Astrientes – Possibilidade de majoração e impossibilidade de minoração ou revogação

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Resumo: As astreintes são impostas como instrumento coercitivo objetivando a celeridade e, destacadamente, a efetividade dos provimentos jurisdicionais. Neste mister, a fixação de seu quantum é de máxima relevância para cumprimento de sua função, a coerção. Portanto, a majoração é perfeitamente cabível, possível e mesmo imperativa na medida em que se faça necessária a implementação da coerção diante da relutância ou inércia do destinatário da multa. Por outro lado, em razão deste mesmo caráter coercitivo, inadmissível é a minoração e principalmente o afastamento integral desta multa, sob pena de torná-la ineficaz na coerção.

Sumário: Introdução. Metodologia. I. Do conceito. II. Da origem. III. Do direito comparado. IV. Da natureza jurídica. V. Da garantia constitucional de acesso à justiça. VI. Do poder-dever de cumprimento das decisões judiciais. VII. Da autotutela como conseqüência do não cumprimento das decisões judiciais. VIII. Do cumprimento das decisões judiciais – o estado democrático de direito e a pax social. IX. Da possibilidade de majoração da multa diária. X. Da impossibilidade de minoração e afastamento da multa diária. XI. Da conclusão. Referências bibliográficas.

“Nenhuma grande descoberta foi feita jamais sem um palpite ousado.” [Isaac Newton]

INTRODUÇÃO

O presente trabalho visa a análise da essência das astreites, sua origem, conceituação, natureza jurídica e verificação de sua eficácia como importante instrumento destinado à concretização e satisfação da pretensão do Jurisdicionado e da prevalência de acesso à justiça, não apenas como garantia de mero ingresso de ação judicial, mas de efetivação tempestiva e oportuna da prestação jurisdicional ofertada.

Propende, também, analisar o caráter coercitivo da multa diária como meio influenciador subjetivo e objetivo para materialização da prestação jurisdicional buscada pelo jurisdicionado e prolatada pelo Judiciário.

Motiva a elaboração do presente trabalho, o não raro descumprimento das decisões judiciais pelo particular destinatário da ordem e pelo próprio Executivo, que detém o poder-dever de dar-lhes efetividade por seus instrumentos, o que alimenta o descrédito para com os Poderes Estatais e culmina na adoção de práticas contemporâneas dos tempos da autotutela.

O estudo do tema caminha para a análise das astreintes não apenas como mero instrumento destinado ao cumprimento isolado de decisão judicial específica, mas como importante aparelho de manutenção do Estado Democrático de Direito através da coerção (subjetivo) e do toque pecuniário (objetivo).

Cabe, neste intróito, tão somente abreviar que o presente trabalho mira lançar de maneira sintética alguns fundamentos, a natureza jurídica, as controvérsias e a casuística sob os quais se consubstancia o instituto das denominadas multas astreintes no Brasil.

O estudo tem sua gênese na verificação de casos concretos, em que a fixação de astreintes alterou o comportamento do particular descumpridor da decisão Judicial; assim como, a suspensão ou afastamento destas implicou no relaxamento do Estado incumbido de cumprir a ordem do Judiciário, como em casos de liminares possessórias.

Em tais casos concretos, verificou-se a sensação de descrédito dos Jurisdicionados em relação ao Estado e a adoção de práticas ilegais particulares para materialização da tutela pretendida.

Concluindo, o trabalho visa evidenciar a proximidade das astreintes do direito Constitucional e seus princípios e, destacadamente, a garantia de acesso à Justiça como poder-dever do Estado Democrático de Direito.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Verificação e análise de casos concretos envoltos em ações judiciais em curso e encerradas, com transito em julgado, em que tenha havido incidência descumprimento de decisões judiciais.

Estudo de dados sobre numero de ações iniciais; relatório de despachos e sentenças de Tribunais Estaduais e Superiores.

Pesquisa de repositório jurisprudencial.

Pesquisa de campo sobre incidentes ocasionados pelo descumprimento de ordens judiciais.

