Aspectos históricos da pena de morte

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária!

Resumo: O presente artigo tem por finalidae fazer um breve levantamento histótico da pena capital, verificando ainda os aspectos políticos de aplicação desta pena na antiguidade, bem como análises pela ótica religiosa, finalizando com noções gerais acerca da pena de morte no Brasil, servindo de base para análises futuras acerca do debate entre defensores e opositores do instituto.

Sumário: Introdução; Alguns aspectos históricos; Enfoques políticos; Reflexões religiosas; Noções da pena de morte no Brasil; Referências bibliográficas.

Introdução

O presente artigo visa trazer ao debate os aspectos históricos, políticos e religiosos que fundaram a pena de morte ao redor do mundo. Tal questão se faz importante para que se possa entender mais esse tão polêmico instituto penal.

O aspecto econômico é colocado em relevo, questiona-se a moralidade desta específica destinação de verbas, em detrimento de outras potenciais prioridades nacionais face a inequívoca falência do sistema prisional. A repulsa dos homens religiosos ante a execução de infratores, em virtude do desrespeito à suposta ordem divina, também é enfocado.

Para os opositores representaria um retrocesso o simples questionamento junto à coletividade, mesmo quanto aos criminosos incorrigíveis e de extrema periculosidade, defendendo apenas o afastamento do convívio social deste indivíduo, contudo, existe no país uma velada aplicação do instituto, presos de determinada categoria são sumariamente executados, ou por agentes da polícia, ou pelos próprios detentos. As excludentes de antijuridicidade que permitem ou retiram a ilicitude de certos homicídios em razão de especiais circunstâncias também são consideradas.

Por fim, tenciona demonstrar o autor que não obstante a expressiva ineficiência verificada em outros países, como meio de intimidação, e por conseguinte, de controle e redução dos índices de criminalidade da pena em tela, não se infirma sua aplicação como forma retributiva em decorrência de delitos específicos de gravidade extrema.

Aspectos Históricos

O termo pena advém do latim – poena – e sua acepção básica quer dizer sofrimento, ou também pode significar dó, lástima. Pode a pena ser encarada sob o ângulo da vingança, do castigo, da intimidação, ato que conduz o infrator ao isolamento do convívio social como meio eficaz de pôr termo às ações perniciosas deste.

Estudiosos do Direito Penal dividem em quatro as fases de aplicação da pena – vingança privada, vingança divina, vingança pública e período humanitário. Na vingança privada, adotada pelo Pentateuco, dentre outras legislações antigas, a vítima de uma ofensa possuía o direito de pessoalmente aplicar a desforra, induziu o surgimento da Lei de Talião, da proporcionalidade entre ofensa e reação, aquele que houvesse causado um mal ao semelhante sofria idêntico mal, em forma de castigo,olho por olho, dente por dente, vida por vida.

Na vingança divina, característica do Direito Penal Teocrático, considerava-se o delito uma ofensa à divindade e a pena, a cargo dos sacerdotes, um desagravo à alma do delinqüente. Na vingança pública, o crime era tido como ofensa ao soberano e a pena tinha efeito intimidativo. Em nome da vingança pública as penas foram bastante desumanas. A morte, precedida de torturas, era a regra nas punições. O suplício infligido nas execuções não restabelecia a justiça e nem reparava o dano, servindo somente para reafirmar o poder dos soberanos e dos que detinham privilégios, pois, atacando a lei, o infrator lesa a própria pessoa do príncipe, este ou aqueles a quem delegou sua força, se apoderam do corpo do condenado para mostrá-lo marcado, vencido, quebrado. Em virtude da insurreição contra o poder ilimitado e arbitrário dos governantes, surge o período humanitário preconizando a suavização dos rigores penais.

No passado, a pena de morte foi amplamente aplicada. Os egípcios a admitiam para todos os crimes. Os hebreus e babilônios também faziam uso dessa medida em larga escala. Beccaria foi um dos defensores do fim da pena de morte, sendo a favor da privativa de liberdade, dando como fundamento não a crueldade daquela, mas sim a rapidez com que era cumprida, não fazendo o infrator “sofrer o que devia”.

