Ensino Jurídico, prática e serviços de assessoria jurídica: Reflexões sobre ensino jurídico a partir da prática do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular do IPA

Sumário: 1.- Da necessidade de uma assessoria jurídica que ultrapassasse o conceito de direito subjetivo individual. 2.- Das expectativas iniciais, andamentos e planejamento 3.- Uma análise crítico-metodológica do trabalho desenvolvido 4.- Referências Bibliográficas 5.- Anexos


1.- Da necessidade de uma assessoria jurídica que ultrapassasse o conceito de direito subjetivo individual.


Considerando transição paradigmática[1] que a Constituição Federal de 1988 impôs com a eleição do princípio da proteção da Dignidade da Pessoa Humana como Fundamento da República,[2] através da instituição de um Estado Democrático de Direito, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, surgiu a necessidade de questionar quais as alterações necessárias no processo de ensino-aprendizagem para abarcar a nova racionalidade imposta pelo Legislador Originário.[3]


Neste processo, além de uma reflexão sobre a grade curricular dos cursos, englobando discussões acerca dos objetivos do ensino jurídico, da atividade docente e sua intencionalidade, tem especial relevância o repensar da prática jurídica. Através dela, tem-se condições de superar a tradicional dicotomia entre teoria e prática e contribuir para uma visão complexa do processo de ensino-aprendizagem do Direito.[4]


Nessa trajetória, primeiramente, necessita-se visitar o conceito de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, disciplinado no art. 207 da CF. Diante dele, necessário estreitar os laços existentes entre estas esferas, também nas práticas profissionais. [5]


Aliado a isso, constata-se a alteração de um Direito Fechado e excludente rumo a um Direito Plural e inclusivo.[6] Neste sentido, formulações jurídicas tradicionais já não mais respondem aos anseios da realidade.[7]


Segundo Gustavo Tepedino:


“ao homem do Direito, nenhuma agenda econômica ou proposta de reformulação do Estado pode seduzir se não se apresentar caracterizada, às escâncaras, a prioridade absoluta, imediata, inadiável com a emancipação do homem e com a erradicação das desigualdades culturais, sociais e regionais que envergonham o país.”[8],


Durante muito tempo, os cursos de Direito ocuparam suas disciplinas práticas com simulações de casos em sala de aula, possibilitando aos acadêmicos instrumentalizar a prática através da reflexão sobre o conhecimento teórico através de um caso fictício formulado previamente pelo professor.


Com o desenvolvimento das atuais teorias da aprendizagem, verificou-se que havia uma distância abissal entre as simulações possíveis e eventuais necessidades que estes acadêmicos viriam a enfrentar na vida cotidiana de graduados.[9]


Institui-se, então, a prática do atendimento às demandas da Sociedade Civil através dos Escritórios- Modelo, ou mesmo através dos Serviços de Atendimento. Este procedimento procurou unir três esferas de preocupação social. A primeira delas trata-se do efetivo acesso à justiça,[10] pois, as desigualdades sociais no Brasil demonstram que uma parcela significativa da população não possui condições de reivindicar seus direitos subjetivos aviltados por falta de recursos financeiros.


Neste aspecto, verifica-se que o princípio do aceso à justiça em uma concepção mais ampla está conectado a outro princípio constitucional, que é o da inafastabilidade do Controle Jurisdicional, necessários para garantir efetividade dos direitos fundamentais individuais e sociais no Estado Democrático de Direito.[11]


Em segundo lugar, indentifica-se o fato de que as experiências práticas referentes ao ensino-aprendizagem por parte dos acadêmicos seriam enriquecidas pelas possibilidades trazidas pela realidade. Além disso, considerando-se que a oportunidade de Estágio, na maioria dos cursos jurídicos se dá a partir da metade do curso, servem de espelho no qual o acadêmico é capaz de avaliar sua permanência ou não na trajetória específica do Direito. Assim, possibilita-se uma opção consciente pela graduação em Direito.


