civis eram considerados suficientes em si para que o sistema jurídico pudesse caminhar sem oscilações. A burguesia consolidando as conquistas e buscando evitar retrocessos nas mudanças sociais alcançadas dogmatizava as relações privadas em uma visão notadamente patrimonialista, reduzindo de certa forma a autonomia da vontade e a própria interpretação da vontade para os cânones por ela defendidos e incorporados à legislação civil.


Os Códigos representavam o eixo central do direito privado. A Constituição Federal, embora tivesse reconhecidamente o papel de Lei mais importante do sistema normativo de um país, ficava relegada a uma função de mera representatividade de ideais e princípios, enquanto que o Código Civil representava a efetividade das normas a serem seguidas pela sociedade. Numa clara inversão simbólica, o Código Civil representava o instrumento jurídico de maior relevância para a sociedade, visto que as condutas humanas estavam em bojo definidas no ponto de vista privado.


3. A Decodificação e a Era dos Estatutos


A complexidade das relações sociais representa a própria inquietação do ser humano buscando novos avanços tecnológicos e mudanças na forma deenxergar o próprio indivíduo,quer seja nas relações intersubjetivas, quer seja na própria interação do homem com o meio ambiente a que está inserido. Houve uma valorização do homem sobre o objeto, o próprio liberalismo que em seu âmago traz uma série de contradições na busca de um individualismo perde espaço para sentimentos mais humanistas. Embora as revoluções socialistas não tenham obtido o êxito de seus idealizadores, passou-se a observar que ideais socializantes começaram a permear as relações sociais, com uma valorização do ser sobre o ter, ou seja, uma visão do mosaico normativo, tendo em primeiro plano o indivíduo e em segundo plano a propriedade.


Percebe-se a formação de um polissistema com a edição de um conjunto de regras ocupando espaços que o Código Civil já não conseguia preencher. Dentre essas normas, podemos de forma exemplificativa elencar, a saber: Lei do Inquilinato, Direito Imobiliário, Lei do Parcelamento do Solo Urbano, Código de Defesa do Consumidor, Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei das Sociedades Anônimas, Lei de Falência e Recuperação Judicial, entre tantas outras.


Em um primeiro momento, esse conjunto de normas com a finalidade de dar completude ao sistema privado eram chamadas de normas extravagantes, pois eram utilizadas para regular situações não definidas no Código Civil.  Serviam para dar as diretrizes a situações ou fatos sociais fora de uma “normalidade” prevista pelo legislador. Posteriormente essas normas passaram a ter o rótulo de normas especiais, quer seja nominadas como extravagantes, quer seja nominadas como especiais. De forma cristalizada demonstram que o Código Civil não tem o condão de prever todas ascondutas humanas, o que em espécie de fato é impossível a qualquer ordenamento que venha edificado em um sistema sem flexibilidade. Afinal, o ser humano está em constante transformação, quer seja pelo implemento de novas tecnologias que são diuturnamente buscadas, quer seja pela relativização de condutas morais que ao longo do tempo sofreram sensíveis alterações.


A estrutura jurídica privada dos Estados passou de um eixo único que é o Código Civil para um conjunto de micro-eixos jurídicos, que são chamados de microssistemas. Sobre o tema Orlando Gomes[5] comentou:


“Essas tantas outras leis especiais distinguem-se do Código Civil e o enfrentam, constituindo microssistemas que introduzem novos princípios de disciplina das relações jurídicas a que se dirigem.


Sua proliferação ocasionou “a emersão de novas lógicas setoriais”. Caracterizam-se, com efeito, pela especialidade e pela diferenciação ou concretude. Promulgados para a regência peculiar de determinadas classes jurídicas ou para a proteção particular de uma categoria de pessoas, alguns desses diplomas legais apanham institutos dantes integrantes do Código Civil, enquanto outros atendem a novas necessidades, sem regulamentação anterior.”


Em razão do ativismo de nosso legislador, deve-se alertar para evitar situações em que ocorram dúvidas sobre a aplicabilidade de normas em razão de conflitos entre normas especiais e o próprio Código Civil. Nesse caso, deve-se utilizar as regras de hermenêutica já conhecidas, ou seja, a) lex posterior deroga, a lei mais recente revoga a anterior quando expressamente dispuser ou quando tutele um mesmo instituto jurídico; e ainda b) lexspecialisderogatgenerali, a norma especial prepondera sobre a norma geral.


A passagem do monossistema para o polissistema não constitui um episódio efêmero, muito ao contrário, representa a nova lógica jurídica, pois o Código Civil possui inegavelmente um papel de destaque nas sociedades modernas que utilizam a sistemática da Civil Law. Sendo assim, deve gozar de uma relativa estabilidade, o que impede a aglutinação das várias normas especiais que estão continuamente em transformação, buscando acompanhar o anseio da sociedade.


4. O Movimento de Constitucionalização do Direito Privado


Como ensina Marcos de Campos Ludwig[6]“é um fenômeno historicamente recente, adotado pelos países de tradição romano-germânica a partir da Revolução Francesa passamos a perceber uma distinção entre a idéia de público e privado.”


Nesse sistema dicotômico, o espaço público representa a coletividade com suas normas de regência, sendo a preponderante a Constituição Federal. Em outro extremo observa-se o espaço privado também com suas normas de regência e a norma que predomina é o Código Civil. A partir dessa concepção, verifica-se de um lado os publicistas e de outro lado os privatistas com concepções axiológicas diversas, estruturando o ordenamento não em um sistema de eixos, mas em um sistema de paralelas.


O Estado tem assentado suas bases existenciais em um modelo social, as Constituições têm sido impregnadas de valores a reger a sociedade, como o pluralismo cultural, a ética, a destinação de uma sociedade calcada em valores de igualdade e respeito mútuo, dignidade da pessoa humana[7]“onde a propriedade passa a ter uma função social”. Percebe-se claramente um espaço de interseção entre as questões que envolvem a sociedade e as questões que tocantesaosindivíduos.


