Colisão de direitos fundamentais: ponderação dos direitos à vida e à intimidade – quebra do sigilo das informações em sede de processo civil

Resumo: O direito à intimidade encontra-se, numa posição hierarquicamente inferior ao direito à vida que aliado ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º,III, CF/88), sobrepõe-se a quaisquer outros. Essa foi a intenção do legislador originário ao inseri-lo no caput do art.5º da Carta de 1988 e ao acrescentar os §§1º e 2º no mesmo artigo que, em consonância com o §3º, reconhece a hierarquia de norma constitucional de direito fundamental aos Tratados de Direitos Humanos, os quais enunciam, internacionalmente, a superioridade do direito à vida. Através de pesquisa bibliográfica, envolvendo doutrinas e jurisprudências dos mais renomados autores do universo jurídico, demonstrou-se que se num caso concreto provar-se, inequivocadamente, que o direito a uma vida digna está sendo transgredido, pode-se, desde que necessário e independentemente da classificação do processo – se cível ou penal-, proceder a quebra do sigilo das informações de uma das partes, desde que haja autorização judicial.


Palavras-chave: Direito à vida; Direito à intimidade; Quebra do sigilo das informações; Tratados Internacionais de Direitos Humanos.


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Abstract: The right to intimacy is hierarchically below the right to live that, when allies with the human dignity principle, overlaps any other fundamental right. That was the main intention of the original legislator when inserting it at article’s 5th caput at the Federal Constitution. Which is also expressed by the inclusion of paragraphs 1st and 2nd at the same item, all lined up with the 3rd paragraph, recognize the hierarchy position as constitutional rule of fundamental right to all Human Rights International Conventions ratified by the Brazilian State. Through a bibliographic research, involving studies from various renowned authors and judicial decisions, it was shown that if in a specific scenario there is a proof that the right to a dignified life is being transgressed, it is allowed, when necessary and regardless of the procedure classification – criminal or civil -, to breach the information secrecy, always with a judicial permit.


Key-words: Right to Live; Right to intimacy; Breach of the information secrecy; Human Rights International Conventions.


Sumário: Sumário: 1. Considerações Iniciais. 2. Direito à vida. 2.1. Significado e Valor. Dignidade da pessoa humana. 2.2. Tratados Internacionais de Direitos Humanos: superioridade do direito à vida reconhecida internacionalmente pelo Estado Brasileiro. a) Hierarquia dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos: Normas constitucionais com natureza de direito fundamental. 3. Solução ao conflito de direitos fundamentais: teoria da ponderação, interpretação constitucional evolutiva e primado do direito mais relevante. 3.1. Ponderação de Direitos Fundamentais. 3.2. Interpretação constitucional evolutiva: princípio da maior eficácia dos direitos fundamentais. Crítica à interpretação literal. 4. Direito fundamental ao sigilo das informações: quebra do sigilo. 5. Descumprimento do pagamento de pensão alimentícia: violação do direito à vida – prisão civil e quebra do sigilo das informações. 5.1. Garantia do direito a alimentos: prisão civil e quebra do sigil o das informações. 6. Considerações finais. 7. Referências Bibliográficas.


1. Considerações Iniciais.


Todos os direitos do ser humano só têm valor, moral ou jurídico, enquanto há vida, que constitui-se em pré-requisito, verdadeira condição de existência, de todos os demais direitos, inclusive os de personalidade. Caracteriza-se como um direito supraestatal, paira acima do Estado.


O direito à vida, como categoria jurídica, passou a ser valorizado – sendo, desse modo, merecedor de debates e construções de documentos jurídicos a seu respeito -, pela sociedade, nacional e internacional, com a explosão das Guerras Mundiais.


Em 1945, com o final da Segunda Guerra Mundial, uma nova ordem foi instituída, simbolizada pela elaboração da Carta das Nações Unidas.


Os Estados signatários da Carta reconhecem, assim, que os direitos humanos  a que faz menção, são objeto de legítima preocupação internacional e não mais de sua exclusiva jurisdição doméstica.


Seguindo este raciocínio, em 1948 foi adotada a Declaração Universal de Direitos Humanos, que introduziu a indivisibilidade desses direitos, conjugando os direitos civis e políticos com os direitos econômicos, sociais e culturais. Tem força vinculante, por já fazer parte do direito costumeiro internacional e por, efetivamente, traduzir os significado de “direitos humanos”, suas disposições aplicam-se como Princípios Gerais de Direito Internacional.


Nos anos que se seguiram, diversos instrumentos jurídicos, de caráter internacional, defensores dos direitos humanos, foram aprovados, destacando-se: o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, aprovado em 1966, pela Assembléia Geral das Nações Unidas e a Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada, do mesmo modo, pela ONU (Organização das Nações Unidas) em 1989 e vigente desde 1990.


O Brasil, signatário de todos os instrumentos já referidos, promulgou em outubro de 1988, a “Constituição Cidadã”, como ficou conhecida a Constituição Federal, elencando como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III) e classificando como direito fundamental de cada indivíduo a inviolabilidade do direito à vida (art. 5º, caput).


A Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à subsistência.


Importa-nos, neste sentido, examinar a dinâmica da relação entre o processo de internacionalização dos direitos humanos e seu impacto e repercussão no processo de redefinição e reconstrução da democracia no âmbito brasileiro; avaliando-se, concomitantemente, o processo de inclusão dos enunciados em tratados internacionais, dos quais o Brasil seja parte, pelo Texto Constitucional.


Inobstante o reconhecimento constitucional da inviolabilidade do direito à vida,  jurisprudência e doutrina majoritárias em nosso país, com fundamento no art. 5º, XII da Carta Magna, posicionam-se no sentido da impossibilidade de deferimento de pedido de quebra de sigilo das informações (bancário ou telefônico) em sede de processo civil, mesmo quando uma das partes litigantes seja um menor que, representado por sua mãe, pleiteia os alimentos dos quais seu pai é devedor e, reiteradamente, insiste ou em não cumprir com o pagamento ou mesmo afirma não possuir condições financeiras suficientes para assim proceder, quando há provas, inclusive, testemunhais, do oposto.


Esta discussão nos remete à decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no Agravo de Instrumento nº 70018683508, que entendeu lícito a quebra de sigilo telefônico de devedor de alimentos para fins de sua localização.


O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no julgamento do AI, apreciado em 28 de março de 2007, decidiu pela possibilidade de quebra do sigilo telefônico, para fins de localização, de devedor de alimentos que vem, reiteradamente, e por um período bastante longo, furtando-se da intimação para cumprimento de ordem de prisão em seu desfavor.


O agravo foi unanimemente provido sob o fundamento de que trata-se de situação excepcional, privilegiando-se o direito à vida:


“(…)Assim, patente a sobreposição do direito à vida dos alimentados em frente à intimidade do executado. A própria possibilidade da prisão civil no caso de dívida alimentar evidencia o caráter superior da verba alimentar, devendo sobrepor o direito do devedor à intimidade.(…)”(grifo nosso)[1]


Apesar do fundamento exposto – prevalência do direito à vida do menor – para decisão de quebra do sigilo telefônico, inúmeros foram os juristas que ao analisarem o caso,  enxergaram a decisão como viciada pela inconstitucionalidade, por ter ido de encontro à regra disposta no art.5º,XII,CF/88, ou seja, que a quebra do sigilo telefônico somente seria possível em sede de processo penal.


