A produção de prova no direito previdenciário

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Resumo: O presente artigo trata de provas, a serem apresentadas pelo segurado ou seus dependentes, com o objetivo de receber um determinado benefício previdenciário do Instituto Nacional do Seguro Social- INSS. O preenchimento dos requisitos exigidos pelo instituto, nem sempre é possível no âmbito administrativo, em virtude de ausência ou insuficiência de provas e o Poder Judiciário torna-se um caminho viável para a concessão do benefício.

Palavras chave: segurado – benefício previdenciário – concessão– provas

Abstract: This article deals with evidence, to be presented by the insured or their dependents, with the purpose of receiving a certain social security benefit from the National Institute of Social Security (INSS). The fulfillment of the requirements demanded by the institute is not always possible in the administrative scope, due to absence or insufficiency of evidence and the Judiciary becomes a feasible way to grant the benefit.

Keywords: insured – social security benefit – concession – evidence

Introdução

 A concessão do benefício previdenciário, muitas vezes é negada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, pois as normativas utilizadas pelos seus servidores nem sempre trazem, as situações vivenciadas pelo segurado ou seus dependentes.

A Previdência Social nem sempre atende o segurado ou seus dependentes, que precisam do benefício, como dispõe o artigo 1º da Lei nº 8.213/1991:

“A Previdência Social, mediante contribuição, tem por fim assegurar aos seus beneficiários, meios indispensáveis de manutenção, por motivo de incapacidade, desemprego involuntário, idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.”

O não atendimento ocorre, porque o INSS restringe-se a reconhecer apenas as situações apresentadas em suas normativas, deixando de conceder os benefícios previdenciários em muitos casos.

     O Poder Judiciário torna-se uma das soluções para o segurado ou seus dependentes, conseguir receber um determinado benefício, pois conta com os princípios constitucionais, como o devido processo legal e a ampla defesa para respaldar sua solicitação.

O sucesso da empreitada, depende muito convicção do julgador, que irá decidir o processo judicial baseado em provas dos fatos alegados pelo autor da ação, que poderá comprovar com prova documental, testemunhal e pericial.

1 – A origem das legislações previdenciárias no Brasil

O futuro constitui motivo de preocupação para o homem e, nesse sentido, diversos países do mundo adotaram medidas para a proteção social da população.

No Brasil não poderia ser diferente e por aqui foram instituídas algumas entidades públicas e privadas, como os seguros, os montepios, os pecúlios, as caixas de aposentadorias e pensões, oferecendo benefícios de maneira graciosa ou não. Somente a partir da Constituição de 1934, foi criada a forma tripartite de custeio, com a contribuição dos empregados, dos empregadores e do Estado.

A padronização do sistema assistencial ocorreu a partir da Lei nº 3.807/1960 – Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS, com a criação de normas uniformes para proteger os segurados e seus dependentes, até então espalhados em várias entidades assistenciais.

Na década de 60, também foram criados inúmeros benefícios sociais, como o auxílio natalidade, o auxílio funeral, o salário família, o décimo terceiro salário, o seguro desemprego e o seguro acidente de trabalho.

A promulgação da Constituição Federal de 1988, foi um importante marco para a proteção social do indivíduo, com a destinação de um capítulo sobre a seguridade social, mencionados nos artigos 194 a 204, abordando a saúde, a previdência social e a assistência social. Várias inovações, em matéria previdenciária, tem ocorrido desde então, destacando as Leis de 1991: nº 8.212, que trata do custeio e nº 8.213, que trata dos planos de benefícios e o Decreto nº 3.048/1999, que trata da aprovação do Regulamento da Previdência Social – RPS.

No sistema brasileiro, a Seguridade Social é financiada por toda a sociedade, pois além das contribuições sociais, ainda contamos com a receita dos concursos de prognósticos, enquanto que a Previdência Social tem caráter contributivo e filiação obrigatória ou facultativa dos segurados.

