Resumo: O presente artigo tem como objeto o imposto sobre grandes fortunas (IGF), em particular a análise da evolução histórica do referido tributo, as dificuldades para a conceituação do que vem a ser “grandes fortunas”, a inércia do Congresso Nacional em criar a lei complementar pendente para a aplicação do imposto e o impacto na arrecadatório e social que traria a implantação desse imposto no Brasil se revelando como uma importante alternativa para crise econômica vivida em nosso país. Observou-se que as divergências sobre o imposto no Poder Legislativo e as especulações em vários aspectos, sempre com base nas experiências internacionais, desencadearam numa inércia na regulamentação do dispositivo que prevê o IGF: o art. 153, VII, da Constituição Federal de 1988. A alta carga social de que se reveste o imposto tratado no presente artigo reclama uma maior atenção por parte da sociedade brasileira que deve cobrar do nosso parlamento a implantação e regulamentação deste tributo que já aguarda há mais de 29 anos.
Palavras-chave: Imposto sobre Grandes Fortunas. Aumento na arrecadação. Crise Financeira. Omissão do Congresso Nacional. Justiça Social.
Abstract: The object of the present article is the tax on large fortunes (IGF), in particular the analysis of the historical evolution of this tribute, the difficulties for the conceptualization of what is becoming "great fortunes", the National Congress's inertia in creating the law Complement pending for the application of tax and the impact on tax collection and social that would bring the implementation of this tax in Brazil proving to be an important alternative to economic crisis experienced in our country. It was observed that the divergences on the tax in the Legislative Power and the speculations in several aspects, always based on the international experiences, triggered in an inertia in the regulation of the device that foresees the IGF: the art. 153, VII, of the Federal Constitution of 1988. The high social burden of the tax dealt with in this article calls for greater attention on the part of the Brazilian society that should charge our parliament the implantation and regulation of this tax that has been waiting for longer 29 years old
Keywords: Tax on Great Fortunes. Increase in collection. Financial crisis. Omission of the National Congress. Social justice.
Sumário: (1)breve relato histórico; (2)o que pode ser considerado “grande fortuna”?; (3)a Constituição Federal de 1988 e o IGF; (4)implantação do IGF como alternativa a crise financeira.
INTRUDUÇÃO
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 é um conjunto de normas escritas, compiladas em um único documento, divididas em preâmbulo, texto principal e ato das disposições constitucionais transitórias. Nesse diapasão, para que suas normas produzam os efeitos almejados pelo constituinte, necessitam estar dotadas de aplicabilidade.
Como é sabido, algumas normas da Constituição Federal de 1988 não são dotadas de aplicabilidade, por serem de eficácia limitada, sendo, neste caso, imperiosa a atuação complementar do poder legislativo a posteriori.
O imposto sobre grandes fortunas – IGF previsto no inciso VII, do artigo 153 do texto constitucional, é uma norma de eficácia limitada, pois reclama a edição de uma lei complementar para produzir todos os seus efeitos. Porém, mesmo após o decurso de mais de 30 (trinta) anos, o Congresso Nacional brasileiro, órgão incumbido de tal tarefa, ainda não cumpriu o mandamento constitucional que lhe foi confiado pela Assembleia Nacional Constituinte.
Desta forma, diante da importância que vem ganhando o debate acerca da implementação do imposto sobre grandes fortunas – IGF no Brasil, sobretudo após a eclosão de uma crise econômica e financeira sem precedentes na história do país, é importante que a população amplie seus conhecimentos acerca do único imposto federal ainda não implantado, tema pouco difundido pela imprensa de massa.
O presente estudo possui natureza jurídica, como se observa pela fundamentação na doutrina, na Constituição Federal e na legislação pátria. Possui também uma alta carga de reflexão jurídica e social sobre os motivos pelos quais o referido imposto, que atinge as camadas mais abastarda da sociedade, ainda não foi implementado, mesmo depois do decurso de mais de três décadas de vigor da Constituição Cidadã.
Os objetivos da presente pesquisa são: realizar um breve relato sobre a evolução histórica do imposto sobre grandes fortunas; estudar o significado da expressão “grandes fortunas”; analisar os projetos de lei complementar, que visam regulamentar o imposto sobre grandes fortunas, aptos à votação pelo Congresso Nacional; identificar as questões burocráticas, políticas e pragmáticas que resultaram na omissão por parte do legislador pós-constituinte; analisar os impactos financeiros e sociais de uma possível implantação do IGF no brasil.