O Estado liberal no Brasil como leciona Paulo Lobo[8] já estava superado desde a Constituição de 1934 que já havia incorporado uma organização social, que foi mais desenvolvida na Constituição de 1988. Aos poucos, os civilistas começaram a abandonar a visão de sistema em que o Código Civil constituía a norma de primeira grandeza para o direito privado e a Constituição a norma de primeira grandeza para o Direito Público. Percebe-se então que o Direito Privado deve ser interpretado de acordo com as vertentes estabelecidas na Constituição Federal. Infere-se então que a Constituição federal não representa uma carta política, mas o arcabouço jurídico que serve uma diretriz dogmática para os todos os ramos do Direito. Nesse sentido, para Luís Roberto Barroso[9]


“Uma das grandes mudanças de paradigma ocorridas ao longo do século XX foi a atribuição à norma constitucional do status de norma jurídica. Superou-se, assim, o modelo que vigorou na Europa até meados do século passado, no qual a Constituição era vista como um documento essencialmente político, um convite à atuação dos Poderes Públicos.”


Partindo para uma visão metafórica, poder-se-ia dizer que a Constituição Federal é o sol de nosso sistema jurídico e todos os demais diplomas legais, normas consuetudinárias gravitam em torno da Constituição Federal. Em razão disso, pode-se perceber a imperatividade das normas constitucionais sobre todas as demais existentes em um país. Para Emerson Garcia[10]


“Após um período relativamente longo de maturação, encontra-se sedimentado o entendimento de que a Constituição, em especial as normas constitucionais que reconhecem os direitos fundamentais, também projeta sua força normativa sobre as relações privadas, devendo nortear a produção e a interpretação das leis ou, em alguns casos, regular diretamente as relações. Tomando-se como referencial o direito privado, a Constituição assegura a sua subsistência, contribui para o delineamento do seu conteúdo, auxilia na fixação dos limites a serem observados na restrição de determinados direitos e, em decorrência do caráter aberto e dos valores veiculados pelas normas constitucionais, que permitem a sua continua atualização, estimula o seu desenvolvimento e constante adequação à realidade.”


Com a Constitucionalização do Direito, surge uma forma de ver a sociedade solidarizante cujos ideais comuns se sobrepõem aos anseios individuais. Por oportuno, cumpre salientar que não se trata de uma desintegração do individualismo humano, mas sim, do primado do bem comum sobre a necessidade individual. É nesse contexto que se pode perceber que, embora todos os diplomas legais contemplem o direito do indivíduo ter a propriedade, fica bem clara a noção de que esta propriedade deve atender a seus fins sociais. Tal pensamento não representa em si um antagonismo, mas no plano axiológico, tem-se uma complementaridade que denota o estágio social-democrático da sociedade em contraposição ao estágio do apogeu do liberalismo que norteou o Código Civil de 1916 entre outros dispositivos legais. Ao tratar do tema Paulo Bonavides[11] reflete que no último meio século, institutos eminentemente privados em razão de seus contornos passaram a ser ordenados pelo Direito Constitucional.


Paulo Lôbo[12]ao comentar sobre o processo de Constitucionalização assevera:


“O processo de constitucionalização do direito civil, assim, largamente delineado, não foi nem é aceito sem resistências. As correntes mais tradicionais dos civilistas reagiram negativamente à interlocução do direito civil com o direito constitucional, entendendo que cada qual deve permanecer em seu lugar.”


É razoável o sentimento de resistência por parte da doutrina. Em primeiro lugar, a idéiade Constitucionalização do Direito Civil representa uma ruptura epistemológica do Direito. Uma estrutura social desenvolveu-se com profundas questões sociais, econômicas e políticas, com marcos teóricosbem consolidados, como a Revolução Francesa e a própria Revolução Industrial. Em segundo lugar, uma desqualificação em que todas as regras seriam guindadas ao plano constitucional e seu desrespeito representaria em última análise o próprio sentimento de desrespeito às normas fundamentais do Estado.


A questão, entretanto, não pode ser endereçada de forma tão superficial com a Constitucionalização do Direito Civil, o fenômeno natural a ser observado é o florescimento em larga medida do “diálogo das fontes”[13], um sistema jurídico flexível em que o operador do Direito  compatibilizará as várias normas existentes entre si e com a premissa da observância ao postulado determinado pela Constituição Federal. Otexto Constitucional em verdade deve ter efetividade na tutela das relações jurídicas e não atuar como um mero limite ou barreira[14].


5. Diretrizes Teóricas do Código Civil de 2002


O Código Civil Brasileiro de 1916, fruto de uma visão oitocentista do direito, estava em descompasso com as transformações sociais ocorridas em especial no século XX. A visão eminentemente patrimonialista e patriarcal do direito destoava do contexto social em que produziam efeitos como aumento do fluxo da decodificação ou clamando por uma nova recodificação com a criação de um novo código que refletisse os anseios da sociedade e em compasso uma visão estrutural do direito, atendendo ao novo viés econômico, político, filosófico e cultural[15].


Embora o Código Civil de 2002 ainda possua uma preocupação patrimonialista, é extreme de dúvidas que esta questão seja tratada de forma mais solidarizada se comparada ao Código Anterior.


Dentre diretrizes observadas pela Comissão de Redação do Anteprojeto do Código Civil de 2002 capitaneada por Miguel Reale, podemos citar as seguintes: (a) tentativa de preservar sempre que possível a estrutura do Código Civil de 1916; (b) alteração do Código Civil Brasileiro de 1916 para atender a princípios como eticidade, da sociabilidade e da operabilidade, (c) inserção no código de matéria já consolidada e por outro lado uma opção por não incorporar matérias que a sociedade ainda não apresentou um viés critico definido; (d) dialética da complementaridade, ontognoseologia[16] e conhecimento conjectural; (e) culturalismo; (f) sistema de normas aberto das cláusulas gerais.