Tem-se, portanto, três motivações para esta prática. Uma de ordem de substância do aprendizado, a segunda referindo-se à efetiva necessidade social desta intervenção e a terceira constituindo-se a partir da possibilidade de opção  consciente pela carreira jurídica.


Falta ainda uma quarta motivação. Esta diz respeito ao fato de que as Universidades, Centros Universitários e Instituições de Ensino Superior são detentoras de conhecimento de ponta, uma vez que a pesquisa é a parte do conhecimento destinada a levantar as novas possibilidades do fenômeno Jurídico. Logo, nas palavras de Pedro Demo, a Instituição de ensino superior recebe uma mandato da sociedade, a fim de que cumpra determinada missão:


Considero que o mandato crucial da universidade sejam educação e conhecimento, no fundo o mesmo de todo o processo educacional formal, embora em estágio mais elevado e posterior, bem como considero que a formação para a cidadania seja parte de seu âmago mais profundo. (sic) [12]


Sendo assim, além do fato de que a população em situação de vulnerabilidade tem efetiva possibilidade de acesso à justiça, existe a situação especial de que os acadêmicos são enriquecidos com um leque maior de situações-problema a ser desvendado. E, por último e talvez a mais importante tarefa, a formação para a cidadania, que chega à sociedade oferecendo conhecimento de ponta em termos de Direito à sociedade civil.


Conhecimento não se distingue apenas pela habilidade racional analítica, seu cerne é principalmente político, como sempre imaginou Foucault, já que sua potencialidade disruptiva se abre no duplo impacto epistemológico (desconstrói e reconstrói saberes) e político (desconstrói e reconstrói práticas históricas). [13]


Na relação Curso de Direito e Sociedade Civil esta não era a única necessidade/possibilidade. Com o desenvolvimento do terceiro setor, a sociedade civil viu surgir uma demanda social crescente em assessorias jurídicas aptas a trabalhar com entidades cujas finalidades seriam não econômicas ou financeiras.


Do relato das próprias entidades, constata-se muitas vezes a procura e a ausência de tutela por parte dos habituais serviços assistência judiciária gratuita, uma vez que as mesmas não se enquadravam no perfil dos “direitos subjetivos individuais”. [14]


Atento a esta demanda, o Projeto de Curso Jurídico instituiu um projeto prático de ensino, de caráter permanente, buscando atender as demandas de cidadania que se originavam na forma conjunta ou coletiva, numa ótica inclusiva, solidarista e de efetiva implementação dos Direitos Humanos e Fundamentais, na forma como se estabeleceu a partir da alteração axiológica constitucional.


Ao final das contas, trata-se de montar a universidade sobre a noção de aprendizagem reconstrutiva política, deixando para trás a tradição reprodutivista do ‘monte de salas de aula’, passando para a idéia mais criativa de ‘laboratório de aprendizagem’. Vamos à Universidade para aprender, pesquisar, elaborar, não para apenas assistir a aulas.[15]


A Constituição Federal de 1988 alterou substancialmente o Ordenamento Jurídico brasileiro, provocando uma verdadeira Virada Copernicana. Tratando-se de uma Carta Democrática e de viés social instituiu os valores e princípios que devem reger toda a Ordem Jurídica, instituindo:


Um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias(…) [16] 


Logo, no projeto constitucional está a preocupação com a garantia de efetivação dos Direitos Sociais e Individuais, além da positivação dos valores da igualdade e da justiça como valores supremos de todo o Ordenamento.


Ao lado disso, a eleição da Dignidade da Pessoa Humana como princípio estruturante, traz implicações para além dos anais dogmáticos. As questões práticas e pragmáticas referentes à efetiva construção de uma sociedade mais fraterna e pluralista perpassam as preocupações com as formas de implementação destes Direitos.