Para atingi-los, será realizada uma pesquisa dogmática instrumental, pois será utilizado material bibliográfico e documentos, e não através de comprovação empírica.
O método de abordagem a ser utilizado será o hipotético-dedutivo, pois tem início pela percepção da uma lacuna causada pela falta da norma regulamentadora sobre o imposto sobre grandes fortunas no Brasil, mesmo após tantos anos. E sobre o questionamento de quais seriam os impactos financeiros e sociais da implantação deste imposto no presente momento de crise que vive o país.
A técnica de pesquisa a ser seguida será a documentação indireta, pois que será respaldada, em boa parte, na interpretação de textos. Ao longo da pesquisa, serão utilizadas fontes das mais variadas: livros, artigos e periódicos, além da rede mundial de computadores (internet).
A primeira parte será dedicada a um breve relato histórico sobre o imposto sobre grandes fortunas – IGF desde a Idade Antiga, passando pela Idade Média, até os dias atuais.
A segunda parte do presente artigo se dedicará a conceituação do que vem a ser “grande fortuna”, a dificuldade de traçar uma definição objetiva para algo que é variável (a riqueza), e as soluções apresentadas pela doutrina para esse entrave conceitual.
A terceira parte será dedicada a um breve estudo sobre o imposto sobre grandes fortunas, enaltecendo o seu caráter de norma constitucional, com ênfase aos projetos de Lei Complementar apresentados no Congresso Nacional e as especulações que cercam o referido a implantação efetiva do tributo.
A quarta parte do estudo será voltada aos impactos financeiros de uma possível implantação do imposto sobre grandes fortunas no Brasil, bem como a utilização dessa exação como um forte instrumento de superação da atual crise financeira e social.
Destarte, será possível analisar de forma crítica as razões pelas quais é tão difícil implementar o referido imposto no Brasil, bem como despertar a atenção da sociedade para a necessidade urgente de discussão do tema como um mecanismo de justiça social.
1. BREVE RELATO HISTÓRICO
Preliminarmente cabe ressaltar que na história da humanidade, desde os primórdios da sociedade civil, as pessoas ou instituições de determinado território precisam despender recursos ou esforços em prol daqueles que são os detentores do poder (político, militar, religioso, etc.), remetendo a cobrança de prestações, que, independente da denominação, podem ser entendidas como tributação, esse fato sem dúvida alguma faz parte da história humana em sociedade.
Além disso, observa-se que a tributação deriva de uma série de contextos sociais, políticos e econômicos que culminaram no processo de fortalecimento do Estado, constituindo uma parcela necessária que encontra fundamento na soberania do Estado, conferindo-lhe o poder de tributar[1].
A existência de grandes fortunas, grandes concentrações de bens é fruto de um processo de acumulação de riquezas nas mãos de poucas pessoas. Tal fenômeno é reportado desde a Idade Antiga, existindo inúmeros relatos e escritos antigos narrando sobre vultosos acúmulos de bens, riquezas, sem contar com a apropriação das riquezas dos povos derrotados em guerras, fato este muito corriqueiro na antiguidade.
Historicamente, os detentores das grandes riquezas sempre foram os mesmos que detinha o poder de cobrar “tributos”, resultando numa constatação inexorável, a de que na Idade Antiga, assim como na Idade Média, as grandes fortunas nunca foram objeto de imposições tributárias específicas, ou seja, que o acúmulo de riquezas fosse fato gerador de qualquer tributo.
Acerca do tema podemos colher as ricas palavras de Sérgio Ricardo Ferreira Mota. In verbis:
“Na verdade, tal tributação seria muito difícil de ocorrer uma vez que os detentores das grandes riquezas se confundiam com os detentores do poder vigente à época. Da mesma forma, nos Estados Feudais da Idade Média ou nos Estados Nacionais da Idade Moderna, o príncipe era o detentor absoluto das propriedades e concentrava toda a riqueza do Estado, unido com a Igreja (Estado confessional), detinha as grandes fortunas. Já a nobreza e o clero, detentores de alguma riqueza, quase não pagavam tributos[2].”
Resta evidente que os interesses políticos contribuíram para a não tributação das grandes fortunas, mesmo na enorme diferença entre a organização do poder político descentralizado característico da Idade Média e a centralização nas mãos dos monarcas na Idade Moderna. “Mesmo com a separação verificada entre a Igreja e o Estado (Estado laico) na Idade Contemporânea, não houve um maior interesse de tributar especificamente as grandes fortunas”[3].
