Responsabilidade paternal após o divórcio: guarda compartilhada

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Rayane Alves Matos – Acadêmica de Direito na Universidade de Gurupi UNIRG. [email protected]

Gilson Ribeiro Carvalho Filho – Professor, Mestre em Direito pela Universidade Católica de Petrópolis- RJ. [email protected]

Resumo: A dissolução de vínculo afetivo não exime as partes dos seus direitos e deveres decorrentes da união, dentre os quais os de cuidado e criação dos filhos, responsabilidade dos genitores enquanto perdurar a menoridade, não se dissolvendo com o rompimento da relação. Em alguns casos, os pais acabam se afastando dos filhos que residem com a genitores. Todavia, o direito prevê como regra nos divórcios a imposição da guarda na modalidade compartilhada, prevista nos artigos 1.583 e seguintes do Código Civil como garantia de igualdade entre os genitores quanto à convivência e responsabilidades. Deste modo, objetiva-se demonstrar que a fixação da guarda compartilhada é a medida mais adequada a garantir a responsabilização igualitária de pais e mães na criação e sustento dos filhos advindos do casamento e da união. Classificada como bibliográfica, a pesquisa teve como metodologia a consulta a um acervo qualificado, elaborado por especialistas e publicados em doutrinas e trabalhos científicos. A pesquisa demonstrou que a imposição da guarda compartilhada é a modalidade que mantém a responsabilidade paternal após o divórcio, sendo o melhor modelo para efetivar a participação paterna no crescimento e criação dos filhos menores.

Palavras-chave: Divórcio. Responsabilidade paterna. Guarda compartilhada. Brasil.

 

Abstract: The dissolution of an affective bond does not exempt the parties from their rights and duties resulting from the union, among which are those for the care and upbringing of children, the responsibility of the parents as long as the minor remains, and does not dissolve with the breaking of the relationship. In some cases, parents end up distancing themselves from the children who reside with their parents. However, the law foresees as a rule in divorces the imposition of custody in the shared modality, provided for in articles 1.583 and following of the Civil Code as a guarantee of equality between parents as to coexistence and responsibilities. In this way, the objective is to demonstrate that the establishment of shared custody is the most adequate measure to guarantee the equal responsibility of fathers and mothers in the upbringing and support of children arising from marriage and union. Classified as bibliographic, the research had as methodology the consultation to a qualified collection, elaborated by specialists and published in doctrines and scientific works. Research has shown that the imposition of shared custody is the modality that maintains parental responsibility after divorce, being the best model to effect parental participation in the growth and upbringing of minor children.

Keywords: Divorce. Paternal responsibility. Shared custody. Brazil.

 

Sumário: Introdução. 1. O instituto da guarda no direito brasileiro. 1.1 Histórico e evolução do instituto. 1.2 Abordagem após a CF/88. 1.3 O melhor interesse do menor. 2. As modalidades de guarda no ordenamento pátrio. 3. A guarda compartilhada. 3.1 Conceito e previsão legal. 3.2 Características.  4. A guarda compartilhada e a responsabilização paternal na criação dos filhos. Considerações finais. Referências.

 

Introdução

A constituição da família pelo casamento e pela união estável é regulamentada pelo direito brasileiro assim como a sua dissolução, haja vista que a sua permanência depende da vontade de ambos os conviventes.

Desta feita, caso um casal opte por colocar fim ao relacionamento afetivo, este direito lhe será garantido. Entretanto, algumas obrigações permanecem mesmo após desfeito vínculo amoroso, como é o caso das uniões que resultaram no nascimento de filhos.

Nesses relacionamentos, mesmo após a sua dissolução, os vínculos dos pais com os filhos devem ser mantidos, por ser um direito de ambos. Mesmo quando há o afastamento de um genitor do lar, o filho continua tendo direito à manter a convivência, assim como o genitor tem direito a dever de tomar decisões relativas à criação das crianças e adolescentes.

Ainda que se consolide o divórcio, o pai e a mãe continuam a ter responsabilidades decorrentes do poder familiar, as quais podem ser dividas a depender do regime de guarda fixada, que de acordo com a redação atual do artigo 1.583 do Código Civil aplica-se em regra a guarda compartilhada.