A lei de Moisés foi apresentada ao povo como sagrada, vinda diretamente de Deus e esculpida na pedra. O chefe de família detinha um poder absoluto sobre as pessoas de sua autoridade e por isso não havia limites na aplicação de castigos: “Quando alguém tiver um filho contumaz e rebelde, que não obedecer à voz de seu pai e de sua mãe e, castigando-o eles, não lhes der ouvidos, então todos os homens de sua cidade o apedrejarão com pedras, até que morra.” (Deut. 21,18,21).

O Código de Hamurabi é normalmente citado como o texto jurídico mais antigo, contém 282 artigos e data, aproximadamente, do ano 2000 a. C. Hamurabi foi o reunificador da Mesopotâmia e fundador do primeiro Império Babilônico, nele encontra-se aplicação da pena de morte em diversos casos:

Art. 3°. Se um homem, em processo, se apresenta como testemunha de acusação e não prova o que disse, se o processo importa em perda de vida, ele deverá ser morto.

Art. 6°. Se um homem roubou bens de Deus ou do palácio, deverá ser morto juntamente com aquele que recebeu o objeto roubado.

Art. 7°. Se um homem comprou ou recebeu em custódia prata ou ouro, escravo ou escrava, boi ou ovelha, asno ou qualquer outro valor da mão do filho de alguém ou do escravo de um homem, sem testemunha nem contrato, esse homem é ladrão e deverá ser morto.

Art.15°.Se um homem fez sair pela porta da cidade um escravo ou uma escrava do palácio ou de outra pessoa, ele será morto.

Art. 22°. Se um homem cometeu um assalto e foi preso, deverá ser morto.

Art.153°. Se a esposa de um homem, por causa de outro homem mandou matar seu marido, essa mulher será empalada.

Art.157°. Se um homem, depois da morte de seu pai, dormiu no seio de sua mãe, eles o queimarão.

Art.209°. Se um homem agrediu a filha de um outro homem e a fez expelir o fruto de seu seio, pesará dez siclos de prata pelo fruto de seu seio. Se essa mulher morrer: matarão a sua filha.

Art.229°. Se um pedreiro edificou uma casa para um homem, mas não a fortificou e a casa caiu e matou o seu dono, esse pedreiro será morto.

Art. 230°. Se causou a morte do filho do dono da casa, matarão o filho desse pedreiro.

No Código de Manu, datado aproximadamente de 1000 a.C. encontra-se extrema crueldade na punição dos crimes de injúria: “Que o rei lhe faça derramar óleo fervente na boca e na orelha, se ele tiver a imprudência de dar conselhos aos brâmanes relativamente ao seu dever.” Se a classe sacerdotal fosse designada de maneira ultrajante por uma pessoa de classe inferior, um estilete de ferro, de dez dedos de comprimento, seria enterrado fervendo em sua boca.

Com relação ao Direito na Grécia antiga, coube a Drácon codificar as leis que anteriormente eram aplicadas pelos eupátridas (os bem nascidos), recebendo poderes extraordinários para tanto. Sua intenção foi combater os abusos da vingança familiar (vindita), substituindo a guerra privada pela repressão social. Somente os parentes próximos (pais, irmãos e filhos) tinham o direito de vingança, e, em caso de composição, teria de haver acordo unânime. Os crimes em sua maior parte eram punidos com a morte, sendo esta a gênese da reputação de sanguinário imputada à Drácon, a expressão legislação draconiana significa de caráter implacável e rigoroso.