A pouca imposição tributária aos detentores do poder político e econômico exigiu um alto preço como forma de compensar os prejuízos suportados pelo Estado, qual seja, o excesso de tributação às classes mais pobres. Tudo isso, por óbvio, gerou uma grande insatisfação social, que ao passar de um longo período, resultou na necessidade de grandes transformações na maneira de tributar do Estado.
Na baixa Idade Média (séc. XVIII-XV), com a promulgação da Constituição Inglesa de 1215, pelo rei João Sem-Terra, a Inglaterra foi pioneira na limitação do poder de tributar do Estado. Na Magna Carta Inglesa ficou acordado que o rei não poderia instituir tributo sem o consentimento do Conselho dos Nobres, que era formado por membros do clero, da nobreza e da burguesia.
Nunca é demais destacar que a incidência de tributos sobre o patrimônio é algo presente na humanidade desde os tempos imemoriáveis, inclusive havendo referências bíblicas a este fato. Os tributos em relação ao patrimônio podem ser divididos em: tributos sobre o patrimônio global, os tributos sobre bens suntuários e os tributos fundiários.
O tributo fundiário remete ao Egito, à Grécia e a Roma. Baseado na posse ou propriedade da terra como riqueza a ser tributada. É o imposto sobre o patrimônio mais antigo que se tem notícia. Contudo, não atingem somente as grandes propriedades de terra, os grandes patrimônios. Ou seja, não constitui um imposto que especificamente verse sobre grandes fortunas.
No final do século XIX e, especialmente no início do século XX, é apresentado ao mundo uma série de tributos progressistas sobre a renda, a exemplo do “Property Tax”, nos Estados Unidos. Outros exemplos estão na chamada “Taxe Annuelle sur la Fortune”, iniciada na Suíça e que se espalhou para boa parte dos países europeus. O tributo sobre o patrimônio global passa a levar em consideração a questão da renda líquida anual, mas também não leva em consideração exclusivamente o aspecto das “grandes fortunas”[4].
Além do processo de limitação do poder de tributar por qual passava a Inglaterra desde a promulgação da Magna Cartado Rei João Sem Terra, no ano de 1692, foi criado um tributo incidindo sobre determinadas categorias de patrimônio, chamado “Land Tax”, considerado como um imposto de guerra contra a França. Tal tributo tornou-se perpétuo em 1797, com a denominação de “Assesse Taxes”, com o objetivo de angariar bens suficientes para a manutenção da guerra contra Napoleão Bonaparte, mas que logo foi substituído por um imposto sobre rendimento geral e regular[5]. Trata-se de um exemplo de tributo que incide sobre bens suntuários.
Vale ressaltar esse tributo incidiu pouco tempo sobre bens luxuosos ou despesas suntuárias, tratando-se apenas de uma medida emergencial do Estado britânico frente a grande necessidade de arrecadação para fazer frente a terrível ameaça francesa nos tempos napoleônicos.
Diante do critério restritivo do regime tributário contemporâneo, o imposto sobre grandes fortunas, que tem incidência própria sobre grandes patrimônios, não pode ser confundido com qualquer outra figura tributária, a exemplo dos impostos sobre o patrimônio global, os impostos sobre bens suntuários e os impostos fundiários, uma vez os parâmetros adotados pelo IGF (“grandes fortunas”), não se adequam a nenhuma das figuras lembradas.
Podemos colher tais conclusões dos preciosos ensinos de Sérgio Ricardo Ferreira Mota. In verbis:
“Dessa forma, constata-se que na história da humanidade a acumulação de riquezas tem estado sempre presente, desde os primórdios da civilização, o que levou ao efeito da concentração de riquezas ter permitido a construção de grandes fortunas. Muitas prestações exigidas na história da humanidade, porém, em muitos momentos e lugares, não são atualmente reconhecidas como submetidas a um regime jurídico tributário na qual se exige estejam inseridas no atual regime de economia capitalista e balizadas pelos direitos humanos perseguidos pela sociedade contemporânea. Conclui-se, portanto, que não houve em qualquer ordenamento positivo qualquer imposição tributária específica sobre grandes fortunas até a instituição do tributo francês denominado “Impôt sur les Grandes Fortunes” no ano de 1981[6].”
