Resumo: A execução fiscal no Brasil ocorre em sua integralidade pela via judicial o que a torna morosa e ineficaz pelo excesso de formalismo exigido no processo judicial. É através dos tributos que o Estado brasileiro gera receita para fazer jus as demandas sociais por um país pobre e com profunda desigualdade financeiro-social. A ineficiência na cobrança dos tributos gera uma sobrecarga nos que não possuem meios de arcar com os custos de até dezesseis anos de uma demanda judicial. A execução fiscal administrativa mostra-se com meio célere, dinâmico e de baixo custo para a cobrança dos débitos fiscais.
Palavras-chaves: tributação, dívida ativa, execução fiscal.
Abstract: Tax execution in Brazil occurs in its entirety via the judicial process, which makes it more cumbersome and inefficient due to the excess of formalism required in the judicial process. It is one of the countries that are the Brazilian state to receive requests for applications as demands by a poor country and deep financial-social inequality. An inefficiency in the collection of taxes, an overload in those that is not a means of custody of a delay. The administrative fiscal execution shows up at midday, dynamic and low cost for collection of tax debts.
Keywords: Taxation. Active Debt. Tax Execution.
Sumário: Introdução. 1. A Tributação No Brasil. 2. O Processo Tributário. 3. Execução Fiscal Administrativa. Conclusão. Referência.
INTRODUÇÃO
Atualmente a execução fiscal no Brasil é regulada pela Lei 6.830/80 e realizada inteiramente pela via judicial. Ocorre que nos últimos anos há uma crescente dúvida quanto à eficiência do atual modelo. A execução fiscal administrativa, de acordo com o Projeto de Lei PL 2412/2007, se prestaria a desafogar o já tão congestionado Poder Judiciário, daria mais celeridade aos atos de execução e eficiência a cobrança do débito fiscal.
Os argumentos para a elaboração do projeto de lei basearam-se em uma execução fiscal eficiente e eficaz combinada com uma prestação jurisdicional célere sem deixar de observar as garantias dos executados. Orientou-se, ainda, pela elaboração de um procedimento que propicie a conexão da fase administrativa de cobrança do crédito com fase judicial, ficando ao Poder Judiciário reservado o julgamento das demandas que possuam caráter patrimonial não elididas administrativamente.
1. A TRIBUTAÇÃO NO BRASIL
Segundo a Teoria do Contrato Social o homem, necessitando viver em sociedade, entrega todos seus direitos individuais à uma certa pessoa, o soberano, como se este fosse um administrador geral de todos os problemas.
De acordo com Rousseau na sociedade contratualista cada um dando-se a todos não se dá a ninguém e com a junção do esforço conjunto haver mais força para conservar o que se tem. Consequentemente, apenas numa sociedade que não aliena ninguém e vive sob o princípio da igualdade de seus membros, dando total liberdade para cada um, não tem necessidade de ser imposta a vontade alheia.
A autodeterminação de cada indivíduo, que livremente adere à sociedade contratualista, resulta em sujeitos livres que aliam-se a outros sujeitos igualmente livres, por vontade geral, criando um corpo social organizado.
A partir daí surgiu a noção moderna de Estado, tendo como função típica a organização social e prestação de serviços essências a todos. Tais serviços geram despesas e a solução encontrada para atender a tais despesas foi o tributo.
Historicamente o termo tributo tem como definição prestação pecuniária ou bens, arrecadados pelo Estado com a finalidade de atender as despesas estatais. Modernamente, com o império do Estado Democrático de Direito, o tributo decorre de lei e é paga pelo cidadão para colaborar com o custeio das despesas coletivas.
Segundo Luciano Amaro:
“Tributar (de tribuere, dividir por tribos, repartir, distribuir, atribuir) mantém ainda hoje o sentido designativo da ação estatal: o Estado tributa. O tributo (tributum) seria o resultado dessa ação estatal, indicando o ônus distribuído entre os súditos. Como súdito paga o tributo para o Estado, o verbo passou a designar também a ação de pagar tributo, dizendo-se tributário, contributário ou contribuinte aquele que paga o tributo ou que ‘contribuiu”. (AMARO, 2003, apud, SANTOS, 2006, p. 22.)
