ISS – Serviço de reboque de embarcação


A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça está para uniformizar a sua jurisprudência em torno da incidência ou não do ISS sobre os serviços de reboque de embarcação à luz do então vigente Decreto- lei n° 406, de 31-12-1968, substituído pela atual lei de regência nacional do ISS, Lei Complementar n° 116/2003, tendo em vista pronunciamentos dispares da 1ª e 2ª Turmas daquele Colendo Tribunal.


O debate se faz necessário porque o elemento temporal do fato gerador define a legislação aplicável para a constituição de crédito tributário. É o que dispõe o art. 144 do CTN:


“Art. 144. O lançamento reporta-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada”.


Fatos geradores ocorridos antes do advento da LC n° 116/2003 regem-se pelas disposições do Decreto-lei n° 406/68 e da respectiva lista de serviços e também, da lista de serviços anexos à Lei Complementar nº 56/87 que antecedeu a lista de serviços em vigor atualmente.


E a lista anexa ao Decreto- lei n° 406/68, parcialmente alterada pelo Decreto-lei n° 834/69 não incluía expressamente o serviço de reboque de navios em seu item 87 que assim dispunha:


“87 – Serviços portuários e aeroportuários; utilização de porto ou aeroporto; atracação; capatazia; Armazenagem interna, externa e especial; suprimento de água, serviços acessórios, movimentação de mercadoria fora do cais”.


A lista anexa à Lei Complementar nº 56/87 nada alterou neste particular.


A corrente pró tributação do serviço de reboque de embarcação sustenta que esse serviço está contido dentro do serviço de atracação de embarcações. Penso que não.


Atracação é ato de amarrar a embarcação à terra, ou encostar a embarcação ao cais do porto. Desatracação é a operação inversa. Reboque de embarcação significa ato de puxar com cabo ou corrente a fim de conduzi-la a um determinado local, ou para auxiliar manobras de atracação ou desatracação[1].


Logo, pode haver atracação, sem serviço de reboque. E pode haver serviço de reboque sem que implique necessariamente atracação da embarcação. Daí tratar-se de serviços distintos. É claro que na hipótese de o serviço de reboque funcionar como meio para execução do serviço de atracação haverá incidência do ISS apenas pela atividade-fim.


O que é preciso distinguir é a tributação do serviço definido em lei complementar, com o serviço de qualquer natureza. Apenas o serviço definido poderá ser tributado. E o legislador complementar poderá definir serviço de qualquer natureza, isto é, incluir na definição de fato gerador do ISS qualquer tipo de serviço, assim entendido o esforço humano aplicado à produção resultando em um bem de natureza imaterial.


Por expressa disposição constitucional (art. 156, III) só se pode tributar serviços definidos em lei complementar, isto é, definido em nível de norma geral de aplicação no âmbito nacional.


A definição de fato gerador é matéria reservada à lei em sentido estrito. Cada entidade política tributante deve instituir o imposto de sua competência descrevendo o respectivo fato gerador, respeitados os princípios tributários e as normas gerais em matéria de legislação tributária. O Código Tributário Nacional é lei sobre leis de tributação.


Não pode haver exigência de tributo por analogia, pois isso importaria na violação do princípio da legalidade tributária (art. 150, I da CF, e art. 97, I, do CTN).


O Decreto- lei n° 406/68 não incluiu na definição de fato gerador do ISS o serviço de reboque de embarcação. Nem a Lei Complementar nº 56/87. Isso só veio a acontecer com o advento da LC n° 116/2003 que incluiu esse serviço no item 20.01 de sua lista anexa:


“20.01 Serviços portuários, ferroportuários, utilização de porto, movimentação de passageiros, reboque de embarcações, rebocador escoteiro, atracação, desatracação, serviços de praticagem, capatazia, armazenagem de qualquer natureza, serviços acessórios, movimentação de mercadorias, serviços de apoio marítimo, de movimentação ao largo, serviços de armadores, estiva, conferência, logística e congêneres”.


A inclusão do serviço de reboque de embarcação na lista de serviços atualmente em vigor é mais uma prova de que antes esse serviço não era tributado.


Colocada a questão nesses termos parece não haver dúvida quanto a inexigibilidade do ISS em relação ao serviço de reboque de embarcação à luz do DL nº 406/68 e da lista anexa à LC n° 56/87, que antecedeu a atual lista de serviços.




Nota:


[1] Cf. nosso ISS – doutrina e prática, São Paulo: Atlas, 2008, p. 183.


Informações Sobre o Autor

Kiyoshi Harada

Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.


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