Infelizmente, esqueceram-se os renomados juristas de que o direito à vida é base fundamental, essência de todos os demais direitos elencados pelo art.5º da Constituição Federal, sem ele, não haveria o direito ao sigilo das informações. Ademais, a própria Carta Magna aduz no §2º do mesmo artigo que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados.


Não é um dos princípios da CF/88 a proteção ao direito à vida? Bem como não reconhece, ela mesma, a essencialidade desse direito, tanto que o citou no caput do art. 5º?


Importante observarmos, ainda, um outro detalhe que não pode nos escapar. O §3º, ainda do mesmo artigo, afirma que os Tratados e Convenções Internacionais sobre direitos humanos, que forem aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros serão equivalentes as emendas constitucionais.


Com este dispositivo, o Constituinte nacional expressamente afirma que todas as disposições referentes aos Direitos Humanos, dispostas em Tratados ou Convenções dos quais o Brasil for parte, terão o valor de dispositivo constitucional. Mesmo aqueles ratificados antes da inclusão do referido §3º, pela Emenda 45. Isso porque ao ratificar os Tratados, o Brasil lhes confere o status de regra jurídica  a  ser  observada  em  seu  território e,  por  serem  os   direitos   humanos   direitos fundamentais, aplica-se o disposto no §1º do já mencionado artigo quinto, ao afirmar que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicabilidade imediata.


O Brasil é signatário da Declaração Universal de Direitos Humanos, bem como de tantos outros instrumentos jurídicos internacionais que exprimem a superioridade e essencialidade do direito à vida. O Estado brasileiro, por conseguinte, por meio do reconhecimento internacional da prevalência do direito à vida, reafirma sua postura de defensor do mesmo.


Observa-se, desse modo, que os Poderes Executivo e Legislativo já reconheceram, ao aprovarem e ratificarem os Tratados e Convenções, bem como ao editarem os parágrafos 1º, 2º e 3º do art. 5º da Lei Magna, que o direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que constitui-se em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais direitos.


A reflexão que ora se propõe, em tom provocativo, diz respeito à possibilidade de quebra do sigilo das informações, bancário ou telefônico, em sede de processo civil, desde que uma das partes litigantes demonstre, inequivocadamente, que o seu direito a uma vida digna – aplicando-se os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e do direito à vida – está sendo violado. Fundamenta-se esta tese na soberania do direito à vida e, portanto, de sua superioridade frente ao direito de privacidade das informações.


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2. Direito à vida.


2.1. Significado e Valor. Dignidade da pessoa humana.


O direito à vida, protegido constitucionalmente (art.5º, caput, CF/88), é inerente ao ser humano que, para existir não necessita de reconhecimento expresso de sua existência em nenhum texto legal. Porém, a inserção do direito à vida de modo explícito na Constituição denota o seu objetivo nitidamente garantista: ao Estado incumbe o dever de agir no sentido de preservar a vida.


Considerando os bens integrantes da personalidade humana (físicos, psíquicos e morais), o direito à vida transcende todos os ramos do direito, por ocupar posição de primazia (primado do direito mais relevante). Representa um bem maior na esfera natural e jurídica, uma vez que a sua volta, e como conseqüência de sua existência, todos os demais direitos da pessoa humana gravitam, revelando, assim, os aspectos da superioridade e da inviolabilidade. Caracteriza-se, verdadeiramente, como um direito supra estatal, ou seja, existe a despeito da lei que o pretende criá-lo ou modificá-lo. Não resulta de lei, precede-a.[2]


Pertinente discurso foi proferido pelo Mestre Paulo Gustavo Gonet Branco, em artigo publicado pela Revista Consulex,


“(…)O próprio postulado da dignidade da pessoa humana ganha maior e decisivo peso quando se liga a proteção do direito à vida. Não há respeito a dignidade humana quando se menospreza a própria existência(…)[3]


O direito à vida somente não pode ser considerado como absoluto pela legislação brasileira porque a atual Constituição Federal, prevê a possibilidade, ainda que restrita, de pena de morte em caso de guerra declarada.  Ao contrário,  como  afirmam  alguns  juristas,


que o princípio da dignidade da pessoa humana (art.1º, III, CF/88) seria barreira na qual encontraria limites o direito à vida. A realidade é diversa. A dignidade da pessoa humana não impõe empecilhos mas “caminha” ao lado do direito à vida para sua mais perfeita compreensão e implementação.


O ser humano e a dignidade antecedem ao ordenamento jurídico, assim como os direitos da personalidade.


A dignidade da pessoa humana confere unidade de sentido, de valor e de concordância prática ao sistema dos direitos fundamentais.


Ao reconhecer a íntima vinculação entre a dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais, estabelece-se um conceito capaz de reunir em si dois aspectos fundamentais: uma ação negativa (passiva), por parte do Estado, no sentido de evitar agressões e uma ação positiva (ativa), no sentido de promover ações concretas que, além de evitar agressões, criem condições efetivas de vida digna a todos, como seria preconizado por um projeto constitucional inclusivo.


Neste sentido, a vida constitucionalmente referida não é uma vida qualquer. Seu conceito se apóia noutra definição constitucional que é a da dignidade, vale dizer, o legislador constitucional propugna pela defesa da vida digna.


 Maria Helena Diniz, ao comentar sobre o direito à vida, preconiza que,


“(…)O direito à vida, por ser essencial ao ser humano, condiciona os demais direitos da personalidade. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, caput, assegura a inviolabilidade do direito à vida, ou seja, a integralidade existencial, conseqüentemente, a vida é um bem jurídico tutelado como direito fundamental básico desde a concepção, momento específico, comprovado cientificamente, da formação da pessoa. Se assim é, a vida humana deve ser protegida contra tudo e contra todos, pois é objeto de direito personalíssimo. O respeito a ela e aos demais bens ou direitos correlatos decorre de um dever absoluto ‘erga omnes’, por sua própria natureza, ao qual a ninguém é lícito desobedecer…Garantido está o direito à vida pela norma constitucional em cláusula pétrea, que é intangível, pois contra ela nem mesmo há o poder de emendar…tem eficácia positiva e negativa”(…)[4]


Recentemente, o direito à vida vem sendo ventilado nas mais diversas esferas do direito.Podemos, inclusive, traçar um “histórico” das mais recentes preocupações nacionais com do direito de viver dignamente, como requer a Carta Magna.


Inicialmente, houve um rebuliço nacional quando avaliava-se a legalização, ética e moralidade das pesquisas embrionárias. Logo em seguida, com a elaboração do Projeto de Lei nº 1.135/91, a legalização do aborto passou a ser o objeto de pauta das fomentadas discussões.


À medida que as disputas  ideológicas,  parlamentares  e  no  seio  da  sociedade,  se


acirravam, questões de cunho religioso e legal eram postas na balança.


Com a crise perpétua do sistema  de  saúde  brasileiro,  mortes  de  alguns  pacientes com  problemas  cardíacos,  que  necessitavam  com  urgência  de   transplantes,   ganharam destaque nacional e o Ministério da Saúde teve que se posicionar. Nos últimos meses discute-se a epidemia de dengue no país, relacionando-a, mais uma vez, à decadência de nosso sistema público de saúde.


Apesar de serem vários os temas discutidos e avaliados, há, contudo, um ponto em comum entre todos eles: o direito à vida como o mais fundamental de todos os direitos a ser protegido, obrigatoriamente, pelo Estado, representado por suas três esferas: Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário.


