Resumo: Este artigo tem por objetivo demonstrar uma análise histórica das Constituições brasileira que está implicitamente ligada às Constituições escritas e rígidas dos Estados Unidos da América, em 1787, e da França, em 1791. Após a Segunda Guerra, se percebeu que o positivismo e a legalidade estrita poderiam justificar atos bárbaros e arbitrariedades, já que não havia uma preocupação com o conteúdo do direito, mas sim a sua forma, até este período, a Constituição era vista muito mais como um documento político do que propriamente como um documento jurídico/vinculante/obrigatório. O constitucionalismo contemporâneo é marcado pela ascensão institucional do poder judiciário. A “judicialização” e o ativismo judicial são temas que atualmente mobilizam não apenas a comunidade jurídica, como a sociedade em geral.
Palavras-chave: Constituições; Histórico; Evolução; Direito Constitucional.
Abstract: This article aims to demonstrate a historical analysis of the Brazilian Constitutions that is implicitly linked to the written and rigid Constitutions of the United States of America in 1787 and of France in 1791. After World War II, it was realized that positivism and legality could justify barbaric acts and arbitrariness, since there was no concern with the content of the law, but rather with its form, until this period the Constitution was seen much more as a political document than as a legal / binding / required. Contemporary constitutionalism is marked by the institutional rise of the judiciary. "Judicialisation" and judicial activism are themes that currently mobilize not only the legal community, but also society in general.
Keywords: Constitutions, Historic, Evolution, Constitutional Right.
Resumen: Este artículo tiene por objetivo demostrar un análisis histórico de las Constituciones brasileña que está implícitamente ligada a las Constituciones escritas y rígidas de los Estados Unidos de América en 1787 y de Francia en 1791. Después de la Segunda Guerra se percibió que el positivismo y la legalidad estrictamente podrían justificar actos bárbaros y arbitrariedades, ya que no había una preocupación con el contenido del derecho, sino su forma, hasta este período, la Constitución era vista mucho más como un documento político que propiamente como un documento jurídico / vinculante / obligatorio. El constitucionalismo contemporáneo está marcado por el ascenso institucional del poder judicial. La "judicialización" y el activismo judicial son temas que actualmente movilizan no sólo a la comunidad jurídica, como a la sociedad en general.
Palabras clave: Constituciones, Histórico, Evolución, Derecho Constitucional.
Sumário: 1. Introdução. 1 – Constituição de 1824 Brasil Império. 1.1 Características. 1.2 Consequências. Organograma do Poder político de acordo com a Constituição de 1824. 2 – Constituição de 1891 Brasil República. 2.2 Características. 2.3 Consequências. 3 – Constituição de 1934 Segunda República. 3.1 Características. 3.2 Consequências. 4 – Constituição de 1937. 4.1 Características. 4.2 Consequências. 5 – Constituição de 1946. 5.1 Características. 5.2 Consequências. 6 – Constituição de 1967. 6.1 Características. 6.2 Consequências. 7 – Constituição de 1988 Constituição Cidadã. 7.1 Características. 7.2 Consequências. 8. Desenvolvimento. 8.1. Neoconstitucionalismo. 8.1.1 A evolução no Brasil. Resumo das Constituições brasileiras. Quadro comparativo da classificação das Constituições Brasileiras. Classificação quanto à forma e sistema de Governo. 3. Considerações finais. Referências
1 INTRODUÇÃO
O Direito Constitucional surge num momento – o final do século XVIII – e num contexto – a Europa Ocidental e a América do Norte – em que o Estado estava firmemente consolidado como forma de organização típica da comunidade política. Como consequência deste fato, a realidade estatal é configurada, desde o princípio, como o marco do Direito Constitucional. Bonavides diz que “a origem da expressão Direito Constitucional, consagrada há mais de um século, prende-se ao triunfo político e doutrinário de alguns princípios ideológicos na organização do Estado Moderno.
O Estado deve ser considerado, deste modo, como uma realidade concreta na base de formação do Direito Constitucional e assim está colocado até este momento.
O conceito de Estado e categorias afins – como o Estado Nacional ou Soberania Estatal – são, pois, conceitos anteriores ao Direito Constitucional.
A origem e a história do Direito Constitucional está associada, portanto, ao surgimento e a evolução do Estado. O Direito Constitucional transforma o Estado / Nação em uma organização jurídico Político fundamental.
Na antiguidade a característica predominante era o governo único para governar as cidades-estados, como no Império Grego e Império Persa até o Império Romano onde tem início uma nova ordem, a ordem estatal.
A característica da Idade Média era o Regime feudal marcado pela concentração de riquezas e pelo predomínio do Direito Romano.
Na Idade Moderna há a predominância do Estado absolutista caracterizado pelo Poder do ilimitado do Rei.
Após a Idade Moderna verifica-se a predominância do Estado Liberal, onde o Estado se encontra sujeito ao império da lei; predomínio da economia privada, do Direito Privado. É com o Estado Intervencionista, em face das múltiplas atividades que o Estado passa a exercer.
A primeira cadeira de Direito Constitucional surge no séc. XVIII por ocasião da Revolução Francesa, com o objetivo de propagar na juventude o sentimento de liberdade, igualdade e fraternidade.
Desde o final da segunda guerra mundial verificou-se, na maior parte dos países, um avanço constitucional sobre o espaço da política tradicional, feita no âmbito do legislativo e do executivo. A supremacia da constituição e a garantia de direitos e garantias fundamentais marcaram o período após a segunda guerra mundial.
Constitucionalismo é como se denomina o movimento social, político e jurídico e até mesmo ideológico, a partir do qual emergem as constituições nacionais. Em termos genéricos e supranacionais, constitui-se parte de normas fundamentais de um ordenamento jurídico de um Estado, localizadas no topo da pirâmide normativa, ou seja, sua constituição. Seu estudo implica, deste modo, uma análise concomitante do que seja constituição com suas formas e objetivos. O constitucionalismo moderno, na magistral síntese de Canotilho "é uma técnica específica de limitação do poder com fins garantir limitação do poder do Estado" (CANOTILHO).[1]
As transformações sociais ocorridas com o constitucionalismo influenciaram de forma definitiva os rumos evolutivos do direito, desconstruindo paradigmas até então existentes, por meio de técnicas hermenêuticas valorativas do conteúdo e da aplicabilidade mais prática das normas, o positivismo veio a surgir assim, como resposta a abstração do direito natural, isto é, uma resposta prática ao idealismo deste.