I DO CONCEITO:

Conforme escólio de De Plácido e Silva (Silva, De Plácido e. Vocabulário Jurídico Vol. III, p.218), a origem do termo multa vem do latim ‘mulcta’ ou ‘multa’ e, no seu sentido originário, significa multiplicação, aumento, implicando uma pena pecuniária. Pode ser vista como uma sanção imposta por infringência à regra ou ao princípio de lei ou ao contrato em virtude do qual fica obrigado a pagar uma certa importância em dinheiro ou cumprir obrigação positiva ou negativa.

Na lição de Orlando Gomes, as astreintes “consiste numa condenação acessória, na qual o juiz fixa determinada multa que o executado deve pagar por dia de atraso no atendimento da condenação principal.” (Obrigações, 9ª ed. Rio de janeiro: Forense, p. 183, 1994).

II DA ORIGEM:

O instituto em comente tem sua origem na jurisprudência do direito francês, cuja motivação para sua criação pelos pretórios francos, nos primórdios do século XIX, deu-se com base na mesma razão lógica que foi introduzida no direito pátrio: meio de constrangimento indireto.

Após um século de vida jurisprudencial não pouco atribulada, em 5 de julho de 1972 as astreintes foram legalizadas no direito francês[1].

III DO DIREITO COMPARADO:

As astreintes difundiram-se no direito comparado. Além da França, a Itália e a Alemanha são exemplos representativos bem sucedidos de aplicação deste mecanismo.

No Brasil tem sua importância já reconhecida e a de aplicação consolidada.

EDUARDO TALAMINI, em sua prestigiada obra “Tutela Relativa aos Direitos de Fazer e Não Fazer” (RT – 2001, p. 257-258), discorre no tópico “9.9 Beneficiário do crédito da multa – Exame crítico do mecanismo”:

 “No processo coletivo, o crédito derivado da multa destina-se aos ´fundos´ de que tratam o art. 13 da Lei 7.347/85 (v. dec. 1.306/94, art. 2º) e o art. 214 da Lei 8.069/90.

No processo de caráter individual, a multa reverte em benefício do autor da demanda. Trata-se de entendimento asserte, e que vem de antes da reforma de 1994, conquanto não exista, no art. 461, nem nas outras regras que versam sobre multa processual, indicação expressa e inequívoca nesse sentido. Supõe-se que tal orientação tenha prevalecido por direta influência do direito francês e do “Projeto Carnelutti” (art. 667 e 668) de reforma do processo civil italiano (itens 2.1.4 e 2.1.5). Por certo, também contribuíram para tanto os antecedentes luso-brasileiros da multa – a “pena” do título 70 do livro IV das Ordenações Filipinas e a “cominação pecuniária” do art. 1.005 do Código de 1939, cuja natureza indenizatória ou coercitiva era controvertida (v. itens 3.1 e 3.4).

Com efeito, tal destinação é mais fácil de ser compreendida – ao menos historicamente – em um sistema como o francês, em que as astreintes foram jurisprudencialmente desenvolvidas a partir do instituto da indenização. Já nos ordenamentos em que a multa foi desde o início concebida com a clara feição de instrumento executivo, sem caráter indenizatório, parece natural que o Estado ou um fundo público embolse-a. É o que ocorre no direito processual alemão e no anglo-saxônico.”

IV DA NATUREZA JURÍDICA:

As astreintes detêm natureza jurídica coercitiva.

Segundo escólio de DIDIER[2]:

“3.6. A multa coercitiva

3.6.1. Natureza jurídica e valor da multa

A multa é uma medida coercitiva que pode ser imposta no intuito de compelir alguém ao cumprimento de uma prestação. Trata-se de técnica de coerção indireta em tudo semelhante às astreites do direito francês. Por ser uma medida corcitiva indireta, a multa está relacionada com as decisões mandamentais. Ela é, talvez, a principal, porque mais difundida, medida de coerção indireta, mas não é a única.”