Essa modalidade de guarda consiste na divisão igualitária dos deveres de cuidado em relação aos filhos, de modo que os dois genitores participam ativamente na tomada das decisões. Essa regra somente é afastada quando verificado pelo Magistrado que a sua fixação não atende ao melhor interesse do menor.

A pesquisa é de natureza bibliográfica porque teve como base um acervo amplo e qualificado sobre o tema, elaborado por especialistas do direito de família disponibilizados em doutrinas e em trabalhos científicos.

Quando ao seu objetivo, a pesquisa classifica-se como exploratória, porque irá aprimorar os conhecimentos sobre a guarda compartilhada para apontar que a fixação da guarda compartilhada é o mecanismo que garante a responsabilização de ambos genitores e assegura os direitos fundamentais das crianças e adolescentes de crescer em um ambiente saudável e harmonioso, com a presença de seus pais, conforme disciplinada o artigo 227 da Constituição Federal de 1988.

 

1 O instituto da Guarda no direito brasileiro

A guarda é um dos institutos regulamentados pelo direito de família que estabelece os direitos e obrigações decorrentes do dever de cuidado e direito à convivência familiar, que é resguardado às crianças e adolescentes.  Sua previsão legal hoje em vigor é resultado de sua evolução legislativa ao longo da história do direito brasileiro.

 

1.1 Histórico e evolução do instituto

A regulamentação do direito de família e seus institutos sofreu significativas alterações ao longo do anos como resultado das mudanças sociais e culturais da sociedade brasileira.

A organização da família de antigamente era pautada do pátrio poder, em aspectos religiosos herdados da idade médica. As normas que vigoravam no século passado reconhecia a família que era exclusivamente constituída por meio do matrimônio e que tinha como característica o modelo patriarcal e hierarquizado (GONÇALVES, 2017).

O Código Civil de 1916, que vigorou por muitos anos no Brasil, disciplinava os direitos e deveres da mulher e do marido em dispositivos distintos. O homem era considerado o chefe da família a quem competia a administração dos bens e sustento da família (GONÇALVES, 2017). A tomada de decisões era exercida unicamente pelo marido, detentor do chamado pátrio poder.

Quando havia a ruptura da relação conjugal, a guarda ficava a cargo de um genitor e o filho tinha a convivência com o outro genitor muito reduzida, situação que prejudicava a relação afetiva entre eles.

Até o século XIX, quando dissolvido o casamento, a guarda era concedida ao pai, que era o detentor de propriedades e que presumidamente possuía condições de sustentar o filho, que assim como a mulher, eram vistos como sua propriedade. Com o passar dos anos, em razão da cultura de ser encargo da mãe o cuidado e criação dos filhos, prevalecia a preferência à mulher, por ser presumido o instinto materno e capacidade da genitora para exercer tal função (GALINDO, 2015).

Enquanto vigorava essa norma, a guarda em regra era concedida em regime unilateral e à mulher, situação que foi alterada com a promulgação da Constituição Federal da República de 1988, que regulamentou o direito de família de forma mais abrangente e igualitária.

 

1.2 Abordagem após a CF/88

A promulgação da Constituição Federal de 1988 alterou a percepção acerca da família e sua regulamentação ao adotar a dignidade da pessoa humana como o fundamento para a ampliação do conceito família e para a igualdade entre homens, mulheres e seus filhos.

 

“A Constituição Federal de 1988, como diz Zeno Veloso, num único dispositivo, espancou séculos de hipocrisia e preconceito. Instaurou a igualdade entre o homem e a mulher e esgarçou o conceito de família, passando a proteger de forma igualitária todos os seus membros. Estendeu proteção à família constituída pelo casamento, bem como à união estável entre o homem e a mulher e à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, que recebeu o nome de família monoparental. Consagrou a igualdade dos filhos, havidos ou não do casamento, ou por adoção, garantindo-lhes os mesmos direitos e qualificações. Essas profundas modificações acabaram derrogando inúmeros dispositivos da legislação então em vigor, por não recepcionados pelo novo sistema jurídico (DIAS, 2016, p.26)”.

 

Hoje em dia, os direitos e deveres relativos à guarda, sustento, educação e convivência entre pais e filhos competem a ambos os genitores, de forma igualitária, por serem decorrentes do poder familiar (GONÇALVES, 2017).