O conceito de tributo foi introduzido no sistema tributário nacional no Código Tributário Nacional (CTN) em seu artigo 3º, nos seguintes termos: “tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada”
Ser uma ‘prestação pecuniária compulsória’ significa que ocorrendo a hipótese tributaria haverá a obrigação do individuo de fazer o pagamento do tributo ao Estado. A compulsoriedade permite que o Estado exija o pagamento podendo se utilizar dos meios legais para a satisfação de seu crédito.
O pagamento ‘em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir’ ratifica o fato do tributo ser uma prestação pecuniária que deva corresponder a uma prestação em dinheiro expressa em moeda corrente, sendo vedado seu pagamento in natura ou in labore. De acordo com o CTN o tributo pode ser pago em cheque ou vale postal ou em casos previstos em lei em estampilha, em papel selado ou processo mecânico.
Só será receita tributaria a que advir de ato lícito decorrente de hipótese prevista em lei. Segundo Santos (2006, p.25) o legislador diferenciou hipótese tributaria de hipótese tributaria sancionatória sendo a primeira decorrente de ato licito e a segunda de ato ilícito distingundo-os o fato jurídico que lhe deu origem.
A instituição em lei do tributo é decorrente do princípio da legalidade que veda os entes da federação brasileira exigir ou aumentar tributos sem lei que o estabeleça, como regra.
O artigo 142 do CTN estabelece que
Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
A cobrança tributária vincula e obriga o servidor que poderá ser responsável pelo não lançamento do tributo. Ressalta-se que o fato de pessoas de direito privado poderem arrecadar tributos não retira seu caráter vinculatório.
Segundo o CTN e a Constituição Federal de 1988 (CF/88) são tributos: os impostos cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte; as taxas que têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição; as contribuições de melhorias instituídas para fazer face ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária, tendo como limite total a despesa realizada e como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado; os empréstimos compulsórios que tem o escopo de atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência e investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional; e as contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesses de categorias profissionais que funcionarão como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas.
No Brasil o poder de tributar é dividido entre os entes da federação em face do princípio do federalismo, devendo cada ente limitar-se a sua parcela de competência. A CF/88 dá aos entes a competência para legislar em matéria tributária sendo essa competência indelegável, intransferível e irrenunciável.
Não se deve confundir a competência com capacidade tributária, está sendo a delegação da função de arrecadar ou fiscalizar a outra pessoa de direito público. A competência tributária classifica-se em privativa, comum, residual e extraordinária.
A competência privativa é o poder que tem todos os entes da federação para instituir os impostos elencados na Constituição Federal. É privativa, pois a Constituição enumera taxativamente os tributos que podem ser cobrados por cada ente.
Ressalta-se que o empréstimo compulsório e as contribuições especiais encontram-se na competência privativa da União, as contribuições sociais para o custeio da previdência e assistência social de seus próprios servidores faz parte da competência privativa dos estados e por fim a contribuição de iluminação pública é de competência privativa dos municípios.
A competência comum é o poder que tem a União, os estados, o DF e os municípios para instituir taxas e contribuições de melhoria no âmbito de suas respectivas atribuições. Aqui se insere a competência cumulativa que é o poder da União de instituir, nos territórios federais os impostos estaduais e caso o território não seja dividido em municípios os impostos municipais. Ao Distrito Federal cabe cumulativamente os impostos municipais e estaduais.
De acordo com o artigo 154, I, da CF a União poderá instituir mediante lei complementar, impostos não previstos em sua competência privativa, desde que sejam não-cumulativos e não tenham fato gerador ou base de cálculos próprios dos já discriminados na própria Constituição Federal. Ademais o artigo 195, § 4º autoriza que lei possa instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I. Chama-se essa competência de residual.