O marco filosófico do novo direito constitucional é o pós-positivismo, e para sua adequada caracterização é necessário a análise dos dois paradigmas anteriores a ele, o jusnaturalismo e o positivismo. Muitas vezes complementares, o positivismo e o jusnaturalismo abarcam ideias que juntas, ajudam a entender como chegamos ao pós-positivismo e posteriormente a sua crise, instaurada em razão das diversas transformações sociais que levaram à necessidade de rever o papel do Estado na regulação das relações privadas, bem como à revisão dos próprios poderes outorgados.
O ponto central do constitucionalismo contemporâneo é a ascensão institucional do poder judiciário e o espaço que este tem ocupado na política. Atualmente, o Brasil passa por uma crise de identidade entre os poderes legislativo, executivo e judiciário e vem deixando de lado a rígida tripartição de poderes estabelecida por Montesquieu, especialmente, quando o judiciário invade terreno de atuação específica do executivo e principalmente do legislativo.
A expansão judicial tem suscitado críticas e preocupações, gerando inicialmente uma repudia a possibilidade do Poder Judiciário substituir o legislador nas lacunas existentes no ordenamento jurídico, por ser, a tarefa de concretização da Constituição confiada ao Poder Legislativo. Assim, por faltar legitimidade democrática ao poder judiciário, na medida em que juízes e tribunais não têm a condescendência popular por meio da votação, em uma análise preliminar, tanto a divisão de poderes proposta por Montesquieu quanto o postulado da Democracia obstam que o Judiciário possa suprir lacunas eventualmente existentes.
Na história das Constituições brasileiras, há uma alternância entre regimes fechados e mais democráticos, com a respectiva repercussão na aprovação das Cartas, ora impostas, ora aprovadas por assembleias constituintes.
1ª – Constituição de 1824 (Brasil Império)
Apoiado pelo Partido Português, constituído por ricos comerciantes portugueses e altos funcionários públicos, D. Pedro I dissolveu a Assembleia Constituinte em 1823 e impôs seu próprio projeto, que se tornou a primeira Constituição do Brasil. Apesar de aprovada por algumas Câmaras Municipais da confiança de D. Pedro I, essa Carta, datada de 25 de março de 1824 e contendo 179 artigos, é considerada pelos historiadores como uma imposição do imperador.
Entre as principais medidas dessa Constituição, destaca-se o fortalecimento do poder pessoal do imperador, com a criação do Poder Moderador, que estava acima dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. As províncias passam a ser governadas por presidentes nomeados pelo imperador e as eleições são indiretas e censitárias. O direito ao voto era concedido somente aos homens livres e proprietários, de acordo com seu nível de renda, fixado na quantia líquida anual de cem mil réis por bens de raiz, indústria, comércio ou empregos. Para ser eleito, o cidadão também tinha que comprovar renda mínima proporcional ao cargo pretendido.
Essa foi a Constituição com duração mais longa na história do país, num total de 65 anos.
1.1) Características:
– A monarquia era a forma de governo de caráter hereditário.
– A religião católica era a religião oficial na época.
– O direito de petição era garantido; todo cidadão poderia apresentar, por escrito, reclamações, queixas ou petições, e expor qualquer infração da Constituição Imperial, requerendo perante a autoridade competente responsabilidade dos infratores.
– Além dos três poderes (Executivo, Judiciário e Legislativo) foi criado um novo poder, o Moderador, por Dom Pedro I, conforme o art. 10.
Poder Moderador: Era um poder autoritário que conferia a D. Pedro I poderes como chefe supremo da Nação, além de dar ao Imperador a competência para intervir nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. A pessoa do Imperador é inviolável e sagrada; ele não está sujeito a responsabilidade alguma, conforme o art. 99 previa.
Além de subjugar os três poderes, também instituiu o regime de Padroado, subjugando o poder da igreja católica ao poder do imperador.
O Senado era composto de membros vitalícios, escolhidos pelo próprio Imperador, constituindo uma representação da Aristocracia Imperial.
1.2) Consequências:
– Provocou diversas reações armadas, como exemplo a Revolução Pernambucana de 1824, que proclamou a Confederação do Equador.
– O duelo entre a Nação e o Imperador culminou com a abdicação deste, a 7 de abril de 1831.
A reação do espírito liberal brasileiro corporificou-se, a seguir, na reforma da Constituição Imperial de 1834.
2ª – Constituição de 1891 (Brasil República)
Após a proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, houve mudanças significativas no sistema político e econômico do país, com a abolição do trabalho escravo, a ampliação da indústria, o deslocamento de pessoas do meio rural para centros urbanos e também o surgimento da inflação. Outra mudança foi o abandono do modelo do parlamentarismo franco-britânico, em proveito do presidencialismo norte-americano.
O marechal Deodoro da Fonseca, proclamador da República e chefe do governo provisório, e Rui Barbosa, seu vice, nomearam uma comissão de cinco pessoas para apresentar um projeto a ser examinado pela futura Assembleia Constituinte. O projeto escolhido vigorou como Constituição Provisória da República até as conclusões da Constituinte.
As principais inovações dessa nova Constituição, datada de 24 de fevereiro de 1891, são: instituição da forma federativa de Estado e da forma republicana de governo; estabelecimento da independência dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário; criação do sufrágio com menos restrições, impedindo ainda o voto aos mendigos e analfabetos; separação entre a Igreja e o Estado, não sendo mais assegurado à religião católica o status de religião oficial; e instituição do habeas corpus (garantia concedida sempre que alguém estiver sofrendo ou ameaçado de sofrer violência ou coação em seu direito de locomoção – ir, vir, permanecer –, por ilegalidade ou abuso de poder).
2.2) Características:
– Instituiu a forma federativa de Estado e a forma republicana do governo (art. 1º).
– Os poderes voltaram a ser 3, sendo excluído o Poder Moderador, conforme determinação do art. 15: “são órgãos da soberania nacional o poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário, harmônicos e independentes entre si”.
– O vice-presidente da república era o presidente do senado.
– Não podiam votar os mendigos, os analfabetos, os religiosos de ordem monástica e os militares de baixa patente (art. 70).
– As penas de Galés (pena que sujeitava os condenados a andar com correntes de ferro nos pés, e de banimento judicial foram abolidas).
– Previu-se expressamente o habeas corpus.