A Lei das XII Tábuas, aprovada no ano de 452 A . C. teve uma importância singular para o povo romano, sendo o resultado de uma luta da plebe. Foi uma das primeiras leis a eliminar a diferença de classes, em razão das normas do período monárquico não mais se adaptarem à nova forma de governo, a república, dando origem ao Direito Civil. A pena de talião estava condicionada à reparação do delito, assim, raras vezes tinha aplicação. Rigorosas eram as penalidades para o falso testemunho, os romanos consideravam esse tipo de delito pior que o roubo. Tábua sétima: 16. “Se alguém profere um falso testemunho, que seja precipitado da rocha Tarpéia”. Parricídio também não era tolerado, 18.“Se alguém matou o pai ou a mãe, que se lhe envolva a cabeça, e seja colocado em um saco costurado e lançado ao rio”. Ainda a mesma Tábua punia os maus advogados severamente declarando em seu inciso 14. “Se um patrono causa dano a seu cliente, que seja declarado sacer, podendo ser morto como vítima devotada aos deuses.”

Os romanos tinham muito apreço pela forma física e como conseqüência a Tábua Quarta dispunha o seguinte: 1. “É permitido ao pai matar o filho que nasce disforme, mediante o julgamento de cinco vizinhos”. Em virtude do grande poder do pater familias o pai detinha sobre a prole direito de vida e morte. Tábua Quarta: 2. “O pai terá sobre os filhos nascidos de casamento legítimo o direito de vida e morte e o poder de vendê-los”.

Outros pontos relevantes, Tábua Segunda: 3. “Se alguém comete furto à noite e é morto em flagrante, o que matou não será punido”. 4. “Se o furto ocorre durante o dia e o ladrão é flagrado, que seja fustigado e entregue como escravo à vítima. Se é escravo, que seja fustigado e precipitado do alto da rocha Tarpéia”. Aspecto bastante interessante encontra-se na Tábua nona, extremo rigor para juízes corruptos, 3. “Se um juiz ou um árbitro indicado pelo magistrado recebeu dinheiro para julgar a favor de uma das partes em prejuízo de outrem, que seja morto”. Como não poderia deixar de ser nas legislações antigas, a mulher adúltera sofria os rigores de sua conduta, “Se uma mulher bebe vinho ou comete um ato vergonhoso com homem estrangeiro, que o marido e a família dessa mulher a julguem e a punam; e se é surpreendida em adultério, que o marido tenha o direito de matá-la”.

Em Roma, os recém-nascidos só vinham ao mundo, só eram recebidos na sociedade em virtude de uma decisão do chefe de família; a contracepção, o aborto, o enjeitamento de crianças e o infanticídio eram práticas comuns e legais. Um cidadão não tem um filho, ele o toma, levanta, o pai exerce a prerrogativa, tão logo nasce a criança, de levantá-lo do chão, onde a parteira a depositou, para tomá-la nos braços e assim manifestar que a reconhece e se recusa a enjeitá-la. A criança que o pai não levantar será exposta diante da casa, quem quiser que a recolha. Quanto às malformadas, em geral eram afogadas, nisso não havia raiva e sim razão, dizia Sêneca: “É preciso separar o que é bom do que não pode servir para nada”.

Um ponto bastante peculiar do Direito romano merecedor de menção era o fato de que, púbere ou não, casado ou não, um menino permanecia sob autoridade paterna e só se tornava inteiramente romano, ou seja, “pai de família” , após a morte do pai (seu juiz natural com poderes para condená-lo à morte por sentença privada). Desta forma, um homem de idade madura não pode realizar nenhum ato jurídico com sua própria autoridade se ainda possui pai vivo, esta situação para um homem adulto era psicologicamente insuportável. Assim, inobstante a severa reprimenda disposta em lei, o parricídio era uma obsessão e ocorria com relativa freqüência.

Enfoques Políticos

Muitos foram os pensadores que se dispuseram a analisar a fundamentação do Estado. Para Grócio, a sociedade política é efeito da sociabilidade, o indivíduo é atraído por seu semelhante independente de qualquer necessidade, esta é uma realização da lei da natureza. Mediante um contrato, seus membros decidem voluntariamente delegar a autoridade pública à uma instância soberana e perpétua, que tem como missão garantir a paz e a concórdia.