A Carta Constitucional assegura no seu art. 5, inciso XXXV a garantia de acesso à justiça, entretanto, para além de uma noção clássica acerca do tema, o que asseguraria o acesso ao poder judiciário em caso de litígio, o NAP preocupa-se com a prevenção destes além disso, com um espectro do acesso à justiça que se impõe para além do poder judiciário, no efetivo acesso às políticas públicas de fomento, bem como na assessoria jurídica na efetivação direta dos direitos fundamentais sociais ou individuais homogêneos.


Partindo de uma visão mais abrangente da garantia constitucional do acesso à justiça, que envolva para além das relações em situações processualizadas, construiu-se um espaço de discussão efetiva de situações sociais relevantes, tais como a proteção à criança e ao adolescente, a questão do meio ambiente, as questões referentes à regularização fundiária, a questão étnica, incluindo discussões sobre a situação das comunidades quilombolas


Com o objetivo de superação da lógica do vencedor e do vencido, e do eterno litigio, decorrente da idéia de judicialização das relações sociais,[17] o NAP visa atuar de modo preventivo, antes mesmo da instauração do conflito. Por este motivo, vincula-se à assessoria jurídica e não assistência judiciária estrito senso.


Neste sentido, através das demandas da sociedade civil que chegaram até o Curso de Direito, ou mesmo da constatação de lacuna na assessoria jurídica de determinados eixos elegeram-se Projetos de Interesse. Dentre eles estão Projeto “Proteção da Criança e do Adolescente”, “Regularização Fundiária ou Direito de Propriedade”, “Oficinas Direitos e Deveres dos portadores de lesão por esforço repetitivo/DORT”, “Projeto Responsabilidade Social” e Projeto Direto Ambiental”, além disso, reservou-se um espaço às demandas da Sociedade Civil Organizada.


2.- Das expectativas iniciais, andamentos e planejamento


Quando de sua formação, o NAP pretendeu firmar-se como órgão de atuação na assessoria jurídica extrajudicial, entretanto, com o desenvolvimento dos trabalhos, verificou-se que há uma necessidade social que está para além de uma simples assessoria extrajudicial, mas enquadra-se em um conceito mais amplo de acesso à justiça.


Faltam informações à população. O número de cadastramentos em órgãos é exagerado e a burocracia exigida para alcançar as mais simples políticas públicas também o é. Ademais, o prazo de validade de cada certidão ou registro é exíguo, o que faz com que uma entidade que esteja em vias de obtenção do seu terceiro cadastramento perante algum dos órgãos políticos, possa, antes mesmo de receber a certidão deste, ter de renovar os dois primeiros.


Esta constatação advém dos procedimentos realizados pelos acadêmicos, que, no decorrer de 2007 apresentaram como maior grau de dificuldade a burocracia no alcance das políticas públicas.


Ademais, 60% dos acadêmicos aponta como grande dificuldade no acesso aos direitos sociais e coletivos diz respeito à falta de informação por parte das lideranças, que se dirigem aos locais de cadastramentos/registros, obtém informações parciais quando não equivocadas tendo de retornar por inúmeras vezes ao local. Tais condutas obstaculizam o efetivo acesso à justiça.


Conforme referido no relatório parcial do NAP elaborado ao final de 2006/1, que passa a integrar o presente, foram previstas atividades nos seguintes projetos: “Proteção da Criança e do Adolescente”, “Regularização Fundiária ou Direito de Propriedade”, “Oficinas Direitos e Deveres dos portadores de lesão por esforço repetitivo/DORT”, “Projeto Responsabilidade Social” e Projeto Direto Ambiental”, além disso, reservou-se um espaço às demandas da Sociedade Civil Organizada.