Nesse sentido, é o entendimento do STJ:

“As astreintes são importante meio de coação e não, pena, sendo cabível, portanto, a imposição de multa por descumprimento de decisão judicial que determina a exclusão do nome do devedor de cadastro de proteção ao crédito. (STJ – AGRESP 200400745782 – (663157 RS) – 4ª T. – Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa – DJU 02.10.2006 – p. 283)”

Brilhante o escólio de Carlos Eduardo de Castro Palermo, in AGILIZAÇÃO E EFETIVIDADE DO PROCESSO – LINHAS GERAIS DA TUTELA ANTECIPADA E DA TUTELA INIBITÓRIA, publicada no Juris Síntese n.º 57, JAN/FEV de 2006:

A multa é de natureza puramente coercitiva, utilizando-se o termo “astreintes” para denominar a multa diária capitulada no § 4º do art. 461 do CPC, a qual é uma faculdade atribuída ao juiz, independentemente do pedido do autor, ou seja, ex officio, resultado da preocupação do legislador em garantir a efetividade da tutela específica e do comando judicial emergente da liminar ou sentença.”

V DA GARANTIA CONSTITUCIONAL DE ACESSO À JUSTIÇA:

O enfoque da garantia de acesso à Justiça, aqui se reporta não ao mero ingresso do pleito presente nas ações judiciais, mas o acesso ao provimento jurisdicional pretendido.

Não há acesso à Justiça sem a materialização do contexto pedido e acolhido no pronunciamento do Judiciário.

O ideal de efetividade do processo já era defendido, muito antes das últimas reformas do processo civil brasileiro, por Chiovenda, o qual, segundo Humberto Theodoro Júnior[3]: “[…] já preconizava que o ideal do processo deveria ser dar a quem tem direito, quanto possível, e de forma prática, tudo aquilo e exatamente aquilo que tivesse direito, segundo a obrigação do devedor.”

Carlos Alberto Alvaro de Oliveira[4], incansável defensor da efetividade no processo de conhecimento, bem assevera que só há direito quando este se efetiva:

“Já o havia assinalado Rudolf von Jhering na grande obra que é o Espírito do Direito Romano (cito da 5. ed. alemã, de 1898, a 1.ed. data de 1858) –‘O direito existe para se realizar. A realização é a vida e a verdade do direito, é o próprio direito. O que não se traduz em realidade, o que está apenas na lei, apenas no papel, é um direito meramente aparente, nada ais do que palavras vazias.

Pelo contrário, o que se realiza como direito é o direito, mesmo quando não se encontre na lei e ainda que o povo e a ciência dele não tenham tomado consciência’. – Assim é porque, sobretudo o direito como entidade prática, a determinação da “essência” não comprova a ‘existência’: o direito não é o direito sem se manifestar na prática e como prática.”

Cumpre trazer a explanação de BARBOSA MOREIRA[5], nosso maior processualista da atualidade, que assim diz:

“Dir-se-á, então, que o processo funciona tanto melhor quanto mais se aproximar seu resultado prático daquele a que levaria a atuação espontânea do direito”.

O movimento de reforma processual pela efetividade das decisões judiciais visa também garantir a credibilidade do Poder Judiciário, afastando a delonga na prestação da tutela jurisdicional e rechaçando severamente o desrespeito das partes em cumprir os provimentos judiciais.

Luiz Guilherme Marinoni[6], nos ensina que o direito a uma tutela jurisdicional efetiva é um direito fundamental previsto na Carta Magna de 1988:

“O art. 5o, XXXV, da Constituição Federal, afirma que ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’. Entende-se que essa norma garante a todos o direito a uma prestação jurisdicional efetiva. A sua importância, dentro da estrutura do Estado Democrático de Direito, é de fácil assimilação. É sabido que o Estado, após proibir a autotutela, assumiu o monopólio da jurisdição. Como contrapartida dessa proibição, conferiu aos particulares o direito de ação, até bem pouco tempo compreendido como direito à solução do mérito. A concepção de direito de ação como direito a sentença de mérito não poderia ter vida muito longa, uma vez que o julgamento do mérito somente tem importância – como deveria ser óbvio – se o direito material envolvido no litígio for realizado – além de reconhecido pelo Estado-Juiz. Nesse sentido, o direito à sentença deve ser visto como direito ao provimento e aos meios executivos capazes de dar efetividade ao direito substancial, o que significa direito à efetividade em sentido estrito.”