Para Thomas Hobbes, o estado de natureza, anterior à formação do Estado, consiste em uma época de guerra de todos contra todos, na qual o homem é o lobo do homem, para dar fim a essa constante insegurança surge a associação com intuito de preservar a integridade física e material de seus membros. A ordem política é uma decisão coletiva, a construção de uma instância superior que tem por fim eliminar a violência natural, e para combatê-la sugere uma potência que desconheça limites. A instauração da sociedade política pressupõe que os cidadãos, de comum acordo, despojem-se integralmente de sua potência individual e a transfiram para a autoridade pública. A soberania una e indivisível do Estado é ilimitada, o contrato que a estabelece não a sujeita a nenhuma obrigação, salvo a de assegurar a tranqüilidade e o bem-estar dos contratantes.

John Locke é contrário ao contrato de submissão proposto por Hobbes, em sua opinião, a sociedade enquanto tal, no estado de natureza, possui a capacidade de se organizar de modo harmonioso, sem que haja necessidade de recorrer à ordem política. O que determina a instauração desta ordem é a impotência a que se encontra reduzida uma tal sociedade quando sua organização natural é ameaçada por inimigos externos e internos. Os direitos naturais não têm força, é indispensável constituir um poder que os enuncie e formalize, que lhes dê força de lei, e que imponha sua efetividade mediante a coerção. O Estado visa a garantir a preservação da propriedade privada, é dos cidadãos que depende o regime, que durará enquanto servir ao bem público.

Para Jean Jacques Rousseau, o contrato que cria o Estado, não é meramente estabelecido entre indivíduos, mas sim, firmado entre cada um consigo mesmo, o que transforma o indivíduo num cidadão. É feita uma alienação total de cada associado, com todos os seus direitos , à comunidade. A alienação total permite a liberdade total, na medida em que ela evita transpor para a sociedade política nova os estigmas da desilgualdade preexistente.

Assim, cada um, dando-se a todos, não se dá a ninguém; e, não existindo um associado sobre o qual não se adquire o mesmo direito que se lhe cede sobre si mesmo, ganha-se o equivalente de tudo que se perde, e maior força para conservar o que se tem, a liberdade só é submissão porque esta é voluntária, a obediência que se prescreveu para si mesmo é liberdade. A vontade geral dá a existência e a vida do corpo político: a soberania é seu exercício e a legislação, seu movimento.

A soberania é infalível e absoluta; infalível, porque a vontade geral é sempre justa e tende sempre à utilidade pública; absoluta, porque, assim como a natureza dá a todo homem um poder absoluto sobre todos os seus membros, o pacto social dá ao corpo político um poder absoluto sobre todos os seus membros.

Conforme rapidamente verificado, a teoria do contrato evidencia que os homens, em função de variados interesses, associam-se, criando um ente capaz de exercer coerção e de garantir as conveniências de seus associados fundadores, e, para tanto, renunciam à sua plena liberdade.

Cristaliza-se o direito do Estado de punir os infratores de suas convenções, em nome da manutenção da ordem e da segurança. Os insatisfeitos com esta disposição vigente poderiam objetar que não participaram do contrato original, e portanto, sua anuência não é legítima, entretanto, a existência do Estado de direito converteu-se em fato social, anterior, exterior e superior aos indivíduos, uma nova geração não poderia tencionar, por exemplo, a mudança de idioma.

Reflexões Religiosas

O sacrifício é um elemento central no culto de muitas religiões, em geral, é oferecido aos deuses algo que as pessoas consideram bastante valioso. Pode ser constituído de frutas, primícias das colheitas, um filhote de animal; em certas culturas, há exemplos de sacrifícios humanos como prática corrente. Os Astecas (México), por exemplo, promoviam jogos para eleger seus campeões, e justamente estes, eram oferecidos em sacrifício ao Deus de sua veneração (sol), acreditavam precisar nutri-lo com o melhor sangue. As vítimas seguiam tal destino com o coração alegre.