2.2. Tratados Internacionais de Direitos Humanos: superioridade do direito à vida reconhecida internacionalmente pelo Estado Brasileiro.


Em 13 de maio de 1996, o então presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, lançou o I Programa Nacional de Direitos Humanos que, após ser atualizado, teve a sua nova versão apresentada em meados de 2002 e apresenta, como primeiro item, dentre as propostas de ações governamentais para “Garantia do direito à justiça”,


“(…)Adotar, no âmbito da União e dos estados, medidas legislativas, administrativas e judiciais para a resolução de casos de violação de direitos humanos, particularmente aqueles em exame pelos órgãos internacionais de supervisão, garantindo a apuração dos fatos, o julgamento dos responsáveis e a reparação dos danos causados às vítimas(…)”(grifo nosso)[5]


O Estado brasileiro, insere em um plano governamental, que tem como área de atuação todo o território nacional, a necessária, e obrigatória, resolução rápida de conflitos que envolvam o desrespeito aos direitos humanos, particularmente naqueles casos que já estão sob análise perante órgãos de atuação internacional (Exs. Tribunal Penal Internacional e o Conselho de Direitos Humanos da ONU). Com este objetivo, portanto, é que devem pautar-se as ações do Executivo, Legislativo e Judiciário brasileiro.


Na dinâmica do processo de consolidação da democracia, o Brasil tornou-se parte dos principais instrumentos jurídicos internacionais de proteção dos direitos humanos, tanto na esfera da Organização das Nações Unidas (ONU) como da Organização dos Estados Americanos (OEA). Destacam-se: a Declaração Universal de Direitos Humanos, Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos; o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; a Convenção Contra Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes; e a Convenção Americana sobre os Direitos Humanos. O País não tem reservas a qualquer desses instrumentos jurídicos.


O Estado brasileiro, ainda participa de todos os principais foros internacionais de direitos humanos, entre os quais a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, que foi, recentemente, transformada em Conselho de Direitos Humanos, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos e, no que diz respeito aos direitos humanitários, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, no qual é um dos membros do Comitê Executivo.


Sob pena de nos estendermos em demasia e pecarmos pela inclusão de informações desnecessárias e meramente cansativas, neste trabalho, nos deteremos em abordar as correntes que estudam a hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos no Brasil e aprofundar-nos naquela da qual somos seguidores e que fundamentam a tese aqui defendida.


Para se enfrentar corretamente o presente tema, necessário se faz a discussão de: a) como os tratados internacionais que versam sobre os direitos humanos fundamentais incorporam-se ao direito interno e b) quais são as regras de interpretação que devem ser adotadas, especialmente no que concerne à harmonização com o Direito interno.


a) Hierarquia dos tratados internacionais de direitos humanos: normas constitucionais com natureza de direito fundamental.


Há quatro correntes acerca da hierarquia dos tratados de proteção dos direitos humanos: 1) hierarquia supra constitucional; 2) hierarquia constitucional; 3) hierarquia infraconstitucional, mas supra legal e 4) paridade hierárquica entre tratado e lei federal.[6]


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Comecemos pela última corrente. Desde 1977, o STF, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 80.004, firmou o entendimento de que os tratados internacionais estão em paridade com a lei federal, apresentando a mesma hierarquia que esta.


Este posicionamento pode ser derrubado pela seguinte constatação: se os tratados apresentam a mesma hierarquia de lei federal, aplicar-se-ia o Princípio segundo o qual lei posterior  revoga lei anterior (lex posterior derogat priori). Ao aplicar este princípio estar-se-ia indo de encontro ao art. 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, que determina, in verbis, “Uma parte não pode invocar as disposições de seu direito interno para justificar o inadimplemento de um tratado.”


Tal dispositivo reitera a importância, na esfera internacional, do princípio da boa-fé, pelo qual cabe ao Estado conferir cumprimento às disposições de tratado com o qual livremente consentiu (art.46 do mesmo diploma).


Importante salientar que apesar de o Brasil ainda não ter ratificado a Convenção de Viena, o princípio da boa-fé, garantido pelo citado art.27, é base fundamental para ratificação de quaisquer acordos internacionais. Se não, perde-se a confiabilidade por parte da comunidade internacional naquele país que usa de escusas posteriores à ratificação do Tratado para a não observância dos seus enunciados, quando as mesmas poderiam ter sido apresentadas quando da assinatura do documento.


Importante crítica deve ser feita a este posicionamento do STF, que, apesar de ter sido apresentado antes da promulgação da Carta de 1988, foi confirmado por ocasião da apreciação de medida cautelar na ADI 1480 MC/DF, DJ 18/05/2001, quando o Ministro Celso de Mello, enunciou,


“(…)o primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao princípio pacta sunt servanda, inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo nacional, o problema da concorrência entre tratados internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja suprema autoridade normativa deverá sempre prevalecer sobre os atos de direito internacional público”(…)


Infelizmente, a Alta Corte Nacional, a despeito de suas mais variadas decisões que caminham juntamente com as transformações sociais, ainda tem entendimento cuja substância origina-se no conceito antigo de soberania e, expressamente, declara que o Estado brasileiro pode se opor ao cumprimento de regras de Direito Internacional, dispostas em tratados que ratificou. Em outras palavras, afirma que o Brasil pode agir de má-fe frente a toda comunidade internacional, isto porque, considerando-se que os tratados posicionam-se hierarquicamente ao lado das leis ordinárias e aplicando-se o princípio da lex posterior derogat priori, entende-se que sendo editada uma lei ordinária que trate do mesmo assunto compreendido pelo tratado, automaticamente, ela o revogará internamente.


Inobstante o posicionamento adotado pelo Excelso Pretório, adotamos a corrente que entende serem os tratados internacionais de direitos humanos equivalentes à norma constitucional e não apenas isso, mas que têm a natureza de normas de direito fundamental. Ao tecer as devidas considerações sobre este posicionamento os restantes, mencionados no início deste item, serão, paulatinamente, excluídos.


Faça-se uma interpretação sistemática do significado das redações dos §§1º, 2º e 3º do art. 5º da Constituição Federal e chegar-se-á à conclusão alhures apresentada. Vejamos. Os referidos parágrafos dispõem que,


“§ 1º – As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.


§2º – Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes…dos tratados internacionais dos quais a República Federativa do Brasil seja parte.


§ 3º – Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.”


Com o enunciado do §2º, a Carta de 1988 está a incluir no rol de direitos constitucionalmente protegidos, os direitos enunciados nos tratados internacionais dos quais o Brasil seja parte e, a partir da inclusão do §3º, pela Emenda Constitucional nº 45, de 08 de dezembro de 2004, todos os tratados e convenções que seguirem o rito de aprovação ali estabelecido, terão o caráter de emenda constitucional. A intenção do constituinte derivado era de dar caráter de norma constitucional aos tratados de direitos humanos, sendo necessário, apenas, o cumprimento de mera formalidade; uma vez que o §1º já estabelecia que as normas definidoras de direitos fundamentais têm aplicabilidade imediata.


Assim sendo, os tratados internacionais de direitos humanos assinados pelo Presidente da República, a partir de 08 de dezembro de 2004, deverão seguir o rito estabelecido no §3º do art.5º da CF para que tenham o caráter de norma constitucional, os demais, ratificados anteriormente a entrada em vigor da Emenda nº 45, mesmo sem terem sido aprovados em 2 turnos e por 3/5 dos votos dos membros de cada Casa do Congresso Nacional, terão o caráter de norma constitucional por tratarem-se de direitos fundamentais e, por conseguinte, têm aplicabilidade imediata, conforme o §1º do art. 5º da CF.