Sérgio Pinto Martins [1]assim comenta sobre o tema:

“É a Previdência Social o segmento da Seguridade Social, composta de um conjunto de princípios, de regras e de instituições destinado a estabelecer um sistema de proteção social, mediante contribuição, que tem por objetivo proporcionar meios indispensáveis de subsistência ao segurado e a sua família, quando ocorrer certa contingencia prevista em lei. “

As contingências de que trata o autor em seu comentário, engloba situações como doença, invalidez, morte, velhice, maternidade e desemprego, como dispõe o artigo 201 da Constituição Federal.

O segurado, por ocasião do pedido de concessão de um determinado benefício previdenciário junto ao Instituto Nacional de Seguro Social – INSS, muitas vezes enfrenta verdadeiro obstáculo para comprovar os requisitos exigidos pelo instituto, culminando muitas vezescom o indeferimento para sua solicitação.

2 – O benefício previdenciário negado

A Constituição Federal de 1988 assegura que todos os cidadãos são iguais perante a lei e, especificamente no inciso LXV, do artigo 5º dispõe que : “ninguém será privado da liberdade, ou de seus bens, sem o devido processo legal” e no inciso LV, do mesmo artigo: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, são assegurados o contraditório a ampla defesa, com os meios e os recursos a ele inerentes.” Esses dois incisos evidenciam que todo cidadão tem o direito de pleitear um determinado benefício previdenciário e caso seja negado, que possa apresentar argumentações, com o intuito de reverter a situação, seja na esfera administrativa ou judicial.

A apresentação de provas auxilia o segurado, a conseguir o reconhecimento de seu direito de pleitear um beneficio previdenciário. Como afirma Wladimir Novaes Martinez [2], é vasta a possibilidade de produção de provas: “O campo de prova é imenso no Direito Previdenciário. As situações, as circunstancias e as hipóteses são quase infinitas. A cada uma delas praticamente corresponde um instrumento probatório específico”.

Por outro lado, Régis Martins de Almeida [3] reconhece a dificuldade do segurado em apresentar provas ao INSS:

“O Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, com fundamento no Decreto nº 3.048/99, estabelece regras, bem como os procedimentos para a concessão administrativa dos benefícios previdenciários aos segurados. No entanto, em determinadas situações, devido às circunstancias do caso concreto, inúmeros benefícios restam negados, com fundamento na ausência de provas hábeis para sustentar a pretensão dos segurados a um determinado benefício previdenciário”.

No caso do INSS indeferir a solicitação, resta ainda ao segurado, recorrer ao Poder Judiciário, que proporciona uma produção de uma maior quantidade de provas, fundamentada nos princípios constitucionais, como o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.  

Nesse sentido, apresentamos as palavras de Marcelo Leonardo [4]:

“O INSS quando se comporta de forma indevida, isto é, negando um benefício que seria jurídica e moralmente devido, merece correção do Judiciário por meio da ação própria. Mas isso não deve servir para a generalização da percepção de que agirá assim. Não parece adequada a postura preconcebida de encarar o estado como oponente do indivíduo, na aplicação aos direitos sociais e não como a entidade, com base na noção de direitos fundamentais de segunda gerações, capaz de, ao intervir na ordem social, garantir-lhe condições de liberdade real e de igualdade de chances”

Já os autores Wagner Balera e Ana Paulo Oriola de Raeffray[5]defendem que o segurado deve, primeiramente, buscar a concessão do benefício no órgão responsável e somente se indeferidos, deve ingressar com a ação judicial:

“A não efetivação do prévio requerimento administrativo transforma o Poder Judiciário em um balcão do INSS tornando o Juiz em mero substituto do agente administrativo, sobrecarregando-o uma vez que inúmeras situações poderiam ter sido resolvidas sem qualquer litigiosidade com a entrega da prestação na via administrativa. No nosso entender, é falso o dilema de cerceamento ao acesso ao judiciário em face da exigência do prévio requerimento administrativo.”

O pleito do segurado, seja no âmbito administrativo como no judicial, requer que alguns requisitos sejam preenchidos, ou seja, que existam provas para a concessão do benefício previdenciário. Para tanto, a apresentação de provas torna-se necessária, para que o benefício seja concedido.

3 – As provas admitidas no Direito Previdenciário

A prova é de suma importância em qualquer ramo do Direito, podendo ser aceita a documental, a testemunhal e a pericial.

A prova documental tem, por objetivo, comprovar fatos passados e que servem como subsídio para a concessão de benefício previdenciário ao segurado ou a seus dependentes, dentre as quais destacamos: a Carteira de Trabalho e Previdência Social, a CNIS, a PPP, exames médicos, receitas médicas, guia de internação em hospitais, etc. Em relação aos dependentes, existe uma série de documentos, que estão relacionados no artigo 22 do Decreto nº 3.048/199 e que podem comprovar a dependência econômica e o vínculo com o segurado. 

A prova testemunhal é admissível, podendo complementar ou mesmo suprir a ausência de outras provas. O próprio INSS adota um formulário denominado “requerimento de justificação administrativa”, com o qual o segurado ou seus dependentes podem registrar os fatos que desejam comprovar, relacionando no mínimo, três e no máximo, seis testemunhas, que podem ser ouvidas pelo instituto.

A prova pericial exige conhecimentos técnicos, havendo necessidade de realização deexamesdos fatos por profissionais,que irão elaborar um laudo pericial, para auxiliar o juiz em sua tomada de decisão.

A prova emprestada é utilizada em Direito, e mesmo sendo de outra área, como a cível ou a trabalhista, poderá ser empregada nos processos previdenciários.

Sérgio Pinto Martins [6] define esse tipo de prova:

“A prova de certo fato que foi produzida num processo pode ser copiada para outro, mediante certidão. É o que ocorreria em relação a um documento, aos depoimentos testemunhais ou pessoais, ao exame pericial etc. A essa prova transferida de um processo para outro dá-se o nome de prova emprestada.”

Eduardo Cambi[7] demonstra certa preocupação com o tema:

“A prova emprestada há de ser sempre analisada no contexto probatório, caso seja uma prova frágil, isto é, da qual não se possa ressaltar ao menos um juízo de probabilidade sobre a existência dos fatos, deve ser admitida, embora mereça uma valoração negativa, especialmente se for a única prova disponível para a verificação da questão controvertida. “

No caso do juiz utilizar-se de uma prova emprestada, que não pode ser admitida no processo, a sentença pode ser anulada, desde que se comprove a violação à garantia constitucional do prejudicado.

 Outro ponto na questão das apresentações das provas a ser destacado, é a crescente informatização do sistema previdenciário, possibilitando ao INSS o acesso ao cadastro das empresas. Essa medida poderácontribuir muito com o segurado, que deixará de apresentar diversas informações ao INSS, facilitando a sua vida, pois muitas vezes não possui a documentação exigida pelo instituto.

 Alguns documentos podem ser destacados e que são aceitos tanto pelo INSS como pelo Poder Judiciário, como prova:

Papéis laborais – as carteiras de trabalho e de saúde, desde que sem rasuras, ilegibilidades ou falsidades materiais fornecem dados para comprovar a existência do vinculo empregatício. No caso da CTPS estar rasurada, deteriorado, por água ou outro dano, somente servira como início razoável de prova material. A ficha de registro de empregado, o cartão de ponto, o livro de ponto, os holerites em papel timbrado da empresa também são aceitos como prova.

Certidões oficiais – as certidões de nascimento, de casamento e de óbito tem ofício de fé e não podem ser contestadas.

Decisões judiciais – a justificação judicial ocorrida na Justiça Federal é demonstração inequívoca da existência de vínculo previdenciário.

O reconhecimento de vínculo empregatício, muitas vezes obriga o segurado a recorrer à Justiça Trabalhista, para que comprove a existência da relação trabalhista e o período laborado. Com relação ao efeito da sentença trabalhista no direito previdenciário, assim se posiciona Régis Martins de Almeida [8] :

“Nesse sentido, consolidou-se tanto na doutrina como na jurisprudência que as sentenças trabalhistas homologatórias de acordos, constituem início de prova material no direito processual previdenciário, desde que fundada em elementos que evidenciam o efetivo exercício da atividade laboral na função e em período mencionados na ação previdenciária, prova esta que restará valorada juntamente com os demais meios de prova constante do processo para a comprovação do tempo de serviço. “

Já Júlio Cesar Botelho [9] afirma que:

“…pode-se concluir que a sentença trabalhista é admitida pelo INSS, como início de prova material, apta a comprovar o tempo de serviço, desde que tenha sido proferida com base em prova documental, contemporânea aos fatos a comprovar, além da fundada em elementos que evidenciem o labor exercido na função e o período alegado pelo trabalhador”.