O Código Civil Brasileiro de 2002 apresenta uma mudança na perspectiva, valorizando o “ser” ao invés do “ter”. As novas concepções do Direito Civil adotam princípios filosóficos com espeque na lealdade, boa-fé e funcionalização social


A elaboração do novo Código Civil Brasileiro na visão de Miguel Reale deveria tratar de uma missão coletiva e não individual e para tanto, a comissão deveria observar os seguintes preceitos: a) competência doutrinaria; b) afinidade intelectual; e c) que fossem juristas de diversos lugares do país, prevenindo assim acusações de bairrismo[17]. Com a coordenação de Miguel Reale, a Comissão responsável pelo projeto do Código Civil teve a seguinte composição: José Carlos Moreira Alves (Parte Geral); Agostinho de Arruda Alvim (Direito das Obrigações); Sylvio Marcondes (Direito de Empresa); Ebert Vianna Chamoum (Direito das Coisas); Clovis do Couto e Silva (Direito de Família); Torquato Castro (Direito das Sucessões).


Pela composição da Comissão, pode-se observar posições filosóficas variadas, porém é certo que a visão culturalista do Coordenador prevaleceu, dando a feição final ao texto.[18] A Comissão estabeleceu em seu método de trabalhoque não iria mudar por mudar o Código Civil, mas implementar alterações que fossem necessárias para modernização do Direito. Não é necessário dizer que tal postura levou a criticasácidas por parcela da comunidade jurídica, que nomeou a comissão como sendo conservadora.


6. A opção pela unidade e sistematização


Miguel Reale costumava dizer que em um país duas são as leis fundamentais: de um lado a Constituição, estruturando o Estado e de outro lado o Código Civil, que em sua percepção é a “Constituição do homem comum” [19], embora significativa parte da doutrina reconheça em Reale a busca pela recodificação, buscando identificar o Código Civil como o diploma jurídico mais importante, rivalizando de certa forma com a Constituição Federal. O próprio Miguel Realeafirmou que este não foi um objeto almejado em seu projeto.


A idéia de não integrar o Direito das Obrigações no projeto do Código foi abandonada desde as primeiras reuniões da Comissão responsável pelo projeto, sendo unanimidade entre seus membros a elaboração de um código sem um sentido de unidade.


Outro ponto marcante no projeto do Código Civil é a tentativa de preservar sempre que possívela estrutura do Código de 1916. A bem da verdade que a ruptura completa com a norma anterior é algo que no aspecto político levaria a uma maior resistência na aprovação do projeto, embora vários institutos tenham sofrido alterações, inclusive com uma modernização da linguagem adotada.


O Código Civil Brasileiro de 2002 substituiu o viés individualista oitocentista, por um solidarista com norte culturalista, observou-se o primado do coletivo sobre o individual e a revisão dos cinco maiores personagens do direito civil: proprietário, contratante, paide família, empresário e o testador.


7. O Culturalismos como matriz filosófica do Código Civil Brasileiro de 2002


O pensamento filosófico que foi adotado pelo coordenador do Projeto do Código Civil Brasileiro que veio a transformar-se na Lei número 10.406 de janeiro de 2002, tem reflexos no pensamento culturalista.


O culturalismo é uma corrente do pensamento filosófico que se utiliza da noção de “cultura” como paradigma central. É, pois uma vertente filosófica que emerge do neokantismo, modelo complexo oriundo da escola alemã e que encontra muitos pensadores no Brasil.


O estudo dos textos de Miguel Reale traz orientações sobre a formação do atual Código Civil como obra sistematizada, analisando de forma crítica os fatos pretéritos, buscando assim formular um pensamento com bases sólidas sobre o que se pretende no futuro.  Diante desse pensamento, as questões ainda não consolidadas pela sociedade, que carecem de maior reflexão e debate não foram, propositadamente, tocadas no Código Civil Brasileiro, como por exemplo a questão do estudo das células tronco, inseminação artificial extra-uterina, que diante da falta de um consenso fica por opção a ser objeto de análise em Lei Especial.


O Culturalismo, na verdade, é a tradução de um longo processo social, consubstanciado em fatos históricos que estabelecerão o sentido da norma.Analisar a perspectiva do professor Miguel Reale tem a valiosa missão de entender o arcabouço histórico-filosófico que representa nosso Código Civil.


 Maria Helena Diniz[20] fala sobre o Culturalismo:


“Toda construção valorativa racional projetada sobre a natureza é considerada como fenômeno culturalista. Neste sentido são observados conteúdos ideológicos que estão sujeitos a alterações ideológicos em razão do arco temporal a ser observador, questões sociais e morais a que estão sujeitos determinados agrupamentos humanos.”


Sobre a mesma questão, Judith Martins-Costa[21] assevera que: “Nenhum código provém do nada, nenhum código opera no vazio, pois seu modelo sempre expressa uma reflexão e uma tomada de posição diante dos problemas do mundo – isto é, uma filosofia.” Neste contexto, o Código é a representação do conjunto de valores impresso no tecido social, que o legislador deve sistematizar.


8. O Princípio da Socialidade


O século XX foi profícuo em mudanças,em alterações na forma do homem ver o próprio homem, se por um lado a Revolução Socialista não atingiu seu objetivo, percebemos que a socialidade tem se tornado mais intensa, principalmente após as duas grandes guerras mundiais e fenômenos sociais tais como emancipação da mulher, o êxodo rural e a concentração urbana, hodiernamente as mudanças ambientais inclusive com o advento dos refugiados ambientais[22] e a percepção clara que o sentimento egoístico do individualismo não pode prosperar diante do bem estar da coletividade.


A socialidade representa o vínculo entre o modelo jurídico adotado e a coletividade[23], temos como elementos emblemáticos os artigos 421[24] e 1228[25] ambos do Código Civil Brasileiro de 2002. A própria idéia de igualdade entre homens e mulheres descrita na Constituição Federal Brasileira e reproduzida no Código Civil também é uma manifestação do princípio da socialidade, que tenta dar tratamento isonômico independentemente do sexo do indivíduo, como ilustração temos a mudança conceitual de pátrio poder, para a nova designação de poder familiar.