2.3) Consequências:
– Separação de Igreja e Estado, não sendo mais assegurada a religião católica o status de religião oficial.
– Estabelecido o direito de culto externo a todas as religiões. (art. 11, inc. 2).
3ª – Constituição de 1934 (Segunda República)
Presidido por Getúlio Vargas, o país realiza nova Assembleia Constituinte, instalada em novembro de 1933.
A Constituição, de 16 de julho de 1934, traz a marca getulista das diretrizes sociais e adota as seguintes medidas: maior poder ao governo federal; voto obrigatório e secreto a partir dos 18 anos, com direito de voto às mulheres, mas mantendo proibição do voto aos mendigos e analfabetos; criação da Justiça Eleitoral e da Justiça do Trabalho; criação de leis trabalhistas, instituindo jornada de trabalho de oito horas diárias, repouso semanal e férias remuneradas; mandado de segurança e ação popular.
Essa Constituição sofreu três emendas em dezembro de 1935, destinadas a reforçar a segurança do Estado e as atribuições do Poder Executivo, para coibir, segundo o texto, “movimento subversivo das instituições políticas e sociais”. Foi a Constituição que vigorou por menos tempo no Brasil: apenas três anos.
3.1) Características:
– Determinou-se a proibição de diferença de salário para um mesmo trabalho, por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil.
– Instituiu-se o salário mínimo, capaz de satisfazer, conforme as condições de cada região, as necessidades normais do trabalhador, ou seja, jornada de oito horas diárias, repouso semanal e férias remuneradas.
– Houve uma reforma eleitoral com a introdução do voto secreto e do voto feminino.
3.2) Consequências:
– O Supremo Tribunal Federal passou a chamar-se de Corte Suprema.
– Foi criado o mandado de segurança, para defesa de direito certo e incontestável ameaçado ou violado por ato manifestante inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade.
4ª – Constituição de 1937
Em 10 de novembro de 1937, Getúlio Vargas deu um golpe de Estado e assumiu poderes ditatoriais. Ele revogou a Constituição de 1934, dissolveu o Congresso e outorgou ao país, sem qualquer consulta prévia, a Carta Constitucional do Estado Novo, de inspiração fascista, com a supressão dos partidos políticos e concentração de poder nas mãos do chefe supremo do Executivo. Essa Carta é datada de 10 de novembro de 1937.
Entre as principais medidas adotadas, destacam-se: instituição da pena de morte; supressão da liberdade partidária e da liberdade de imprensa; anulação da independência dos Poderes Legislativo e Judiciário; restrição das prerrogativas do Congresso Nacional; permissão para suspensão da imunidade parlamentar; prisão e exílio de opositores do governo; e eleição indireta para presidente da República, com mandato de seis anos.
Com a derrota da Alemanha na Segunda Guerra Mundial, as ditaduras direitistas internacionais entraram em crise e o Brasil sofreu as consequências da derrocada do nazifascismo. Getúlio Vargas tentou, em vão, permanecer no poder, mas a grande reação popular, com apoio das Forças Armadas, resultou na entrega do poder ao então presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), José Linhares, após a deposição de Vargas, ocorrida em 29 de outubro de 1945.
O novo presidente constituiu outro ministério e revogou o artigo 167 da Constituição, que adotava o estado de emergência, acabando também com o Tribunal de Segurança Constitucional. Ao fim de 1945, as eleições realizadas para a Presidência da República deram vitória ao general Eurico Gaspar Dutra, empossado em 31 de outubro de 1946, que governou o país por decretos-lei, enquanto preparava-se uma nova Constituição.
4.1) Características:
– Nesse período foram instituídos os seguintes documentos legais em vigor até hoje: Código Penal, Código de Processo Penal, Leis das Contravenções Penais e consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
– Foi determinado em todo o Brasil estado de emergência que perdurou durante todo o Estado Novo.
– Pelo art. 178, os parlamentos foram fechados e as eleições suspensas. O chefe de Estado exercia a função legislativa, por intermédio das leis constitucionais e dos decretos-leis.
4.2) Consequências:
– Reduziu a esfera dos direitos individuais, desconstitucionalizando o mandado de segurança e a ação popular.
– Foram abolidos os partidos políticos e a liberdade de imprensa.
– Pelo fato de ser um regime ditatorial, houve uma excessiva perseguição aos opositores do governo.
5ª – Constituição de 1946
Essa Constituição, datada de 18 de setembro de 1946, retomou a linha democrática de 1934 e foi promulgada de forma legal, após as deliberações do Congresso recém-eleito, que assumiu as tarefas de Assembleia Nacional Constituinte.
Entre as medidas adotadas, estão o restabelecimento dos direitos individuais, o fim da censura e da pena de morte. A Carta também devolveu a independência ao Executivo, Legislativo e Judiciário e restabeleceu o equilíbrio entre esses poderes, além de dar autonomia a estados e municípios. Outra medida foi a instituição de eleição direta para presidente da República, com mandato de cinco anos.
As demais normas estabelecidas por essa Constituição foram: incorporação da Justiça do Trabalho e do Tribunal Federal de Recursos ao Poder Judiciário; pluralidade partidária; direito de greve e livre associação sindical; e condicionamento do uso da propriedade ao bem-estar social, possibilitando a desapropriação por interesse social.
Destaca-se, entre as emendas promulgadas à Carta de 1946, o chamado ato adicional, de 2 de setembro de 1961, que instituiu o regime parlamentarista. Essa emenda foi motivada pela crise político-militar após a renúncia de Jânio Quadros, então presidente do país. Como essa emenda previa consulta popular posterior, por meio de plebiscito, realizado em janeiro de 1963, o país retomou o regime presidencialista, escolhido pela população, restaurando, portanto, os poderes tradicionais conferidos ao presidente da República.
Em 1964, o golpe militar derrubou João Goulart e conduziu o país a uma nova ditadura.
5.1) Características:
– A justiça do trabalho foi constitucionalizada e passou a ser um ramo do poder judiciário.
– Para estabelecimento de impostos, era necessária lei prévia obrigatória (princípio da legalidade tributária).
– Os juízes e tribunais só podiam ser naturais, ficando vedado os juízes de exceção. O foro privilegiado ficou proibido.
– A retroatividade da lei Penal ficou vedada.
– A extradição de brasileiro ou estrangeiro por crime político ou de opinião não seria deferida.
5.2) Consequências:
– O Tribunal do Júri voltou a ter previsão constitucional.
– Foi garantida a assistência judiciária para os necessitados.
Com o fim das eleições assumiu a presidência do Brasil o General Eurico Gaspar Dutra, iniciando os trabalhos para elaboração de uma nova constituição.
Com a renúncia do Presidente Jânio Quadros em 25 de agosto de 1961, ocorreu uma crise inconstitucional que culminou com a implementação do parlamentarismo no país por meio da Emenda Constitucional nº. 4 de 02 de setembro de 1961. Assumindo o cargo de primeiro ministro Tancredo Neves, tomando assim a presidência da república João Goulart. Através de referendo popular em janeiro de 1963, o parlamentarismo foi afastado do sistema político brasileiro.
6ª – Constituição de 1967
O contexto predominante nessa época era o autoritarismo e a política da chamada segurança nacional, que visava combater inimigos internos ao regime, rotulados de subversivos. Instalado em 1964, o regime militar conservou o Congresso Nacional, mas dominava e controlava o Legislativo. Dessa forma, o Executivo encaminhou ao Congresso uma proposta de Constituição que foi aprovada pelos parlamentares e promulgada no dia 24 de janeiro de 1967.
Mais sintética do que sua antecessora, essa Constituição manteve a Federação, com expansão da União, e adotou a eleição indireta para presidente da República, por meio de Colégio Eleitoral formado pelos integrantes do Congresso e delegados indicados pelas Assembleias Legislativas. O Judiciário também sofreu mudanças, e foram suspensas as garantias dos magistrados
Essa Constituição foi emendada por sucessiva expedição de Atos Institucionais (AIs), que serviram de mecanismos de legitimação e legalização das ações políticas dos militares, dando a eles poderes extra constitucionais. De 1964 a 1969, foram decretados 17 atos institucionais, regulamentados por 104 atos complementares.
Um desses atos, o AI-5, de 13 de dezembro de 1968, foi um instrumento que deu ao regime poderes absolutos e cuja primeira consequência foi o fechamento do Congresso Nacional por quase um ano e o recesso dos mandatos de senadores, deputados e vereadores, que passaram a receber somente a parte fixa de seus subsídios. Entre outras medidas do AI-5, destacam-se: suspensão de qualquer reunião de cunho político; censura aos meios de comunicação, estendendo-se à música, ao teatro e ao cinema; suspensão do habeas corpus para os chamados crimes políticos; decretação do estado de sítio pelo presidente da República em qualquer dos casos previstos na Constituição; e autorização para intervenção em estados e municípios. O AI-5 foi revogado em 1978.
6.1) Características:
– Competia à União a apuração das infrações penais contra a segurança nacional e a ordem política e social, bem como determinar a censura em diversões públicas.
– O Presidente da República podia expedir decretos com força de Lei sobre matéria de segurança nacional e finanças públicas.
– O Ministério Público era uma seção conjugada ao poder Judiciário.
– Toda pessoa natural ou jurídica era responsável pela segurança nacional.
6.2) Consequências:
– Reduziu a autonomia dos municípios estabelecendo a nomeação de prefeitos de alguns municípios pelo governador.
– Houve uma criação de suspensão de direitos políticos e individuais.
– Baseou toda a estrutura de poder na segurança nacional.
7ª – Constituição de 1988 (Constituição Cidadã)
Em 27 de novembro de 1985, foi convocada a Assembleia Nacional Constituinte com a finalidade de elaborar novo texto constitucional para expressar a realidade social pela qual passava o país, que vivia um processo de redemocratização após o término do regime militar.
Datada de 5 de outubro de 1988, a Constituição inaugurou um novo arcabouço jurídico-institucional no país, com ampliação das liberdades civis e os direitos e garantias individuais. A nova Carta consagrou cláusulas transformadoras com o objetivo de alterar relações econômicas, políticas e sociais, concedendo direito de voto aos analfabetos e aos jovens de 16 a 17 anos. Estabeleceu também novos direitos trabalhistas, como redução da jornada semanal de 48 para 44 horas, seguro-desemprego e férias remuneradas acrescidas de um terço do salário.
Outras medidas adotadas Constituição de 88 foram: instituição de eleições majoritárias em dois turnos; direito à greve e liberdade sindical; aumento da licença-maternidade de três para quatro meses; licença-paternidade de cinco dias; criação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em substituição ao Tribunal Federal de Recursos; criação dos mandados de injunção, de segurança coletivo e restabelecimento do habeas corpus. Foi também criado o habeas data (instrumento que garante o direito de informações relativas à pessoa do interessado, mantidas em registros de entidades governamentais ou banco de dados particulares que tenham caráter público).
Destacam-se ainda as seguintes mudanças; reforma no sistema tributário e na repartição das receitas tributárias federais, com propósito de fortalecer estados e municípios; reformas na ordem econômica e social, com instituição de política agrícola e fundiária e regras para o sistema financeiro nacional; leis de proteção ao meio ambiente; fim da censura em rádios, TVs, teatros, jornais e demais meios de comunicação; e alterações na legislação sobre seguridade e assistência social.
7.1) Características:
– Os alicerces da República Federativa do Brasil são: a Soberania, Cidadania, Dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.
– Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos.
– Estabeleceu a faculdade do exercício do direito de voto ao analfabeto e os jovens entre 16 e 17 anos.
– Estabeleceu novos direitos trabalhistas.
7.2) Consequências:
– Poder Judiciário voltou a ter independência, com autonomia funcional administrativa e financeira.
– Fim da censura.
A atual Constituição vigente contem 250 artigos, 97 artigos nos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias e recebeu 96 emendas desde a sua vigência em 5 de outubro de 1988 até 6 de junho de 2017.
No que se refere a Constituição de 1988, destaque-se a influência direta no seu texto, do jurista português Gomes Canotilho, e do jusfilósofo socialista espanhol Elias Diaz.
DESENVOLVIMENTO
O Constitucionalismo pode ser vislumbrado sobre a perspectiva jurídica, sociológica ou política, partindo-se da ideia de que todo Estado deve possuir uma Constituição, que contém regras que dão sustentação a limitação do poder, inviabilizando que os governantes possam fazer prevalecer seus interesses.
Podemos citar, como dois marcos mais importantes na história do constitucionalismo moderno, a Constituição norte-americana de 1787 e a Constituição francesa de 1791, esta, que teve como preâmbulo a declaração universal dos direitos do homem e do cidadão de 1789.