A multa diária NÃO É PENA, e nem possui tal natureza, mas é instrumento que somente incidirá caso haja descumprimento de uma Decisão Judicial.

O Poder Judiciário pode e deve fixar medidas que assegurem o cumprimento de suas decisões, sem que isso signifique penalização.

A fixação de multa diária é, portanto, uma faculdade reservada ao juízo de forma a garantir a efetividade de uma liminar ou sentença.

VI DO PODER-DEVER DE CUMPRIMENTO DAS DECISÕES JUDICIAIS:

O descumprimento das decisões judiciais é imposição conseqüente do Estado Democrático de Direito, e destinada tanto ao administrado quanto à própria administração.

Em inúmeras ocasiões, vê-se a ocorrência de conflitos motivados pelo fato do Executivo não cumprir os éditos do Judiciário.

E nesta seara, também atua com grande eficácia a fixação da multa ora em destaque.

VII DA AUTOTUTELA COMO CONSEQUÊNCIA DO NÃO CUMPRIMENTO DAS DECISÕES JUDICIAIS:

A credibilidade do Estado Democrático de Direito é fruto do ciclo que se inicia com a lide; adentra o poder Judiciário (Estado) na busca de pronunciamento solucionador da pretensão resistida; conclui-se pelo pronunciamento que há de ser materizado e por fim ao embate sobre o bem da vida buscado pelo(s) jurisdicionado(s).

Não concretizado pronunciamento do Judiciário, há o abandono das instituições pelos administrados, que por sua conta pratica barbáries de próprio punho, atentatórias não só à dignidade, mas contra próprios ser humano.

Desta forma, a autotutela só se manifesta no meio social se não resolvida e materializada a lide levada ao Estado (Judiciário), e aqui adentram astreintes como importante instrumento de coerção destinado a dar eficácia aos decretos do Poder Judiciário.

VIII DO CUMPRIMENTO DAS DECISÕES JUDICIAIS – O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO E A PAX SOCIAL:

A premissa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste em superar as desigualdades sociais e regionais e instaurar um regime democrático que realiza a justiça social com a participação popular.

O caráter coercitivo das astreintes tem o condão-mor de garantia de eficácia do provimento buscado pelo administrado e, por conseqüência, fazer valer o poder-dever que é reservado exclusivamente ao Estado de dizer o direito e fazer cumprir seus Éditos.

A prevalência desta sistemática iniciada com o pleito apresentado pelo jurisdicionado e encerrado com a satisfação da tutela pretendida, é a máxima que preserva a vitalidade do Estado Democrático de Direito.

Na obra A DITADURA MILITAR, OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E O JUDICIÁRIO BRASILEIRO, da jurista Liza Bastos Duarte, publicada no Juris Síntese nº 49, de SET/OUT de 2004, esta sssim escreve:

“A configuração do Estado Democrático de Direito não significa apenas unir formalmente os conceitos de Estado Democrático e Estado de Direito, consiste, na adesão de ambos os conceitos e renomeando-os a um novo conceito que incorpore um componente revolucionário de transformação do status quo. Inova, então a Constituição de 1988, quando afirma que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito, pois em sua assertiva, ao nosso ver, existe uma ousada proposta de um estado que irradie os valores da democracia sobre todos os seus elementos constitutivos, em especial sobre a ordem jurídica.

Se a legalidade é princípio basilar do Estado Democrático de Direito, deve a mesma subordinar-se à Constituição. O Estado Democrático de Direito vive sob o império da lei, entretanto, a lei por si só é letra fria, desanimada de sua autoria humana e de seus ideais igualitários e de justiça. Interpreta-la descontextualizada das contingências humanas e sociais seria decepar-lhe sua finalidade precípua: buscar da igualização das condições dos socialmente desiguais. Deve, pois, ser destacada a relevância da lei no Estado Democrático de Direito, não apenas quanto ao seu conceito formal de ato jurídico abstrato, geral, obrigatório e modificativo da ordem jurídica existente, mas também à sua função de regulamentação fundamental, produzida segundo um procedimento constitucional qualificado que não dispense sua real adequação ao contexto da sociedade e na realização de seus interesses, objetivos que podem ser factíveis somente através do judiciário.”

