O Acesso à Justiça Sob as Perspectivas da Reforma Trabalhista

ELINE FAGUNDES DOS SANTOS FILHA[1]

 

RESUMO:  O presente artigo tem como objetivo analisar as principais mudanças da reforma trabalhista e como tais alterações causaram impactos aos trabalhadores na busca pelo judiciário. Assim, busca analisar quais alterações da Lei nº 13467/2017 trouxe maiores impactos ao empregado, dificultando o seu acesso à justiça. Para tal estudo, usou-se como metodologia a pesquisa bibliográfica doutrinária e de estudiosos do Direito do Trabalho. Como resultados, pode-se notar que as alterações trazidas pela reforma trabalhista obstaculizaram que o trabalhador procure a Justiça do Trabalho, já que mesmo sendo beneficiário da justiça gratuita, poderá arcar com ônus econômico.

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PALAVRAS-CHAVE: Reforma trabalhista; justiça gratuita; acesso à justiça.

ABSTRACT: This article aims to analyze the main changes of the labor reform and how these changes have caused impacts to the workers in the search for the judiciary. Thus, it seeks to analyze which changes of Law 13467/2017 brought greater impacts to the employee, making it difficult to access justice. For this study, the doctrinal bibliographical research and of Labor Law scholars was used as methodology. As a result, it can be noted that the changes brought about by the labor reform hindered the worker from seeking the Labor Court, since even though he may be a beneficiary of free legal services, he could bear the economic burden.

KEYWORDS: Labor reform; free justice; access to justice.

 

SUMÁRIO: 1.Introdução. 2. Fontes e princípios gerais do Direito do Trabalho. 2.1 O acesso a justiça como direito fundamental. 3. Reforma trabalhista. 3.1 Principais mudanças da Lei nº 13.467/2017. 3.2 Reflexos das alterações: trabalhador prejudicado?. 4. A dificuldade do acesso a justiça diante da reforma trabalhista. 5. Conclusão. Referências.

 

  1. INTRODUÇÃO

O Direito do Trabalho surgiu com o fulcro de amparar os trabalhadores frente a opressão dos empregadores. Como amparo, princípios importantes atuais continuam a validar tal aplicação.

A proteção aos direitos trabalhistas surgiram na busca pela manutenção do equilíbrio entre as partes, já que, naturalmente, as relações de trabalho são formadas por partes desiguais – fortes e fracas . Vide conceito de direito do trabalho:

Nessa lata acepção, a área jurídico trabalhista abrange, pelo menos,  os seguintes grupos do ramo jurídico: a) Direito Material do Trabalho, englobando o Direito Individual e o Direito Coletivo do Trabalho; b) Direito Constitucional do Trabalho; c) Direito Internacional do Trabalho; d) Direito Público do Trabalho, englobando o Direito Processual do Trabalho, o Direito Administrativo do Trabalho, o Direito Previdenciário e Acidentário do Trabalho e, finalmente, o Direito Penal do Trabalho (há forte e consistente dissenção sobre a real existência autônoma desse ramo).

Na acepção restrita, O Direito do Trabalho, como conjunto de princípios, regras e institutos jurídicos dirigidos à regulação das relações empregatícias e outras relações de trabalho expressamente especificadas, não abrange, obviamente, ramos jurídicos em que a categoria básica não seja a relação empregado-empregador, mas relaçoes nucleares próprias (DELGADO, 2016, p.59,60).

Para o presente estudo, irá se utilizar o Direito do Trabalho como alcance restrito, que é o instituto que regula relações entre empregados e empregadores, buscando manter equilíbrio entre tal relação, protegendo as partes hipossuficientes. Esta proteção será regulada por normas, regras e princípios, que serão vistos adiante com mais afundo.

No entanto, as modificações trazidas pela Lei nº 13.467/17 abriu espaço para discussões sobre a eficácia do Direito do Trabalho para proteger os direitos dos trabalhadores, bem como o questionamento se as mudanças trazidas não irão causar prejuízo no direito de acesso à justiça, já que existem vários ônus que poderão recair sobre as partes – principalmente os empregados, partes hipossuficientes nas vinculações entre empregado e empregador – após a busca ao Judiciário.

É sabido que o indivíduo possui acesso à justiça garantido pela Constituição Federal vigente. Assim, o trabalhador poderá buscar o judiciário sempre que sentir os seus direitos em ameça ou lesionados. O doutrinador Mauro Schiavi esclarece não basta apenas que seja garantido o acesso à justiça, mas que também é de máxima importante que exista efetividade nesse acesso, assim, deverá ser formado por princípios e regras justas e razoáveis que possibilitem não só o ingresso da demanda, mas também “poder participar, contar com a participação adequada do juiz, a fim de receber um  provimento jurisdicional consentâneo com os valores da sociedade (SCHIAVO, 2017, p.17)”.

De outro lado, além dos ônus que poderão recair sobre o indivíduo que buscar a Justiça do Trabalho, a Lei nº 13.467/17 manteve normas que asseguram o acesso á justiça de forma efetiva, como, por exemplo, a possibilidade da concessão da justiça gratuita ao reclamado, desnecessidade do preposto da reclamada ser empregado, dentre outras.

Nesse liame encontra-se o objeto do presente artigo, buscar analisar como ficará o acesso à justiça pós Reforma Trabalhista, e se tais mudanças realmente poderão trazer mais prejuízos do que benefícios às relações trabalhistas e se as partes ficarão prejudicadas na busca pelo acesso à justiça.

 

  1. FONTES E PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO DO TRABALHO

Para a aplicação da lei, é importante que se use elementos diversos, tais como os princípios gerais do direito, os princípios constitucionais e os princípios do Direito do Trabalho.