Os autores mencionados defendem que, a sentença trabalhista pode ser admitida como prova, desde que evidenciem o efetivo exercício da atividade laboral e o período alegado pelo segurado em sua solicitação previdenciária.

Não importa quais os tipos de provas utilizados, bastando que sejam admissíveis em Direito e forneçam subsídios para comprovar os fatos alegados pelos segurados ou seus dependentes e auxiliem na decisão do julgador.

Conclusão

Os benefícios previdenciários podem ser concedidos aos segurados ou seus dependentes pelo INSS, através de requerimento administrativo, desde que sejam cumpridos os requisitos exigidos. No entanto, inúmeras vezes os benefícios previdenciários são negados, com fundamento na falta de provas para a sua concessão.

O Poder Judiciário é então acionado, com o intuito de atender a pretensão do segurado ou de seus dependentes, pois proporciona uma maior quantidade de provas, não ficando restrito aos documentos relacionados no Decreto nº 3.0148/1999. Assim, o julgador estará melhor respaldadopara proferir a sua decisão, visto que a produção de provas não sofrerá restrições, como ocorre na esfera administrativa.

 

Referências
ALMEIDA, Régis Martins de. A produção probatória no processo judicial previdenciário. Disponivel em www.magister.com. Acesso em 29/11/2016.
BALERA, Wagner e RAEFFRAY, Ana Paula Oriola de (coordenadores). Processo previdenciário – teoria e prática. São Paulo: Conceito Editorial, 2012.  
BOTELHO, Júlio César. Dos efeitos da sentença trabalhista no direito previdenciário. São Paulo: Revista de Previdência Social nº 395, 2013.
BRASIL. Lei 8.212/1991, Lei 8.213/1991 e Decreto 3.048/1999. Disponível em www.planalto.gov.br. Acesso em 29/11/2016.
CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância> São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.
MARTINEZ, Wladimir Novaes. A prova no direito trabalhista. São Paulo: LTr, 2012.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito de seguridade social. São Paulo: Atlas, 2001.
___________________. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense. São Paulo: Atlas, 2008.
TAVARES, Marcelo Leonardo. O devido processo legal previdenciário e as presunções de prova. Disponível em www.impetus.com.br. Acesso em 29/11/2016.
 
Notas
[1] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. São Paulo: Atlas, 2001, p.296.

[2] MARTINES, Wladimir Novaes. A prova no direito previdenciário. São Paulo: LTr, 2012, p.31.

[3] ALMEIDA, Régis Martins de. A produção probatória no processo judicial previdenciário. Revista brasileira de direito, v.3, nº 15, 2013, p.58.

[4] TAVARES, Marcelo Leonardo. O devido processo legal previdenciário e as presunções de prova. Disponível em awww.impetus.com.br. Acesso em 29/11/2016.

[5] BALERA, Wagner e RAEFFRAY, Ana Paula Oriola de. Processo Previdenciário – Teoria e prática. São Paulo: Conceito Editorial, 2012, p.322.

[6] MARTINS, Sérgio Pinto. Direito processual do trabalho: doutrina e prática forense. São Paulo: Atlas, 2008, p. 352.  

[7] CAMBI, Eduardo. A prova civil: admissibilidade e relevância. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p.61.

[8] ALMEIDA, Régis Martins de. Idem, idem.

[9] BOTELHO, Júlio César. Dos efeitos da sentença trabalhista no direito previdenciário. São Paulo: Revista de Previdência Social nº 395, 2013, p.866.  


Informações Sobre o Autor

Eliana Cavalheiro de Carvalho

Advogada graduada em Direito pela Universidade Braz Cubas. Pós graduanda em Direito da Seguridade Social Faculdade Legale


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