Todavia, em agosto de 2007, através de discussão com os membros integrantes do NAP, verificou-se a necessidade de atuação na área de etnia, uma vez que se trata de demanda crescente, concebida, muitas vezes através de raciocínio de senso comum, sem que se estabeleçam as devidas críticas e atenção científica da área do Direito. Neste sentido, ingressou no Núcleo um novo grupo de trabalho, ocupado com as questões de etnia, o que envolveria a questão das comunidades quilombolas. Para o ano de 2008, o NAP estuda convênio com a Organização Não Governamental COHRE,[18] Centre On Housing Rights and Evictions, sediada em Genebra, na Suíça, cujo termo de convênio acompanha o presente. Em atividade na Comunidade Manuel Barbosa, contou-se ainda com o apoio da FUNASA – Fundação Nacional de Saúde.


Sendo assim, o NAP, no momento atual conta com os seguintes parceiros, dentre outros cujos vínculos de trabalho ainda estão em construção:


– ASAFOM (Associação do Fórum Municipal da Criança e do Adolescente de Porto Alegre)


– Curso de Terapia Ocupacional IPA


– AVIDA


– Comunidades Quilombolas: Silva, Guaranha, Manuel Barbosa e Areal;


– NEOCHEN


– FUNASA


– Comunidades da Vila Orfanatrófio e do Jardim Marabá


– Associação das Educadoras Populares


3.- Análise Crítico-Metodológica do trabalho desenvolvido:


3.1.- Considerando a necessidade de reflexão sobre a prática que está sendo desenvolvida, o grupo concluiu que seria necessária a construção de um grupamento de dados sobre as efetivas atuações do ano de 2007. Entretanto, com a finalidade de apresentar uma análise qualificativa e não somente quantificativa, foi sugerido a elaboração de perguntas motivadoras que pudessem apresentar dados das vivências individualizadas e não somente dos trabalhos desenvolvidos pelo grupo.


Portanto, através das quatro questões indicadas foram levantados os gráficos contendo informações sobre a chegada e permanência no projeto, o interesse e a motivação pelo mesmo, juntamente com os aspectos relevantes e as maiores dificuldades encontradas pelos acadêmicos.


– Relatar como chegaram até o NAP e por que decidiram ficar?


– Analisar criticamente os procedimentos realizados?


– Indique qual a importância que se dá ao trabalho e por quê?


– Houve alguma transformação na sua vida a partir do projeto? Qual a contribuição?


Cada acadêmico apresentou individualmente as respostas a estes questionamentos e o grupo sintetizou os resultados nos seguintes indicadores percentuais:


1.Como chegaram até o NAP


a.Convite de alunos – 36%


b.Convite de professores – 54%


c.Lançamento dos Projetos de Ensino, Pesquisa e Extensão – 45%


d.Para dar continuidade a trabalho de pesquisa anterior – 18%


2.Interesse e Motivação pelo NAP


a.Semestres iniciais podem participar – desafios – 9%


b.Questões sociais, demandas coletivas, maior eficácia dos Direitos Humanos – 54%


c.Aquisição de Conhecimento Técnico – 45%


e..Contato direto com a comunidade – 18%


f.Estrutura física para desenvolvimento das ações – 36%


g.Trabalho de pesquisa – 18%


h.Trabalho mais produtivo, com resultados práticos – 9%


i.Teoria e prática jurídica – 45%


3.Aspectos relevantes no projeto:


a.Convívio e crescimento com semestres mais avançados –27%


b.Opcional, não obrigatório, muito atrativo e importante para as comunidades – 63%


c.Gosto pelo estudo, leituras, pesquisa e conhecimento técnico – 81%


d.Nova compreensão sobre a regularização de associações e trabalho com demandas sociais e coletivas – 72%


e.Vivência prática com orientação e suporte técnico – 45%


f.Conexão entre teoria, prática e realidade social – 54%


g.Realização pessoal e profissional – 90%


h.Espaço físico disponibilizado (sala, computador, telefone) – 9%


i.A esperança e satisfação do cliente ou das entidades quando se finaliza o atendimento – 18%