Guilherme Calmon[26] verifica que existe íntima ligação nas conexões estabelecidas entre o Direito Constitucional e Direito Civil atualmente e que esta permuta de funções contribui para a edificação de uma ética social


A questão da função social do contrato para Joseli Lima Magalhães[27] é um instituto que deve ocupar as discussões nos fóruns de Direito Privado, evitando assim uma conceituação vazia de pouca aplicabilidade, uma vez que permite o magistrado verificar com liberdade se o contrato celebrado de fato está cumprindo seu papel social. Com isso, rompe-se a limitação da anulabilidade do contrato com espeque tão somente na questão da interferência da autonomia, da vontade quer seja por erro, dolo, coação ou simulação e passa-se a prestigiar a própria eficácia do contrato, ultrapassando a relação intersubjetiva e alcançando a sociedade da maneira como o negócio jurídico deve ser interpretado pelos Tribunais.


9. O Princípio da Eticidade


O Código Civil Brasileiro de 1916, foi influenciado pelo Código Civil Francês e o Código Civil Alemão,possuía a pretensão de representar àexaustão a completude legislativa, ou seja, o modelo do sistema fechado, pois os atos da vida civil estavam representados na norma, cabendo ao magistrado sua aplicação. O papel de intérprete está relegado a um segundo plano de existência, foi o que se convencionou designar “juiz boca da Lei”, pois cabia ao Juiz aplicar a norma ao caso concreto. Esse princípio da subsunção era erigido sobre a plataforma de que a paz social em grande medida advinha da estabilidade e da segurança das relações jurídicas em uma estrutura jurídica codificada, em que os indivíduos tivessem a exata percepção de seus direitos e suas obrigações.É evidente que este modelo de técnica legislativa pode funcionar em uma sociedade de baixa complexidade com as relações jurídicas tendoreduzido índice de mutabilidade, como, por exemplo, a sociedade brasileira do fim do século XIX.


A velocidade das transformações políticas, econômicas, sociais e tecnológicas ocorridas ao longo do século XX e percebidas neste início de século XXI,levam à reflexão de que o modelo fechado de legislação não atende aos anseios dos indivíduos. O Direito não se baseia no experimentalismo, no puro empirismo. Baseia-se nas necessidades da coletividade, na tutela de novas relações jurídicas ou antigas relações jurídicas vistas por um novo prisma axiológico, sendo afetadas de forma multidisciplinar por uma gama de influências como: economia, sociologia, política entre outras. Charles SandersPierce[28]em sua teoria do pragmatismo apresenta a idéia de contextualismo, que consiste na variante filosófica que busca demonstrar a importância do contexto para a aplicação do Direito.


O Código Civil Brasileiro de 2002 adota uma posição vanguardista se comparado com o Código Civil anterior, pois apresenta uma construção normativaprincipiológica em vários momentos, impulsionando o Magistrado impregnado pelo culturalismo a solucionar os casos postos a sua apreciação sem o rigor positivista. Sua atuação é visível, ao aplicar valores éticos ao caso concreto, procurando dar contornos de maior flexibilidade no ato de decidir, que não representa apenas subsumir o fato à norma, mas interpretar de acordo com os valores éticos e morais daquela sociedade em determinado momento, o que representa a decisão mais justa. Não há, portanto a plenitude hermética que notabilizou o Código anterior. Nesse sentido, o Código Civil Brasileiro de 2002 representou um avanço com a inclusão das chamadas cláusulas abertas.


A utilização de cláusulas abertas de certa forma constitui uma aproximação com os valores defendidos por aqueles que têm o sistema jurídico da Common Law, em que hátradição das cláusulas abertas. Por outro lado, os críticos desse modelo indagam se a segurança jurídica não fica de certo modo ameaçada com o empoderamento dos juízes ao decidir conforme sua íntima convicção do que é justo.


A questão por certo não deve ser conduzida pelos extremistas, pois entre os princípios a serem observados pelos magistrados persiste o da necessidade de fundamentar sua decisão que está sujeita à modificação pela instância superior. O receio de eventual abuso não pode servir para refrear esta importante mudança que serve para tornar o texto legal mais ágil, sempre moderno acompanhando as mudanças sociais.


A Ética no Direito Privado, representa uma matriz filosófica aplicadapelos agentes sociais no trato diuturno de suas relações jurídicas. O Código Civil de 2002 estabeleceu a eticidade como um de seus nortes teóricos, determinando que os indivíduos devem ter em mira a boa-fé como uma verdadeira bússola.


A boa-fé está intimamente ligada à própria questão da dignidade da pessoa humana, como assevera Nelson Rosenvald[29]


“A dignidade da pessoa humana é simultaneamente valor e princípio, constituindo elemento decisivo na afirmação de qualquer Estado Democrático de Direito, assumindo proporção de cláusula geral, apta a condicionar e conformar todo o tecido normativo.


Cogitando de um sistema aberto, cuja supremacia axiológica é referida pela dignidade da pessoa humana, o direito civil e a Constituição manterão intenso vinculo comunicativo, com repercussão material dos princípios que lhe são comuns, nesta constate travessia, a boa-fé é sentida como a concretização do princípio da dignidade humana no campo das obrigações.


No plano da otimização do comportamento contratual e do estritocumprimento ao ordenamento jurídico, o art. 113, dispõe que os negócios jurídicos devem ser interpretados de acordo com a boa-fé. O magistrado não apelará a uma interpretação literal do texto contratual, mas observará o sentido correspondente às convenções sociais ao analisar a relação obrigacional que lhe é submetida.”


A boa-fé é algo intrínseco emtodos os contratos, não se exige que tal princípio seja declarado pelas partes, como ressalta Maria Angélica Benetti Araújo[30],a boa-fé participa do conteúdo jurídico de toda a relação jurídica. Para essa autora, o Código Civil Brasileiro de 2002 não trouxe verdadeira inovação, masaglutinou os entendimentos que já estavam consolidados na doutrina e na jurisprudência.


Para Cibele Pinheiro Marçal Cruz e Tucci[31]O emprego da ética nas relações privadas constitui verdadeira vedação à utilização de astúcia, deslealdade e ardis na elaboração das cláusulas obrigacionais, impondo a boa-fé e lealdade como postulado de conduta a ser observado.