Faz-se oportuno o excelente o escólio de LUIZ RODRIGUES WAMBIER[7], que assim ensina:

Garantir a efetividade de suas decisões é a contrapartida que o Estado tem que dar à proibição da autotutela.”

Somente, portanto, a harmonização entre os poderes “dizendo o direito” e satisfazendo a pretensão submetida faz valer o império do Estado Democrático de Direito, calcado na dignidade da pessoa humana, conforme consolidado na Constituição vigente.

IX DA POSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO DA MULTA DIÁRIA:

A função das astreintes é vencer a obstinação do destinatário ao cumprimento da obrigação e incide a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância.

Assim, em face do caráter coercitivo, as astreintes podem ser majoradas após arbitramento. Isto em caso de se verificar a inércia do destinatário da multa que demonstra desinteresse em cumprir a ordem emanada.

Sobre a majoração deste instituto, colacionamos importante decisão do Tribunal de Justiça do Espírito Santo:

 “Mostrando-se insuficiente a multa cominada, agiu corretamente o MM. Juiz de primeiro grau ao agravar a penalidade imposta, como meio de inibir o descumprimento do comando judicial, considerando até mesmo a notória capacidade econômica das agravantes recalcitrantes, buscando assim garantir a efetividade da tutela jurisdicional. 5. Ademais, cumprida efetivamente a ordem judicial, como se deve sempre esperar, o aumento do valor da multa não acarretará qualquer ônus para as agravantes. 6. Recurso parcialmente conhecido e desprovido. (TJES – AG 024059006395 – 4ª C.Cív. – Relª Desª Catharina Maria Novaes Barcellos – J. 01.11.2005)”

X DA IMPOSSIBILIDADE DE MINORAÇÃO E AFASTAMENTO DA MULTA DIÁRIA:

Se admitida a minoração ou o afastamento da multa, certamente o caráter coercitivo do instituto perda a eficácia.

Sendo sabedor de que pode minorar o quantum ou afastar integralmente as astreintes, o destinatário recalcitrante nenhuma preocupação esboçara em dar eficácia á decisão contra si exarada.

Desta forma, afastar a rigidez e inflexão da dita multa é dizer não ao seu fim-máximo: a coerção.

Nem mesmo o bem da vida (objeto) envolto na lide impõe limites ao quantum de multa.

Calha à ocasião o escólio de ALEXANDRE FREITAS CÂMARA[8], assim redigido:

 “As astreintes, como visto, não têm natureza convencional nem se prestam a prefixar perdas e danos, não se confundindo com estas. Em razão dessa distinção, não se pode querer aplicar às astreintes o disposto no art. 412 do Código Civil de 2002, que limita o valor da cláusula penal, estabelecendo que esta não pode exceder o valor da obrigação principal.

As astreintes não estão limitadas pelo valor da obrigação, cujo cumprimento se destinam a permitir obter. Podem ultrapassar este valo superando-o.”

A coerção objetivada pela multa em testilha objetiva o cumprimento da prestação jurisdicional (definitiva ou não), mas também visa, destacadamente, a própria preservação da credibilidade do Judiciário a das Leis Processuais que regulam nosso Ordenamento, viabilizando a estabilidade do sistema e a eficácia das decisões exaradas.

WAMBIER sintetiza que:

“A multa diária é típico mecanismo de preservação da autoridade do juiz. É medida processual, de caráter público. Isso ficou mais claro com as alterações introduzidas no Código de Processo Civil pelas Leis 8.952/94 e 8.953/94.”

Destarte, seria ilógico coagir o destinatário com uns instrumentos falível.