O direito do trabalho possui fontes formais e matérias, assim como os demais ramos do Direito. A doutrina afirma que “ os fatores materiais tendem a atuar conjugadamente, no processo de indução à elaboração ou momdificação do fenômeno do Direito (DELGADO, 2016, p.141)”. Podem ser analisadas entre fontes econômicas, sociológicas, políticas, que em conjunto criam tendências para a elaboração ou modificação das leis.

Já as fontes formais são “os meios de revelação e transparência da norma jurídica – os mecanismos exteriores e estilizados pelos quais as normas ingressam, instauram-se e cristalizam-se na ordem jurídica(DELGADO, 2016, p.142)”. No meio trabalhista podem ser classificadas em heterônomas e autônomas.

Fontes formais heterônomas são: Constituição, leis, tratados e convenções, regulamentos e sentenças normativas. Já as fontes autônomas são os acordos e convenções coletivos e os costumes.

De acordo com o Dicionário Aurélio, a palavra princípio possui várias definições, mas para o presente estudo, importante destacar os significados: “aquilo que regula o comportamento ou a ação de alguém, preceito moral; regras ou conhecimentos fundamentais e mais gerais”. Consequentemente, pode-se definir os princípios gerais do Direito como aqueles que norteiam a aplicação e hermenêutica das Leis.

O estudioso Nei Frederico Cano Martins (MARTINS) afirma que os princípios podem ter três funções principais, sendo elas: auxiliar na interpretação, na elaboração das leis, e para preencher lacunas na lei:

A doutrina costuma assimilar a tríplice função dos princípios. Em primeiro lugar, prestam eles à importante função de auxiliar na tarefa  de interpretação das normas jurídicas, em especial no trabalho interpretativo feito pelos juízes, em seus julgamentos. Em segundo lugar , atuam de molde a colaborar  na ingente atividade de elaboração das leis, devendo o legislador balizar sua atuação dentro dos limites estabelecidos pelos princípios. Em terceiro lugar, os princípios  pode ter função integrativa, servindo como meio para  preencher eventuais lacunas da lei (MARTINS, p.276).

As funções dos princípios buscam auxiliar tanto legislador, quanto o aplicador do Direito, mantendo assim, o equilíbrio no sistema jurídico, já que há mudanças constante de normas e da legislação.

Nota-se que os princípios possuem enorme importância para regular a aplicação e interpretação das normas e legislação. Dentro do Direito se faz muito importante o estudo sobre as fontes por meio da qual os direitos, normas, leis e regras se externalizam (DELGADO, 2016, p.139).

Os princípios ganharam espaço, deixando de ser apenas norteadores de regras ou somente para suprimento em casos de omissão legislativa, passando a possuir caráter de norma em si, com aplicação semelhante a das regras positivadas (SCHIAVI, 2017, p.20). Desta forma, nota-se que os princípios possuem enorme importância no  mundo jurídico, devendo nortear os acontecimentos e fatos, empenhando-se para conseguir aplicação justa do direito.

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São três os princípios gerais, que comunicam-se, e que são aplicados no direito do trabalho: lealdade e boa fé, não alegação da própria torpeza, efeito lícito do exercício regular do próprio direito:

Em seu conjunto, esses três princípios produzem repercussões, quer no âmbito do Direito Material do Trabalho, quer no âmbito do Direito Processual do Trabalho. Nesses dois segmentos, sintetizam a noção de que a ordem jurídica deve apenas acolher e conferir consequências compatíveis em favor de uma pessoa com respeito a condutas lícitas e de boa fé por ela praticadas. Em tal sentido, esses princípios não somente iluminam a compreensão da ordem jurídica como também, ao mesmo tempo, fornecem poderoso instrumento à aferição valorativa dos fatos trazidos ao exame do intérprete e aplicador concreto do Direito (DELGADO, 2016, p.198).

Assim, para aplicação das normas trabalhistas é importante que haja combinação das fontes formais, materias e dos princípios, em busca da verdade e do equilíbrio.

A doutrina atual considera como existente o princípio do protecionismo processual (SCHIAVI, 2017, p.24), já que os empregados são partes fracas nas relações processuais, possuindo pouco recursos financeiros, maior dificuldade em produzir provas e o fato de, muitas vezes, desconhecer as normas processuais. Esse princípio teria nascimento originado em outros princípios, tais como o da isonomia e o do acesso à justiça.

Com as alterações trazidas pela Lei nº 13.467/17, questionamentos sobre desamparo do trabalhador nas relações processuais, já que com tais mudanças, agora o trabalhador possui maior responsabilidade e poderá suportar ônus, como pagamento de honorários sucumbências e periciais, fazendo com que se distancie por medo de suportar os prejuízos financeiros que podem derivar da sua busca ao judiciário.

No entanto, com a existência dos princípios, que devem assistir as partes da forma mais protetora e justa, mesmo com a reforma trabalhista, as partes, e aqui frisa-se principalmente os empregados, possuem um arrimo seguro, já que os alguns são direitos fundamentais, com reflexo em vários ramos do Direito. Porém é necessário que os aplicadores do Direito percebam a importância da aplicação legal juntamente com com os princípios.

 

  • O ACESSO À JUSTIÇA COMO DIREITO FUNDAMENTAL

A Constituição Federal vigente traz um rol de direitos e garantias fundamentais, dentre as quais se enquadram os princípios e garantias do acesso à justiça. O processualista Alexandre Freitas Câmara (2012, p.35) afirma que os princípios constitucionais devem ser aplicados em primeiro lugar, com base na supremacia das normas constitucionais sobre as demais normas jurídicas.