A Eticidade, no passado,por certo estava inserida na forma de ver o direito, entendo que esta estava subsumida na própria autonomia da vontade e na literalidade dos contratos, tal pensamento era o mesmo de base positivista que determinava a completude do Código. Atualmente, não se exige a análise baseada na literalidade do contrato, o operador do Direito pode ultrapassar a forma para atingir o espírito. Os valores do Ethos[32] devem servir para a própria interpretação do contrato, buscando o equilíbrio contratual.


Já vai longe a época em que o mero poderio econômico de um dos contratantes permitia ajustar os termos do pacto conforme suas únicas necessidades, deixando os demais contratantes com a opção de anuir ou não  a aquele acordo que não atendia as partes de forma equilibrada. O pensamento hora forjado, não está baseado naquela sociedade fulcrada no auge do liberalismo, mas em um pensamento socializante de que o Direito normatiza a sociedade e não alguns mais afortunados.


Para Renata Domingues Barbosa Balbino[33], Os princípios deixaram de ser apenas mecanismos supletivos para adquirir a função de fontes do direito. E é exatamente esta a maior contribuição das diretrizes teóricas do novo Código Civil, a formulação de cláusulas abertas com a clara utilização de princípios que produzirão jovialidade à norma, sempre acompanhando os valores éticos em destaque na sociedade.


O princípio da eticidade está fundado no valor da pessoa humana como fonte de todos os demais valores. Prioriza a equidade, a boa-fé, a justa causa e demais critérios éticos. Confere maior poder ao juiz para encontrar a solução mais equitativa.[34]


10. O Princípio da Operabilidade


O Código Civil 2002 buscou construir um elenco normativo cujacompreensão seja mais fácil, não só para os operadores do direito mas para a sociedade de maneira geral,eliminar as dúvidas havidas no código de 1916 que por vezes levavam a situações semelhantes com resultados diametralmente opostos.


Certos dilemas causados pela forma enunciativa dos institutos geraram por certo dilemas em várias decisões judiciais. O próprio Miguel Reale[35] traz como corolário situaçõesnebulosas da prescrição e decadência


A própria sistemática da aplicação do princípio da operabilidade levou a Comissão responsável pelo projeto do Código Civil a estabelecer cláusulas abertas.


Dentro do contexto abordado, é possível sem alterar a letra da Lei, alterar substancialmente seu sentido, com base em valores éticos, políticos, econômicos, sociais vigentes em determinado momento.


A norma passa a gozar de maior perenidade, pois será alterado apenas seu espírito de acordo com a mudança da sociedade ou do grupamento social que a utilize. Não podemos deixar de lado que o Brasil é um país continental e não existe perfeita uniformidade social em todos os seus recantos. Sendo assim, sem ferir a norma é possível ao Juiz observar o contorno da norma, ajustando a necessidade de seu jurisdicionado em razão dos valores culturais existentes naquele contingente.


Implícito ao princípio da operabilidade, apresenta-se o princípio da concretude, que estabelece a obrigação do legislador em não legislar abstrato mas, tanto quanto possível legislar para o indivíduo situado: para o homem enquanto marido, para mulher enquanto esposa, para o filho enquanto um ser subordinado ao poder familiar.[36]


11. As cláusulas abertas


O sistema de cláusulas abertas ou cláusulas gerais constitui um modelo que promove uma ruptura com o sistema que prevaleceu até meados do século XX em que a segurança jurídica residia na positivação do direito através de normas escritas que buscavam tutelar todas as relações jurídicas existentes na sociedade. Admite-se que a norma não é capaz de prover todas as necessidades humanas e há a necessidade de uma flexibilização para permitir ao Estado tratar de forma justa os conflitos de interesse.


Norberto Bobbio[37] ressalta que na medida em que as legislações envelheciam percebia-se as insuficiências do sistema, ficava patente a inexistência de um dogma da completude, que o legislador sem o dom da onisciência, não podendo prever e assim normatiza todas as condutas.


As cláusulas abertas permitem uma oxigenação do sistema jurídico, com a aplicação de princípios norteadores para a solução de conflito, como os princípios constitucionais que representam a constitucionalização do direito privado com a adoção de princípios tais como a dignidade da pessoa humana entre outros.


Procurou-se, com a nova codificação, reformular a linguagem hermética do Código Civil de 1916 baseado, preponderantemente, em tipo e não em princípios, apesar da diretriz de se preservar ao máximo a atual redação, a menos que houvesse mudança profunda ou em virtude das variações semânticas ocorridas desde o Código passado.[38]


A questão da insegurança jurídica é discutida por alguns juristas, José de Oliveira Ascensão[39] indaga se terá o Novo Código Civil seguido o caminho certo. Numa vida jurídica caracterizada por um acentuado desprendimento da Lei, quase um desprestígio prático desta, a mudança operada na ordem normativa não irá afinal agravar os males presentes, como da própria justiça que se aspira alcançar?


A crítica suscitada leva a seguinte reflexão: os poderes de integração da norma pelos magistrados não se tornam excessivos ao depositar toda a confiança na realização de justiça pelo magistrado. Habermas questiona o papel solitário do juiz “Hércules”, que pressupõe alguém que tenha a pretensão de um privilégio cognitivo que garanta sozinho, a integralidade da comunidade jurídica. Ora, se o Direito é a principal forma de integração social e deve respeitar o principio da integridade, logo, o juiz não deveria ficar sozinho na realização de sua tarefa.


Qual a formação humanística do magistrado? Está preparando para o desafio não só de administrar os conflitos, mas solucionar os conflitos aplicando decisões que atendam ao culturalismo? Um Direito fundado em cláusulas gerais pressupõe a capacidade valorativa, e, portanto desde logo a sensibilidade ética dos interpretes.[40]


Sobre as cláusulas gerais Francisco dos Santos Amaral Neto[41], afirma que são preceitos jurídicos vazios ou incompletos que, graças à sua generalidade e abstração, podem abranger um vasto grupo de situações, de modo lacunar e com possibilidade de ajustamento a uma conseqüência jurídica. Seriam normas jurídicas muito amplas, até indeterminadas.