XI DA CONCLUSÃO:

No referente às multas astreintes como meio de coerção, podemos, sinteticamente, fazer as seguintes considerações:

Sempre que “suficiente e compatível com a obrigação” deverá o juiz aplicá-la (CPC, Art. 461, § 4º);

Não depende de requerimento da parte para aplicá-la;

Deve o juiz sempre fixar “prazo razoável para cumprimento da obrigação”, somente após isto estará o devedor sujeito à pena cominada;

A multa pode ser aplicada tanto em medida de antecipação de tutela como pela sentença final de mérito;

A multa uma vez fixada não se torna imutável, podendo o juiz mantê-la sempre dentro de parâmetros de compatibilidade. Sua revisão pode ocorrer mesmo em sede de execução, pois ela não integra o mérito da sentença, mas simples medida executiva indireta que não se recobre do manto da ‘res judicata’;

Exigibilidade da multa: se sua imposição se der na sentença, sua exigência dar-se-á na execução do mesmo julgado. Dependerá, no entanto, de liquidação, estabelecendo-se o inadimplemento com respectivos valores de duração, aperfeiçoando-se o título executivo judicial (liquidez, certeza e exigibilidade).

No que se refere à sua essência coercitiva, as astreintes possuem a finalidade precípua de impor a máxima satisfação do objeto da vida buscado pelo jurisdicionado, e assim manter a credibilidade do Poder Judiciário, e por conseguinte do Estado Democrático de Direito, tornando despicienda a adoção de praticas particulares remotas aos tempos da autotuela.

 

Referências bibliográficas:
Código Civil/1916.
Código Civil/2002.
Código de Defesa do Consumidor.
Código de Processo Civil.
AMARAL, Guilherme Rizzo, in As Astreintes e o Processo Civil Brasileiro, Livraria do Advogado.
DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros.
MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela específica. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A tutela específica do credor nas obrigações negativas. In TEMAS de direito processual, Saraiva.
WATANABE, Kazuo et al. Código brasileiro de defesa do consumidor. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária.
JORGE, Flávio Cheim; RODRIGUES, Marcelo Abelha. Tutela específica do art. 461 do CPC e o processo de execução.
ARAÚJO CINTRA, Antônio Carlos de; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros.
WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil, Vol. 03, 8ª Edição, RT, 2007.
NERY JR, Nelson; Nery, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante – 10ª Edição 2007.
MARCATO, Antonio Carlos. Código de Processo Civil Interpretado, 2ª Ed. 2005. ATLAS.
DIDIER, Fredie Junior, in Curso de Direito Processual Civil, Editora JusPodivm, Vol. 2, 2007, pg. 349
Notas:
[1] MULTA PROCESSUAL DO CPC, 461, § 4º SUA ORIGEM, SEU ESCOPO E SEU BENEFICIÁRIO, de Leandro Vieira, colhida do site: http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=1725
[2] DIDIER, Fredie Junior, in Curso de Direito Processual Civil, Editora JusPodivm, Vol. 2, 2007, pg. 349
[3] THEODORO JÚNIOR, Humberto. Tutela específica das obrigações de fazer e não fazer. Jus Navigandi, Teresina, v. 6, n. 56, abr. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2904>. Acesso em: 13 maio 2004.
[4] OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro. Efetividade e processo de conhecimento. Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Porto Alegre, v. 16, p. 7-19, 1999, p. 7
[5] BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Temas de direito processual civil: 6ª. Série. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 215.
[6] MARINONI, Luiz Guilherme. O direito à tutela jurisdicional efetiva na perspectiva da teoria dos direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, v. 8, n. 378, 20 jul. 2004. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=5281>.
[7] Curso Avançado de Processo Civil, Vol. 01, 9ª Edição, RT-2007, pág. 321.
[8] Câmara, Alexandre Fritas, in Lições de Direito Processual Civil, 7ª Ed., Editora Lumen-Juris, 262.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Marcones José Santos da Silva

 

Advogado. Formado em direito pela UFPA. Especialista em Direito Processual Civil pela UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA – UNISUL

 


 

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