j.Desenvolvimento da responsabilidade diante das entidades – 9%


k.Revisão do conceito de trabalho em equipe  – 9%


4.Dificuldades encontradas


a.Medo de atuar e não corresponder à responsabilidade – 9%


b.Burocracia e demora nos procedimentos administrativos – 36%


c.Informações desencontradas nos diversos setores da administração pública – 18%


d.Aflição diante da difícil situação de vulnerabilidade em que se encontram as comunidades – 9%


e.Dificuldade financeira das entidades- 18%


f.Falta de conhecimento das entidades sobre aquilo que procuram regularizar – 9%


g.Demandas não encerradas por falta de interesse das próprias comunidades.- 9%


Os resultados acima identificados foram retirados dos relatórios apresentados, tomando por base os questionamentos. Para o ano que segue, o grupo organizará um formulário padrão para este levantamento de dados de forma que se possa chegar a resultados mais significativos de perfil de trabalho.


Entretanto, a análise de alguns dos dados se faz importante para a reflexão sobre a prática realizada.


O meio mais eficaz para o convite aos alunos da participação é o docente, e em segundo lugar, os próprios acadêmicos. Esta constatação densifica a idéia de que em tempos de ensino à distância, a presença do professor enquanto agente de mobilização permanece sendo a mais eficiente.[19]


O maior foco de interesse pelo projeto identificado através dos relatórios pelos acadêmicos, é o envolvimento com as questões sociais, demandas coletivas, e, por conseqüência uma maior eficácia pragmática dos Direitos Humanos, o que encontra ressonância com os valores Constitucionais e com as idéias de Paulo Bonavides, que chega a mencionar a construção de um Estado Social Democrático de Direito da Sociedade.


Um Estado, certamente, da economia de mercado, embora debaixo de alguma tutela ou dirigismo, que pouco ou nada lhe afetava as estruturas, posto que interditasse determinados espaços da ordem econômica, subtraídos ao livro jogo das forças produtivas. Era assim o Estado Social do Estado e não o Estado Social da sociedade. (…) O Estado Social da sociedade, que é, sobretudo, o Estado Social dos Direitos Fundamentais (…) é o Estado social em que o Estado se avulta menos e a Sociedade mais; onde a liberdade e a igualdade já não se contradizem com a veemência do passado; onde as diligências do poder e do cidadão convergem por inteiro, para transladar no campo da concretização, direitos, princípios e valores que fazem o homem se acercar da possibilidade de ser efetivamente livre, igualitário e fraterno. A esse Estado pertence também a revolução constitucional  do Segundo Estado de Direito, onde os direitos fundamentais conservam sempre seu primado. Sua observância faz a legitimidade de todo o ordenamento jurídico.[20]


Em segundo lugar está a oportunidade de aquisição de conhecimento técnico através da práxis, desafiando a tradicional dicotomia entre teoria e prática.


Dentre os pontos relevantes do projeto, o tópico mais mencionado pelos estudantes foi a realização pessoal e profissional e em segundo lugar gosto pelo estudo, leituras, pesquisa e conhecimento técnico, seguido do acréscimo de uma nova compreensão sobre a regularização de associações e trabalho com demandas sociais e coletivas.[21]


Nos questionamentos referentes às dificuldades, embora poucos relatórios os apresentasse de forma clara e concisa a identificação, a burocracia e a demora dos procedimentos administrativos toma relevo. Sobre este tema, entende-se também como papel político dos acadêmicos de Direito, o encaminhamento de pareceres e solicitações aos órgãos competentes, explicitando as dificuldades encontradas e sugerindo meios alternativos para supressão destas dificuldades.


Considerando que os maiores desafios localizam-se na burocracia e demora nos procedimentos, dá-se ensejo a outros questionamentos, tais como os limites da função estatal e a filtragem no acesso aos recursos de políticas públicas, o que será questionado a partir do trabalho em 2008.