Embora criticas possam ser verificadas, de certa forma são até bem vindas, pois se não houvesse o debate e a posição contrária,  questões atuais estariam sendo decididas com base na leis mosaicas ou no corpus iurescivilis. A vertente oitocentista de completude da norma demonstrou estar superada, pois não acompanha a velocidade operada em nosso tecido social, por outro lado, a aplicação baseada exclusivamente em uma estrutura principiológica também não parece ser o porto seguro das relações jurídicas extremamente complexas. Embora socializadas, não afastam o individualismo derivado das questões patrimoniais, observadas em nossa sociedade de orientação capitalista. Como em vários aspectos jurídicos a busca pelo equilíbrio parece ser a solução mais adequada, portanto extremos como uma normatização hermética ou outro extremo como um abandono ao codex e o primado de principio não representam esta posição de equilíbrio. A existência de normas que permitam em sua aplicação a observância de valores e princípios consagrados pela sociedade parece ser um bom ponto de partida.


A visão culturalista de Miguel Reale no Código Civil Brasileiro de 2002 permite, com a adoção de cláusulas gerais, um conjunto normativo perene, embora continuamente atualizado, pois estará em constante reestruturação uma vez que a sociedade é dinâmica, abandonando certas práticas, criando outras ou ainda restabelecendo práticas que julgavam estar envelhecidas. Écom base nesse constante movimento que se permite a adoção de um Código Civil de orientação principiológicaem que o magistrado pode, no caso concreto julgar com base na equidade, pois como assevera Francisco Amaral dos Santos Neto, justiça e equidade estão intimamente ligadas. O Código Civil Brasileiro apresenta várias referências à equidade, para ilustrar podemos citar: o artigo 413[42], artigo 479[43], artigo 944[44], artigo 1638,III[45].


No sistema das cláusulas abertas como assevera Fátima Nancy Andrighi[46]o juiz sem provocação nada poderá fazer. De nenhuma valia será a disponibilidade da chave-mestra da cláusula geral se o advogado, companheiro indispensável à administração da Justiça, não provocar o juiz com pedidos dessa ordem. Nesse contexto, há uma responsabilidade na mudança e na própria realização da justiça dos advogados na elaboração de peças e teses que rompam com as limitações estabelecidas em normas positivadas e rígidas que procuram abrir os olhos dos magistrados para situações que mereçam um olhar crítico para a decisão mais justa. Deve, poispromover os necessários recursos quando a utilização das cláusulas não representar uma decisão justa e equânime. Por outro lado, os Juízes devem estar libertos das amarras e grilhões que por séculos nortearam sua liberdade de julgar. Os operadores do Direito assumem papel de relevância, pois são aqueles que manejam ferramentas jurídicas na busca pela Justiça.


O sistema das cláusulas gerais representa um desafio metodológico em quea leitura do Código Civil de 2002 na perspectiva civil-constitucional é de extrema importância para a realidade das relações jurídicas segundo os ditames da solidariedade e justiça social[47]


12. Nota conclusiva


O projeto do atual Código Civil foi originado na década de 70, porém durante sua longa permanência nos Gabinetes do Congresso Nacional até sua efetiva promulgação em 2002, foi objeto de várias alterações, não sendo merecedor da crítica de alguns de que já nasceu ultrapassado. Ao revés a mudança metodológica com a inserção de várias cláusulas abertas tem o condão de dar-lhe sempre um ar jovial, à medida que os operadores do Direito, ou seja, advogados e magistrados têm a liberdade de buscar a interpretação que seja compatível com o senso de justo da sociedade em determinado momento da história ou mesmo observado o conjunto de valores morais de uma determinada região ou determinado grupamento social.


O Código Civil Brasileiro de 2002 passou a ser dotado de uma perenidade, que é atributo que se busca em qualquer normatização, em especial, aquela cujos efeitos refletem em todo ordenamento privado de um país.


Nesse sentido, quebram-se os grilhões que escravizavam o intérprete que agia corretamente ao simplesmente aplicar a Lei. A visão Positivista do Direito representa a subsunção do Justo ao que foi Normatizado sem considerar as nuances de cada caso, estabelecendo um tratamento único e padronizado a todos, indistintamente de suas peculiaridades fáticas. As diretrizes adotadas pelo Código Civil harmonizam-se com os preceitos Constitucionaise constituem verdadeiro avanço no Direito Privado.


Por outro lado, persistem os críticos que discutem que algumas questões que abarcam toda a sociedade não foram discutidas pelo Código, como por exemplo a questão envolvendo a utilização da pesquisa e tratamento com células troncos, uma sobrevalorização da família tradicional sobre as relações de fato, ou ainda a questão da concepção in vitro.


Miguel Reale já havia oferecido contra-argumento a seus críticos, defendo a própria aplicação do culturalismo como sendo a sedimentação de valores por parte do tecido social, portanto questões com tal nível de problematização cuja sociedade não tem uma posição definida não devem ser estabelecidas pelo legislador em um Código, mas que a normatização virá oportuno temporecom o necessário debate da sociedade.


Com a Constitucionalização do Direito Civil, a aplicação dos postulados: eticidade, socialidade e operabilidade podem ser apresentados pelos operadores do Direito e decididos pelo judiciário com o diálogo das fontes normativas e com uma hermenêutica orientada à luz da Constituição Federal.


Como ensina Guilherme Calmon[48]


“Observa-se que o trabalho a ser desenvolvido é, ainda, bastante intenso e árduo. A constitucionalização do Direito Civil é fenômeno e, simultaneamente, diretriz dos novos tempos, permitindo se alcançarem a unidade, a harmonia e a coerência no sistema.  As normas jurídicas codificadas, a despeito do esmero na sua formulação na via legislativa e da sua pertinência à ordem jurídica em vigor, não deixam de se revestir de algo teórico, necessitando, assim, ser diuturnamente experimentadas e avaliadas de acordo com a verificação das suas conseqüências no meio social. Daí porque a atividade de interpretação não pode se restringir às normas jurídicas, devendo abranger os fatos da vida social, bem como inserir as normas no contexto do processo histórico global sob o prisma das necessidades sociais contemporâneas.”