Observe-se que, seque faz-se necessário uma interpretação a partir do princípio de proteção prioritária dos direitos humanos ou da constatação do reconhecimento pela própria Constituição Federal de sua incompletude, ao expressamente dispor que os direitos e garantias por ela expressos não excluem os enunciados em tratados internacionais, concedendo-lhes, a contrario sensu, o valor de norma constitucional.


Para Canotilho[7] e Antônio de Araújo[8], o conteúdo materialmente constitucional dos tratados e convenções internacionais de direitos humanos é suficiente para reconhecer-lhes a condição de norma constitucional, ademais quando considera-se a proliferação de instrumentos internacionais sobre Direitos do Homem e do fenômeno da integração comunitária.


Ao reconhecer aos tratados, validade de regra jurídica a ser seguida internamente e sabendo-se que os tratados de direitos humanos enunciam direitos fundamentais, com a disposição expressa do §1º de que estas têm aplicabilidade imediata, logicamente, reconhece-se aos tratados de direitos humanos não apenas o valor de norma constitucional como de norma constitucional de direito fundamental.


3.Solução ao conflito de direitos fundamentais: teoria da ponderação, interpretação constitucional evolutiva e primado do direito mais relevante.


3.1.Ponderação de Direitos Fundamentais


Devido à carga valorativa inserta em nossa Constituição, que tem uma pluralidade de concepções, é certo que normalmente haja uma tensão permanente entre alguns princípios.


Sabe-se que os direitos fundamentais não são absolutos e ilimitados, encontram seus limites em outros direitos fundamentais, também consagrados pela Magna Carta.. Portanto, quando houver uma aparente contradição ou conflito entre direitos fundamentais utilizar-se-á da aplicação do princípio constitucional fundamental da proporcionalidade, que concederá ao caso concreto uma aplicação coerente e segura da norma constitucional.


Este é um princípio que funciona como critério para solução de conflitos de direitos fundamentais, através de juízos comparativos de ponderação dos interesses envolvidos no caso concreto.


Ao buscar a interpretação dos direitos fundamentais catalogados a primeira dificuldade apontada é a dos limites, ou seja, até que ponto é possível buscar o exercício de um direito fundamental tutelado e como solucionar quando há conflito entre estes direitos.


Neste caso, as colisões podem ocorrer quando os titulares têm direitos fundamentais idênticos ou, ainda, quando há distinção de direitos fundamentais, mais o exercício de um dos titulares limita a irradiação de efeitos do outro.


Todas as teorias de interpretação, que têm como objeto de estudo o fenômeno da colisão de direitos fundamentais, tem um ponto de consenso, que é o entendimento de que não há possibilidade de solucionar tal questão sem limitar ou restringir um dos titulares de direitos fundamentais.


Inicialmente, deve-se determinar se os direitos fundamentais são regras ou princípios.


Sabe-se que os princípios, ao lado das regras, são normas jurídicas. Os princípios, porém, exercem dentro do sistema normativo um papel diferente dos das regras. Estas, por descreverem fatos hipotéticos, possuem a nítida função de regular, direta ou indiretamente, as relações jurídicas que se enquadrem nas molduras típicas por elas descritas. Não é assim com os princípios, que são normas generalíssimas dentro do sistema.


Os princípios podem ser vislumbrados em distintas dimensões: fundamentadora, interpretativa, supletiva, integrativa, diretiva e limitativa.[9] Assim sendo, qualificam,


“(…) juridicamente, a própria realidade a que se referem, indicando qual a posição que os agentes jurídicos devem tomar em relação a ela, ou seja, apontado o rumo que deve seguir a regulamentação da realidade, de modo a não contravir aos valores contidos no princípio” e, tratando-se de princípio inserido na Constituição, a de revogar as normas anteriores e invalidar as posteriores que lhes sejam irredutivelmente incompatíveis”(…)[10]


Após o exposto, observa-se que os direitos fundamentais enunciados no art.5º da Constituição Federal de 1988 tratam-se de princípios constitucionais, uma vez que indicam o norte para o qual deve-se  guiar o hermeneuta e são considerados como a base na qual se estruturou toda a Carta Magna. Os Direitos Fundamentais estão inseridos dentro daquilo que o constitucionalismo denomina de princípios constitucionais fundamentais, que são os princípios que guardam os valores fundamentais da ordem jurídica.


Visando apontar a especificidade jurídica dos princípios, Alexy os diferencia das regras através da análise das formas de solução, dentro do ordenamento jurídico, do conflito interno entre regras e entre princípios. O conflito entre regras pode ser solucionado, segundo o ordenamento normativo do direito, de duas maneiras: ou através de uma cláusula de exceção que uma das regras teria, a qual eliminaria o conflito ao estabelecer uma solução específica para o caso, ou então, uma delas estaria a lesar o ordenamento jurídico o que a tornaria inválida e, portanto, deveria tal regra ser expelida do mesmo ordenamento.[11]


No caso do conflito entre os princípios, este se dá no plano do seu “peso valorativo” que entre eles – os princípios colidentes – deverá ser ponderado e não no plano da validade, como no caso do conflito entre regras.


Ele denomina tal critério hermenêutico de regra da proporcionalidade, um meta-princípio estruturado em três passos ou estágios subseqüentes: o da adequação, o da necessidade e o da proporcionalidade, em sentido estrito. O primeiro passo diz respeito à verificação da adequabilidade dos meios jurídicos empregados para a obtenção de um certo fim. O segundo passo questiona a existência de outro meio, menos gravoso para a propriedade privada, que tutelasse o meio ambiente com a mesma eficácia. Por fim, no estágio da razoabilidade em sentido estrito, procede-se a um cálculo de custo-benefício entre os princípios colidentes de modo a verificar seu maior ou menor grau de eficácia.[12]


Conclui-se que, a partir da consideração que os princípios constitucionais encontram-se num mesmo patamar de igualdade, quando o hermeneuta depara-se com uma situação na qual são postos, em conflito, dois princípios constitucionais, lhe caberá dar precedência a um em detrimento do outro, não lhe atribuindo primazia absoluta, mas valorando-o de conformidade com o caso concreto; por conseguinte, o intérprete deverá valer-se de um critério hermenêutico de ponderação dos valores jusfundamentais que Alexy denomina de “máxima da proporcionalidade” a qual é equacionada em três fases, como acima demonstrado.


O juízo de ponderação não atribui hierarquia absoluta entre um princípio sobre outro, ao contrário deve assegurar a aplicação das normas em colisão, sendo que uma delas fatalmente será preterida ou atenuada em prol da melhor justiça.


3.2.Interpretação constitucional evolutiva: princípio da maior eficácia dos direitos fundamentais. Crítica à interpretação literal.


Muito se tem discutido acerca da efetividade dos direitos constitucionalmente garantidos.


Num país em que em muitos setores sociais dão ainda os primeiros passos, ostentando Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) pior do que o de países ainda em organização tribal, ainda não se conseguiu garantir aos seus nacionais sequer os direitos a liberdades públicas ditas de primeira dimensão, como a liberdade e a vida.