Essa nova percepção veio expressamente reconhecida pelo direito civil com a entrada em vigor do Código Civil de 2002, que regulamentou o direito de família segundo os fundamentos contidos na Constituição Federal.

O artigo 1.567 do Código Civil de 2002 dispõe que “a direção da sociedade conjugal será exercida, em colaboração, pelo marido e pela mulher, sempre no interesse do casal e dos filhos” (BRASIL, 2002).

Como resultado desse dispositivo, ambos os genitores são igualmente responsáveis pelos filhos menores, sendo que a guarda das crianças e adolescentes pode ser fixada em favor de qualquer um deles, de modo que o Código Civil não estabelece a preferência de nenhum deles.

Além de sua regulamentação no Código Civil, a convivência dos filhos menores também está assegurada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), lei especial voltada à proteção dos interesses dos infantes.

A fixação da guarda e suas modalidades estão estabelecidas a partir do artigo 1.83 do Código Civil, no Capítulo que trata da Proteção da Pessoa dos Filhos, que será melhor discutido oportunamente. Todos as normas em vigor que tratam do instituto da guarda no direito brasileiro estão voltadas a proteção do melhor interesse do menor.

 

1.3 O melhor interesse do menor

A Constituição Federal reconhece expressamente as crianças e adolescentes como indivíduos detentores de direitos, que devem ser assegurados de forma prioritária. Assim dispõe o artigo 227:

 

“Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988)”.  

 

A proteção prioritária dos direitos dos menores está também disciplinada no artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente, que está pautado no princípio do melhor interesse do menor.

 

“O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente representa importante mudança de eixo nas relações paterno-materno-filiais, em que o filho deixa de ser considerado objeto para ser alçado a sujeito de direito, ou seja, a pessoa humana merecedora de tutela do ordenamento jurídico, mas com absoluta prioridade comparativamente aos demais integrantes da família de que ele participa. Cuida-se, assim, de reparar um grave equivoco na história da civilização humana em que o menor era relegado a plano inferior, ao não titularizar ou exercer qualquer função na família e na sociedade, ao menos para o direito (GAMA, 2008, p. 180)”.

 

Este princípio reconhece os direitos dos menores e leva em consideração o seu interesse na tomada de decisões, e não dos genitores. Segundo esse princípio, o julgador deverá sempre optar pelo caminho que assegura os direitos fundamentais das crianças e dos adolescentes.

O princípio do melhor do interesse é capaz de garantir a efetivação dos direitos subjetivos dos menores, que por terem a condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, tem especial proteção do ordenamento jurídico (PERIPOLLI, 2014).

Assim sendo, diante de uma situação de disputa de guarda, caberá ao Magistrado fixar o regime de guarda que melhor atenda aos interesses do menor.

 

2 AS MODALIDADES DE GUARDA NO ORDENAMENTO PÁTRIO

O ordenamento jurídico prevê mais de uma modalidade de guarda dos filhos, as quais se distinguem no tocante ao papel exercido por cada um dos genitores na criação dos menores.  A sua escolha, quando não pactuada pelos pais, será fixada pelo Juiz.

 

“A guarda tão apenas identifica quem tem o filho em sua companhia, diante da inexistência ou dissolução da sociedade afetiva dos pais, permanecendo intacta a autoridade parental e a guarda jurídica do artigo 1.589 do Código Civil, que é representada pelo direito de o pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poder/dever de visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação (MADALENO, 2018, p. 564)”.

 

A atual redação do artigo 1.583 do Código Civil determina que “a guarda será unilateral ou compartilhada” (BRASIL, 2002). Cada uma delas possui características próprias, que as distinguem uma da outra.

A guarda unilateral, que foi a regra adotada por muitos anos, é a modalidade na qual apenas um dos genitores detém a guarda sobre os filhos, escolhido por ser o detentor de melhores condições de manter o filho sobre seus cuidados, ficando a cargo do outro genitor acompanhar e supervisionar a tomada das decisões para resguardar os interesses dos menores (MADALENO, 2018).

Nessa modalidade, apenas um dos genitores detém a guarda dos filhos e fica encarregado de tomar as decisões diárias sobre a criação do filho. O segundo genitor, por residir em local diverso, acaba ficando em segundo plano, apesar de mantido os seus deveres do poder familiar.