Moisés libertou os israelitas do jugo egípcio, conduziu-os pelo deserto errando durante quarenta anos, levando-os a Canaã, a Terra Prometida. Durante a travessia do deserto, Deus, deu a Moisés, no Monte Sinai, as duas tábuas da Lei com os Dez Mandamentos a que os israelitas deviam obedecer. Dessa forma, fez-se um pacto segundo o qual os israelitas deveriam reconhecer a existência de um só Deus, e em troca se tornariam o povo escolhido pelo onipotente. Receberiam sua ajuda e seu apoio, desde que cumprissem o que lhes cabia no acordo e obedecessem às leis prescritas. Dentre as proibições contidas na lei havia: “não matarás”.

Para os muçulmanos, seguidores do Islã (submissão a Deus), o livro sagrado (Alcorão) constitui concomitantemente, uma doutrina religiosa, um código penal, código civil, e constitucional, seguido por mais de 40 países (Quinta parte da população mundial), seus preceitos legais estabelecem normas de conduta, fixando o certo e o errado, o permitido e o proibido, especificando sanções para os transgressores. Maomé, o profeta, praticamente anulou a classe sacerdotal, cada muçulmano é o sacerdote de si mesmo. A pena de talião é prescrita contra quem infligir a morte: homem livre por homem livre, escravo por escravo, mulher por mulher.

Em Roma havia a religião doméstica, o senhor do fogo doméstico estabelecia na família a condição de cada um. O pai é o primeiro junto ao fogo, ele o acende e o conserva, é ele o pontífice. Em todos os atos religiosos a função mais elevada é desempenhada pelo pai, é ele quem degola a vítima; é ele quem pronuncia a fórmula de oração que deve atrair sobre si e os seus a proteção dos deuses. A família e o culto são perpetuados através dele, tão somente o pai representa toda a seqüência dos descendentes. O culto doméstico repousa sobre ele, quando a morte chegar ele será um ser divino que os descendentes invocarão.

O poder do marido sobre a mulher procedia, como todo direito privado das crenças religiosas que colocavam o homem acima da mulher. A autoridade do marido é tanta, que este, antes de morrer, podia designar para a esposa um tutor ou mesmo um segundo marido. Dentro do rigor do direito primitivo, os filhos permanecem ligados ao fogo doméstico do pai e, conseqüentemente, submetidos à sua autoridade, visto que, enquanto o pai viver, eles serão menores. O pai podia vender o filho, uma vez que era lícito dispor de toda a propriedade da família, em relação ao filho, havia ainda, o direito de enjeitá-lo.

O chefe de família era um verdadeiro juiz, com direito de sentenciar à morte seus membros, sem possibilidade de apelação. Nenhuma autoridade gozava de competência para alterar suas sentenças. No tocante à mulher, a religião era tão severa que, em algumas situações, caso não desejasse condená-la à morte, era ao menos forçado a repudiá-la, não dispondo da faculdade de conceder-lhe o perdão.

A Igreja, durante a Inquisição, também não ficou atrás, havendo um manual para os adeptos do Santo Ofício:

Inquisição – Orientações para os interrogadores

“A finalidade da tortura é obrigar o suspeito a confessar a culpa que cala. Pode-se qualificar de sanguinários todos esses juízes de hoje, que recorrem tão facilmente à tortura, através de outros meios, completar a investigação. Esses juízes sanguinários impõem torturas a tal ponto que matam os réus, ou os deixam com membros fraturados, doentes para sempre. O inquisidor deve ter em mente que: o acusado deve ser torturado de tal forma que sai saudável para ser libertado ou para se executado.”

