A natureza (constitucional?) do princípio do duplo grau de jurisdição no direito processual brasileiro

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Resumo: O direito ao duplo grau de jurisdição orienta o sistema processual brasileiro, onde são previstos inúmeros recursos e meio de impugnação de decisões judiciais. Ainda assim, o texto constitucional não prevê expressamente esse direito. No entanto, a previsão de recursos no texto constitucional, inclusive em relação a decisões em primeiro grau de jurisdição, com a consequente admissão da necessidade de confirmação/revisão das decisões judiciais, é um forte indicativo da natureza constitucional do princípio do duplo grau de jurisdição.

Palavras chave: Recurso. Constitucional. Duplo. Grau. Jurisdição.

Abstract: The right of appeal to the guides the Brazilian legal system, where numerous resources and means of challenging judgments are predicted. Still, the Constitution does not expressly provide that right. However, the estimates of resources in the Constitution, including in relation to decisions in the first degree of jurisdiction, with the consequent recognition of the need confirmation / revision of judgments, is a strong indicator of the constitutional principle of double jurisdiction .

Keywords: Resource. Constitutional. Double. Degree. Jurisdiction.

Sumário: Introdução. 1. A natureza constitucional do princípio do duplo grau de jurisdição.  Conclusão. Referências.

Introdução

O duplo grau de jurisdição é princípio que norteia o direito processual brasileiro, no qual são previstos inúmeros recursos e medidas passíveis de utilização na impugnação das decisões judiciais. Sua justificativa encontra amparo em razões de falibilidade humana (do julgador), garantia de justiça e segurança jurídica aos pronunciamentos jurisdicionais, assim como no princípio da igualdade, do qual decorre a ideia de se garantir decisões iguais a situações juridicamente idênticas.

Nesse contexto é de grande valor a definição da natureza do direito ao duplo grau de jurisdição, pois essa análise torna possível a identificação da extensão, dos limites e da legitimidade eventuais restrições a esse direito no sistema processual vigente.

Com esse intuito analisar-se-á se o duplo grau de jurisdição é princípio inerente à sistemática processual delineada na constituição.

1. A natureza constitucional do princípio do duplo grau de jurisdição

O direito ao duplo grau de jurisdição orienta o sistema processual brasileiro, onde são previstos inúmeros recursos e meio de impugnação de decisões judiciais.

Ainda assim, o texto constitucional não prevê expressamente esse direito. Inclusive, a doutrina e jurisprudência entendem que o inciso LV do art. 5º da CRFB/88 – que estabelece que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes – não assegura o direito ao duplo grau de jurisdição.

Por outro lado, há autores que defendem que o direito ao duplo grau de jurisdição decorre implicitamente do texto constitucional, especialmente em razão do escalonamento do Poder Judiciário em tribunais, além do fato de alguns recursos encontrarem expressa previsão constitucional.

O STF, a seu turno, tem assentado que não há um direito ao duplo grau de jurisdição, salvo nos casos expressamente garantidos pela constituição, como, por exemplo, o do recurso ordinário constitucional, que devolve a matéria à instância imediatamente superior. (MENDES. 2012. p. 444).

A esse respeito, Ingo Wolfgang Sarlet defende que a Constituição não consagra o direito ao duplo grau de jurisdição no processo civil. (SARLET. 2013. p. 766).

A ausência de previsão expressa, bem como a previsão tópica de algumas espécies recursais não significa necessariamente que o duplo grau de jurisdição não encontra fundamento constitucional. Na verdade, a doutrina e jurisprudência reconhecem a existência de princípios e direitos constitucionais implícitos, o que pelo ao menos demanda uma investigação minuciosa acerca da previsão constitucional do direito ao duplo grau de jurisdição.

Nesse contexto, a previsão de recursos no texto constitucional, inclusive em relação a decisões em primeiro grau de jurisdição, com a consequente admissão (ainda que implicitamente) da necessidade de confirmação/revisão das decisões judiciais, é um forte indicativo da natureza constitucional do princípio do duplo grau de jurisdição.