Para manter-se em contato com o filho, o genitor não exerce a guarda unilateral tem direito a manter visitas regulares com o menor, que podem ser livres o determinadas, a depender do caso.

Esse direito está resguardado pelo artigo 1.589 do Código Civil, que assevera que “o pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação” (BRASIL, 2002).

Por muito tempo, a guarda unilateral foi a regra adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro, que na maioria dos casos era exercida pela genitora, ante a percepção social de que compete à mãe a criação e cuidado dos filhos.

A segunda modalidade de guarda prevista na Lei é a chamada guarda compartilhada, que diferente do que ocorre na unilateral, existe a “a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns” (BRASIL, 2002).

Apesar de ter sido inserida no ordenamento através do Código Civil, foi apenas em 2008 que ela passou a ser regulamentada pela norma através da Lei 11.698, que alterou os dispositivos do Código Civil para disciplinar as regras acerca da guarda compartilhada, que até então tinha pouca aceitação (VAN DAL; BONDEZAN, 2019).

A então lei da guarda compartilhada (Lei nº 11.698/2008), não apenas se limitou a incluir essa nova modalidade ao sistema jurídico, mas também tratou de estabelecer os requisitos para a aplicação da modalidade de guarda unilateral ao caso concreto.

 

“determinava o § 2.º do art. 1.583 do Código Privado que a guarda unilateral seria atribuída ao genitor que revelasse as melhores condições para exercê-la, o que era repetição da anterior previsão do art. 1.584 do CC/2002. Todavia, o preceito foi além, ao estabelecer alguns critérios objetivos para a fixação dessa modalidade de guarda, a saber: a) afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar; b) saúde e segurança; c) educação (TARTUCE, 2017, p. 164)”. 

 

Em qualquer uma destas duas modalidades, é possível que a sua fixação seja modificada, quando comprovado que o genitor não cumpriu com os deveres que o regime lhe impõe, situação que pode lhe acarretar na perda de determinadas prerrogativas do genitor guardião (GONÇALVES, 2017).

Desde a entrada em vigor da Lei nº 13.058/2014 (nova lei da guarda compartilhada), que alterou os dispositivos legais do CC/2002 sobre a Proteção da Pessoa dos Filhos, a guarda compartilhada passou a ser a regra a ser adotada pelo magistrado quando demonstrado que ambos os genitores tem aptidão para exercer o poder familiar e não manifestarem em contrário, conforme determina o parágrafo 2º do artigo 1.584.

 

“Observa-se que, pelo sistema da Lei n. 11.698/2008, se não houvesse acordo entre o pai e a mãe, a guarda unilateral deveria ser concedida ao genitor que apresentasse “melhores condições” para exercê-la. A Lei n. 13.058/2014 alterou esse critério, estabelecendo que, quando não houver acordo entre o pai e a mãe, o juiz deve determinar, prioritariamente, que a guarda seja compartilhada, desde que ambos os genitores estejam aptos para cuidar dos filhos (GONÇALVES, 2017, p.372/373)”.

 

Por se tratar da nova regra legal, já que a lei deixa clara a preferência pela fixação da guarda compartilhada, suas principais especificações e características serão doravante apontadas.

 

3 A GUARDA COMPARTILHADA

A guarda compartilhada, modalidade de guarda em que há compartilhamento dos deveres de guarda entre os genitores, é regida no direito brasileiro segundo os seguinte aspectos:

 

3.1 Conceito e Previsão Legal

A previsão e conceituação legal da guarda compartilhada está contida no §1º do artigo 1.583 do Código Civil, que estabelece:

 

“Art. 1.583.  A guarda será unilateral ou compartilhada.

 

  • 1 o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 o ) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008)” (BRASIL, 2002)”.

 

A guarda compartilhada é conceituada por Flavio Tartuce do seguinte modo:

 

“a guarda compartilhada é entendida como aquela em que há a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns (TARTUCE, 2017, p.164)”.

 

É uma modalidade de guarda que está fundamentada nos ideais de convivência harmônica, em que há a cooperação dos dois genitores que, após a dissolução da relação afetiva, pactuam entre si o comprometimento de ambos no cuidado e criação dos filhos em comum, para estabelecer uma convivência que seja boa para os dois pais bem como para os filhos (GONÇALVES, 2017).