(Manual dos Inquisidores – Nicolau Eymerich – 1376)

Noções da pena de morte no Brasil

Entre os indígenas também havia um direito penal, no qual predominavam as penas corporais, mas existia também a pena capital para várias infrações, sendo comum o emprego do tacape nos rituais de sacrifício dos inimigos. Em algumas regiões eram aplicados venenos. Havia, ainda, o sepultamento de pessoas vivas, principalmente em relação a crianças, além de outras formas de execução, algumas copiadas dos povos colonizadores, como o enforcamento.

Com a divisão do Brasil em capitanias hereditárias, o Capitão e o Governador nomeavam os Ouvidores e com eles decidiam as questões criminais. Podiam aplicar a pena de morte, salvo tratando-se de pessoa de mór qualidade, pois nesse caso, excetuados os crimes de heresia, traição, sodomia e moeda falsa, só tinham alçada até dez anos de degredo e cem cruzados de multa. Nessa época, embora em vigor as Ordenações Manuelinas, na prática, o direito criminal era ao arbítrio dos donatários.

Nos vinte e cinco anos de permanência dos holandeses em Pernambuco (1630-54), a pena de morte era a sanção por excelência, executada pela forca, pela espada, pela fogueira, pela entrega da vítima aos índios e pelo esquartejamento do condenado ainda vivo.

Após a proclamação da independência (1822), entrou em vigor a primeira Constituição do Brasil (1824), inspirada no liberalismo do século XVIII. Embora não tenha afastado a pena capital, o texto constitucional aboliu os açoites, a marca de ferro quente e as demais penas cruéis. Em seu art. 179, inciso XXI, estabeleceu que “as cadeias serão seguras, limpas e bem arejadas, havendo diversas casas para separação dos réus, conforme suas circunstâncias e natureza de seus crimes”. Com isso, demonstrou a Constituição Imperial preocupação com as condições carcerárias e a tendência a afastar a idéia da pena unicamente retributiva.

O Código Criminal de 1830 previu a pena de morte para os seguintes crimes: homicídio, se agravado com algumas circunstâncias do art.16 (art. 192); roubo com resultado morte (art. 271) e insurreição. Esta, nos termos do art. 113, ficaria configurada se houvesse reunião de vinte ou mais escravos para obterem a liberdade por meio da força. A referida pena era executada na forca (art.38), no dia seguinte à intimação do réu da sentença irrevogável, salvo em se tratando de Domingo, dia santo ou festa nacional (art. 39). De acordo com o art. 40, o acusado, em seu vestido ordinário, deveria ser conduzido pelas ruas mais públicas até a forca, acompanhado do juiz criminal, do escrivão e da força militar.

A execução era, assim, precedida de ritual destinado a incutir temor no povo. Os corpos dos enforcados podiam ser entregues aos parentes ou amigos, mediante pedido ao juiz que presidisse à execução; no entanto, não podiam ser enterrados com pompa, sob pena de prisão, de um mês a um ano (art. 42). A mulher grávida só podia ser condenada à morte, ou mesmo executada, quarenta dias após o parto (art.43). A pena de morte foi largamente aplicada até a Segunda metade do século XIX, contudo, a ocorrência de erro judiciário que culminou com a execução de Motta Coqueiro, em Macaé (1855), impressionou profundamente o Imperador, que passou a comutá-la sistematicamente em galés perpétuas.

Como nas Ordenações Portuguesas estava prevista a pena de morte, todas as colônias de Portugal, incluindo o Brasil, a aplicavam, desta forma, desde sua descoberta até 1890. Seguia-se a orientação dos colonizadores, não somente existia a pena com também era executada com brutalidade e de forma indiscriminada. De 1890 a 1937, não houve pena de morte no Brasil, porém, durante o governo de Getúlio Vargas, ela foi reativada para os casos de crimes políticos com traição à pátria e de homicídios praticados com requintes de crueldade. Em 1946, a Constituição restringiu a aplicação da pena, somente os crimes militares em tempo de guerra eram apenados com a morte. Em 1964, a pena capital voltou a ser reativada para os casos de guerra psicológica adversa ou revolucionária subversiva, além dos casos previstos no Código Penal Militar.