A competência extraordinária encontra-se no artigo 154, II, da CF e segundo ela a União poderá instituir na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.
Essa competência independe de outros impostos terem ou não fatos geradores já previstos na CF/88, sejam eles da própria União, dos estados ou municípios. Segundo alguns doutrinadores essa seria uma exceção a bitributação que é vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Por fim, cabe mencionar que a competência tributária outorgada pela Constituição Federal é uma faculdade para os entes federativos, não sendo seu exercício obrigatório e de acordo com o artigo 8º do CTN “O não-exercício da competência tributária não a defere a pessoa jurídica de direito público diversa daquela a que a Constituição a tenha atribuído.”
Para que haja obrigação do cidadão de pagar o tributo, deve existir uma relação jurídica tributária entre ele e o Fisco. Essa relação une o sujeito ativo, a Fazenda Pública, ao sujeito passivo podendo ser o contribuinte ou o responsável tributário, em torno de uma obrigação pecuniária, a obrigação principal ou uma obrigação não pecuniária representada pela obrigação acessória tributária.
Segundo Torres
“Na relação jurídica tributária podem-se distinguir os seus aspectos substantivos (materiais) e administrativos (formais), o que constitui projeção da distinção entre o Direito Tributário Material e o Direito Tributário Formal. A relação jurídica tributaria material compreende os vínculos surgidos das leis que dispõe sobre os tributos. A relação formal abrange os vínculos decorrentes da lei sobre os deveres instrumentais e os procedimentos administrativos necessários a exigência do tributo […].”(TORRES, 2006, p.232)
São inúmeras as relações jurídicas tributárias já que um mesmo contribuinte poderá ser sujeito passivo em face da União, estados e municípios. Esse mesmo contribuinte poder ser devedor de várias espécies tributarias simultaneamente.
2 O PROCESSO TRIBUTÁRIO
O processo tributário brasileiro dar-se pelas vias administrativa e judicial. O processo administrativo tributário regula a prática dos atos da administração e do contribuinte no que se pode chamar de acertamento da relação tributária revisando o lançamento. Classifica-se em: impugnação de lançamento, restituição de tributo e consulta.
Na impugnação de lançamento o contribuinte impugna, no prazo de 30 dias, o auto de infração ou o lançamento, instalando-se o contencioso administrativo.
Na restituição cada tributo estabelece seu sistema em sua legislação.
A consulta é a formulação sobre a legislação tributária aplicável a determinado fato seguindo o rito do contraditório.
São diversos os processos tributários judiciais podendo ter natureza declaratória, constitutiva negativa ou mandamental. No Brasil prevalece o sistema de dualidade de jurisdições, ou seja, os tributos federais são julgados pela Justiça Federal e os tributos estaduais e municipais pela Justiça Estadual.
A Ação Declaratória é proposta pelo contribuinte visando à declaração de existência ou inexistência do crédito tributário e segue o rito ordinário.
A Ação Anulatória de Débito Fiscal visa a anulação de lançamento tributário e adota, igualmente a Ação Declaratória, o rito ordinário.
Na Ação de Consignação em Pagamento de Débito Fiscal o sujeito passivo consigna judicialmente a importância do credito fiscal nos casos de recusa de recebimento, ou subordinação deste ao pagamento de outro tributo ou de penalidade, ou ao cumprimento de obrigação acessória, de subordinação do recebimento ao cumprimento de exigências administrativas sem fundamento legal e de exigência, por mais de uma pessoa jurídica de direito público, de tributo idêntico sobre um mesmo fato gerador.
Conforme Torres (2006, p. 352) a execução fiscal desde a época do Império possui legislação especial vigorando por mais de 30 anos o Decreto-lei número 960, de 1938. Com a entrada em vigor do Código de Processo Civil este passou a regular a execução fiscal até 1980 com o advento do atual sistema de execução fiscal regulado pela Lei 6830/80.
De acordo com o artigo 201, do CTN, constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular.
A execução fiscal é ajuizada com base na certidão extraída dos livros de inscrição da dívida ativa. A dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova pré-constituída sendo a presunção relativa que pode ser ilidida por prova inequívoca, a cargo do sujeito passivo ou do terceiro a que aproveite.
A execução fiscal se desenvolve com o despacho do juiz que determina, inicialmente, a citação, a penhora se não for paga a dívida, nem garantida a execução, por meio de depósito ou fiança, arresto, se o executado não tiver domicílio ou dele se ocultar, registro da penhora ou do arresto e avaliação dos bens penhorados ou arrestados.
De acordo com a Lei de Execuções Fiscais (LEF) a citação será para que no prazo de cinco dias, o executado pague a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, ou garantir a execução.
De regra, a citação será feita pelo correio, com aviso de recepção. A citação pelo correio considera-se feita na data da entrega da carta no endereço do executado, ou, se a data for omitida, no aviso de recepção, dez dias após a entrega da carta à agência postal. Se o aviso de recepção não retornar no prazo de quinze dias da entrega da carta à agência postal, a citação será feita por Oficial de Justiça ou por edital.
A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem: dinheiro, título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa, pedras e metais preciosos, imóveis, navios e aeronaves, veículos, móveis ou semoventes e direitos e ações.
Poderá o devedor oferecer embargos no prazo de trinta dias quando irá formar-se um juízo cognitivo. O executado deverá garantir a execução com depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure atualização monetária, fiança bancária, nomeando bens à penhora ou indicando à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda Pública.
Não são admissíveis embargos do executado antes de garantida a execução. Nos embargos o executado deverá alegar toda matéria útil à defesa, requerer provas e juntar aos autos os documentos e rol de testemunhas.
A reconvenção, a compensação, e as exceções, não são cabíveis, salvo as de suspeição, incompetência e impedimentos, serão argüidas como matéria preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos.
Recebidos os embargos, o Juiz mandará intimar a Fazenda, para impugná-los no prazo de trinta dias, designando, em seguida, audiência de instrução e julgamento.
Caso o executado não ofereça embargos ou estes sejam rejeitados, se inicia a fase expropriatória com o leilão dos bens penhorados ou com sua adjudicação pela Fazenda Pública.
Nessa fase o juiz designará dia e hora para o leilão do bem penhorado através do edital de leilão e intimação. Se o bem não alcançar lance igual ou superior a avaliação será arrematado por quem oferecer quantia não inferior a 60% dessa avaliação em segundo leilão.
A Fazenda Pública poderá adjudicar os bens penhorados antes do leilão, pelo preço da avaliação ou depois do leilão, se não houver licitante, pelo preço da avaliação ou havendo licitantes, com preferência, em igualdade de condições com a melhor oferta.
Ressalta-se que, segundo pesquisa feita no ano de 2007 pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, do início do processo administrativo até o fim da execução fiscal leva-se em média 16 anos dividindo-se esse período em quatro anos e três meses na fase administrativa, sete anos no curso da execução fiscal, cinco anos discutindo os embargos a execução, verificando-se, no modelo atual, a existência de pelo menos três possibilidades de discussão do mesmo débito fiscal.
3 EXECUÇÃO FISCAL ADMINISTRATIVA
Em quatro de abril de 2008 o Procurador-Geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Lucena Adams, apresentou a proposta do novo projeto de Execução Fiscal Administrativa ao Conselho Federal de Justiça. A proposta de Projeto de Lei foi então elaborada, num consenso entre a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e os Juízes Federais.
O projeto de lei propõe a transferência para os órgãos da Fazenda Pública o encargo pela notificação, identificação do patrimônio penhorável do devedor e bloqueio temporário do bem, para assegurar sua posterior penhora na fase judicial, passando essas atividades a ter caráter administrativo tornando o processo mais rápido e eficaz.
O projeto prevê, em seu artigo 4º, a criação do Sistema Nacional de Informações Patrimoniais dos Contribuintes que será gerenciado pela Receita Federal do Brasil. Tal cadastro será o instrumento utilizado para verificar a situação patrimonial dos contribuintes, seja de bens móveis ou imóveis registrados pela União, Estados ou Municípios.
O desejo de trazer a penhora administrativa para o âmbito da execução fiscal é antigo. Em 1999 o Senador Lúcio Alcântara apresentou os projetos de lei nº. 174/96 e nº. 608/99. O Senador Pedro Simon e o Deputado Celso Russomanno também apresentaram projetos que nunca prosperaram.
Segundo Prudente a execução fiscal administrativa é juridicamente possível ante aos atributos dos atos administrativos, que segundo a melhor doutrina, se revestem da presunção de legitimidade, em face do princípio da legalidade ao qual se subordina a Administração Pública.[1]
Há, ainda, a imperatividade e a auto-executoriedade consistente na possibilidade desses atos serem imediata e diretamente executados pela própria Administração de forma coercitiva, atendendo ao princípio da supremacia do interesse público, sem que, contudo, haja afronta ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, imposto no artigo 5º, inciso XXXV, da CF.
Ainda de acordo com Prudente, a execução do crédito da Fazenda Pública pela via administrativa, não dispensa a observância dos princípios informativos do direito público e processual civil, tais como os da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência dos atos administrativos em consonância com os princípios processuais da boa-fé e da lealdade, do interesse do credor, da economia processual, da responsabilidade patrimonial do devedor, da menor onerosidade da execução, do contraditório, dentre outros, garantidos constitucionalmente pelo devido processo legal.
De acordo com o projeto de lei a Dívida Ativa da União será apurada e inscrita pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, a das Autarquias e Fundações públicas federais será apurada e inscrita pela Procuradoria-Geral Federal. Aqui já se observa uma primeira mudança, visto que de acordo com a LEF, não há diferença entre os créditos da União e da Administração Indireta.
O procedimento inicia-se com o Termo de Inscrição de Dívida Ativa que deverá conter, dentre outras informações, o nome e o número de inscrição perante o CPF e o CNPJ, se houver, do devedor, dos co-responsáveis e, sempre que conhecido, o domicílio ou residência de um e de outros; o valor originário de cada uma das parcelas componentes da dívida principal, individualizando-se as que sejam destinadas a terceiras entidades, o termo inicial e a forma de calcular os juros de mora, atualização monetária e demais encargos previstos em lei ou em contrato; a origem, a natureza e o fundamento legal ou contratual da dívida; a data e o número da inscrição no registro de Dívida Ativa e o número do processo administrativo ou do auto de infração, se neles estiver apurado o valor da dívida.
Ao ser concluída a inscrição, será realizada investigação patrimonial dos devedores inscritos por parte da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e da Procuradoria-Geral Federal e pelos órgãos, tudo por intermédio do Sistema Nacional de Informações Patrimoniais dos Contribuintes e por outros meios legalmente admitidos.
Reza o artigo 5º do projeto que
Inscrito o crédito em Dívida Ativa, o devedor será notificado do inteiro teor da certidão para, em sessenta dias, alternativamente:
I – efetuar o pagamento, acrescido dos encargos incidentes;
II – solicitar o parcelamento do débito por uma das formas previstas em lei;
III – prestar garantia integral do crédito em cobrança, por meio de depósito administrativo, fiança bancária ou seguro-garantia.(…)
§ 2o Após a inscrição, o devedor poderá, independentemente de notificação, adotar uma das providências descritas nos incisos II e III do caput deste artigo, fazendo jus, desde logo, à obtenção da certidão de que trata o art. 206 da Lei n.º 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional, desde que a Fazenda Pública verifique que o crédito está integralmente garantido.
§ 3o Transcorrido o prazo de quinze dias sem a manifestação da Fazenda Pública, presume-se que o crédito está integralmente garantido.
§ 4o O devedor, ou o responsável legal, que não praticar um dos atos descritos nos incisos I a III do caput deverá relacionar quais são e onde se encontram todos os bens que possui, inclusive aqueles alienados entre a data da inscrição em Dívida Ativa e a data da entrega da relação, apontando, fundamentadamente, aqueles que considera impenhoráveis. (…)
§ 6o Transcorrido o prazo de que trata o caput deste artigo sem que o devedor tenha praticado um dos atos previstos em seus incisos de I a III, a Fazenda Pública deverá efetuar os atos de constrição preparatória necessários à garantia da execução. (…)
§ 8o A fiança bancária e o seguro-garantia serão executados imediatamente caso não sejam tempestivamente opostos embargos à execução ou quando esses forem rejeitados ou julgados improcedentes.
§ 9º Em caso de solidariedade passiva, a garantia prestada por um dos co-devedores aproveitará os demais, mas, na superveniência de efetivação da garantia do crédito pelo devedor indicado originariamente na certidão, a inclusão dos co-devedores tornar-se-á sem efeito com a sua consequente exclusão do pólo passivo.
O despacho que determinar a notificação ordenará, ainda, a efetivação da constrição preparatória e a avaliação de bens, sobre tantos bens e direitos quantos bastem para garantir o débito e o registro da constrição, independentemente do pagamento de custas ou outras despesas.
A notificação que se refere o supracitado artigo 5º será feita no endereço do devedor, por carta com aviso de recebimento, ou por outro meio, inclusive eletrônico, com comprovação do recebimento. Haverá presunção de validade da notificação dirigida ao endereço informado pelo devedor à Fazenda Pública, a partir da prova de seu recebimento.
Notificado, o devedor poderá argüir, ressalta-se que pela via administrativa, no prazo de trinta dias, fundamentadamente, sem efeito suspensivo, o pagamento, a compensação anterior à inscrição, matérias de ordem pública e outras causas de nulidade do título que possam ser verificadas de plano, sem necessidade de dilação probatória.
Não se manifestando a Fazenda Pública, após trinta dias contados da argüição, faz presumir a rejeição dos argumentos levantados pelo devedor. A rejeição de qualquer dos fundamentos da arguição pela Fazenda Pública não impede a sua renovação em sede de embargos à execução.
A constrição preparatória, que ocorreu quando da notificação do devedor, veda a alienação ou a constituição de ônus sobre o bem ou direito objeto da constrição pelo prazo de cento e vinte dias e induzirá fraude à execução mesmo após esse prazo. Observa-se que tais bens ficarão sob a guarda do devedor, que não poderá recusar a responsabilidade de depositário, salvo se indenizar, com antecipação, as despesas com a guarda do bem.
Ao tomar ciência do ato de constrição terá o devedor prazo de quinze dias para impugnar avaliação de bens declinando o valor que entende correto devendo o órgão de cobrança competente responder à impugnação também em quinze dias. Na hipótese de o órgão de cobrança não acolher a impugnação, o devedor poderá renová-la em juízo
Note-se que essa impugnação difere da arguição supracitada acerca do valor da dívida ativa. Cabe ressaltar que até o momento o devedor teve duas oportunidades para se manifestar uma administrativa e outra judicialmente. A primeira acerca do débito, a segunda acerca do despacho de constrição preparatória, ficando claro que seu direito à defesa e ao contraditório de forma alguma fica prejudicado.
Após os procedimentos de notificação e constrição de bens pela via administrativa, a Fazenda Pública terá, em regra, o prazo de trinta dias para promover o ajuizamento da ação de execução fiscal, salvo nos casos em que a constrição preparatória for de dinheiro em conta bancária, caso em que a execução fiscal deverá ser ajuizada em três dias após a realização da constrição sobre o dinheiro, sob pena de ineficácia imediata da constrição.
Quando a constrição preparatória ou provisória for em dinheiro em conta bancária, que não poderá exceder o montante em execução, a Fazenda Pública será quem determinará à autoridade supervisora dos sistemas bancário, preferencialmente por meio eletrônico.