O doutrinador Gilmar Ferreira Mendes aduz que os direitos fundamentais são importantes para fixar limites para aplicação de outros direitos:

O direitos humanos estabelecem condições e limites àqueles que tem competência de criar e modificar o direito e negam o poder de violar o direito. Certamente, todos os direitos não podem fazer nada contra um poder fático, a potestas desnuda,  como tampouco nada pode fazer a moral face ao cinismo. Os direitos somente tem efeito face a outros direitos, os direitos humanos somente em face a um poder jurídico, isto é, em face a competências cuja origem jurídica e cujo status jurídico seja respeitado pelo titular da competência (MENDES, 2017, p.341 apud KRIELE, 1980, p.159, 160).

Assim, para aplicação de um determinado direito é necessário que existam outros direitos que possam amparar tal propósito. Assim, para que haja efetividade na aplicação de leis trabalhistas, existem limitadores que buscam dar maior efetividade a proteção dos direitos trabalhistas. Dentre estes, os princípios constitucionais encontram-se como normas máximas, que deverão serem observados sempre.

O artigo 5º da Carta Magna traz no inciso XXXV a expressão do direito ao acesso à justiça:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

Essa garantia também pode ser denominada como princípio do direito de ação ou da inafastabilidade judicial (TORRES). Pode-se empreender do princípio citado, que a apreciação judiciária é um direito fundamental que assiste a todo cidadão sendo assim todo aquele que se sentir lesado ou ameaçado em seus direitos tem assegurado o acesso aos órgãos judiciais, não podendo a lei vedar esse acesso (CAMARA, 2012, p.49).

O direito a proteção judicial efetiva, como denomina o doutrinador Gilmar Ferreira Mendes (2017, p.344), tem um amplo âmbito de proteção, abarcando não só as lesões e ameaças cometidos pelo Poder Público, mas como também as derivadas de conflitos privados.

O acesso à justiça, além de ser protegido pela Constituição, também deverá ser utilizado de forma a buscar o bem comum entre os cidadãos, devendo, portanto, ser aplicado com base no princípio da isonomia – importante princípio constitucional, que visa  igualar os indivíduos, dando a cada um o tratamento de acordo com as suas necessidades – concedendo não só o acesso à justiça, como também a qualidade da prestação jurisdicional.

No Direito do Trabalho, não poderá ser de forma diferente. É sabido que as relações de trabalho são compostas por parte fraca, o trabalhador, e a parte mais forte, os empregadores. Desta forma, deverá ser garantido o acesso à justiça, para ambas as partes, proporcionando mais do que a proteção judicial efetiva, como também qualidade do acesso e da sua aplicabilidade.

 

  1. REFORMA TRABALHISTA

Em meio aos problemas sociais e políticos enfrentados pelos cidadãos, a reforma trabalhista surgiu como se fosse uma pílula mágica de soluções, que estaria apta a exterminar as adversidades sofridas pela classe trabalhadora. No entanto, estudiosos afirmam que a mesma surgiu como meio de retrocesso:

Vivemos tempos muito delicados no Brasil, nas mais variadas expressões da vida em sociedade: no Direito, na Economia, na Sociologia, na Ética, entre outras as quais, imbricadas numa teia de interdependência, conformam um presente que liquefaz o processo evolutivo da civilização e faz antever um futuro perverso para as relações humanas.

Neste cenário crítico, desponta como forte elemento de desconstrução social, a recém aprovada Lei nº 13.467/17, que materializa a chamada Reforma Trabalhista. Aprovada de forma açodada, a norma imprime instantâneo retrocesso social, inédito na lenta história de afirmação dos direitos sociais em solo pátrio (KREIN, GIMENEZ e SANTOS, 2018, p.11).

Segundo o Presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho) Ministro Ives Gandra Filho, tal alteração legislativa surge como instrumento de flexibilização das normas relativas ao Direito do Trabalho, com o fulcro de diminuir as taxas de desemprego, flexibilizando os direitos sociais para assim atrair investidores, que consequentemente ofertarão mais oportunidades de emprego, e fazendo a economia do país crescer (KREIN, GIMENEZ e SANTOS apud Ministro Ives Gandra Filho, 2018, p.57- 58).

No entanto, com o enfraquecimento do trabalhador frente ao empregador, a desigualdade social tende a se solidificar cada vez mais, e o resultado será aumento de desemprego, precarização do trabalho, da pobreza, da desigualdade e da exclusão social (KREIN, GIMENEZ e SANTOS apud Ministro Ives Gandra Filho, 2018, p.59).

De acordo com Mauricio Godinho Delgado (2017, p.39,40) a reforma trabalhista se justifica no propósito de haver uma maior segregação social, como os tempos antigos. O exímio doutrinador aponta três principais aspectos em que se se divide a finalidade da reforma trabalhista, sendo eles: o direito individual do trabalho, regras do direito coletivo do trabalho e regras do direito processual.

No campo do direito individual várias mudanças ocorreram no sentido de mitigar o direito da classe trabalhadora. Insta salientar que a Carta Magna vigente elencou um número de artigos para manter a segurança e  qualidade de vida do trabalhador brasileiro. No entanto, em sentido oposto a Lei Maior, a reforma trabalhista vem colocar o trabalhador em posição de desvantagem frente ao seu empregador, que, via de regra, sempre possui maior força econômica e social:

Ao invés de respeitar o patamar jurídico fixado na Constituição da República, a Lei nº13.467/2017 simplesmente faz emergir parâmetro jurídico sepultado há décadas no campo do Direito, isto é, a desmedida prevalência do poder econômico na principal relação de poder existente no âmbito da economia e da sociedade, a relação de emprego (DELGADO, 2017, p.41).