A conceituação dada por Pablo Stolze Gagliano é a seguinte:

 

“guarda compartilhada ou conjunta — modalidade preferível em nosso sistema, de inegáveis vantagens, mormente sob o prisma da repercussão psicológica na prole, se comparada a qualquer das outras. Nesse tipo de guarda, não há exclusividade em seu exercício. Tanto o pai quanto a mãe detêm-na e são corresponsáveis pela condução da vida dos filhos (GAGLIANO, 2018, p. 1.083)”.

 

Maria Berenice Dias leciona que no ordenamento nacional “a guarda compartilhada é a regra, sem a necessidade de consenso dos pais, dividindo-se o tempo de convívio de forma equilibrada entre os genitores” (DIAS, 2016, p. 52).

Dispõe o Código Civil Brasileiro que esta regra deve ser aplicada caso comprovado pelo Magistrado que ambos os genitores possuem interesse e condições de cuidado dos filhos.  Se aplicada, a guarda dos filhos será pautada nas condições e características indicadas na Lei.

 

3.2 Características

A guarda compartilhada dá aos genitores os mesmos direitos, mas principalmente os mesmos deveres de criação, que são partilhados entre os dois genitores.

Diferente do que ocorre na guarda unilateral, a guarda compartilhada é o regime que possui como característica principal a participação ativa de ambos os genitores na criação dos filhos. Maria Berenice Dias tece o seguinte comentário:

 

“Todo o prestigio é dado à guarda compartilhada, que se tornou obrigatória quando ambos os pais têm condições de exercê-la (CC 1.584 § 2.º), impõe a responsabilização conjunta e o exercício dos concertantes ao poder familiar (CC 1.583 § 1.º), sendo dividida, de forma equilibrada, o tempo de convívio com os filhos (CC 1.583 § 2.º). (DIAS, 2016, p. 473)”.

 

Em tese, com o compartilhamento da guarda haverá maior participação dos genitores, principalmente dos pais, anteriormente excluídos de participação da vida dos filhos em razão do regime de guarda unilateral.

Nessa modalidade, a criação dos filhos e as tomadas de decisões competem a ambos os pais, assim como o tempo de convivência deve partilhado de forma equilibrada.

 

“Na guarda compartilhada, a criança tem o referencial de uma casa principal, na qual vive com um dos genitores, ficando a critério dos pais planejar a convivência em suas rotinas quotidianas e, obviamente, facultando-se as visitas a qualquer tempo. Defere-se o dever de guarda de fato a ambos os genitores, importando numa relação ativa e permanente entre eles e seus filhos (GONÇALVES, 2017, p.370)”.

 

Importante esclarecer que, tendo em vista a fixação de uma residência principal, a simples fixação do regime de guarda compartilhada não gera por si só a extinção da obrigação de prestação de alimentos em relação aos filhos, a qual dependerá da análise da capacidade e necessidade do alimentando e do alimentado (TARTUCE, 2017).

A guarda compartilhada pode ser requerida pelos genitores no ato de dissolução da união afetiva, mas pode também ser decretada pelo Magistrado, quando as partes não estiverem chegado a um consenso (BRASIL, 2002).

Para dirimir as situações de não concordância, dispõe o §2º do artigo 1.584 do Código Civil que:

 

“Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor (BRASIL, 2002)”.

 

A decisão será tomada pelo Magistrado, levando sempre em consideração o princípio do melhor interesse do menor. Se verificado que o conflito entre os genitores prejudica o crescimento do menor, a guarda compartilhada será afastada.

 

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. GUARDA COMPARTILHADA DE MENOR. IMPOSSIBILIDADE DE CONVIVÊNCIA HARMÔNICA ENTRE OS GENITORES. MELHOR INTERESSE DO FILHO. SUMULA N. 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. A guarda compartilhada entre pais separados deve ser interpretada como regra, cedendo quando os desentendimentos dos genitores ultrapassarem o mero dissenso, podendo interferir em prejuízo da formação e do saudável desenvolvimento da criança. 2. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático dos autos (Súmula n. 7 do STJ). 3. No caso concreto, o Tribunal de Origem analisou as provas contidas no processo para concluir que a guarda compartilhada não atende ao melhor interesse do menor. Alterar esse entendimento demandaria reexame do conjunto probatório do feito, vedado em recurso especial. 4. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ – AgInt no REsp: 1688690 DF 2017/0185629-0, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 15/10/2019, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/10/2019)”.