Com a Emenda Constitucional n° 11, de 13 de outubro de 1978, foi novamente abolida apena de morte para os crimes comuns contra a segurança nacional e restringida sua incidência à legislação penal aplicável em caso de guerra externa.

A atual Constituição, de 1988, ao cuidar dos Direitos e Garantias Fundamentais, em seu art. 5°, caput, garante aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida. No inciso XLVII, do mesmo artigo, proíbe expressamente a pena de morte, salvo em caso de guerra declarada nos termos do art. 84, XIX.

Referência Bibliográfica

ALCORÃO – Trad. Mansour Challita. Associação Internacional Gibran, 1995.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. 5° ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

BÍBLIA SAGRADA – Trad. João Ferreira de Almeida. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1995.

BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. 9° ed. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992.

BRASIL. Código Penal. Organização de Textos, notas remissivas e índices por Juarez de Oliveira. 35° ed. São Paulo: Saraiva, 1997

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil.

Brasília DF: Senado, 1988

CALHEIROS, B. Bonfim. A pena de morte. Rio de Janeiro: Editora Destaque, 1998.

CHALLITA, Mansour. Os mais belos pensamentos de todos os tempos, III vol. Rio de Janeiro. Associação Cultural Internacional Gibran, 1995.

CHÂTELET, François. História das idéias políticas. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1985.

COULANGES, Fustel de. A cidade antiga. São Paulo: Editora Edipro, 1998.

DAHER, Paulo Rodrigues. Pena de morte. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1996.

DUEK, Oswaldo Henrique Marques. A pena capital e o direito à vida. São Paulo:Ed. Juarez de Oliveira, 2000

DUTRA, Augusto Barreto. Pena de morte – um remédio social urgente. 7° ed. São Paulo: Editora Universitária de Direito, 1998

FRAGOSO, Heleno Cláudio. Lições de direito penal. 3° edição. São Paulo: Bushatsky, 1998.

GAARDER, Jostein. O livro das religiões. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

JESUS, Damásio Evangelista de. Direito penal vols. I e II. 21° ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1998.

MIRABETE, Júlio Fabrini. Manual de direito penal vols. I e II. 17° edição. S.P: Ed. Atlas, 2000.

NIETZSCHE, Friedrich. Além do bem e do mal. Rio de Janeiro: Ed. Ediouro, 1991.

PHILIPPE, Ariés. História da vida privada vol. I. Do Império Romano ao Ano Mil. São Paulo: Companhia Das Letras,1989.

PINHEIRO, Ralph Lopes. História resumida do direito. 6° ed. Rio de Janeiro: Thex Editora, 1997.

ROUSSEAU, Jean Jaques. O contrato social. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

SCHOPENHAUER, Arthur. Aforismos sobre filosofia da vida. Rio de Janeiro: Ed. Ediouro, 1991.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 17° ed. S.P.: Malheiros, 2000

VARELLA, Drauzio. Estação carandiru. 11° ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.

VIEIRA, Jair Lot. Código de Hamurabi. São Paulo: Editora Edipro, 1994.

VIEIRA, Jair Lot. Código de Manu. São Paulo: Editora Edipro, 1994.

VIEIRA, Jair Lot. Lei das XII tábuas. São Paulo: Editora Edipro, 1994.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Carlo Arruda Sousa

 

Técnico Jurídico da Justiça Federal do Rio de Janeiro e MBA em direito da empresa e da economia e advogado

 


 

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária!

A Violência Contra a Mulher no Ambiente Virtual e…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Isabela Karina...
Equipe Âmbito
41 min read

Proposta de inserção de um quesito direcionado ao conselho…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Autor: Me....
Equipe Âmbito
30 min read

Psicopatia e o Direito Penal: Em Busca da Sanção…

Quer participar de um evento 100% gratuito para escritórios de advocacia no digital? Clique aqui e inscreva-se grátis no evento Advocacia Milionária! Nome do...
Equipe Âmbito
10 min read

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *