Salário-Família e a guarda compartilhada

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Sumário: I – Introdução; II – Do Salário-Família; III– Da Guarda Compartilhada; IV– Efeitos da Guarda Compartilhada no Salário-Família; V – Considerações Finais


Palavras-Chave: Salário-Família. Guarda Compartilhada.


I – Introdução


O tema salário-família já possui boa discussão doutrinária, sendo que os Tribunais já delinearam o instituto, resolvendo diversos problemas decorrentes da apreciação da norma jurídica que trata do assunto, qual seja, a Lei 8.213/91, especialmente nos artigos 65 a 70.


Fato novo – que se trás por meio deste artigo – é a possibilidade ou não da guarda compartilhada gerar este benefício.


Como se sabe, se marido e mulher possuírem filhos de até 14 anos ou inválidos, ambos terão direito ao salário-família. Acontece que se o casal separar, apenas receberá o salário-família a pessoa que ficar com a guarda dos filhos.


No entanto, a guarda compartilhada, ao dispor que ambos – pai e mãe – terão a responsabilidade de custear as despesas dos filhos, logo, surge daí a pergunta, se a Previdência Social teria ou não que continuar pagando o salário-família aos dois pais. Vamos ao assunto.


II – Do Salário-Família


A Constituição Federal, no inciso IV, do artigo 201, determina que a previdência social atenderá, nos termos da lei, ao salário-família, sendo que este benefício foi estendido apenas aos trabalhadores empregados e avulsos, nos termos do artigo 7o, incisos XII e XXXIV da CF/88.


O salário-família tem a finalidade de auxiliar os trabalhadores acima na manutenção de sua família, sendo que a Emenda Constitucional de n. 20, de 1998, estipulou que este benefício será devido apenas aos empregados e avulsos de baixa renda.


E por baixa renda, nos termos do artigo 13 da citada Emenda, é considerado o trabalhador que percebe R$.360,00 de remuneração, bruta, ao mês, cujo valor, atualmente, está em R$.676,27. Logo, só terá direito ao salário-família o empregado ou avulso que receba remuneração até este valor, sendo que se receber um centavo a mais, por mês, perderá direito ao benefício, no que tange àquela competência.


Este artigo 13 da Emenda 20/98 cassou direitos adquiridos, violando o artigo 60, § 4o, inciso IV, da CF/88, uma vez que antes da promulgação da Emenda Constitucional não havia limite de vencimentos para percepção do salário-família, logo, o artigo 13 aboliu um direito individual do trabalhador, ao estipular a questão da baixa renda.


Como requisito para recebimento do salário-família, a lei previdenciária estipula que o trabalhador deve apresentar certidão de nascimento do filho ou da documentação relativa ao equiparado, estando condicionado à apresentação anual de atestado de vacinação obrigatória, até 6 anos de idade, e de comprovação semestral de freqüência à escola do filho ou equiparado, a partir dos 7 anos de idade.


O salário-família é um benefício que não requer cumprimento de prazo de carência, como dispõe o artigo 26 da Lei 8.213/91, sendo que, atualmente, o trabalhador que auferir renda de até R$.449,93, receberá o valor mensal de R$.23,08; e para os trabalhadores com rendimento superior a R$.449,94 e inferior ou igual a R$.676,27, a cota será de R$.16,26, na proporção do respectivo número de filhos ou equiparados de qualquer condição, até 14 anos de idade ou inválido.


Este benefício cessará nas seguintes hipóteses:


a) Por morte do filho ou equiparado, a contar do mês seguinte ao do óbito;


b) Quando o filho ou equiparado completar 14 anos de idade, salvo se inválido, a contar do mês seguinte ao da data do aniversário;


c) Pela recuperação da capacidade do filho ou equiparado inválido, a contar do mês seguinte ao da cessação da incapacidade; ou


d) Pelo desemprego do segurado.


E sobre o tema deste artigo, vem o Decreto 3.048/99, no artigo 87, dispor que:


“Tendo havido divórcio, separação judicial ou de fato dos pais, ou em caso de abandono legalmente caracterizado ou perda do pátrio-poder, o salário-família passará a ser pago diretamente àquele a cujo cargo ficar o sustento do menor, ou a outra pessoa, se houver determinação judicial nesse sentido.”