Recentemente vem sendo objeto de estudo a denominada interpretação constitucional evolutiva, que propugna pela alteração constitucional não em seu texto, mas na compreensão dos seus significados e na progressiva concretização de seus princípios e garantias, a partir de uma compreensão sistemática e axiológica conceitual.[13]


Isto é, ao aplicar normas constitucionais aos casos concretos examinados, devem ser propostas soluções que estejam em consonância com as linhas mestras reconhecidas nos direitos humanos internacionais e na Constituição Federal, de forma a dar materialidade às garantias perseguidas pelo Constituinte de 1988, quais sejam: os valores de uma sociedade fraterna, pluralista, a redução das desigualdades sociais e regionais e a garantia dos direitos fundamentais.


Ao atribuir-se carga normativa aos princípios mestres da Constituição – como a dignidade da pessoa humana e a inviolabilidade do direito à vida –, é possível uma interpretação pós-positivista, alinhando-se a esses princípios constitucionais fundamentais todas as normas, nacionais ou de convenções internacionais, formando um bloco normativo cujos elementos integrantes se intercomunicam.


Vedado está, ao intérprete constitucional, realizar verdadeiros retrocessos dos direitos fundamentais, como faz a Suprema Corte em sua hermenêutica paradoxal. Admite-se os Tratados como regras jurídicas aplicáveis nacionalmente, enuncia-se que os direitos fundamentais têm aplicabilidade imediata, ao mesmo tempo que qualifica-se os tratados internacionais de direitos humanos – que dispõem sobre os mais fundamentais dos direitos-, como lei ordinária, passíveis, portanto, de serem revogados por qualquer outra lei ordinária. Neste sentido, leciona Ingo Wolfgang Sarlet,


“(…)impõe-se a indagação sobre se um dos efeitos inerentes às normas constitucionais que consagram direitos fundamentais desta natureza não seria também o de gerarem o que se convencionou chamar de proibição de retrocesso, impedindo o legislador de, voltando atrás sobre seus próprios passos, abolir determinadas posições jurídicas por ele próprio criadas. Cumpre frisar, neste contexto, que parte da doutrina se posiciona favoravelmente a este aspecto, ressaltando que, uma vez concretizado determinado direito social prestacional, este acaba por transformar-se, neste sentido, num típico direito de defesa”(…)[14]


Ao interpretar a Constituição de modo a alcançar a maior efetividade de suas normas, firmando-as de conformidade com a realidade social, bem como em consonância com todo o texto constitucional, destaca-se a aplicação dos seguintes princípios de interpretação constitucional: 1)Princípio de unidade da Constituição; 2)Princípio da máxima efetividade e o 3) Princípio de interpretação conforme à Constituição.


Os princípios constitucionais são o conjunto de normas que espelham a ideologia da


Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte como fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui.[15]


Quanto a problemática de interpretação constitucional, leciona José Afonso da Silva,


“(…)a tarefa da hermenêutica constitucional consiste em desvendar o sentido mais profundo da Constituição pela captação de seu significado interno, da relação de suas partes entre si e mais latamente sua relação com o espírito da época, ou seja, a compreensão histórica de seu conteúdo, sua compreensão gramatical na sua relação com a linguagem e sua compreensão espiritual na sua relação com a visão total da época. Ou, em outras palavras, o sentido da Constituição se alcançará pela aplicação de três formas de hermenêutica: a) a hermenêutica das palavras; b) a hermenêutica do espírito; c) a hermenêutica do sentido, segundo Richard .Palmer (p. 86) que prefiro chamar de hermenêutica contextual(…)”[16]


Modernamente, deve-se buscar uma interpretação que enquanto reflete o interesse do constituinte originário, melhor adequa-se a realidade social e englobe o sentido maior de toda a Carta Constitucional. Neste sentido, deve-se interpretar a Constituição objetivando-se conferir a maior eficácia aos direitos fundamentais, incluindo-se, neste rol, os enunciados em Tratados de Direitos Humanos.


Partindo-se da consideração que o direito a uma vida digna – fusão do princípio da dignidade da pessoa humana e do direito à vida – é o mais fundamental de todos os direitos, constata-se que o intérprete constitucional, ao aplicar as regras de hermenêutica quando da leitura da Carta Magna, deve ter sempre em mente, o fim maior do constituinte originário, ao instituir o princípio da dignidade da pessoa humana, dispor o direito à vida no caput do art.5º e elencar os §§1º e 2º do art.5º da CF/88; do constituinte derivado, ao acrescentar o §3º e dos Poderes Executivo e Legislativo, ao assinarem, aprovarem e ratificarem os Tratados de Direitos Humanos.


Por fim, importante fazermos uma rápida menção a regra de hermenêutica aplicada pelos intérpretes da Constituição Federal que consideram inconstitucional a permissividade da quebra de sigilo bancário em sede de processo civil, porque de acordo com o disposto no  art.5º,XII, a mesma é considerada uma exceção apenas utilizável em procedimentos criminais.


O modelo interpretativo por eles utilizado é denominado de interpretação literal ou, como consideram alguns, interpretação gramatical, criticada por muitos juristas nacionais e internacionais, por não buscar o sentido, o espírito, de todo o Texto Constitucional, mas apenas de algumas palavras ou expressões isoladamente.


De passagem, sobre essa temática, merece referência o seguinte voto do então Ministro do STF, Carlos Velloso:


“(…)Ora, a meu ver essa interpretação puramente literal de um texto isolado não seria boa. Temos que interpretar as normas constitucionais no seu contexto e quando interpretamos a Constituição é bom lembrar a afirmativa de Marshall, no ‘M’Culloch v. Maryland’, de 1819: quando se interpretam normas constitucionais, deve o intérprete estar atento ao espírito da Constituição, ao que ela contém no seu contexto. Parece-me que a interpretação literal não prestaria obséquio à Constituição, que deve ser sistematicamente interpretada(…)”[17]


Há regras que o intérprete tem que seguir, regras essas que dependem da orientação que ele assume e sua cultura, que se manifesta nos chamados métodos de interpretação, que se multiplicam a partir da fértil imaginação da teoria constitucional germânica, de onde vêm os métodos chamados científico-espiritual, hermenêutico-concretizador, tópico-problemático e jurídico normativo-estruturante. Entretanto, para que uma interpretação prestigie os princípios democráticos jurisprudência dos valores é a que mais se aconselha, porque se trata de um método de interpretação que encontra base no texto de nossa Constituição, precisamente porque ela incorpora um sistema de valores essenciais à convivência democrática que informa todo o ordenamento jurídico.


Seguindo este pensamento, importante a mensagem deixada por José Afonso da Silva,


“(…)Todas as suas normas e princípios são suscetíveis de serem interpretados em função do valor que neles se encarnam, especialmente porque todas as normas e princípios constitucionais têm uma única direção qual seja a de garantir o primado da dignidade da pessoa humana, que, por seu lado, resume todas as manifestações dos direitos humanos. A dignidade da pessoa humana, inscrito no art. 1º, III, da Constituição, não é uma criação constitucional, pois ela é um desses conceitos a priori, um dado preexistente a toda experiência especulativa, tal como a própria pessoa humana.(…)”[18]


Deve-se, portanto, interpretar a Constituição primando-se pela garantia do princípio da dignidade da pessoa humana, pela garantia de uma vida digna.


Ao interpretar-se o art. 5º,XII e §3º da CF/88, deve-se aplicar as regras da interpretação evolutiva – objetivando-se a máxima efetividade dos direitos fundamentais -, analisando-se a redação do dispositivo em consonância com o espírito da Carta Magna, expressos pelo legislador em várias passagens de seu Texto, as quais foram alhures mencionadas: da superioridade do direito a uma vida digna. A Constituição, reconhecendo a sua existência e a sua eminência, transformou-a num valor supremo da ordem jurídica, quando declara a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito e o direito à vida como o mais fundamental de todos os direitos, expresso por sua inserção no caput do art. 5º da CF/88 e reconhecido por todos os Tratados de Direitos Humanos já ratificados pelo Brasil.