O segundo aspecto trazido por Delgado (2017) diz respeito ao Direito Coletivo do Trabalho. Afirma o estudioso que com a devastação dos direitos individuais, os coletivos também foram gravemente atingidos.

O direito coletivo surgiu na história “como instrumentos de aperfeiçoamento das condições de vida e de trabalho das pessoas humanas trabalhadoras, como mecanismos de elevação das condições de pactuação da força de trabalho no sistema econômico capitalista (DELGADO, 2017, p.44)”. Desta maneira, com o enfraquecimento dos direitos dos trabalhadores, o direito coletivo, consequentemente, foi substancialmente afetado:

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A Lei de Reforma Trabalhista, entretanto, apresenta regramento distinto, vislumbrando no Direito Coletivo do Coletivo um instrumento adicional de regressão no patamar civilizatório mínimo assegurado pelo Direito Individual do Trabalho, o Direito Coletivo do Trabalho passaria a se direcionar, nos termos da nova lei, para o caminho de se tornar mais um meio de redução do patamar civilizatório mínimo trabalhista garantido pela ordem jurídica especializada da República brasileira (DELGADO, 2017, p.45).

Por fim, mas de igual importância, o direito processual também viu-se prejudicado. Os trabalhadores não encontram mais amparo em tal campo, pois a possibilidade de penalização do obreiro tornou-se descomunal:

As preocupações e objetivos da Lei de reforma Trabalhista, entretanto, são de natureza sumamente diversa, centrando-se na ideia de restringir, ao máximo, o acesso á jurisdição pela pessoa humana trabalhadora, além de instigar a transmutação do processo judicial laboral em tortuoso calvário de riscos e apenações a essa pessoa (DELGADO, 2017, p.48).

Como é sabido, a grande maioria das causas trabalhistas são movidas por empregados, que recebem salários parcos. Com as alterações processuais, principalmente em relação ao ônus de sucumbência recíproca, “que abre um adicional campo de incerteza e elevado risco econômico para o autor de qualquer ação trabalhista (DELGADO, 2017, p.49)”.

A doutrina também tece críticas quanto a concessão da justiça gratuita e seus reflexos. A justiça gratuita esta regulada no artigo 790B da nova lei trabalhista, assim para gozar de tal benefício a parte não poderá receber salário superior a 40% dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social, também deverá insuficiência de recursos para pagamento das custas judiciais. Porém, as apreciações giram em  torno dos reflexos que poderá sofrer a parte beneficiária da justiça gratuita, podendo, durante ou após o processo, ter que arcar com honorários periciais, sucumbenciais e custas em casos de ausências injustificadas. Tais questões estão sendo julgadas pela Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5766. Até o momento, o Relator Miistro Roberto Barroso entende que o pagamento das custas por ausência injustificada é importante para desistimular o excesso de ações.

O gravame de ter que arcar com encargos, mesmo sendo beneficiário da justiça gratuita, faz com que diversos trabalhadores carentes ou em situação de pobreza não procurem a Justiça do Trabalho por medo de sofrer sanções pecuniárias, aumentanto assim a insegurança jurídica.

Ademais críticas também são feitas nas alterações contidas no artigo 8, parágrafo único da nova Lei. Vide texto antigo:

Artigo 8º: As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Parágrafo Único: O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

Vide nova redação:

Art. 8º As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Paragráfo Único 1º: O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho.

A retirada da parte final da paragráfo único do artigo 8º recebeu crítica da doutrina na parte em pode-se interpretar que na aplicação do direito comum retira-se a questão da incompatibilidade com o Direito do Trabalho. No entanto, Florença Dumont Oliveira (2016/2017, p.446) afirma que essa crítica não encontra amparo, haja visto que por raiz principiológica do Direito brasileiro exige a compatibilidade para aplicação subsidiária de leis. Para mais, o artigo 769 da Consolidação  das Leis do Trabalho (CLT) não sofreu qualquer alteração,  mantendo a disposição de forma expressa que  “para aplicação subsidiária do Direito Processual Civil deverá haver compatibilidade com as normas do Direito Processual do Trabalho (OLIVEIRA, 2016/2017, p.446)”.

Múltiplas foram as mudanças trazidas pela Lei nº 13467/2017, recebendo ora amparo, ora crítica da doutrina, como também dos operadores do Direito. Adiante ver-se-se os reflexo da reforma trabalhista, onde haverão comentários sobre mudanças pontuais, sobretudo nos aspectos que atingiram a classe trabalhadora.

 

  • PRINCIPAIS MUDANÇAS DA LEI Nº 13467/2017

Dentre as mudanças trazidas pela reforma trabalhista, sejam elas de direito material ou processual, algumas delas implicam diretamente nos trabalhadores – como a concessão da justiça gratuita e o custo que o beneficiário pode ter que suportar durante ou após a demanda. Algumas dessas alterações serão tratadas nos próximos parágrafos.

O Título II da Consolidação  das Leis do Trabalho (CLT) sofreu alterações no que trata da jornada de trabalho. Sobre as horas itinerantes :

As horas itinerantes dizem respeito ao tempo despendido  pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno,em condução fornecida pelo empregador, em se tratando de local de difícil acesso ou não servido por transporte público (conceito fundado na redação do §2º do art. 58 da CLT, conforme redaçaõ promovida pela Lei n. 10.243/2001). Esse tempo itinerante para ida e volta ao trabalho, em que o trabalhador fica à disposição do empregador em condução por este fornecida, era tido como parte componente da jornada de trabalho do obreiro, desde que observadas as demais condições fixadas no anterior art.58, §2º, da CLT (local de trabalho de difícil acesso ou não servido por transporte público).