 

Caso a guarda compartilhada seja fixada, os dois genitores exercerão todos os direitos e deveres elencados no artigo 1.634 do Código Civil, que decorrem do poder familiar. Em tese, essa modalidade de guarda tornou-se a regra adotada por ser aparentemente o modelo que torna mais ativa a participação do pai na criação e educação dos filhos após a dissolução do vínculo conjugal.

 

4 A GUARDA COMPARTILHADA E A RESPONSABILIZAÇÃO PATERNAL NA CRIAÇÃO DOS FILHOS

Como fora explanado anteriormente, por muito tempo, a guarda unilateral foi a modalidade mais aplicada aos divórcios e dissolução de uniões estáveis, contudo, geralmente residentes com a genitora, os pais acabavam tendo pouca participação na criação e na tomada de decisões quanto à vida do menor, com quem possuía também menor período de convivência.

A alteração dos dispositivos contidos no Código Civil surgiram após a percepção de que a imposição do regime de guarda unilateral não se apresentava como um modelo adequado a nova percepção sobre as funções de cada um dos genitores com a criação dos filhos, já que o fundamento que norteia a fixação do regime é o interesse do filho, na busca por sua felicidade (MADALENO, 2018).

Sobre o ponto de vista doutrinário, a modalidade que melhor atende a essa finalidade é a guarda compartilhada, que além de ser benéfica ao menor, também permite a maior participação do genitor que reside em outra casa.

 

“o objetivo da guarda compartilhada vai além da simples responsabilização dos genitores por alguém que ambos contribuíram para que existisse; na verdade, ela significa a intervenção em todos os sentidos no direcionamento da criação e educação dessa criança. Significa, também, um envolvimento emocional maior, o que é extremamente benéfico para ambas às partes: genitor e gerado. Tal benefício se dá, de um lado, pela satisfação que os pais têm em auxiliar a manutenção e educação do rebento; e de outro, pela segurança e tranquilidade que gera no filho a certeza de estar sendo amado e protegido pelos pais, e não disputado por eles (ROSA apud GARAJAU, 2017, p.1)”.

 

Leonardo Moreira Alves aponta como vantagem desta modalidade de guarda a manutenção da aproximação entre filhos e seus pais, como método de evitar a perda de contato entre os genitores e os infantes após a dissolução do relacionamento.

 

“Como é cediço, inúmeros são os efeitos traumáticos provocados pela dissolução do casamento/união estável no desenvolvimento psíquico dos filhos menores e um deles, notadamente, é a perda de contato frequente com um dos seus genitores. Nesse sentido, verifica-se que a guarda compartilhada pretende evitar esse indesejado distanciamento, incentivando, ao máximo, a manutenção dos laços afetivos entre os envolvidos acima referidos, afinal de contas pai (gênero) não perde essa condição após o fim do relacionamento amoroso mantido com o outro genitor (gênero) do seu filho, nos termos do art. 1.632 do Código Civil. (ALVES apud GAGLIANO, 2018, p. 1.084)”.

 

Pablo Stolze Gagliano aponta que a guarda compartilhada estimula a paternidade responsável, já que tem como vantagem o afastamento da exclusividade presente na guarda unilateral para permitir que a criança mantenha-se mais próxima do outro genitor, por serem eles igualmente responsáveis pela tomada de decisão referente a criação do filho (GAGLIANO, 2018).

São as suas especificidades que demonstram que a guarda compartilhada torna a participação do pai mais efetiva, ante a igualdade que ela proporciona entre os integrantes do poder familiar.

 

“As Leis n. 11.698/2008 e 13.058/2014 chegaram em boa hora, assegurando “a ambos os genitores responsabilidade conjunta, conferindo-lhes, de forma igualitária, o exercício dos direitos e deveres concernentes à autoridade parental. Não mais se limita o não guardião a fiscalizar a manutenção e educação do filho quando na guarda do outro (CC, art. 1.589). Ambos os pais persistem com todo o complexo de ônus que decorrem do poder familiar, sujeitando-se à pena de multa se agirem dolosa ou culposamente (ECA, art. 249)” (GONÇALVES, 2017, p. 370)”.