Conclui-se, após as devidas análises, que o princípio da ponderação é o que, hoje, melhor se adequa a situações de conflito entre direitos fundamentais; ocorre que, quando um desses direitos a ser  avaliado é o direito à vida, deve-se acrescer ao referido princípio  as técnicas basilares da teoria da interpretação evolutiva somadas ao primado do direito mais relevante.


Como já foi pormenorizadamente explanado, se está em discussão a vida de um ser humano, fica superada toda e qualquer alegação que possa ser feita, não cabendo aos entes públicos criar burocracias, pondo em risco a mesma, porque essa é a relevância da questão.


A vida não está no mesmo patamar de nenhum dos outros direitos fundamentais, por isso, independentemente da situação posta no caso concreto, ela sempre será considerada o direito mais relevante e, como tal, quando feito o juízo de ponderação, ela se sobreporá e, aplicando-se as bases constituintes da interpretação evolutiva, o hermeneuta decidirá por defender o mais fundamental de todos os direitos, o princípio maior de toda a Carta Constitucional, não retrocedendo em décadas de construção legislativa na defesa dos direitos humanos fundamentais.


4.Direito fundamental ao sigilo das informações: quebra do sigilo.


A Constituição Federal de 1988, ao tratar de direitos e garantias individuais, dispõe nos incisos X e XII do artigo 5º, respectivamente, que: “X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (…); XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal”.


Todos esses valores considerados pela Carta Suprema relacionam-se com o sigilo de dados e informações. Primando por este objetivo, são garantidos o sigilo profissional, o sigilo funcional, o sigilo bancário e o sigilo fiscal.


O sigilo tem como máxime proteger a individualidade do ser humano, visa resguardar suas informações pessoais, de forma que seus dados não sejam transmitidos a outras pessoas sem o seu consentimento, de modo a não lhe gerar transtornos e constrangimentos. Entretanto, em prol de um “bem maior” este direito individual é relativizado e ocorre o que se chama de quebra de sigilo.


O direito de proteção às informações, inclusive aquele referente a dados fiscais e bancários, não é absoluto. Ninguém pode se eximir de prestar informações no interesse público, para esclarecimento de fatos essenciais e indispensáveis à aplicação da lei, principalmente, quando trata-se de norma de caráter constitucional, também de direito fundamental, como é o caso do direito à vida.


O sigilo, em verdade, não é estabelecido para ocultar fatos, mas, sim, para revestir  a revelação deles de um caráter de excepcionalidade.


A jurisprudência do STF, conciliando o interesse público com o interesse privado, entendeu que a garantia do sigilo de dados constitui matéria que “resolve-se com observância de normas infraconstitucionais, com respeito ao princípio da razoabilidade e que estabeleceriam o procedimento ou o devido processo legal para a quebra do sigilo bancário”.[19]


O CTN (Código Tributário Nacional) ao tratar de um dos deveres da Administração Pública, qual seja, o de fiscalização, também faz referência ao sigilo, em seu artigo 198.


Para remover esse obstáculo criado pelo Código Tributário Nacional foi editada a  Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001. Seu art. 6º dispõe que as autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios examinem documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso, e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.


Após a edição da Lei Complementar (LC) nº 105 diversos juristas, em todo o país, alegaram sua inconstitucionalidade, por permitir a quebra do sigilo bancário através de determinação advinda de autoridade administrativa. Mais uma vez, dentro do universo jurídico dos debates o sigilo das informações foi arduamente defendido.


Não nos cabe discutir neste trabalho a constitucionalidade da referida LC, por não encontrar-se dentro de nosso objeto de estudo, contudo, cabe-nos informar que embora a maioria dos juristas exerça ferrenha defesa do sigilo bancário, a Constituição Federal não se referiu diretamente a isso. O que a Lei Maior garante é o direito à intimidade, à privacidade e a inviolabilidade da transmissão de dados. O direito à privacidade e à intimidade não têm definição fechada, estando no nebuloso campo interpretativo.


O sigilo das informações que encontra-se garantido pelo direito à privacidade e a inviolabilidade, apesar de considerado como direito fundamental e direito de personalidade, por estar elencado no art. 5º da Constituição Federal, encontra-se numa posição hierarquicamente inferior aos direitos personalíssimos. O direito à vida é um direito personalíssimo, o mais fundamental de todos os direitos, verdadeira condição de existência para quaisquer outros direitos, inclusive, os direitos de personalidade. Constitue-se no mínimo necessário para que a pessoa exista, é um direito inato, congênito e extrapatrimonial a cada se humano; é oponível a todos e irrenunciável. Sem vida não há sigilo às informações, porque não haverá nenhum ser cujas informações devam ser resguardadas.


Pondo-se os pesos na balança, aplicando-se o princípio da ponderação em conjunto com o princípio da interpretação evolutiva – tarefa do Poder Judiciário -, encontrar-se-á que o direito mais relevante a ser protegido e garantido sobre todos os demais, inclusive sobre o direito fundamental do sigilo das informações, é o direito à vida.


Quiroga Lavié aponta a relatividade dos direitos fundamentais, afirmando que os indivíduos devem operar observando os limites impostos pelo direito.[20]


A Declaração Universal de Direitos Humanos declara a relatividade dos direitos fundamentais, ao dispor:


“Art. XXIX.


1. (…)


2. Nos exercícios de seus direitos e liberdades, toda pessoa estará sujeita apenas as limitações determinadas pela lei, exclusivamente com o fim de assegurar o devido reconhecimento dos direitos e liberdades de outrem e de satisfazer as justas exigências da moral, da ordem pública e do bem-estar de uma sociedade democrática.”


É cediço, que “direito fundamental não pode servir de salvaguarda de práticas ilícitas.” [21] E não é este o caso que encontra-se o pai que buscando fugir do cumprimento de sua obrigação alimentar para com seu filho, foge da justiça e muda-se constantemente para que não seja encontrado e executada a pensão alimentar arbitrada judicialmente?


Abaixo trataremos especificamente deste caso, do pai que, por anos, nega-se em cumprir a obrigação alimentar que tem para com seu filho, infringindo seu direito a uma vida digna, agindo, portanto, ilicitamente.


Deve-se, frisar, ao final, que cabe, unicamente, ao Poder Judiciário, a quebra do sigilo das informações, garantindo-se, desse modo a eficácia do princípio constitucional da reserva jurisdicional[22], bem como a imparcialidade da decisão.


5.Descumprimento do pagamento de pensão alimentícia: violação do direito à vida – prisão civil  e quebra do sigilo das informações.


5.1. Garantia do direito a alimentos: prisão civil e quebra do sigilo das informações.


Quando do julgamento do Agravo de Instrumento nº 70018683508, apreciado em 28 de março de 2007, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, deferiu o pedido de quebra do sigilo telefônico de devedor de alimentos que vem, reiteradamente, e por um período bastante longo, furtando-se da intimação para cumprimento de ordem de prisão em seu desfavor.


Conforme o relatório do Agravo de Instrumento, os autores buscavam o pagamento de pensão alimentícia, devida desde março de 2004. Como o devedor reside em comarca diferente da dos autores, observaram-se diversas dificuldades em citá-lo na ação executória instaurada, tendo sido expedida ordem de prisão em abril de 2006.