A nova redação do § 2º do art.58, acoplada a concomitante revogação do §3º do mesmo art.58 da CLT, são fatores que sugerem a eliminação pura e simples, pela Lei nº 13467/2017, de todo esse tempo integrante da jornada de trabalho do empregado brasileiro, denominado de horas in itenere (DELGADO, 2017, p.121).

Nota-se que não existe mais as horas itinerantes, sendo que o trabalhador sofreu enorme prejuízo nesse âmbito. A mudança no dispositivo legal não altera o conceito de jornada de trabalho, assim, o empregado que estiver dentro da área da empresa já estará com sua jornada iniciada.  Vale expor que tal regra não alcançara os contratos antigos, mas tão somente os novos contratos de trabalho após 13 de novembro de 2017.

Também houve alterações na duração do trabalho: Houve alteração na duração do trabalho em tempo parcial de 25 horas semanais para até 30 horas semanais:

Art. 58-A.  Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração não exceda a trinta horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares semanais, ou, ainda, aquele cuja duração não exceda a vinte e seis horas semanais, com a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais.

Também houve a inserção da possibilidade de horas extras, antes não permitida pela Consolidação  das Leis do Trabalho (CLT). Assim, tem-se dois modelos de contrato de trabalho a tempo parcial:

Efetivamente, em conformidade com a Lei da Reforma Trabalhista, passam a existir dois modelos de regime de trabalho a tempo parcial: o primeiro modelo diz respeito àquele regime cuja duração não exceda 30 horas semanais (neste caso foi ampliado o limite máximo de 25 horas, constante do texto anterior do art.58 A da CLT). Fica claro que neste modelo não há possibilidade de horas suplementares semanais (novo caput do art. 58-A da CLT).

O segundo modelo do regime de trabalho em tempo parcial diz respeito àquele cuja duração não exceda 26 horas semanais. Nesse modelo, contudo, fica clara “a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais” (novo caput, in fine, do art.58-A da CLT). Essas horas suplementares serão pagas, evidentemente, com o adicional de 50% sobre o salário/hora normal (novo §3º do art.58-A da CLT). Na prática, nesse segundo modelo, o empregado pode trabalhar até 32 horas semanais, sendo 26 horas a duração contratual padrão e mais seis horas suplementares (DELGADO, 2017, p.124).

A duração dos contratos a tempo parcial serão duas: 30 e 26 horas semanais, admitindo no segundo caso, até 06 horas extras semanais. Importante modificação no pagamento das horas extras merece ser trazida, já que de acordo com o novel diploma, serão pagas com no mínimo 50% do valor da hora normal, e não mais de apenas 20% como previa o artigo 59, §1º.

Com relação a duração dos contratos de trabalho, continuam do mesmo modo, sendo de 44 horas semanais, podendo ter até 02 horas extras por dia. Vale ressaltar que empregados e empregadores poderão acordar jornada de 12 horas por 36 horas de descanso, regulamentada no artigo 59 A da Consolidação  das Leis do Trabalho:

Art. 59-A.  Em exceção ao disposto no art. 59 desta Consolidação, é facultado às partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação.

Vale elucidar que dentro das 12 horas de trabalho deverá ser observado o intervalo para alimentação e repouso, podendo até ser indenizado em pecúnia caso não seja gozado – artigo 59-A da Consolidação  das Leis do Trabalho.

Ainda dentro do tema de jornada de trabalho, houve mudanças na compensação de horas, também denominada de banco de horas. Anterior a reforma trabalhista, o regime de compensação clássico funcionava dentro do mesmo mês, assim, as horas suplementares agregadas em um ou mais dias, deveria incidir na diminuição da jornada em outros dias, lembrando que tanto a agregação quanto a diminuição deveriam ocorrer dentro do mesmo mês. Posteriormente a compensação ganhou o nome de banco de horas, e deveria ocorrer num lapso temporal de um ano (DELGADO, 2017, p.127,128).

Com a reforma, essa exigência não se encontra mais expressa, podendo ser feita a partir de um acordo entre empregado e empregador.  Caso a compensação seja feita no mesmo mês, este acordo poderá ser tácito ou escrito. Na hipótese de ocorrer em um prazo máximo de até 06 meses o acordo deverá ser escrito, mas poderá ser individual. Ademais, caso o funcionário seja demitido sem que tenha gozado o descanso das horas trabalhadas, estas deverão ser pagas como horas extras.

A Lei nº 13467/2017 disciplinou nova forma de trabalho que não era regulamentadas pelo antigo diploma legal trabalhista. Foi ncluído pelo artigo 75-B o teletrabalho, també conhecido como home office:

Art. 75-B.  Considera-se teletrabalho a prestação de serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo.

O teletrabalho já era disciplinado pelo diploma antigo, no artigo 6º, que prelecionava:

Art. 6º: Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego;

Assim, o teletrabalho era regido pelas normas gerais que regulamentavam as relações de emprego. Com o acréscimo explícito da modalidade teletrabalho na Lei nº 13467/2017, quem exerce tal função não é regido pelas mesmas regras comuns às relações de emprego. O teletrabalho não possui normatização de jornada de trabalho, já que a importância é que se entregue o trabalho, e não o tempo que se levou para prestá-lo.

Nova modalidade de contrato de trabalho inserido por meio da reforma trabalhista é o contrato intermitente, regulado nos artigos 443, §3º e 452-A e seus paragráfos. Contrato de trabalho intermitente é aquele feito de forma escrita que autoriza a jornada móvel  variada – períodos de trabalho alternados por períodos de inatividade – , assim, um mesmo empregado poderá prestar serviço a diferentes empregadores.