Não sendo encontrado o devedor para ser notificado o oficial da Fazenda Pública, achando bens do devedor, a constrição provisória será convertida em arresto. Não encontrado bens não se ajuizará a execução fiscal enquanto não localizados quaisquer valores que possa recair a constrição preparatória.
Decorrido o prazo de um ano, sem que sejam localizados bens, será ordenado o arquivamento dos autos do processo administrativo pertinente. A qualquer tempo, quando encontrado bens, os autos do processo administrativo serão desarquivados e será dado prosseguimento à cobrança.
Se da decisão que ordenar a suspensão do ajuizamento tiver decorrido o prazo prescricional, a autoridade administrativa poderá de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.
Depois de ajuizada a execução fiscal o juiz despachará, se deferir a inicial, para promover a citação do devedor, determinar a convolação da constrição preparatória em penhora ou arresto, intimar o executado da convolação da constrição preparatória em penhora e registrar da penhora ou arresto independentemente do pagamento de custas ou despesas.
O juiz não se pronunciará de ofício acerca da validade da constrição preparatória ou seu reforço, salvo quando a constrição recair sobre bem impenhorável ou houver evidente excesso de garantia.
A sentença que rejeitar liminarmente a execução tornará sem efeito a constrição preparatória ou provisória.
O executado é obrigado a comunicar ao juízo da execução toda a movimentação que fizer em seu patrimônio que prejudique a satisfação do crédito da Fazenda Púbica, sob pena de ineficácia do ato praticado.
No projeto de lei, os embargos à execução, assim como na LEF, deverão ser opostos em trinta dias contados da citação da execução. Quando o executado deixar de oferecer embargos tempestivos, a Certidão de Dívida Ativa passará a gozar de presunção absoluta de veracidade que até então, de acordo com o artigo 3º da LEF e 204, do CTN, possuía presunção relativa, não se admitindo novas alegações sobre a extinção do crédito.
A exceção para novas alegações ocorrerá quando, de direito superveniente, competir ao juiz conhecê-las de ofício ou quando por expressa autorização legal, puderem ser formuladas em qualquer tempo e grau de jurisdição.
Quando o excesso de execução for fundamento dos embargos, o embargante deverá declarar na petição inicial o valor que entende correto, apresentando memória de cálculo, sob pena de rejeição liminar dos embargos ou de não conhecimento desse fundamento.
De igual teor do artigo 17, da LEF, o artigo 24 do projeto de lei reza que se os embargos forem recebidos a Fazendo Pública terá o prazo de trinta dias para impugná-los.
Assim como na LEF nos embargos à execução fiscal e em todos os incidentes judiciais relativos à execução, qualquer intimação ao representante judicial da Fazenda Pública será feita pessoalmente.
O novo texto trás como inovação a possibilidade da Fazenda Pública requerer ao juízo a suspensão do prazo para impugnação, para averiguação das alegações de fato articuladas pelo embargante, tais como o pagamento e a compensação anteriores à inscrição em Dívida Ativa, podendo tornar sem efeito todos os atos de execução até então praticados.
Verifica-se que esse dispositivo além de ser benéfico para o devedor, traduz a economia processual, visto que a própria administração, em seu poder de autotutela, averiguará administrativamente qualquer situação que de pronto possa, por fim, nos embargos arguidos.
Outro benefício dado ao devedor, elencado no projeto de lei, é que durante o prazo de suspensão requerido pela Fazenda Pública o mesmo terá direito a certidão positiva com efeitos negativos.
O prazo de suspensão para averiguação será de trinta dias. Nesse prazo a Fazenda Pública poderá cancelar, emendar ou substituir a certidão de Dívida Ativa, assegurado ao executado a devolução do prazo para embargos, que somente poderá versar sobre a parte da certidão de Dívida Ativa eventualmente modificada e prosseguir nos atos de execução e oferecer impugnação aos embargos com relação à parte da certidão de Dívida Ativa que não restar alterada.