Por fim, cabe destacar que o perfil Humanista e de inclusão forçosamente delineado no corpo Constitucional de 1988 que deve encontrar eco nas diversas instituições que pretendem ensino jurídico.


3.2.- Além dos relatórios individuais, foram levantados outros dados pelo grupo de trabalho. Estas informações dizem respeito aos atendimentos efetivos e à população atendida em cada projeto.


– Número de entidades atendidas: 136


– Destas tem-se comunidades oriundas do convênio ASAFOM e demais demandas da sociedade civil, no seguinte número:


ASAFOM: 64


SOCIEDADE CIVIL: 18, sendo que estas dividem-se em


– Associações de moradores: 4


– Cooperativas: 2


– Comunidades remanescentes de quilombos: 4


– Associações com interesse comum: 8


Dos atendimentos realizados encerraram-se 24.


3.2.1.- Projeto “Proteção da Criança e do Adolescente”:


– 63 entidades contatadas


– 19 atendimentos encerrados


– 4 procedimentos jurídicos diferenciados que incluem a regularização dos atos constitutivos, a retirada de CNPJ, parecer sobre utilidade pública federal, regularização perante a SMED, registro no CMDCA.


3.2.2.- Regularização Fundiária ou Direito de Propriedade


– 2 comunidades atendidas:


– Orfanatrófio: 85 famílias – em fase de processo judicial e reuniões administrativas na tentativa de uma conciliação e


– Jardim Marabá: 600 famílias – em fase de procedimento administrativo junto à prefeitura municipal, secretarias e síndico da massa falida sedizente proprietária da área.


Ressalta-se neste ponto o projeto de 2007 de inclusão do convênio com a ONG COHRE – Centro pelo Direito à moradia, contra despejos, que realizará terá importante conexão entre este projeto e o projeto referente à etnia.


3.2.3.- Oficinas Direitos e Deveres dos portadores de lesão por esforço repetitivo/DORT”


– 2 comunidades atendidas:


– AVIDA


– Grupo IPA de portadores de LER/DORT


Após ministrar 3 oficinas sobre a temática para as comunidades e elaborar parecer sobre a possibilidade da formação de uma cooperativa para viabilizar renda, o grupo participou de seminário sobre a temática, tendo acompanhado as duas comunidades em suas discussões cotidianas. No momento, encontram-se elaborando projeto social com a finalidade de recebimento de recurso oriundo do Ministério da Saúde e do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador, com a finalidade da implantação de oficinas terapêuticas, passíveis de conversão em benefícios aos lesionados.


3.2.4.- Projeto Responsabilidade Social


Houve visita ao Centro de Bancos sociais criados e mantidos pelo sistema FIERGS e estuda-se a possibilidade de convênio com o banco de projetos sociais, para viabilizar aos acadêmicos a convivência com um sistema de intervenção social por parte dos empresários.


Foi elaborado trabalho apresentado na semana acadêmica sobre a temática.


3.2.5.- Projeto Direito Ambiental


Em fase de estruturação, os acadêmicos estão comprometidos no acompanhamento da ONG NEOCHEN e em fase de montagem de estudo científico acerca das bases do Direito Ambiental.


Dentre as expectativas para o próximo ano estão o envolvimento do grupo no Seminário interno, bem como a apresentação de resultados de pesquisa em eventos de outras instituições.


3.2.6.- Projeto Efetivação da igualdade


Etnia:


Tendo surgido somente no segundo semestre no ano de 2006, o projeto tem por objetivo discutir a questão da igualdade, principalmente na questão da etnia com um grupo de trabalho voltado ao atendimento das comunidades remanescentes de quilombos.


Juntamente com estes acadêmicos o grupo discute a questão da igualdade racial, inclusive com a questão das quotas na Universidade, tendo participado com artigo científico nesta temática no Concurso AJURIS de Direitos Humanos.