Os Estados Unidos diferentemente, a constituição americana sempre teve o caráter de documento jurídico passível de aplicação direta e imediata pelo judiciário. A concepção de constituição como norma jurídica suprema criou condições necessárias para que os juízes pudessem exercer a função de controlar a legitimidade constitucional das leis.
É o que cita Luís Roberto Barroso (2012, p.02):
“Berço do constitucionalismo escrito e do controle de constitucionalidade, a Constituição americana – a mesma desde 1787 – teve, desde a primeira hora, o caráter de documento jurídico, passível de aplicação direta e imediata pelo Judiciário. De fato, a normatividade ampla e a judicialização das questões constitucionais têm base doutrinária em O Federalista e precedente jurisprudencial firmado desde 1803, quando do julgamento do caso Marbury v. Madison pela Suprema Corte.”[2]
Proclamada a independência do Brasil, surge a necessidade de uma unidade nacional, bem como de um poder centralizador e uma organização nacional que freassem os poderes regionais e locais, sem deixar de adotar princípios básicos da teoria política. O constitucionalismo era o princípio fundamental, que se realizava por meio de uma constituição escrita, onde se consubstanciasse o liberalismo, a declaração de direitos e a separação de poderes (SILVA, 2005, p. 74).[3]
A primeira experiência do Brasil como nação livre, após a declaração de independência em 1822, deu-se à luz do constitucionalismo clássico ou histórico, a luz da Declaração dos direitos do homem e do cidadão em 1789 que dispunha que toda sociedade para ter uma Constituição deve ter nela a garantia de direitos e a separação de poderes (COELHO, 2009, p. 183).[4]
Assim, por influência da revolução francesa e das revoluções americanas, a Constituição de 1824, continha importante rol de direitos civis e políticos que acabou por influenciar as Constituições seguintes. A Constituição de 1824, quanto a divisão e ao exercício do poder político, não adotou a separação tripartida de Montesquieu, pois, além das funções legislativa, executiva e judiciária, estabeleceu-se o poder moderador. Segundo Pedro Lenza (2011, p. 97)[5], durante esse período o poder judiciário era independente e composto por juízes e jurados. Mas o Imperador, por meio do poder moderador podia suspendê-los por queixas, não sendo garantida a inamovibilidade.
Gilmar Ferreira Mendes (2009, p. 1083), destaca que:
“A Constituição de 1824 não contemplava qualquer modelo assemelhado aos modelos hodiernos de constitucionalidade. A influência francesa ensejou que se outorgasse ao Poder Legislativo a atribuição de “fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las”, bem como “velar na guarda da Constituição”.[6]
Nesse período, a chave de toda a organização política estava efetivamente no poder moderador e no aparelho político do governo, dois órgãos reforçavam a ação do poder soberano: o senado e o conselho de estado. Os liberais lutaram contra esse mecanismo centralizador, sendo que em 1889, venceram as forças descentralizadoras, com consubstanciação dos poderes efetivos e autônomos locais, agora aliados aos novos fatores que se firmaram: o federalismo e a democracia (SILVA, 2005, p. 76-77).[7]
Com a Constituição de 1891, o Poder Moderador foi extinto, adotando-se a teoria clássica de Montesquieu da tripartição de poderes. Sua fonte inspiradora foi a Constituição americana de 1787, conforme aduz Inocêncio Mártires Coelho (2009, p. 186):
“Constituição, mesmo, nós só a tivemos ao término dos trabalhos da Assembleia Constituinte, que operou sobre projeto elaborado pela Comissão dos Cinco e retocado pelo bico da pena Rui Barbosa, um republicano de última hora que, forte no constitucionalismo norte americano, “escrevia para o Brasil traduzindo o inglês”, como observou, em comentário mordaz, o arguto Afonso Arinos de Melo Franco.”[8]
Nesta época o poder legislativo federal era bicameral, composto pela câmara dos deputados e o senado federal, passando o órgão máximo do poder judiciário a se chamar Supremo Tribunal Federal, sendo mantida a justiça federal. Com a Constituição de 1891 e o reconhecimento do Supremo Tribunal Federal como órgão máximo do poder judiciário, foi estabelecida a competência da Suprema Corte para rever as decisões das justiças dos estados, em última instância, quando fosse questionada a validade e aplicação de tratados ou leis federais ou quando se contestasse a validade de leis ou atos dos governos locais.
A Constituição de 1934 introduziu significativas mudanças no sistema de controle de constitucionalidade, a par de manter algumas disposições da Constituição de 1891, estabeleceu que a declaração de inconstitucionalidade só poderia ser realizada pela maioria da totalidade de membros do tribunal. Consagrou ainda, a competência do senado federal para suspender a execução de qualquer lei ou ato deliberação ou regulamento, quando hajam sido declarados inconstitucionais pelo poder judiciário.
A Carta de 1937 trouxe um retrocesso no controle de constitucionalidade brasileiro, embora não tenha introduzido qualquer modificação no modelo difuso, estabeleceu esta, que poderia o presidente da república, no caso ser declarada a lei inconstitucional, submetê-la novamente ao exame do parlamento, que se a confirmasse por dois terços dos votos em cada uma das câmaras ficaria sem efeito a decisão do tribunal.
A Constituição de 1946 restaura o controle judicial no direito brasileiro, emprestando nova conformação à ação direta de inconstitucionalidade, introduzida, inicialmente na Constituição de 1934. Nesta, foi atribuído ao procurador geral da república a titularidade para a representação de inconstitucionalidade, para fins de intervenção federal.
A Carta de 1967 concentrou fortemente o poder no âmbito federal, esvaziando os Estados e os Municípios e conferindo amplos poderes ao Presidente da República. Segundo Gilmar Ferreira Mendes (2009, p. 1094)[9], a constituição de 1967 não trouxe muitas mudanças ao sistema de controle de constitucionalidade mantendo-se a ação direta de inconstitucionalidade tal como prevista na Constituição de 1946, e mantendo incólume o controle difuso. O ato institucional nº 5, conferiu ao chefe do poder executivo amplos poderes, podendo decretar o recesso do congresso nacional, das assembleias e das câmaras dos vereadores, bem como determinar a intervenção nos estados e municípios, sem limitações, tendo suspendido as garantias constitucionais.
Com a Constituição de 1988 o Superior Tribunal de Justiça passou a ser a corte responsável pela uniformização da interpretação da lei federal, e o Supremo Tribunal Federal passou a cuidar de temas predominantemente constitucionais. Conforme Pedro Lenza (2011, p. 125) “pela primeira vez se estabeleceu o controle das omissões legislativas, seja pelo mandado de injunção (controle difuso), seja pela ADI por omissão (controle concentrado) ”.[10]
Com a Emenda Constitucional nº. 3 de 1993, disciplinou-se o instituto da ação declaratória de constitucionalidade, como forma mais célere de resolução das controvérsias judiciais. Conforme leciona Gilmar Ferreira Mendes acerca do controle de constitucionalidade brasileiro (2009, p. 1104):
“A Constituição de 1988 reduziu o significado do controle de constitucionalidade incidental ou difuso ao ampliar de forma marcante, a legitimação para propositura da ação direta de inconstitucionalidade (Art. 103), permitindo que, praticamente, todas as controvérsias constitucionais relevantes sejam submetidas ao Supremo Tribunal Federal mediante processo de controle abstrato de normas.”[11]
Com o avanço do direito constitucional, as premissas ideológicas sobre o sistema de interpretação tradicional deixaram de ser suficientes, pois, se verificou que a solução dos problemas jurídicos nem sempre se encontravam no relato abstrato do texto normativo, sendo necessária uma participação mais ativa do poder judiciário na interpretação e efetivação das normas jurídicas nos casos concretos apresentados, garantindo-se sempre os direitos e garantias do cidadão.
2.1 NEOCONSTITUCIONALISMO
O estado constitucional de direito somente veio a se consolidar após a segunda guerra mundial, como expõe Daniel Sarmento (2011, p.76-77):
“Até a Segunda Guerra Mundial, prevalecia uma cultura jurídica essencialmente legicêntrica, que tratava a lei editada pelo parlamento como a fonte principal do Direito, e não atribuía força normativa às constituições. As constituições eram programas políticos que deveriam inspirar a atuação do legislador, mas que não podiam ser invocados perante o Judiciário, na defesa de direitos”.[12]
Antes da segunda guerra mundial, teorias positivistas defendiam que a validade do direito seria determinada exclusivamente por considerações formais, pela atribuição ou reconhecimento de competência normativa à sua fonte produtora ou simplesmente pela eficácia social da norma, conforme leciona Norberto Bobbio (2006, 142):
“O positivismo jurídico, definindo o direito como um conjunto de comandos emanados pelo soberano, introduz na definição o elemento único da validade, considerando, portanto, como normas jurídicas todas as normas emanadas num determinado modo estabelecido pelo próprio ordenamento jurídico, prescindindo do fato de estas normas serem ou não efetivamente aplicadas na sociedade: na definição do direito não se introduz assim o requisito eficácia.”[13]
Com o fim da segunda guerra mundial, tornou-se evidente a insuficiência do positivismo e surgiram diversas escolas de pensamento que defendiam a reaproximação do direito e a moral. “A aproximação das ideias de constitucionalismo e de democracia produziu uma nova forma de organização política, que atende por nomes diversos: estado democrático de direito, estado constitucional de direito […]” (BARROSO, 2012, p.01).[14]
Assim, após a segunda guerra mundial, a necessidade de superação do passado de barbaridades, e dos horrores do totalitarismo, fez-se buscar soluções de preservação da dignidade contra os abusos dos poderes estatais. Os países que saíam do trauma dos regimes ditatoriais passaram a buscar proteger as declarações liberais das suas constituições de modo eficaz (BRANCO, 2009, p.224).[15]
O direito constitucional se espalha pela Europa nesta época, na medida em que os seus países foram se democratizando, e iniciando nova organização política do estado constitucional de direito. Este vem a ser acolhido em Portugal e na Espanha nos anos setenta e em diversos outros países da Europa.
Nos Estados Unidos, “diferentemente, desde do início do século XIX é reconhecido o valor normativo da Constituição como um documento máximo da ordem jurídica” (BRANCO, 2009, p.224)[16]. A supremacia da constituição era um instrumento de submissão dos poderes a limites, e tendo os limites bem delineados, era a garantia a proteção das minorias em face de possíveis alterações pela maioria, contra as quais as limitações eram estabelecidas.
A concepção de constituição na Europa então, se aproxima da constituição dos Estados Unidos de 1787, já previa a proteção aos direitos fundamentais, bem a consagração da constituição como norma jurídica soberana, sendo possível ao judiciário limitar o exercício de poder pelo legislativo, invalidando decisões legislativas que a contrariem a Constituição, garantindo sempre sua supremacia.
Contudo, enquanto a Constituição norte-americana é sintética e se limita a definir traços básicos do estado, as cartas europeias nesse período foram extensas e repletas de normas e garantias.
Como expõe Daniel Sarmento (2011, p. 78):
“As constituições europeias do 2º pós-guerra não são cartas procedimentais, que quase tudo deixam para as decisões da maiorias legislativas, mas sim documentos repletos de normas impregnadas de elevado teor axiológico, que contem importantes decisões substantivas e se debruçam sobre uma ampla variedade de temas que outrora não eram tratados pelas constituições, como a economia, as relações de trabalho e a família”.[17]
Daniel Sarmento (2011) explica ainda, que como grande parte das normas constitucionais se caracterizavam por indeterminações semânticas, principalmente por princípios, deu-se espaço a técnica de ponderação, tornando frequente o recurso ao princípio da proporcionalidade na esfera judicial e tornando cada vez mais importante o papel do poder judiciário.
A introdução nas cartas constitucionais de direitos fundamentais, implicou novo raciocínio jurídico, que como princípios, exigem uma ponderação, através do qual juízes e tribunais exercem um juízo de valor que mais otimize a sua aplicação, dando, portanto, maior poder aos juízes na concretização dos direitos e garantias do cidadão, bem como para afastar interpretações contrarias a esses direitos.