 

Isto posto, a guarda compartilhada permite ao pai o contato com o filho menor, situação que poderia ser dificultada caso a guarda fosse unilateral em favor da genitora. Segundo André Manzzelo, “O exercício do poder familiar compete aos pais, igualmente, pois não é o exercício de uma autoridade, mas de um encargo imposto pela paternidade e maternidade, decorrente da lei, conforme o artigo 1631 do Código Civil.” (MANZZELO, 2014)

Para Maria Berenice Dias, a guarda compartilhada “é a modalidade de convivência que garante, de forma efetiva, a corresponsabilidade parental, a permanência da vinculação mais estrita e a ampla participação da ambos na formação e educação do filho” (DIAS, 2016, p. 857), diferente do que ocorre na guarda unilateral, que segundo a mesma autora “afasta, sem dúvida, o laço de paternidade da criança com o não guardião” (DIAS, 2016, p. 856). E continua:

 

“A preferência legal é pelo compartilhamento, pois garante maior participação de ambos os pais no crescimento e desenvolvimento da prole. O modelo de corresponsabilidade é um avanço. Retira da guarda a ideia de posse e propicia a continuidade da relação dos filhos com ambos os pais. (DIAS, 2016, p. 858)”.

 

Portanto, a doutrina reconhece que a imposição do regime de guarda compartilhada é o instrumento que melhor garante a participação do genitor, que deixa de ser mero espectador com o dever de apenas visitar e dar alimentos, e o insere na tomada de todas as decisões relativas a criação do seu filho(a).

Entretanto, é evidente que essa regra não deve ser imposta como a solução para todos os casos, de maneira que, quando demostrado que o interesse do pai não for conveniente ao interesse do filho, ela deve ser afastada para contemplar o melhor interesse do menor, princípio que norteia o instituto da guarda no direito brasileiro (GONÇALVES, 2017).

 

Considerações Finais

A dissolução de um casamento ou de uma união estável não afasta a responsabilização de que os pais tem sobre seus filhos, de modo que se mantém o dever de educar, acompanhar, criar e alimentar seus descendentes.

O direito de família atual, ao dispor sobre os deveres dos pais regulamenta o poder familiar, o que significa dizer que os dois genitores são igualmente responsáveis pela criação dos filhos.

O artigo 1.634, que disciplina o exercício do poder familiar deixa claro que os deveres decorrentes da criação é competência de ambos os pais independentemente da situação conjugal (BRASIL, 2002).

É com base nessa concepção que a denominada guarda compartilhada é o regime a ser aplicado em regra após a separação dos pais, sendo que a guarda unilateral passou a ser considerada a exceção após a entrada em vigor da nova Lei de Guarda, sancionada em 2014.

Desde então, a guarda compartilhada se tornou a regra legal em razão de aparentemente ser o regime que melhor atende à necessidade das crianças e adolescentes.

Conforme a pesquisa demonstrou, a guarda compartilhada tem como finalidade garantir e resguardar os direitos não apenas dos genitores de participarem ativamente da vida de seus filhos, mas também destes de terem a companhia de ambos os pais, sem a limitação de encontros curtos com um genitor que não participa de sua criação.

Diante de suas características, o posicionamento majoritário doutrinário e jurisprudencial é de que a guarda compartilhada é a modalidade legal que possibilita a participação efetiva do pai na criação dos filhos, tornando-o mais responsável por seus descendentes.

A fixação desse regime tem se mostrado o mais acertado em razão da igualdade em direitos e deveres dos genitores, mas pode ser afastado quando não houver interesse de um dos genitores ou quando os conflitos entre os pais tornarem prejudicial a convivência entre eles. Cada caso deve ser analisado pelo Julgador, que irá optar pelo regime de guarda considerando as condições reais e, principalmente o melhor interesse do menor, princípio que deve sempre ser considerado no âmbito do direito de família.

 

Referências

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Promulgada em 05 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 24 ago. 2020.

 

_______. Lei nº 13.058, de 22 de dezembro de 2014. Altera os arts. 1.583, 1.584, 1.585 e 1.634 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), para estabelecer o significado da expressão “guarda compartilhada” e dispor sobre sua aplicação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/Lei/L13058.htm>. Acesso em: 12 set. 2020.

 

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