Com o objetivo de ampliar o atendimento às comunidades quilombolas, está em fase de estudo de um convênio com a ONG COHRE – Centro pelo Direito à Moradia Contra os Despejos.


Sexo:


Para 2008, o grupo de trabalho tem por objetivo compreender as questões referentes à desigualdade e preconceitos por sexo, com a finalidade de traçar metas para assessoria jurídica coletiva desta população.


Para tanto, formou-se um sub-grupo que, neste momento esta contatando as entidades que trabalham com esta temática. 


Sobre este tema, o artigo vitorioso do prêmio Direitos Humanos da Ajuris, em 2007, foi realizado pelo Acadêmico Gulherme Wünsch, em que questionou a possibilidade jurídica do casamento entre homossexuais.


3.2.7.- Outras demandas da sociedade civil


Foram atendidas outras entidades, dentre as quais a Associação dos Celíacos do Brasil/RS, tendo-se prestado atendimento, inclusive, para a elaboração da FENACELBRA, Federação das associações, em nível de Brasil.


Por fim, destaca-se que para a superação do ensino bancário, tão criticado por Paulo Freire,[22] há de ser deslocada a concepção de ensino da sala de aula para a vida. Há de se desenvolver atividades que viabilizem a prática jurídica e a construção da cidadania, incluindo-se o outro como aquele que tem algo a ensinar.


Para isso, o docente precisa abandonar a concepção de dono do saber e dispor-se a facilitar a aprendizagem. Descer do pedestal imaculado das relações de poder e estar disposto a trocar, compartilhar. 


 


Referências ibliogáficas

CARDOSO, Simone Tassinari, Do contrato parental à siocioafetividade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

DEMO, Pedro, Universidade, Aprendizagem e Avaliação, Porto Alegre: Mediação, 2004.

ENRICONE, Délcia, Ser professor, Porto Alegre: Edipucrs, 2004

ESTEVES, João Luiz Martins, Cidadania e Judicialização dos conflitos sociais, disponível em http://www.uel.br/cesa/direito/doc/estado/artigos/constitucional/Cidadania%20e%20Judicializa%C3%A7%C3%A3o%20dos%20Conflitos%20Sociais.pdf, capturado em 10.01.2007.

FACHIN, Luiz Edson, Teoria Crítica do Direito Civil, Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

MOSQUERA, Juan. Educação,novas perspectivas.Porto Alegre: Sulina, 1980.

_______________. Ensino uma tarefa de reflexão. Porto Alegre: Sulina, 1977.

PORTO, Sérgio Gilberto, As garantias do Cidadão no Processo Civil, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003.

SARLET, Ingo W. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na CF 88. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

TEPEDINO, Gustavo, Temas de Direito Civil – Tomo II. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

 

Notas:

[1] Chegando a causar uma verdadeira “Revolução Copernicana”, nas palavras de Luiz Edson Fachin, Repensando os Fundamentos do Direito Civil Brasileiro.

[2] SARLET, Ingo W. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na CF 88. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004.

[3] “É aceita pacificamente, hoje, a idéia de que a educação é algo permanente e que a aprendizagem dura a vida inteira. Ninguém está totalmente formado ou estruturado, e mais ainda, a educação permanente pode possibilitar a visão mais ampla e nítida de uma sociedade evolutiva, voltada  para o bem comum e para sua própria consciência crítica e criativa. Muitas são as possibilidades que se oferecem para a educação como ciência em um mundo em mudança.” (MOSQUERA, Juan. Educação,novas perspectivas.Porto Alegre: Sulina, 1980).

[4] MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo.

[5] “A respeito da formação normal se haverá de considerar o ensinar a pensar como uma ajuda essencial para a aprendizagem formativa. A instrução deverá educar para um pensar que seja adequado às coisas. Em última análise deverá ser pensamento-no-fazer.” (MOSQUERA, Juan. Ensino uma tarefa de reflexão. Porto Alegre: Sulina, 1977.)