No tocante às férias, a Lei nº 13467/2017 no artigo 134, §1º, da CLT possibilita o fracionamento das mesmas em até 03 períodos, sendo que “um deles não poderá ser inferior a 14 dias, e os demais não poderão ser inferiores a cinco dias corridos, cada um”, ainda deverão ser acordados entre empregado e empregador.

Também houveram alterações no sentido de não poder iniciar o gozo das férias em até dois dias antecedentes a feriados e ao repouso semanal remunerado:

Art. 134.

  • 3o É vedado o início das férias no período de dois dias que antecede feriado ou dia de repouso semanal remunerado.

Nos casos de contratos a tempo parcial, estes terão direito a mesma tabela de férias dos demais empregados regidos pela Consolidação  das Leis do Trabalho, como também concedeu a possibilidade de um terço das férias ser convertido em abono pecuniário – artigo 58-A, §6º da Consolidação  das Leis do Trabalho.

O artigo 394-A teve uma nova redação aplicada pela reforma trabalhista, permitindo que mulheres grávidas e as que estão amamentando possam trabalhar em ambientes insalubres de grau médio e mínimo, devendo ser completamente afastada dos ambientes com grau máximo de insalubridade. Em qualquer caso, o salário da gestante será preservado, incluindo ainda o adicional de insalubridade (DELGADO, 2017, p.150).

Vale ressaltar que antes da reforma, as gestantes e lactantes deveriam ser afastadas de atividades insalubres em quaisquer graus. Após a reforma, para que haja esse afastamento, é necessário que a trabalhadora apresente atestado de médico da sua confiança.

Quanto a vinculação do empregado ao sindicato, a reforma extinguiu a obrigatoriedade da contribuição sindical, nos artigos 545, 579, 582, 583 e 602.

Dentre os muitos artigos que sofreram acréscimos ou alterações pela reforma trabalhista, acima foram expostos os mais importantes, relativos a não obrigatoriedade da contribuição sindical. Assim, para que haja o desconto sindical será necessário que o empregado autorize de forma prévia e expressa.

Também vale esclarecer que a reforma inseriu uma tabela que deverá nortear os magistrados nas concessões de indenizações, minimizando assim, casos de indenizações exacerbadas concedidas.

Caso o empregado busque o judiciário e o empregador acionado não tiver violado qualquer direito, o obreiro poderá ser condenado a pagar multa e indenização ao empregador.

Por fim, traz-se a possibilidade de acordos variados que poderão ser firmados por empregado e empregador, não sendo necessário passar pelo Judiciário, sindicato ou qualquer instituto que busque resguardar os direitos trabalhistas. Vale salientar que tal possibilidade pode criar um enorme massacre de empregadores sobre empregados, haja visto que caso os empregados não aceitem tais acordos “propostos” poderão perder os seus empregos, aumentando assim, os números do desemprego no país.

  • REFLEXOS DAS ALTERAÇÕES: TRABALHADOR PREJUDICADO?

Após breve explicitação das principais alterações trazidas pela Lei nº 13.467/2017, importante que se faça uma análise sobre os impactos sofridos pelo trabalhador. Indubitavelmente a reforma trouxe mudanças que impactam de forma negativa para os trabalhadores.

Com a implementação da possibilidade do empregado pagar custas, mesmo sendo beneficiário da justiça gratuita, criou-se uma política de medo entre trabalhadores. Apesar do Ministro Roberto Barroso, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5766, ter reconhecido que a previsão celetista do pagamento de custas quando o empregado, por motivo injustificado, faltar a audiência, seja instrumento que evitará o excesso de ações trabalhistas sem comprometimento, tal normatização gera pânico na massa trabalhadora.

Outro ponto de enorme desvantagem para o operário é a imposição do pagamento de honorários periciais e advocatícios, em casos de sucumbencias. Apesar do pouco tempo da aplicação da Lei nº 13467/2017, casos foram noticiados de empregados que recorreram ao Judiciário para reclamar direitos trabalhistas, e tendo suas demandas negadas acabaram contraindo dívidas gigantescas, através da condenação em honorários:

Uma ação trabalhista movida contra uma concessionária de caminhões no interior de Mato Grosso transformou-se em dor de cabeça inesperada para o vendedor Maurício Rother Cardoso, ex-funcionário da empresa e autor do processo. Ele ingressou na Justiça em 2016 queixando-se, entre outras coisas, de reduções salariais irregulares e do cancelamento de uma viagem prometida pela concessionária como prêmio para os melhores funcionários. No fim, quase todos os pedidos foram negados pela Justiça e, de quebra, foi condenado a pagar R$ 750 mil em honorários para o advogado do ex-empregador.

A ação foi ajuizada pela mulher em julho de 2017, tendo a reforma trabalhista entrado em vigor em 11 de novembro deste ano e a sentença do processo proferida no dia 24 do mesmo mês. Na decisão, o magistrado esclareceu que as normas de direito material, que regulam as relações trabalhistas, seriam analisadas em sua forma anterior. As regras de cunho processual, contudo, seguiram as novidades aprovadas pela reforma.