Como marco histórico, da supremacia da constituição e do controle pelo poder judiciário, cita-se a mais notória decisão proferida pela Suprema Corte americana, o caso Marbury v. Madison que foi a primeira decisão na qual a Suprema Corte afirmou o seu poder de exercer o controle de constitucionalidade, negando aplicação a leis que, de acordo com sua interpretação, fossem inconstitucionais. Conforme expõe Paulo Gustavo Gonet Branco (2009, p.229):
“O caso Marbury v. Madison reclama superioridade para o Judiciário, argumentando, essencialmente, com a ideia de que a Constituição é uma lei e que a essência da Constituição é ser um documento fundamental e vinculante. Desenvolve-se a tese de que interpretar as leis insere-se no âmbito das tarefas próprias do Judiciário. Em caso de conflito entre dois diplomas, o juiz deve escolher, segundo a técnica aplicável, aquele que haverá de reger a situação levada a julgamento. Cabe, por isso, ao Judiciário, diante da hipótese de conflito entre uma lei infraconstitucional e a Constituição, aplicar esta última e desprezar a primeira”.[18]
Daniel Giotti de Paula (2011, p. 282) afirma que “não há dúvidas de que a fonte remota do ativismo, traduzida em uma postura de atuação dos juízes da Suprema Corte americana, está na própria legitimidade que lhe foi outorgada para controlar a constitucionalidade de atos normativos”.[19]
Deve-se atentar que antes, conforme Montesquieu, os juízes eram somente a “boca da lei”, e estes gradativamente passaram a ter que lidar com conceitos indeterminados, cláusulas gerais, tendo que regular o direito, ou estabelecer o direito a ser aplicado no caso concreto. O juiz passou a se encontrar muitas vezes dividido entre a obrigação de aplicar a lei ou de ministrar uma justiça equitativa e adaptada ao momento atual da sociedade, se achando, nesta ocasião, forçado interpretar o texto de uma outra forma, lhe atribuindo um novo sentido.
Assim, as novas posições adotadas pelos juízes foram fundamentais para o desenvolvimento do neoconstitucionalismo, com a constitucionalização do Direito, a irradiação das normas e valores constitucionais, bem como a rejeição ao formalismo, o realce a primazia do princípio da dignidade da pessoa humana, e os direitos fundamentais consagrados constitucionalmente que devem ser protegidos e aplicados, pelos Poderes Públicos e pela sociedade.
2.1.1 A evolução no Brasil
O judiciário brasileiro sofreu grandes influências dos grandes debates que tomaram corpo na Europa e nos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial, e que chegaram ao Brasil e se consolidaram com a Carta Magna de 1988. “No caso brasileiro, o renascimento do direito constitucional se deu, igualmente, no ambiente de reconstitucionalização do país, por ocasião da discussão prévia, convocação, elaboração e promulgação da Constituição de 1988.” (BARROSO, 2012, p.01).[20]
Conforme leciona ainda Luis Roberto Barroso (2012, p.02):
“A partir de 1988, e mais notadamente nos últimos cinco ou dez anos, a Constituição passou a desfrutar já não apenas da supremacia formal que sempre teve, mas também de uma supremacia material, axiológica, potencializada pela abertura do sistema jurídico e pela normatividade de seus princípios. Com grande ímpeto, exibindo força normativa sem precedente, a Constituição ingressou na paisagem jurídica do país e no discurso dos operadores jurídicos.”[21]
Com atribuição à norma da constituição um do status de norma jurídica superior, superou-se o modelo que vigorou na Europa no qual “a Constituição era vista como um documento essencialmente político, um convite à atuação dos Poderes Públicos” (BARROSO, 2012, p.01)[22]. Com as mudanças verificadas com a Constituição de 1988, podemos destacar o reconhecimento da força normativa dos princípios jurídicos e valorização da sua importância no processo, onde regras e princípios tiveram reconhecido seu caráter normativo e passaram a ser concretizadas pelo poder judiciário. Bem como, a rejeição ao formalismo, a constitucionalização do direito, com irradiação de normas e valores constitucionais e a reaproximação entre o direito e a moral.
Como expõe Daniel Sarmento (2011, p.86):
“Até 1988, a lei valia muito mais do que a Constituição no tráfico jurídico, e, no Direito Público, o decreto e a portaria ainda valiam mais do que a lei. O Poder Judiciário não desempenhava um papel político tão importante, e não tinha o mesmo nível de independência de que passou a gozar posteriormente”.[23]
Atualmente a Constituição “se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. ” (José Afonso da Silva, 2006, p. 45)[24]. Sendo lei fundamental e suprema do Estado brasileiro, as normas que integram a ordenação jurídica só serão válidas se se conformarem com as normas da Constituição Federal.
Inocêncio Mártires Coelho (2009, p. 149), ressalta que “sob o novo constitucionalismo, a Constituição, que outrora era um simples catálogo de competências e fórmulas exortativas que não vinculavam o legislador […], essa Carta Política simbólica assume, agora, a função de norma suprema”.[25]
A Carta Magna introduziu duas novidades, ao prever a inconstitucionalidade por omissão e ampliar a legitimidade para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade, por ação ou omissão. Passou-se a ter então, o controle jurisdicional, combinando critérios difuso e concentrado, este de competência do Supremo Tribunal Federal, podendo também declarar inconstitucional a omissão legislativa.
Segundo José Afonso da Silva (2005, p. 49)[26], para defender a supremacia constitucional existem três sistemas de controle, o político, onde a verificação da inconstitucionalidade é realizada por órgãos de natureza política, como poder legislativo, o controle jurisdicional, que se outorga ao poder judiciário a declaração de inconstitucionalidade de lei e de outros atos do poder público, e o controle misto, que ocorre quando a constituição submete certas categorias de leis ao controle político e outras ao controle jurisdicional.
Luís Roberto Barroso (2011, p. 228) afirma que a grande importância dada a um poder judiciário forte como elemento essencial para uma democracia moderna, decorre muito de uma desilusão com a política e uma crise da representatividade do parlamento no Brasil. Uma constituição analítica também contribuiu para a “judicialização”, onde importantes questões são decididas em última análise pelo Poder Judiciário conforme expõe este autor:
“No Brasil, o fenômeno assumiu proporção ainda maior, em razão da constitucionalização abrangente e analítica – constitucionalizar é, em última análise, retirar um tema do debate político e trazê-lo para o universo das pretensões judicializáveis – e do sistema de controle de constitucionalidade vigente entre nós, em que amplo o acesso ao Supremo Tribunal Federal por via das ações diretas”. (2011, p. 230-231)[27]
Com a Constituição de 1988 abriu-se ainda, a possibilidade de declaração de inconstitucionalidade sem a pronúncia da nulidade, na medida em que se atribuiu particular significado ao controle de constitucionalidade da omissão do legislador, bem como, previu expressamente o mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora tornar inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais.