Se Fazenda Pública cancelar, emendar ou substituir a certidão de Dívida Ativa em razão de argumentações nos embargos do devedor, deverá pagar honorários de sucumbência, respondendo, proporcionalmente, pelas custas que o devedor houver suportado, salvo quando o devedor tenha contribuído para o erro.
A fiança bancária e o seguro-garantia, dado como garantia pelo devedor quando da notificação da inscrição do crédito em Dívida Ativa, serão executados imediatamente sendo os embargos intempestivos, rejeitados ou julgados improcedentes.
A oposição de embargos não suspende o curso da execução. Nos autos, o juiz poderá deferir medida cautelar para assegurar a eficácia prática da futura sentença, desde que, constatada a plausibilidade do direito invocado, haja fundado temor de que a demora a tornará ineficaz.
O devedor conta, ainda como meio de defesa, de ação judicial autônoma. O mesmo se quiser manifestar-se, desde logo, judicialmente poderá opor à inscrição em dívida ativa ou à execução por meio de ação autônoma, que será distribuída ao juiz competente para conhecer da execução fiscal e dos embargos e restará prevento.
Ressalta-se que o ajuizamento da Ação Autônoma importa em renúncia ao poder de recorrer na esfera administrativa e desistência do recurso acaso interposto.
Aduz o artigo 26, § 2º, do projeto que a propositura de qualquer ação relativa ao débito inscrito na dívida ativa não inibe a Fazenda Pública de promover-lhe execução; todavia, se relevantes os fundamentos e diante de manifesto risco de dano de difícil e incerta reparação, ficará suspensa a execução, mediante garantia consistente em depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro-garantia.
Cabe observar que os defensores desse novo modelo de execução fiscal dos débitos fiscais da Fazenda Pública são favoráveis a uma lei que institua a transação tributária.
Tal instituto seria um instrumento utilizado anteriormente a execução fiscal no qual, segundo o Procurador-Geral da Fazenda Nacional[2], consistiria em um acordo entre o contribuinte e a Fazenda Pública, que transigiriam a respeito dos juros e mora sobre o principal, bem como modalidades alternativas de quitação, a serem homologadas na própria esfera administrativa, objetivando promover a solução de demandas de natureza tributária, permitindo a satisfação de créditos tributários e evitando controvérsias tributárias.
A lei geral de transação seria admissível nas hipóteses de matéria jurídica controvertida, fato imponível de difícil determinação e de demonstração da ausência da capacidade de pagamento.
CONCLUSÃO
A execução fiscal administrativa visa o aperfeiçoamento da cobrança da dívida pública fazendária. Ao trazer para via administrativa a maioria dos atos e procedimentos executivos, propõe-se um processo mais célere, visto que o Poder Judiciário encontra-se, atualmente, sobrecarregado. Retira-se, da via judicial, procedimentos simples, dispensando formalidades que torna lento o atual sistema de execução fiscal.
O sistema proposto pelo anteprojeto de lei não compromete o direito de defesa do contribuinte e certamente reduzirá o número de demanda judicial executiva. Caso o contribuinte entenda ter sido lesado, poderá recorrer ao Judiciário e recuperar em juízo, mediante repetição de indébito, o equivalente aos bens já executados, ou seja, os valores indevidamente cobrados.
O intuito não é desprestigiar o Poder Judiciário, mas tão-somente abordar a execução como ato administrativo, que de fato é. Ao Judiciário reservam-se os litígios mais complexos.
Ressalta-se que o presente artigo não tem a pretensão de esgotar um assunto polêmico e não pacificado. Pretende-se, apenas, levantar questões e trazer a tona uma discussão necessária para o aprimoramento do atual sistema de execução, que há muito deixou de ser satisfatório e cumprir com o seu papel: uma execução fiscal célere, eficiente e eficaz.
Informações Sobre o Autor
Rachel Mesquita Carvalho
Advogada na Companhia de Água e Esgoto do Estado do Ceará CAGECE lotada na Consultoria Jurídica. Graduada em 2007 na Faculdade Integrada do Ceará. Especialista em Direito Público desde 2009