O Código Civil Brasileiro de 2002 rompe com a dogmática oriunda do pensamento oitocentista, procura humanizar as relações intersubjetivas, realçando o elemento subjetivo, atendendo a postulados de boa-fé, valorizando a ética que por tantas vezes foi lançada no recôndito monturo em nome da positivação e de uma suposta segurança jurídica. Com o atual corpo normativo civil, a opção do legislador foi firmada no sentido de coroar a busca pela Justiça e pelo bem estar social.


 


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Notas:

[1]GOMES, Orlando. Raízes Históricas do Código Civil. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p.11-13

[2]GOMES, Orlando, op. cit. p. 27.

[3]FACCHINI NETO, Eugênio. Reflexões histórico-evolutivas sobre a constitucionalização do direito privado. In: SARLET, Ingo Wolfgang (org.) Constituição, Direitos Fundamentais e Direito Privado. Porto Alegre: livraria do advogado.2003. p. 18.

[4]Referencia ao Código Civil Francês que foi publicado aos 21 dias do mês de marco de 1804, sob a orientação do General Napoleão Bonaparte. A sua promulgação, concretizada em 36 leis aprovadas entre 1803/4, ratificou e corrigiu a maior parte das conquistas sociais alcançadas pela sociedade civil burguesa a partir da Revolução de 1789.

[5]GOMES, Orlando. Raízes Históricas do Código Civil. São Paulo: Martins Fontes, 2003.p.11-13

[6]LUDWIG, Marcos de Campos. Direito Público Privado: A Superação da Dicotomia. In : COSTA, JUDITH Martins (coord.). A Reconstrução do Direito Privado. São Paulo. Revista dos Tribunais. p. 94-97.

[7]A expressão dignidade da pessoa humana surgiuno contexto que hoje é adotado , em 1945, no preâmbulo da Carta das Nações Unidas.

[8]LÔBO, Paulo. A Constitucionalização do Direito Civil Brasileiro. In Direito Civil Contemporâneo: Novos problemas à luz da Legalidade Constitucional (org. Gustavo Tepedino). São Paulo: Atlas. 2008. p.18-19.

[9]BARROSO, Roberto Luis. A Constitucionalização do Direito e o Direito Civil. In Direito Civil Contemporâneo: Novos problemas à luz da Legalidade Constitucional (org. Gustavo Tepedino). São Paulo: Atlas. 2008. p.240-241.

[10] GARCIA, Emerson. Conflito entre Normas Constitucionais: Esboço de uma Teoria Geral, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.302-303

[11] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Malheiros, 10ª ed., 2000, p.34

[12]LÔBO, Paulo. Op. Cit. p.22-23.

[13]MARQUES, Claudia Lima. Diálogo entre o Código de Defesa do consumidor e o Novo código Civil: 12 n. 45. São Paulo: Revista dos Tribunais, jan/mar, p. 74-75

[14]PERLINGIERI. Pietro. Perfis do Direito Civil Introdução ao Direito Civil e Constitucional. 3ª. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2007 passim.

[15]GAMA. Guilherme Calmon Nogueira da. Direito Civil: Obrigações. São Paulo: Atlas. 2007. p.80

[16] Ontognoseologia estuda, deum lado, as condições do sujeito que conhece (gnoseologia) e, de outro lado, o ser enquanto objeto a ser conhecido (ontologia).

[17] REALE, Miguel. As Diretrizes Fundamentais do Projeto do Código civil. Comentários sobre o projeto do Código Civil brasileiro: Série Cadernos do CEJ. V. 20. Brasília: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, 2002 passim.

[18] MARTINS-COSTA. Judith e BRANCO, Gerson. Diretrizes Teóricas do Novo Código Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva. 2002.passim

[19]REALE, Miguel. Op. Cit.

[20] DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 131-132

[21]MARTINS-COSTA. Judith. Culturalismo e Experiência no Novo Código Civil. Revista do Tribunal Regional Federal da 1 a. Região, v. 18 n. 6 jun. 2006.

[22]Para Ronaldo Decicino – São os refugiados ambientais – uma categoria social, formada por grupos humanos que se deslocam não por causa de guerras, epidemias ou distúrbios políticos, mas devido a catástrofes ambientais que tornam a vida insustentável em seus habitats originais.

Vários desastres ambientais já provocam o êxodo de grandes massas de população: o tsunami, ocorrido em dezembro de 2004, que destruiu a costa de diversos países asiáticos, matando milhares de pessoas e deixando milhões de desabrigados; o furacãoKatrina, em agosto de 2005, que deixou 1 milhão de norte-americanos desabrigados; o terremoto que atingiu o sul da Ásia, em outubro de 2005, matando milhares de pessoas. E, no primeiro semestre de 2008, o ciclone que atingiu Mianmar, matando 22 mil pessoas e deixando 1 milhão de desabrigados – ou o terremoto que matou 50 mil pessoas na China.

Segundo levantamentos da ONU, estima-se que hoje já existem tantos refugiados ambientais quanto pessoas que são forçadas a deixar suas casas por causa de distúrbios sociais. Entre os problemas ambientais estão o esgotamento do solo, a desertificação, as enchentes, os terremotos, os furacões e outros desastres naturais.

Essa nova categoria de refugiados ainda não foi classificada nos acordos internacionais, embora, ainda segundo estimativas da ONU, os refugiados ambientais possam, em breve, ultrapassar o número oficial de pessoas em situação de risco – contabilizado pelo Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) -, que inclui os refugiados políticos e pessoas em busca de asilo devido a perseguições de vários tipos.

A ONU afirma que é preciso criar mecanismos para que essas pessoas recebam proteção adequada. Nesse sentido, é necessário que se crie uma definição legal para o conceito de refugiado ambiental, de maneira que esses grupos sociais possam receber uma assistência similar a dos outros tipos de refugiados – ou seja, possam ter auxílio financeiro, direito a solicitar asilo em outros países ou participar de políticas de reassentamento.