É defendido atualmente por grandes doutrinadores que o mandado de injunção seria o instrumento dirigido contra a omissão legislativa visando possibilitar o exercício de direito subjetivo, competindo ao juiz proferir a decisão que contivesse a regra concreta destinada a assegurar esse direito, conforme leciona Jose Afonso da Silva (2005, p. 450):
“O mandado de injunção tem, portanto, por finalidade realizar concretamente em favor do impetrante o direito, liberdade ou prerrogativa, sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o seu exercício. Não visa obter regulamentação prevista na norma constitucional. Não é função do mandado de injunção pedir a expedição da norma regulamentadora, pois ele não é sucedâneo da ação de inconstitucionalidade por omissão (art. 103 §2º). É equivocada, portanto, data vênia, a tese daqueles que acham que o julgamento do mandado de injunção visa a expedição de norma regulamentadora do dispositivo constitucional dependente de regulamentação, dando a esse remédio constitucional o mesmo objeto da ação de inconstitucionalidade por omissão.”[28]
Atualmente, verifica-se no Brasil diversos precedentes da postura ativista do Supremo Tribunal Federal, como na aplicação da Constituição a situações não expressamente contempladas, imposição de condutas ou abstenções ao poder público, tanto em caso de inércia do legislador, como no de políticas públicas insuficientes.
É certo que a concentração de poderes no judiciário leva a certa desconsideração do papel desempenhado por outras instituições, como o poder legislativo. Contudo, deve-se ter em vista que o poder legislativo sempre terá um papel de destaque na concretização dos direitos, pois as decisões judiciais da Suprema Corte não criam obstáculos a ação posterior do poder legislativo, que pode, inclusive, ultrapassar a decisão proferida pelo tribunal por meio de leis.
No Brasil, o neoconstitucionalismo é cada vez mais impulsionado pela descrença da população em relação à política, no poder legislativo e nos partidos políticos, enquanto a Justiça, adota decisões em consonância com a opinião pública, fortalecendo ainda mais o sentimento neoconstitucionalista.
Hoje em dia, o Supremo Tribunal Federal faz parte da vida dos brasileiros, seja por meio da televisão, twitter, youtube, bem como através da participação da sociedade por meio de audiências públicas ou do amicus curie, tornando o poder judiciário o órgão mais próximo, acessível e transparente dos cidadãos e a opinião pública.
Conforme leciona Luís Roberto Barroso (2013, p.07) é comum nos países com Cortes Supremas existe uma variação entre o judiciário que procura reduzir sua interferência nas ações dos outros poderes, e decisões que suprem omissões e muitas vezes inovam na ordem jurídica:
“O binômio ativismo-autocontenção judicial está presente na maior parte dos países que adotam o modelo de supremas cortes ou tribunais constitucionais com competência para exercer o controle de constitucionalidade de leis e atos do Poder Público. O movimento entre as duas posições costuma ser pendular e varia em função do grau de prestígio dos outros dois Poderes.”[29]
À medida que decisões importantes e questões polêmicas passaram a ser decididas pela Suprema Corte, está se viu em posição muito mais importante na sociedade, e a clássica separação de poderes, que impunha limites rígidos ao poder judiciário, cedeu espaço a outras visões mais favoráveis a atuação dos magistrados para a tutela de direitos e garantias fundamentais.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os Estados Unidos da América do Norte mantêm a mesma Constituição Republicana e Presidencialista de 1787 com 7 artigos e 27 emendas, em igual e mesmo período, o Brasil já foi de tudo: Colônia, Império, República Presidencialista, Ditadura Civil, Ditadura Militar, República Parlamentarista e até Democracia, sempre com Constituições que pouco refletiram a verdadeira pauta de valores desejados pelo povo, o único detentor legítimo daquele poder capaz de criar e/ou derrubar uma Constituição.
Em todas as fases do constitucionalismo revelou-se pela limitação do governo pelo Direito, são as chamadas limitações constitucionais.
No Estado constitucional democrático em que vivemos a separação entre o direito e política tem sido considerada como essencial. Na política, deve vigorar a soberania popular e a vontade da maioria, enquanto no direito deve vigorar o disposto pela lei e pelos direitos fundamentais estabelecidos na Constituição, que possui supremacia sobre todo o ordenamento jurídico. A crença nessa distinção tem resistido ao tempo e até hoje se mantém a tradicional divisão entre a política e o direito. Contudo, a concretização da ordem fundamental e do estado democrático de direito estabelecido pela Carta Magna de 1988 depende da edição de leis, leis estas que dependem do poder político do país que ocupa os dois órgãos de representação do poder legislativo brasileiro, a câmara dos deputados e o senado federal.
Apesar da separação entre o direito e a política, é fato que a Constituição Federal não basta em si mesma, e toda a organização político-administrativa do Estado depende da edição de lei para sua organização e funcionamento. O problema começa a surgir, quando um dos poderes começa a não atuar como deveria, e outro poder fica obrigado a assumir sua função por uma atuação defeituosa.
A tripartição concebida por Aristóteles e aprimorada por Montesquieu, visava à contenção do poder, pois ao conter o poder e evitar a concentração do poder estatal em único órgão, encontrava-se a justiça e garantia do Estado Democrático. O fundamento da divisão era a proteção do cidadão, contudo, atualmente, a divisão rígida de poderes passou a ir contra os direitos mais fundamentais do cidadão, direitos garantidos constitucionalmente e que se tornaram inoperantes pela inércia legislativa. Assim, não se pode perder de vista que as escolhas políticas devem ser no limite em que as mesmas estejam em conformidade com a ordem jurídica, não se admitindo omissões abusivas e ilegais, casos em que o controle jurisdicional se torna necessário.
O modelo tripartite de Poderes deve ser conformado com os tempos atuais, impondo-se o controle de um poder sobre o outro como forma de concretização dos objetivos buscados pelo Estado Social em que vivemos, em vista da feição prestacional do Estado.
O futuro do constitucionalismo identifica-se com a verdade, com a solidariedade, consenso, continuidade, participação e universalização dos direitos humanos e do ideal de cidadania pura e sadia.
Informações Sobre os Autores
Halleyde Souza Ramalho
Advogada professora na Unibalsas mestra em educação nas ciências pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
Benigno Nuñez Novo
graduado em Direito pela Universidade Estadual da Paraíba 1999 especialista em educação: Área de Concentração: Ensino – Faculdade Piauiense 2005 mestre em Ciências da Educação – Universidad Autónoma de Asunción 2009 e doutor em Direito Internacional – Universidad Autónoma de Asunción 2011