Não se quer dizer que esse direito é absoluto, tampouco que toda decisão judicial é passível de recurso. Na realidade, o fato de existirem decisões judiciais que não admitem qualquer recurso – ao menos a outra instância – não exclui a natureza constitucional do direito ao duplo grau de jurisdição, pois os direitos constitucionais admitem restrições fundadas nos postulados da proporcionalidade e razoabilidade.

Por outro lado, mesmo inexistindo expressa previsão constitucional, a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José de Costa Rica), no art. 8°, n. 2, alínea h, estabelece que toda pessoa acusada de um delito tem como garantia mínima do direito de recorrer da sentença a juiz ou tribunal superior. Consagra, dessa forma, o direito ao duplo grau de jurisdição no processo penal.

Nesta perspectiva, a ordem jurídica brasileira prevê expressamente o princípio do duplo grau de jurisdição, ao menos em matéria processual penal, já que a convenção foi incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto presidencial n° 678/1992.

Sarlet afirma, sobre esse tema, que "a Convenção Interamericana de Direitos do Homem prevê expressamente o direito ao duplo grau de jurisdição no processo penal, de modo que é possível afirmá-lo como elemento essencial para conformação do processo justo no âmbito penal".  (SARLET. 2013. p. 766).

Quanto à natureza desse direito, conforme o entendimento do Supremo Tribunal Fereral quanto às normas da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José de Costa Rica), pode-se defender sua supralegalidade, isto é, em patamar imediatamente inferior a Constituição, mas acima da legislação ordinária.

Não obstante, acerca da natureza das normas internacionais, Flávia Piovesan defende que os tratados internacionais de direitos humanos incorporados no Brasil antes da vigência da emenda constitucional n° 45/2004 são materialmente e formalmente constitucionais, por força do §2° do art. 5° da CRFB/88. Assim, como a Convenção Americana de Direitos Humanos foi incorporada em 1992, inclusive o art. 8°, n. 2, alínea h, que trata do direito ao duplo grau de jurisdição, sua natureza é de norma constitucional. (PIOVESAN. 2012. p. 129).[1]

Importa esclarecer que essa previsão não impede, evidentemente, eventuais restrições e limitações a esse direito, como ocorre, por exemplo, no caso de competência penal originária do STF, em que a garantia do processo justo decorre do fato da causa ser julgada pela Corte de maior escalão no direito brasileiro.

Gilmar Mendes, nesse sentido, destaca que "não se reconhece um direito a uma contestação continuada e permanente, sob pena de se colocar em xeque um valor da própria ordem constitucional, o da segurança jurídica". (MENDES. 2012. p. 444).

Assim, pelo exposto, o princípio do duplo grau de jurisdição tem natureza constitucional seja implícita ou expressa, o que não impede, contudo, a existência de restrições a esse direito.

Conclusão

O direito ao duplo grau de jurisdição orienta e informa toda a sistemática processual brasileira. Neste sentido, há recursos cuja previsão é expressa no próprio texto constitucional, inclusive de decisões em primeiro grau de jurisdição.

Apesar dessa constatação, não há expressa previsão constitucional ao direito ao duplo grau de jurisdição. No entanto, a ausência de previsão expressa não significa que o duplo grau de jurisdição não encontra fundamento constitucional. Na verdade, da existência de recursos previstos na Constituição infere-se a admissão, ainda que implícita, da necessidade de confirmação/revisão das decisões judiciais, o que confirma a natureza constitucional desse direito.

 

Referências
MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 7. Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2012.
PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 13 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.
SARLET, Ingo; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013.
 
Notas:
[1] A referida autora entende que após a EC 45/2004 esses tratados são materialmente constitucionais, salvo se incorporados na forma do §3° do art. 5° da CRFB/88, quando seriam formal e materialmente constitucionais.

Informações Sobre o Autor

Luciano Aragão Santos

Bacharel em direito pela Unidade de Ensino Superior Dom Bosco, Analista Processual do Ministério Público da União, Pós-Graduando em Direito Aplicado ao MPU, pela Escola Superior do Ministério Público da União – ESMPU; e especialista em direito e processo do Trabalho pela Universidade Anhaguera-Uniderp


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