Direito de propriedade: a incessante luta entre proprietário e/ou consumidor e as concessionárias de fornecimento de energia elétrica

Resumo: Neste artigo faremos uma reflexão sobre a interferência no direito de propriedade causado pelas concessionárias de distribuição e fornecimento de energia elétrica em razão da instalação irregular de postes de energia elétrica, passagem de fios de alta tensão aérea ou equipamentos sobre os imóveis urbanos, situação essa que impossibilita o pleno uso da propriedade, como a expansão vertical do imóvel.

Palavras-chaves: direito de propriedade. Uso. Obrigação de fazer. Concessionárias de energia elétrica.

Abstract: In this article we will reflect on the interference with the right to property caused by distribution and supply of electricity due to the irregular installation of electricity poles, wires passing high voltage aerial or equipment on urban properties, location that which hinders the full use of the property, as the vertical expansion of the property.

Keywords: property right. Use. Obligation to do. Dealers of electricity.

Sumário: Introdução; 1. O direito de propriedade e ao uso; 2. As irregularidades cometidas pelas concessionárias de energia elétrica na propriedade alheia; 3. A obrigação de fazer e a não cobrança pela remoção de postes, fios de alta tensão e equipamentos. Conclusão. Referencias.

Introdução.

Com o crescimento cada vez mais rápido dos grandes centros urbanos e até mesmo das regiões mais periféricas do Brasil e porque não dizer rural, surge a necessidade de expansão da rede de fornecimento de energia elétrica.

É nesse momento de grande expansão dos centros urbanos que observamos a aparente falta de planejamento na implantação das redes elétricas e a má disposição de postes, passagem de fios de alta tensão e até mesmo a colocação de equipamentos das concessionárias elétricas e suas terceirizadas em locais particulares, trazendo grande transtorno aos proprietários e/ou consumidores das mesmas.

Assim, nasce a necessidade de esclarecer que tem o proprietário e/ou consumidor afetado no exercício do direito de uso das suas propriedades de buscar a tutela jurisdicional na remoção dessas inconveniências, sem que para isso deva arcar com as respectivas remoções, sendo essa obrigação ser suportadas financeiramente pelas respectivas concessionárias de energia.

1. O direito de propriedade e ao uso.

O direito de propriedade está disposto na carta constitucional brasileira de 1988, devidamente exposto no artigo 5ª, caput, e inciso XXII, bem como dispostos no artigo 1.228 e seguintes Código Civil de 2002, o que faculta ao proprietário o pleno direito de uso e gozo de seus frutos.

Assim dispõe o artigo 5ª da Constituição Federal do Brasil de 1988:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)

XXII – é garantido o direito de propriedade;”

Não obstante vemos também o que dispõe o artigo 1.228 do Código Civil de 2002:

“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”

É a partir desse prenuncio que passamos a observar que o proprietário tem o direito de uso e gozo da sua propriedade e deve se opor a quem o detém injustamente. Daí nasce o interesse do proprietário e/ou consumidor em se opor as irregularidades praticadas pelas concessionárias de energia elétrica em sua propriedade e o direito de não pagar pela remoção de postes, fios de alta tensão ou equipamentos intrusos em sua propriedade ou que obstem no uso pleno da mesma.

2. As irregularidades cometidas pelas concessionárias de energia elétrica na propriedade alheia.

Não é incomum observa nos grandes centros urbanos e até em cidades pequenas aquele poste de energia elétrica em frente a entrada de garagens, impossibilitando a entrada e saída de veículos dos imóveis, bem como aqueles fios de alta tensão elétrica que passam por cima de imóveis, impossibilitando o proprietário e/ou em expandir seu imóvel de forma vertical.

Ainda mais, não é incomum, observar situações em que as concessionárias de energia acabam por implantar portes de energia dentro do terreno do consumidor, sem a devida autorização. Tal intromissão na propriedade alheia causa transtornos ambientais e financeiros.

A intromissão abrupta das concessionárias de energia elétrica em imóveis privados obriga aquele proprietário e consumidor a ter que se adaptar a essa situação, porém, o mesmo o faz por não saber que se opor a essa intromissão e buscar seus direitos junto ao Poder Judiciário, exercendo seu direito petitório.

3. A obrigação de fazer e a não cobrança pela remoção de postes, fios de alta tensão e equipamentos.

O proprietário e/ou consumidor, ao observar a intromissão abrupta da concessionária de energia elétrica em sua propriedade, não sendo a mesma devidamente autorizada a implantar o poste de energia ou ao passar os fios de alta tensão sobre seus respectivos imóvel, estando comprometendo o uso da propriedade, pode e deve provocar o Poder Judiciário para que tal intervenção cesse.

Assim, confirma a jurisprudência pátria:

“OBRIGAÇÃO DE FAZER. Remoção de poste de energia elétrica instalado defronte à residência do autor Circunstância que impede a entrada e saída de veículos Restrição ao direito de propriedade (art. 1228 do CC) Responsabilidade da concessionária pelo custeio da remoção Cumprimento da obrigação Elevação do prazo para 30 dias Razoabilidade Recursos provido, em parte”. (TJ-SP – APL: 1220484620098260001 SP 0122048-46.2009.8.26.0001, Relator: Ligia Araújo Bisogni, Data de Julgamento: 31/10/2012, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/11/2012).