Há, inclusive, a necessidade de se rever a idéia de que só é um refugiado a pessoa que cruza fronteiras nacionais. Refugiados ambientais também são os que se dirigem a outras regiões dentro do próprio território. Desastres como o provocado pelo furacão Katrina mostraram de forma clara que muitas pessoas, forçadas a deixar suas casas por catástrofes naturais, com frequência permanecem no país onde vivem.

A ONU revela que os desalojados em seus próprios países tornam-se mais susceptíveis à miséria e a ataques criminosos, sendo que a lei internacional não oferece efetiva proteção a esses grupos sociais.

O conceito de refugiado, como é conhecido na atualidade, surgiu ao final da Segunda Guerra Mundial, quando a quantidade de pessoas deslocadas por causa dos conflitos bélicos atingiu proporções gigantescas. O conceito abrange os perseguidos por opinião política, questões raciais, opção religiosa, nacionalidade e associação a determinado grupo social.

[23] BRANCO, Gerson. Op.cit 64

[24] O artigo 421 Código Civil trata da função social do Contrato “A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”

[25] O artigo 1228 Código Civil trata da função social da propriedade “O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha

 §1º O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, as belezas naturais, o equilíbrio e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

[26] CALMON NOGUEIRA DA. Guilherme. Op cit. p.84

[27] MAGALHÃES. Joseli Lima, Da Recodificação do Direito Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2006.

[28] Charles Sanders Pierce ao lado de William James e John Dewey foram considerados os fundadores da Escola do Pragmatismo que se assentava em trêsidéias principais: o antifundacionalismo, o consequencialismo e o contextualismo.

[29]ROSENVALD, Nelson. O princípio da Boa-fé. In Revista do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Brasília, v.15, n. 10, out.2003. Passim.

[30] ARAÚJO, Maria Angélica Benetti. Autonomia da Vontade no Direito Contratual. In NERY JUNIOR, Nelson e ANDRADE NERY, Rosa Maria de. Revista de Direito Privado n. 27. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais. Jul. – set. 2006. p. 286

[31] TUCCI, Cibele Pinheiro Marçal Cruz e. Teoria Geral da Boa-fé Objetiva. In Revista do Advogado. Ano 22. n. 68. São Paulo: Associação dos Advogados de São Paulo. Dez. 2002.p. 102

[32]A palavra ethos tem origem grega e significa valores, ética, hábitos e harmonia. É o “conjunto de hábitos e ações que visam o bem comum de determinada comunidade”. Ainda mais especificamente, a palavra ethos significava para os gregos antigos a morada do homem, isto é, a natureza. Uma vez processada mediante a atividade humana sob a forma de cultura, faz com que a regularidade própria aos fenômenos naturais seja transposta para a dimensão dos costumes de uma determinada sociedade. Em lugar da ordenação observável no ciclo natural das coisas (as marés ou as fases da Lua, por exemplo), a cultura promove a sua própria ordenação ao estabelecer normas e regras de conduta que devem ser observadas por cada um de seus membros. Sendo assim, os gregos compreendiam que o homem habita o ethos enquanto a expressão normativa da sua própria natureza. Embora constitua uma criação humana, tal expressão normativa pode ser simplesmente observada, como no caso das ações por hábito, ou refletida a partir de um distanciamento consciente. Nesse caso, adentramos o terreno da ética enquanto discurso racional sobre o ethos

[33] BALBINO, Renata Domingues Barbosa. O Princípio da boa-fé objetiva no novo Código Civil In Revista do Advogado. Ano 22. n. 68. São Paulo: Associação dos Advogados de São Paulo. Dez. 2002.p. 111

[34] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: parte geral. São Paulo: Saraiva. 4ª ed. Ver. Atual. 2007.  p.25

[35] REALE, Miguel. Op.cit.

[36] REALE, Miguel. Op. cit

[37] BOBBIO, Norberto. Teoria Geral do Direito, 3ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 278

[38] MAGALHÃES. Joseli Lima. Op. Cit. p. 153.

[39] ASCENSÃO, José de Oliveira. Cláusulas gerais e a segurança jurídica no Código Civil de 2002. Revista Trimestral de Direito Civil – RTDC. Ano 7 v. 28. Rio de Janeiro: Padma outubro a dezembro de 2006. Passim

[40] ASCENSÃO, José de Oliveira. Op. Cit.

[41]AMARAL NETO, Francisco dos Santos. A equidade no Código Civil Brasileiro. Série Cadernos do CEJ. vol. 25. Brasília: Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, 2004. p.17

[42]. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.

[43]. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a modificar eqüitativamente as condições do contrato

[44]. A indenização mede-se pela extensão do dano.Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.

[45]. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:

III – praticar atos contrários à moral e aos bons costumes

[46] ANDRIGHI, Fátima Nancy. Cláusulas Gerais e Proteção da Pessoa.  InTEPEDINO, Gustavo Direito Contemporâneo:novos problemas à luz da legalidade Constitucional. São Paulo:Atlas. 2008. p.294-295

[47] TEPEDINO, Gustavo. Crise de Fontes normativas e técnica legislativa na parte geral do Código Civil de 2002. In A parte geral do Novo Código Civil: estudos na perspectiva civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar. 3ª ed. rev.2007. p. XXXIII.

[48]GAMA. Guilherme Calmon Nogueira da.Capacidade para testar, para testemunhar e para adquirir por testamento In  CARVALHO, Dimas de Messias e CARVALHO,  Dimas Daniel (coord.) Direito das Sucessões Inventário e Partilha. Minas Gerais: Del Rey. 2007. p.238-239


Informações Sobre o Autor

Fabio Anderson de Freitas Pedro

Mestrando em Direito pela Universidade Gama Filho (RJ). Professor do Curso de Direito do Centro Universitário da Cidade (RJ). Professor da Pós-Graduação Lato Sensu do Centro Universitário da Cidade (RJ). Pesquisador. Advogado. Membro daAssociação Brasileira de Direito Aeronáuticoe Espacial (RJ). Membro da Associação Latino Americana de Aeronáutica (Houston – E.U.A), Membro da Academia Brasileira de Direito Civil (MG)


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