Por sugestão dos agentes de polícia de São Paulo, que buscaram pelo executado inúmeras vezes, requereu-se a quebra de seu sigilo telefônico.


O pedido foi negado em primeira instância e a medida liminar do agravo, então interposto, também foi indeferida pelo Desembargador plantonista.


Quando do julgamento na Turma, o agravo foi unanimemente provido sob o fundamento de que o direito à vida dos alimentandos sobrepõe-se  à intimidade do executado.


Alega-se a inconstitucionalidade de decisões que, como esta, decretam a quebra do sigilo as informações em sede de processo civil, sob o fundamento de que vai de encontro ao art. 5º,XII,CF/88, o qual enuncia, in verbis,


“Art. 5º. (…)


XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.” (grifo nosso)


 A inconstitucionalidade refere-se a necessidade de existência de um processo penal e que, conforme a Lei n º 9.296/96, que regulamenta o sigilo telefônico, é necessária a comprovação efetiva de ser o único modo de descobrimento para a produção probatória da verdade.


Como já discutido anteriormente, o direito à vida soma-se ao princípio da dignidade da pessoa humana, desse modo, todo ser humano tem direito a uma vida digna; direito este que sobrepõe-se a quaisquer outros, uma vez que dele derivam todos os demais direitos fundamentais. Trata-se de direito personalíssimo, sem o qual não existiram nenhum dos direitos de personalidade. Demonstrada, portanto, indiscutivelmente, a violação do direito a uma vida digna, devem ser utilizados todos os recursos jurídicos disponíveis com o intuito de fazer parar o desrespeito à inviolabilidade deste direito. Fazendo uso, inclusive, da quebra do sigilo das informações – telefônicas, de correspondência ou bancárias – , mesmo que em sede de processo civil, pois sabe-se que o mais superior dos direitos fundamentais está sendo transgredido.


 Por sua indiscutível importância, as normas atinentes ao direito alimentar são consideradas de ordem pública, pois objetivam proteger e preservar a vida humana. Em conseqüência, tais regras são inderrogáveis e, sobretudo, quando os alimentos derivam do iure sanguinis, ou seja, de obrigação por parentesco, não admitem renúncia ao direito nem convenção que assente a inalterabilidade de seu valor, devendo atender as necessidades normais de qualquer pessoa em desenvolvimento; abarcando-se, neste caso, a habitação, a alimentação, o vestuário, o tratamento médico, a instrução, educação e o lazer.


Diversos são os instrumentos jurídicos, que ligam-se, diretamente, ao direito alimentar, dada a sua especificidade e especialidade, como obtemperam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery,


“(…)A obrigação legal de alimentos é toda especial. Como seu adimplemento se relaciona diretamente com a sobrevivência do alimentando, o sistema dota a prestação alimentar de mecanismos extraordinários de cumprimento, dentre os quais se destacam a possibilidade de prisão civil (CF 5º LXVII); o privilégio constitucional creditório (CF 100 caput e § 1º); garantias especiais de execução (CPC 602) e o privilégio de foro do domicílio ou da residência do alimentando, para a ação em que se pedem alimentos (CPC 100 II)(…)”(grifo nosso)[23]


A prisão civil por alimentos está disposta no art. 5º, LXVII da Constituição Federal e no art. 733, §1º do Código de Processo Civil (CPC). É uma forma de coerção imposta ao devedor de alimentos, garantida ao alimentante, dentre as modalidades de direitos fundamentais.


A prisão civil do devedor de alimentos não é punição, mas um meio coercitivo para que os alimentados possam ver, o mais rápido possível, atendidas as suas necessidades básicas.


Analisando, sistematicamente, o artigo 733,§1º do CPC com o art.5º, inciso LXVII da CF/88, constata-se que o procedimento prevê a possibilidade de prisão civil alimentar na hipótese de inadimplemento voluntário e inescusável, ou seja, se um alimentante deixa de pagar a pensão porque está desempregado e não tem qualquer ganho que lhe possibilite arcar com o pagamento dos alimentos, sua prisão não será decretada. Logo, o art.733 garante o princípio da ampla defesa antes da decretação do mandado de prisão.


Além de justificar, durante o procedimento executório, sobre sua impossibilidade de cumprir com o pagamento, o alimentante, que não tem meios de arcar com a pensão alimentícia, poderá promover uma ação de revisão dos alimentos prestados, em que buscará a exoneração provisória, ou a diminuição do valor que foi arbitrado, conforme o caso.


A prisão civil é meio de experimentar a solvabilidade, ou de vencer a má vontade daquele que procura ocultar o que possui. Vários são os autores, que ressaltam a natureza da prisão como meio coercitivo, dentre eles, Barbosa Moreira[24], Humberto Theodoro Júnior[25] e Pontes de Miranda[26], afirmando que a prisão representa um meio de coerção tendente a conseguir o adimplemento da prestação por obra do próprio devedor, estando totalmente despojada de caráter punitivo.


Após as discussões realizadas, nos deparamos com um paradoxo: a Constituição Federal de 1988, expressamente, declara a possibilidade de decretação de prisão daquele que, reiteradamente, descumpre com sua obrigação de prestação alimentícia para com seu filho menor, entretanto, não permite a quebra do sigilo telefônico desse mesmo devedor, com o intuito de encontrá-lo, ou seja, privilegia-se o direito à intimidade em detrimento do direito à liberdade do devedor de alimentos.


Hierarquicamente, pode-se afirmar que, o direito à vida é o mais valioso dos direitos fundamentais; seguido, neste caso, pelos direitos à liberdade e à intimidade, nesta ordem valorativa. Desse modo, aplicando-se os princípios da ponderação e da interpretação evolutiva, encontrar-se-á o verdadeiro significado da Lei: ao salvaguardar o direito à alimentos, a Carta Magna, objetiva garantir o direito à inviolabilidade de uma vida digna do alimentando e, por conseguinte, possibilita a restrição da liberdade do devedor e, obviamente, a quebra do sigilo das informações. Neste último caso, desde que haja comprovação, inequívoca, de violação do direito à vida.


Quando da análise pertinente à pedido de prisão civil por não pagamento da prestação alimentícia, os olhos do hermeneuta estão voltados ao devedor  – se não cumpre com o pagamento porque não pode ou porque não quer e o lapso temporal decorrido sem os alimentos devidos -, enquanto que, quando da análise da decretação de quebra dos sigilo das informações, volta-se a atenção, ao alimentando – analisa-se se o seu direito, fundamental e personalíssimo, à inviolabilidade de uma vida digna, está sendo infringido pela escusa do devedor.


6.Considerações Finais.


A Constituição da República Federativa do Brasil assegurou no art. 1º, III, como princípio do Estado Democrático de Direito Brasileiro, a dignidade da pessoa humana e trouxe, no caput do art. 5º, a inviolabilidade do direito à vida, estabelecendo, outrossim, como direito fundamental e personalíssimo, o direito a uma vida digna. Direito reconhecido, inclusive, por diversos tratados internacionais de direitos humanos, dos quais o Brasil é parte e que, posicionam-se, hierarquicamente, no ordenamento jurídico brasileiro, como norma constitucional de direito fundamental.


Ainda, a Magna Carta, dispõe sobre a inviolabilidade do sigilo de informações como regra e, excepcionalmente, a interceptação para fins de investigação criminal e instrução processual penal (art. 5º,XII). Trata-se do direito fundamental à intimidade de cada ser humano.