Observamos que a decisão acima faz clara menção ao direito de uso da propriedade e dá destaque a situação de restrição do uso da mesma pela colocação de poste de energia em frente a garagem do autor, que impossibilita o uso mesma. E mais, o magistrado não foge ao interesse do consumidor ao condenar a concessionária a arcar com os custos da remoção do poste que causa tal restrição, impossibilitando a mesma de cobrar pela obrigação da respectiva remoção.

Não obstante, vale destacar que a próxima decisão:

“responsabilidade administrativa. ENERGIA ELÉTRICA. POSTE. calçada. imóvel residencial. garagem. acesso. restrição excessiva ao exercício da propriedade. remoção. custos. RAZÕES DISSOCIADAS.

1. É inepto o recurso cujas razões não guardam pertinência com os fundamentos da decisão recorrida.

2. As despesas de remoção de poste de energia elétrica instalado, na calçada, que obsta o uso do imóvel residencial como garagem devem ser suportadas pela concessionária, porquanto se trata de sacrifício ao direito de propriedade em prol da coletividade. Princípio da isonomia na repartição dos encargos públicos. Hipótese em que deve ser majorado o prazo fixado para a conclusão da obra. Recurso dos Autores não conhecido. Recurso da Ré provido em parte. DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA – Presidente – Apelação Cível nº 70050107861, Comarca de São Borja. Porto Alegre, 18 de outubro de 2012.”

O julgado acima também destaca que deve a concessionária suportar os gastos com a remoção do poste que trás restrições ao uso da propriedade do proprietário e/ou consumidor deve ser suportado em sua totalidade pela concessionária que provocou tais restrições ao uso da propriedade do consumidor.

Assim, ao destacarmos os julgados acima, podemos ainda mostrar neste artigo outras decisões como:

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PRELIMINAR. FALTA DE INTERESSE DE AGIR.

A Constituição Federal assegura aos cidadãos o livre acesso ao judiciário, em seu art. 5º, XXXV, de modo que entender necessária a requisição na esfera administrava fere o referido preceito constitucional.

MANUTENÇÃO E REPARAÇÃO DE REDE ELÉTRICA. ÔNUS DA CONCESSIONÁRIA.

Encontrando-se o poste de energia elétrica em via pública é ônus da concessionária a sua manutenção. Art. 114, § único, da Resolução 456/2000 da ANEEL.

REMOÇÃO DE POSTE. OBSTRUÇÃO DE ENTRADA DE IMÓVEL.

Comprovada a obstrução da entrada do imóvel por poste de energia elétrica é de responsabilidade da concessionária a remoção, sem qualquer custo ao consumidor.

COMPENSAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

Entendo possível a compensação dos honorários advocatícios, mesmo que uma das partes litigue com assistência judiciária gratuita, uma vez que a matéria inclusive já foi sumulada pelo STJ (súmula 306).

Preliminar rejeitada, apelo provido em parte.” (Apelação Cível Nº 70042919381, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Maraschin dos Santos, Julgado em 29/06/2011).

Ainda mais, mesmo que o poste tenha sido instalado em local onde não existe edificação, deve ser observado o direito de propriedade que deve ser exercido em sua plenitude e não deve sofre restrições provocadas por terceiros.

Assim, o julgado abaixo destaca a responsabilidade da concessionária de energia em arcar com os custos da remoção de poste que provoca restrições a disposição do uso pelo proprietário do imóvel prejudicado.

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. REMOÇÃO DE POSTE DE SUSTENTAÇÃO DE REDE DE ENERGIA ELÉTRICA. POSTE PRÉ-EXISTENTE À AQUISIÇÃO DO TERRENO PELA AUTORA. NECESSIDADE DE REMOÇÃO PARA VIABILIZAÇÃO DE EDIFICAÇÃO. DEVER DA CONCESSIONÁRIA. DECRETO Nº 41.019/57. PRECEDENTES DESTA CORTE. NECESSIDADE DE AMPLIAÇÃO DO PRAZO PARA EXECUÇÃO DA REMOÇÃO. PRAZO DE 30 DIAS. POSSIBILIDADE E LEGALIDADE DA FIXAÇÃO DE ASTREINTE. RAZOABILIDADE DO VALOR ARBITRADO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO, POR MAIORIA”. (Apelação Cível Nº 70031214935, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 26/08/2009).

Logo, uma vez que o proprietário e/ou consumidor se sentir prejudicado no seu direito de exercício do direito de propriedade, deve buscar a concessionária para que sane tal restrição provocada pela sua intromissão na propriedade, mesmo que o poste de energia ou fiação de alta tensão que passe por cima de sua propriedade seja pré-existente a edificação em terreno.