O único ponto em que o banco foi condenado diz respeito a não concessão do intervalo de 15 minutos antes da jornada extraordinária, previsto no artigo 384 da CLT – inclusive, revogado pela reforma. O juiz também rechaçou a testemunha trazida pela bancária, alegando se tratar de “verdadeira testemunha profissional”, presente em inúmeros processos. Nesse sentido, Costa condenou o banco ao pagamento de R$ 50 mil pelo direito violado e de R$ 7,5 mil de honorários de sucumbência. A autora, por sua vez, por ter sido sucumbente nos pedidos que totalizavam R$ 450 mil, segundo o juiz, deve R$ 67,5 mil de honorários. O montante equivale a 15% do valor da liquidação da sentença, limite estipulado pela CLT (GAZETA DO POVO, 2017).

É sabido que a parte trabalhadora, em muitas vezes, é a mais fraca na relação processual trabalhista, por conta dos seus poucos recursos financeiros, do seu desconhecimento da legislação, como também da complexidade que a pode impossibilitar de produzir provas. Desta forma, partindo das dificuldades enfrentadas, a parte trabalhadora ainda poderá ser obrigada a gastar com honorários sucumbeciais. Decisões judiciais podem ser equivocadas pela insuficiência de provas, consequentemente o trabalhador poderá ter os seus direitos lesionados, e ao buscar o judiciário sofrer ainda mais, sendo onerado a pagar condenações que podem alcançar valores altíssimos, como no caso do o vendedor Maurício Rother Cardoso (GAZETA DO POVO, 2017).

O doutrinador Mauro Schiavi (2017, p.17,18) afirma que mesmo com as alterações inseridas pela Lei nº 13467/2017, o legislador preocupou-se em manter as garantias do acesso à justiça. Dentre as garantias mantidas, estão: possibilidade de concessão de justiça gratuita ao reclamado, possibilidade de parcelamento dos honorários periciais, sucumbência recíproca, impossibilidade de desistência do processo pelo reclamante, mitigação dos efeitos da revelia. Os doutrinadores, e aplicadores do direito, Jorge Luiz Souto Maior e Valdete Severo dispõe que não basta o acesso à justiça  ser uma garantia, mas que também deve servir àqueles que são o principal alvo dos regramentos (2017, p.150).

Ao colocar a obrigatoriedade de pagamento de custas, os trabalhadores, que já possuem poucos recursos, acabam por assustar-se, fazendo com que repensem sobre a decisão de buscar a proteção dos seus direitos por via judicial.

Nitidamente constata-se, apesar dos poucos assuntos aqui discutidos, que o trabalhador encontra-se em enorme situação de desvantagem pós reforma trabalhista. Os ônus prováveis que possam surgir das demandas trabalhistas são de volume tão grande, que o acesso a justiça encontra-se prejudicado. No entanto a dificuldade do acesso ao Judiciário pelo obreiro será tratada no próximo item de forma mais abrangente.

 

  1. A DIFICULDADE DO ACESSO A JUSTIÇA DIANTE DA REFORMA TRABALHISTA

Mesmo após ter entrado em vigor a reforma trabalhista ainda causa grandes discussões. Doutrinadores e aplicadores do Direito lançam seus argumentos a favor e contra, mas na grande maioria dos casos, constata-se que o trabalhador foi substancialmente prejudicado:

Aliás, como já manifestado em outro texto, foram os próprios argumentos apresentados como fundamentos da reforma que inauguraram essa (ir)racionalidade, pois os dispositivos da lei atendem exclusivamente aos interesses dos empregadores e os fundamentos trazidos foram no sentido da preocupação com a melhoria da condição de vida do conjunto dos trabalhadores, incluindo os excluídos, sem retirada de direitos. Assim, se ao aplicar os dispositivos da lei, não se aplicam os seus fundamentos. Trata-se, portanto, igualmente, de um não aplicar, aplicando.

Claro que estes fundamentos são falsos e, ao aplicar a lei rebaixando o patamar dos direitos dos trabalhadores e aumentando as margens de lucro dos empregadores, o que se teria é uma perfeita harmonia entre os objetivos da lei e os efeitos por ela produzidos. Mas como  os fundamentos retoricamente utilizados para a sua aprovação foram os da proteção dos trabalhadores, torna-se possível aplicar a lei em consonância com esses fundamentos, os quais, ademais, enquadram-se nos fundamentos clássicos do Direito do Trabalho e aí o que se terá como resultado é um não aplicar dos objetivos reais pretendidos pela reforma, aplicando a lei como suporte em seus fundamentos retóricos (KREIN, GIMENEZ, SANTOS, 2018, p.293)

O Direito do Trabalho tem como princípios a defesa dos trabalhadores, partes hipossuficientes nas relações de trabalho, no entanto, nota-se que a reforma trabalhista colocou o obreiro em situação extremamente complicada, haja visto que o mesmo teve direitos rebaixados, aumentando assim, a opressão dos empregadores sobre empregados.

A Desembargadora da 1ª Região, Vólia Bonfim Cassar, afirma que o contéudo da reforma trabalhista “desconstrói o direito do trabalho como conhecemos, inverte seus princípios, suprime regras favoráveis ao trabalhador, prioriza a norma menos favorável ao empregado, a livre autonomia da vontade (CASSAR, 2017,p.289)”.

O direito do trabalho possui como princípio o in dubio pro misero, que estabelece que em caso de dúvida, o juiz poderá interpretar o caso em favor do operário. No entanto, com as modificações trazidas pela reforma, tal princípio não possui mais eficácia em sua aplicação, já que agora deverá o obreiro provar os direitos reclamados, sob pena de não acolhimento dos pedidos, que poderá resultar em responsabilização por pecúnia – condenação de pagamento de honorários sucumbenciais.

Assim, não é difícil notar que o acesso a justiça encontra-se lesado, já que a parte mais miserável da situação pode ter que arcar com valores em pecúnia, quando os seus pedidos não forem acolhidos pelo Judiciário.