[6] “É o legado deste sistema que teima em recusar a travessia do indivíduo ao sujeito e do sujeito à cidadania.” (FACHIN, Luiz Edson, Teoria Crítica do Direito Civil, Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 11)

[7] CARDOSO, Simone Tassinari, Do contrato parental à siocioafetividade. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004, p. 47 – 58 – “A revolta dos fatos contra o Código”

[8] Gustavo Tepedino, Temas de Direito Civil, p. 451.

[9] “A sensação de desamparo por que passam os estagiários que, literalmente, jogados ao mar tempestuoso da sala de aula no final do curso, deparam-se então com a complexidade das situações reais da prática (…) para as quais encontram-se, na maioria das vezes bastante despreparados – a exigir-lhes capacidade de avaliação, intuições oportunas e prontas decisões.” (BOCCHESE, Jocelyne da Cunha, O professor e a construção de competências, in ENRICONE, Délcia, Ser professor, Porto Alegre: Edipucrs, 2004, p. 26.) 

[10] CARPENA, Márcio Louzada, Da garantia da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional e o Processo Contemporâneo, in PORTO, Sérgio Gilberto, As garantias do Cidadão no Processo Civil, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 11-30.

[11] CARPENA, Márcio Louzada, Da garantia da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional e o Processo Contemporâneo, in PORTO, Sérgio Gilberto, As garantias do Cidadão no Processo Civil, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 11-30.

[12] DEMO, Pedro, Universidade, Aprendizagem e Avaliação, Porto Alegre: Mediação, 2004,  p. 9.

[13] DEMO, Pedro, Universidade, Aprendizagem e Avaliação, Porto Alegre: Mediação, 2004, p.11.

[14] FACHIN, Luiz Edson , Teoria Crítica do Direito Civil, Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 9.

[15] DEMO, Pedro. Universidade, aprendizagem e avaliação. Porto Alegre: Mediação, 2004.p. 39.

[16] Preâmbulo da Constituição da República Federativa do Brasil.

[17] ESTEVES, João Luiz Martins, Cidadania e Judicialização dos conflitos sociais, disponível em http://www.uel.br/cesa/direito/doc/estado/artigos/constitucional/Cidadania%20e%20Judicializa%C3%A7%C3%A3o%20dos%20Conflitos%20Sociais.pdf, capturado em 10.01.2007.

[18] O COHRE está baseado em Genebra, Suíça, e desenvolve três Programas Regionais: Programa COHRE África, Pro grama Ásia-Pacífico e Programa das Américas, este último com sede em Porto Alegre, RS, Brasil. Maiores informações sobre o COHRE podem ser acessadas em nosso site institucional “ www.cohre.org“.

[19] GRILLO, Marlene. O professor e a docência: o encontro com o aluno, p. 73-89.

[20] BONAVIDES. Paulo, Do Estado Liberal ao Estado Social, p. 19.

[21] Sobre o tema, Juan Mosquera, em sua obra Ensino, uma tarefa de reflexão: afirma que “no que diz respeito à evolução afetiva, podemos manifestar que é correta quando simultaneamente acontecem renúncias às nossas dificuldades para ajudar as pessoas. Autonomia, fim de toda a evolução afetiva (…) trata de libertar as outras pessoas e não torná-las dependentes. Logo, ao desenvolvimento de atividades que proporcionem aos acadêmicos de Direito uma vinculação afetiva com o desenvolvimento da autonomia responde melhor aos anseios da formação de um profissional habilitado do que o “aulismo” característico dos cursos jurídicos. P. 79.

[22] Pedagogia da Autonomia.


Informações Sobre o Autor

Simone Tassinari Cardoso

Professora de Direito Civil do Centro Universitário Metodista IPA, coordenadora do NAP – Núcelo de Assessoria Jurídica Popular do IPA, doutoranda em Dirieto pela PUCRS, professora da Escola da AJURIS.


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