Mas, se a concessionária se recusar a realizar tais remoções ou se só o fizer querendo cobrar pelo serviço de remoção deve o proprietário e/ou consumidor exercer seu direito de petição. Provocar o Poder Judiciário para que esse condene a concessionária a realizar tal serviço sob as suas expensas, isentando o requerente, neste caso proprietário e/ou consumidor de arcar com qualquer espécie financeira.

Nesse sentido já decidiu esta Câmara, no julgamento da Apelação Cível n.º 70042255935, Relatora Des.ª Denise Oliveira Cezar, Julgado em 16/06/2011:

“APELAÇÃO. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. REMOÇÃO DO CABO DE TENSIONAMENTO – ESTAI. DECRETO N. 98.335/1989. DEMONSTRAÇÃO DA LIMITAÇÃO EXCESSIVA AO DIREITO DE PROPRIEDADE. DEVER DA CONCESSIONÁRIA. Nos termos do Decreto nº 98.335/1989, a mudança do poste e outros equipamentos da rede são feitos pela concessionária e cobrados do usuário, quando a alteração atende ao seu interesse pessoal. Entretanto, comprovada a restrição excessiva do direito de propriedade bem como a inutilidade da existência do ESTAI no imóvel do autor, é devida sua remoção por conta da empresa concessionária. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. INOCORRÊNCIA. Excluída a multa e a indenização pela litigância de má-fé porquanto não deduzida defesa contrária a texto expresso de lei (art. 17, I, do CPC) e não alterada a verdade dos fatos (art. 17, II) pela empresa concessionária ré. VALOR DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REDUÇÃO. Redução do valor dos honorários advocatícios, nos termos do § 3º do art. 20 do CPC. APELAÇAO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME.”

Desse modo, observamos que o entendimento é que, em regra, a mudança do poste e outros equipamentos da rede são feitos pela concessionária e cobrados do usuário, quando tal alteração atende única e exclusivamente a interesses estéticos do imóvel, conforme previsto pelo Decreto nº 98.335/1989, que alterou a redação do Decreto nº 41.019/1957.

No entanto, quando tal restrição provocada pela instalação de postes de energia ou passagem fios de alta tensão provocar ônus excessivo ao proprietário e/ou consumidor, inviabilizando o exercício da propriedade, não há falar de interesse do usuário, mas de fazer cessar impedimento ao exercício do seu direito de propriedade.

Este é o caso proposto na referida litigância, uma vez que os fios de alta tensão e o poste de energia elétrica instalado pela concessionária, um poste colocado ao final da rede, cujo objetivo é o de manter os fios esticados, ocupa a quase totalidade da frente do terreno do autor o que impede que ele possa usar de forma plena sua propriedade.

Conclusão.

Observamos a clara abusividade na cobrança pelas concessionárias de energia elétrica para a remoção de postes, fios de alta tensão e equipamentos das respectivas companhias dos imóveis atingidos pela intromissão abrupta dessas.

Ainda mais, buscamos aqui esclarecer que o proprietário e/ou consumidor deve ter respeitado o seu direito de livre exercício e uso dos respectivos imóveis atingidos por restrições provocadas pelas concessionárias de energia elétrica, visto o direito a ser preservado e devidamente exposto em nossa Legislação e devidamente protegido em nossa jurisprudência pátria.

Logo, toda vez que uma pessoa se sinta prejudicada pela interferência externa ao seu imóvel, deve procurar o Poder judiciário e exercer o seu direito ao acesso à justiça e direito petitório.

 

Referências:
BRASIL. Constituição da República Federativa de 1988. São Paulo: Saraiva, 2013;
BRASIL. Código Civil. Edição 23. São Paulo: Saraiva, 2013;
Brasil. Tribunal de Justiça de São Paulo. APL: 1220484620098260001 SP 0122048-46.2009.8.26.0001, Relator: Ligia Araújo Bisogni, Data de Julgamento: 31/10/2012, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 05/11/2012. Disponível em: http://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22594891/apelacao-apl-1220484620098260001-sp-0122048-4620098260001-tjsp. Acesso em 06 de março de 2014;
Brasil. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível nº 70050107861. Relator (a) Comarca de São Borja. Porto Alegre, 18 de outubro de 2012. Disponível em: http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/22536559/apelacao-civel-ac-70050107861-rs-tjrs. Acesso em 06 de março de 2014;
Brasil. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70042919381, Primeira Câmara Cível. Relator: Jorge Maraschin dos Santos, Julgado em 29/06/2011. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/65257731/djse-27-01-2014-pg-575?ref=home. Acesso em 06 de março de 2014;
Brasil. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível Nº 70031214935, Primeira Câmara Cível. Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 26/08/2009. Disponível em: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/65583558/djse-03-02-2014-pg-559. Acesso em 06 de março de 2014;
Brasil. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Apelação Cível n.º 70042255935, Relatora Des.ª Denise Oliveira Cezar, Julgado em 16/06/2011. Disponível em: http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/112470974/apelacao-civel-ac-70051799484-rs/inteiro-teor-112470984. Acesso em 06 de março de 2014.

Informações Sobre o Autor

Anderson Maia Almeida

Bacharel em Direito pela Faculdade Belém – FABEL.


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