O docente, e Juiz do Trabalho do Estado de São Paulo, Jorge Luiz Souto afirma que os magistrados devem interpretar as normas inseridas pela reforma com base “na razão de ser da Justiça do Trabalho (MAIOR, 2016/2017, p.150)”. Assim, a legislação deverá atender ao sujeito, dando-lhe a convicção de que os seus direitos possam ser absorvidos da forma correta.

A Justiça do Trabalho tem como principal escopo a proteção das relações de trabalho, mantendo o equilíbrio e extirpando quaisquer tipos de abusos que possam acontecer. No entanto as três principais mudanças processuais trazidas pela reforma trabalhista que causam impacto no trabalhador, assustam os doutrinadores e aplicadores do Direito.

Além das mudanças de direito material, também existiram alterações na esfera processual, que refletem diretamente na parte mais hipossuficiente das relações trabalhistas: o empregado.

As preocupações e objetivos centrais da Lei da Reforma Trabalhista, entretanto, são de natureza sumamente diversa, centrando-se na ideia de restringir, ao máximo, o acesso à jurisdição pela pessoa humana trabalhadora, além de instigar a transmutação do processo judicial laboral em tortuoso calvário de riscos e apenações a essa pessoa.

Trata-se, sem dúvida, de um constrangedor complemento à lógica das mudanças promovidas pela lei nos campos do Direito Individual do Trabalho e do Direito Coletivo do Trabalho, agora dirigidas ao Direito Processual Trabalhista.  E nessa direção processual trabalhista, a nova lei evidencia uma estrutura concertada e brandida no sentido de comprometer o patamar civilizatório processual garantido pela Constituição da República e pelo Direito Processual do País às pessoas humanas simples e destituídas de poder e de riqueza na realidade brasileira (DELGADO, 2017, p.48).

Mesmo com tais mudanças trazidas, aplicadores do Direito não podem deixar que as partes hipossuficientes sejam engolidas pelas partes mais fortes das relações trabalhistas.

A reforma trabalhista se justificou com o intuito de diminuir os níveis de desemprego e melhorar a economia, já que empregadores poderão investir sem grandes riscos. No entanto, a Desembargadora Magda Barros Biavaschi afirma que a Lei nº 13467/2017 é composta de falácias, que foram usadas para fortalecer a classe dos grandes empresários:

A reforma em questão, longe de solucionar os problemas das desigualdades nas relações de trabalho no país, tende a gerar mais distorções sociais e iniquidades, com impactos negativos na atividade econômica, na Previdência, na atividade sindical a na litigiosidade. Ao retroceder ao encontro “livre” das vontades “iguais” como instância normatizadora prevalente desconsidera a história da construção do direito do trabalho, cujos princípios próprios lhe dão fisionomia (BIAVASCHI, 2017, p.202).

Por fim, cumpre ressaltar mais uma vez que apesar das mudanças inseridas na legislação trabalhista, os operadores do Direito – sejam eles magistrados, advogados, servidores – devem resguardar a naturez do Direito do Trabalho: manter e buscar o equilíbrio nas relaçoes trabalhistas, tornando as partes iguais e com a mesma paridade de armas, apesar das enormes diferenças econômicas que as separam.

 

  1. CONCLUSÃO

A reforma trabalhista foi inserida pela Lei nº 13467/2017, trazendo diversas alterações e inserções na Consolidação  das Leis do Trabalho. Após tais mudanças, muitas discussões foram criadas, quando trabalhadores começaram a ter direitos usurpados, a serem surpreeendidos com sanções pecuniárias durante ou após as ações trabalhistas judiciais, propostas com o intuito primeiro de buscar direitos feridos anteriormente por empregadores.

Dentre as diversas modificações, nota-se que as mudanças no campo processual, e que geram ônus para os trabalhadores, foram as que mais criaram debates, principalmente nos aspectos relativos à concessão da justiça gratuita e a possibilidade do benefiário da mesma ser condenado ao pagamento de honorários periciais e sucumbenciais.

A concessão da justiça gratuita está consagrada na Carta Magna vigente, e é um direito que assiste todos aqueles que preencherem os seus requisitos: comprovar a insuficiência de recursos. Quando a reforma trabalhista regulamenta que até aquele que for beneficiário da justiça gratuita, poderá arcar com ônus de honorários sucumbenciais ou periciais, acaba por afastar o empregado das ações trabalhistas, quando estes a procuram para tutelas seus direitos.

Juristas e doutrinadores afirmam que tal alteração retira direitos conquistados através de muitas lutas e labutas, inclusive contrariando a Carta Magna vigente, que traz o acesso à justiça como um direito fundamental.

No entanto, deve-se sempre buscar manter a natureza essencial do Direito do Trabalho, buscando manter o equilíbrio das relações trabalhistas, bem como obedecendo os dispositivos constantes na Constituição Federal vigente.

Tais mudanças não podem constituir óbices aos trabalhadores que possuem seus direitos prejudicados por empregadores, que cada vez mais ganham dinheiro através da usurpação de direitos.

Assim, os profissionais que atuam na justiça do trabalho, devem buscar manter a integridade essencial do Direito do Trabalho, impedindo que a reforma trabalhista transforme empregados em indivíduos medrosos, escravizados, subalternos e humilhados. Mantendo, portanto, os valores sociais e humanos nas relações de trabalho, revendo e coibindo atos de empregadores que descumprem a legislação, em um grande sinal de desrespeito e desobediência.

 

REFERÊNCIAS

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[1]Eline Fagundes dos Santos Filha, pós graduanda em Direito do Trabalho. Email: [email protected]

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