Destarte, se houver separação ou divórcio do casal, o salário-família passará a ser pago diretamente àquele a cujo cargo ficar o sustento do menor (grifo nosso).


III– Da Guarda Compartilhada


O artigo 226, § 5º, da CF/88, determina que “os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher”, sendo que o artigo 5º, inciso I da Carta Magna dispõe que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”.


Partindo deste pressuposto, sobre o poder familiar poderíamos dizer que seria um “conjunto de direitos concedidos ao pai ou à própria mãe, a fim de que, graças a eles, possa melhor desempenhar a sua missão de guardar, defender e educar os filhos, formando-os e robustecendo-os para a sociedade e a vida.”[1]


Nosso Código Civil atual, no artigo 1634, traz as competências que os pais possuem quanto à pessoa dos filhos menores, tais como dirigir-lhes a criação e educação e tê-los em sua companhia e guarda.


A guarda dos filhos então será a condição estipulada pela lei que determine estar aquele sob o poder e em companhia do pai ou da mãe, lembrando sempre que o julgador deve ter em vista o interesse dos menores.


O pai ou a mãe que não permanecer com a guarda do filho poderá, nos termos do artigo 1589 da citada norma civil, visitá-lo e tê-lo em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.


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Tanto que o Código de Processo Civil, em seu artigo 1121, determina que a petição de Divórcio/Separação conterá o acordo relativo à guarda dos filhos menores e ao regime de visitas (inciso II) e o valor da contribuição para criar e educar os filhos (inciso III).


Em nosso país, o modelo adotado pela legislação era, até este ano, a guarda uniparental, isto é, quando apenas um dos pais permanece com a guarda dos filhos. Todavia, por meio da Lei 11.698/08, se normatizou, no Brasil, a guarda compartilhada.


Por meio da lei acima, alterou-se a redação do artigo artigo 1.583 do Código Civil, que ficou assim redigido:


“A guarda será unilateral ou compartilhada.


§ 1o  Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.”


Desse modo, pela guarda compartilhada os pais irão decidir – juntos – a saúde, a educação do filho, como que escola freqüentar, religião, onde passar as férias, sendo que, para Maria Alice Zaratin Lotufo[2], a guarda compartilhada é válida quando, na separação, não existem divergências quanto ao que é bom para os filhos e ambos os genitores têm as mesmas expectativas em relação a eles, possuem os mesmos valores, são diligentes, afetivos e reconhecem que seus filhos, submetidos a essa modalidade de guarda, enfrentariam melhor a situação. Não implica, necessariamente, em duplicidade de domicílios; pode existir a guarda compartilhada e o domicílio ser único, sendo esta, talvez, a melhor forma.


A guarda compartilhada então vem para equilibrar o papel dos genitores, tão desgastados que estão pela guarda uniparental, que quase sempre premiava a mãe com o direito de ficar cuidando – sozinha – dos filhos.   A Lei 11698 entrará em vigor 60 dias após sua publicação, tendo esta ocorrida no último dia 13 de junho, o que tornará aberto o caminho para que os pais tenham os mesmos direitos e obrigações frente aos filhos, cuidando tanto da parte jurídica como física daqueles.


IV– Efeitos da Guarda Compartilhada no Salário-Família


Este é o momento de apreciar a guarda compartilhada e seus efeitos no Direito Previdenciário, principalmente no que tange ao benefício intitulado salário-família.


Foi visto, no item II, que o salário-família é devido aos pais dos filhos que tenham até 14 anos ou inválidos, sendo que os genitores/segurados da previdência social devem perceber remuneração mensal, bruta, de R$.676,27.


Com a separação ou divórcio do casal, a legislação previdenciária dispõe – em regra geral – que o salário-família será devido tão somente ao segurado que ficar com a guarda do menor ou inválido.


Todavia, com a vinda da guarda compartilhada, mudam-se os paradigmas haja vista a previdência social conhecer apenas a guarda uniparental, e não a compartilhada, onde os pais permanecem com as prerrogativas físicas e jurídicas de cuidados com seus filhos, o que torna discutível o artigo 87 do Decreto 3.048/99.