O direito à intimidade, como todos os demais, encontra limitações em seu exercício, principalmente no tocante às demais liberdades públicas.


Missão das mais difíceis é justamente encontrar até onde os limites cerceiam tal direito, erigido ao importante rol dos direitos da personalidade. O que se encontra em conflito é o interesse de preservar a vida privada contra o interesse de justiça. Nos deparamos com uma situação onde o excesso de limites bem como a maximização do exercício ao direito à intimidade podem trazer conseqüências nefastas como a ilegítima violação de direito fundamental ou a impunidade, respectivamente.


Quando o direito à vida e o direito à intimidade, ambos direitos fundamentais reconhecidos pela Constituição Federal de 1988, encontram-se em conflito, cabe ao hermeuneuta aplicar os princípios da ponderação e da interpretação evolutiva, buscando encontrar o direito mais relevante.


Foi o caso do julgamento do AI nº 70018683508, pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O direito à alimentos do menor, filho do executado, garante-lhe a manutenção dos direitos à alimentação adequada e à saúde, ambos corolários do direito à vida. Todos os recursos legais foram utilizados e o devedor não foi encontrado, após mais de 3 anos de duração do pleito. Sem as condições mínimas para sua subsistência, o direito a uma vida digna do menor estava sendo violado, portanto, a quebra do sigilo telefônico, medida cabível nas circunstâncias, poderia e deveria ser aplicada, independentemente de tratar-se de procedimento civil ou criminal.


Uma vez que a própria CF/88 possibilita-se a prisão civil do devedor de alimentos, porque impossibilitaria a quebra do sigilo de suas informações, sabendo-se que o direito à liberdade em muito supera o direito à intimidade?


Independentemente do caso concreto posto sob análise, o direito à vida irá sempre se sobrepor e, desde que demonstrado, inequivocadamente, que o mesmo está sendo violado e que todos os recursos, legalmente dispostos, já foram utilizados, não há razão, moral, ética ou jurídica, para não ser decretada a quebra do sigilo das informações daquele que, continuadamente, infringe o mais fundamental de todos os direitos.


 


Referências Bibliográficas

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12.NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil anotado e legislação extravagante: atualizado até 2 de maio de 2003. 2. ed. rev. e  ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2003;

13.PIOVESAN, Flavia. Direitos Humanos e o direito constitucional internacional. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007;

14.Pontes de Miranda. Comentários à Constituição de 1946. 3. ed., Tomo IV, Rio de Janeiro: BORSOI, 1960;

15.PONTES DE MIRANDA, F. C. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, t.10 1976;

16.Programa Nacional de Direitos Humanos: PNDH II. Ministério da Justiça. Secretaria de Estado dos Direitos Humanos. Disponível em: < http://www.mj.gov.br/sedh/pndh/pndh2.pdf>;

17.ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 4ª ed. Malheiros, São Paulo, 1999;

18.SARLET, Ingo Wolfgang. Os Direitos Fundamentais Sociais na Constituição de 1988. Revista Diálogo Jurídico. Direito Público. Vol. 1, 2001. Disponível em <http://www.direitopublico.com.br/pdf/revista-dialogo-juridico-01-2001-ingo-sarlet.pdf>;

19.SILVA, José Afonso da. Interpretação da Constituição. In: I Seminário de Direito Constitucional Administrativo, 2006, p. 1. Disponível em: < http://www.tcm.sp.gov.br/legislacao/doutrina/30a03_06_05/jose_afonso1.htm>.

 

Notas:

[1]  Inteiro teor da decisão disponível em: <http://jus2.uol.com.br/pecas/texto.asp?id=757>

[2]  Pontes de Miranda. Comentários à Constituição de 1946. 3. ed., Tomo IV, Rio de Janeiro: BORSOI, 1960, p. 242 e 243.

[3] BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Tem o embrião direito à vida?Revista Jurídica Consulex. 30 de abril de 2008. p. 56.

[4] DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito. São Paulo: Editora Saraiva, 2001. p. 22/24.  

[5]  Programa Nacional de Direitos Humanos: PNDH II. Ministério da Justiça. Secretaria de Estado dos Direitos Humanos. Disponível em: < http://www.mj.gov.br/sedh/pndh/pndh2.pdf>

[6]  PIOVESAN, Flavia. Direitos Humanos e o direito constitucional internacional. 8ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p.71.

[7]  CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 1993, p. 901.

[8]  ARAÚJO, Antônio de. Relações entre o direito internacional e o direito interno: limitação dos efeitos do juízo de constitucionalidade. In: Estudos sobre a jurisprudência do Tribunal Constitucional. Lisboa: Editorial Notícias, 1993,111 p.13.

[9]  BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 7a ed. Malheiros, São Paulo, 1998, p. 254

[10]   ROCHA, José de Albuquerque. Teoria Geral do Processo. 4ª ed. Malheiros, São Paulo, 1999, p. 47.

[11] Alexy, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, 2002, p. 87-89.

[12]  Ob. Cit. p. 111-115

[13]  BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e Aplicação da Constituição. 4a edição. São Paulo, Editora Saraiva, 2001, p. 145.

[14]  SARLET, Ingo Wolfgang. Os Direitos Fundamentais Sociais na Constituição de 1988. Revista Diálogo Jurídico. Direito Público. Vol. 1, 2001, p.34. Disponível em <http://www.direitopublico.com.br/pdf/revista-dialogo-juridico-01-2001-ingo-sarlet.pdf>.

[15] BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. São Paulo, Saraiva, 1999, p. 147.

[16] SILVA, José Afonso da. Interpretação da Constituição. In: I Seminário de Direito Constitucional Administrativo, 2006, p. 1. Disponível em: < http://www.tcm.sp.gov.br/legislacao/doutrina/30a03_06_05/jose_afonso1.htm>

[17] Voto na Reclamação 383/SP, RTJ 147/465

[18]  Ob. Cit. p. 3

[19]  RE nº 219.970, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 10-9-99, p. 23.

[20]  LAVIÉ, Quiroga. Derecho constitucional. 3ª ed. Buenos Aires: Depalma, 1993, p. 123.

[21]  RT 709/418, Supremo Tribunal Federal.

[22]  MS 23.452 – RJ. Supremo Tribunal Federal. Relator: Ministro Celso de Mellok

[23]  NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria Andrade. Código Civil anotado e legislação extravagante: atualizado até 2 de maio de 2003. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 2003, p.749.

[24]  MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1976, p.114-115.

[25]  JÚNIOR, Humberto Theodoro. Processo de Execução. 3 ed. São Paulo: LEUD, 1976, p. 342.

[26] PONTES DE MIRANDA, F. C. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, t.10 1976, p. 483.


Informações Sobre o Autor

Paola Frassinetti Alves de Miranda

Bacharela em Ciências Jurídicas pela Universidade Estadual da Paraíba, em julho de 2007. Pesquisadora e autora de diversos artigos jurídicos nas áreas de Direito Econômico e Direitos Humanos. Dentre os quais destacam-se: “Direitos Humanos e a Corte Penal Internacional”, “Família, sociedade e Estado – juntos pela violação dos direitos fundamentais da criança e do adolescente: o instituto da destituição do poder familiar e os abrigos para menores” e “O Plano de Aceleração do Crescimento e as impropriedades da Lei. 11.079/2004: objetivos inalcançáveis”.


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