Apenas para relembrar, este artigo 87 prevê que “Tendo havido divórcio, separação judicial ou de fato dos pais, (…) o salário-família passará a ser pago diretamente àquele a cujo cargo ficar o sustento do menor”.


Ora, se o sustento do menor é feito por ambos os pais – na guarda compartilhada – então o salário-família deverá ser pago aos dois segurados da previdência social.


Com isto, estamos colocando em prática o disposto no artigo 193 da Constituição Federal, onde se determina que a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.


Neste sentido, Carlos Maximiliano chama nossa atenção para os Fatores Sociais, pregando que “o julgador hodierno preocupa-se com o bem e o mal resultantes do seu veredictum. Se é certo que o juiz deve buscar o verdadeiro sentido e alcance do texto; todavia este alcance e aquele sentido não podem estar em desacordo com o fim colimado pela legislação – o bem social.     Toda ciência que se limita aos textos de um livro e despreza as realidades é ferida de esterilidade.       Cumpre ao magistrado ter em mira um ideal superior de justiça, condicionado por todos os elementos que informam a vida do homem em comunidade.     Não se pode conceber o Direito a não ser no seu momento dinâmico, isto é, como desdobramento constante da vida dos povos.    A própria evolução desta ciência realiza-se no sentido de fazer prevalecer o interesse coletivo, embora timbre a magistratura em o conciliar com o indivíduo. Até mesmo relativamente ao domínio sobre imóveis a doutrina mudou: hoje o considera fundado mais no interesse social do que no individual; o direito de cada homem é assegurado em proveito comum e condicionado pelo bem de todos.  Eis porque os fatores sociais passaram a ter grande valor para a Hermenêutica, e atende o intérprete hodierno, com especial cuidado, às conseqüências prováveis de uma ou outra exegese.”[3]


V – Considerações Finais


O salário-família, sendo um benefício previdenciário devido aos segurados de baixa renda – trabalhadores empregados e avulsos – tem a finalidade de auxiliar estes no custeio de suas famílias.


Para tanto, a Previdência Social determina o pagamento mensal de R$.23,08 para o segurado que auferir renda de até R$.449,93, sendo que o valor diminuirá para R$.16,26 se o trabalhador perceber um rendimento superior a R$.449,94 e inferior ou igual a R$.676,27, na proporção do respectivo número de filhos ou equiparados de qualquer condição, até 14 anos de idade ou inválido.


Se dois trabalhadores estiverem na situação acima, e forem casados, ambos terão direito ao salário-família. Todavia, a legislação previdenciária dispõe que na separação ou no divórcio, apenas o genitor que ficar com a guarda do filho é que continuará recebendo o salário-família.


Todavia, com a guarda compartilhada esta situação se altera, já que ambos os trabalhadores continuarão cuidando de seus filhos, diferentemente então da guarda uniparental, onde se costuma verificar que a mãe fica com a guarda física do filho, escolhendo a escola a ser freqüentada, o médico, a religião, onde morar, e o pai apenas paga uma pensão alimentícia e visita o filho nos finais-de-semana.


Deste modo, a guarda compartilhada é uma exceção à regra do artigo 87 do Decreto 3.048/99, devendo a Previdência Social continuar pagando o salário-família aos segurados que vierem a se divorciar ou separar.


 
Notas:

[1] PONTES DE MIRANDA, Tratado de Direito Privado. Tomo IX. 4a Ed. São Paulo: RT, 1983. P. 105/106.

[2] In A guarda e o exercício do direito de visita. Artigo publicado na Revista do Advogado, Ano XXVII, Maio de 2007, n. 91, da Associação dos Advogados de São Paulo. P. 98.

[3] Hermenêutica e Aplicação do Direito. Rio de Janeiro, Forense: 1979. P. 158.


Informações Sobre o Autor

Mauricio de Carvalho Salviano

Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP. Advogado. Professor no Curso de Direito do UniToledo/SP. Gestor do Damásio Educacional em Araçatuba/SP


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