A citação acima reflete o entendimento de que o tributo francês “Impôt sur les Grandes Fortunes” é a primeira incidência tributária da história, dentre todos os ordenamentos jurídicos existentes, em que especificamente os parâmetros utilizados estão sob o prisma das “grandes fortunas”, ou seja, estamos falando de um tributo cuja fonte ou fato gerador consiste, em tese, no patrimônio pertencente às pessoas qualificadas como possuidoras de grande fortuna.
O tributo francês em muito se assemelha a autorização constitucional, prevista no art. 153, inciso VII, da Constituição Federal de 1988 para que o Brasil crie um imposto específico para tributar “grandes fortunas”.
2. O QUE PODE SER CONSIDERADO “GRANDE FORTUNA”?
A conceituação do que pode vir a ser considerado como “grandes fortunas” é um dos maiores entraves para a implementação desse imposto no ordenamento jurídico, por se tratar de um elemento essencial em que não há nenhum tipo de consenso por parte dos estudiosos sobre a definição mais adequada.
Ives Gandra Martins[7], autor de um dos anteprojetos de Lei Complementar visando regulamentar o imposto sobre grandes fortunas no Brasil, explana essa dificuldade de conceituação, ao afirmar que:
“O próprio nome do imposto é curioso. O imposto incide sobre "grandes fortunas". Uma "grande fortuna" é mais do que apenas uma "fortuna". Já "fortuna" é maior do que "riqueza".”
Nesse sentido, encontramos doutrinadores renomados do campo do direito tributário, com o professor Leandro Paulsen.[8]
Diante da dificuldade conceitual que envolve o imposto, a expressão “grandes fortunas” passa a ser considerada um conceito jurídico indeterminado. A indeterminação não se verifica apenas no fato de que a expressão “grandes fortunas” é abstrata, mas há uma incerteza em relação ao tema especialmente pelas questões subjetivas e temporais, capazes de gerar variações claras na noção de ”fortuna” e de “riqueza”. A variação temporal e a variação subjetiva são explicadas por Francisco José Santos da Costa, através de exemplos em que é possível ter um pouco da dimensão da quão difícil é a missão de descobrir um conceito satisfativo para o termo “grandes fortunas”. Senão vejamos:
“A variação temporal, relativa ao conceito de "grandes fortunas", está na mensuração do conceito em determinada época, ou seja, o que seria uma "grande fortuna" há 100 anos, hoje pode ser a quantia equivalente a um salário mínimo de um trabalhador da indústria. Concernente à variação subjetiva, aplicada ao mesmo conceito, tem-se que diz respeito aos aspectos pessoais do indivíduo, explicando melhor, o que pode ser uma "grande fortuna" para uma pessoa de classe média, pode ser o equivalente a uma viagem a Europa de um mega empresário.
Mesmo se podendo determinar que o fato está ou não abrangido pelo núcleo do conceito, percebe-se que o conceito objeto deste estudo encontra-se em uma área nebulosa ou cinzenta, pois se encontra em uma região entre a zona de certeza positiva e a zona de certeza negativa[9].”
A chamada zona de certeza positiva é o patamar a partir do qual há consenso por parte de todos os sujeitos que protagonizam as discussões sobre a implementação do IGF no Brasil. Nessa zona somente estariam pessoas com fortunas indiscutivelmente grandes em relação à média, que consistem apenas nas pessoas bilionárias. Essa zona é notadamente restrita no Brasil, insuficiente para que o imposto cause qualquer repercussão considerável, tornando-o totalmente sem eficácia.
Em contrapartida, a zona de certeza negativa, a mais aceita hoje é a da soma de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) dentro de determinado núcleo familiar. Contudo, a zona de certeza negativa sofre muito mais no que diz respeito à variação temporal, especialmente diante da desvalorização moeda, melhor dizendo, das moedas apresentadas na história econômica do Brasil após a promulgação da Constituição de 1988.
Walter Alexandre Bussamara[10] apontada dificuldade de quantificar valor do que pode ser considerado como sendo uma “grande fortuna” no Brasil ou qual o melhor critério para se aferir tal importância. Ipsis litteris:
“Outro ponto, por sua vez e, por fim, que nos parece também questionável, diz respeito à parametrização do que venha a ser definido, no mundo fenomênico (em que vivemos), como sendo, de fato, uma “grande fortuna”, […].
Com efeito, o termo “fortuna”, por si só, já nos traz a ideia de “riqueza”. Por sua vez, uma “grande fortuna” nos faria pensar em algo além do mero conceito daquela. E, ao que nos parece, o aguardado imposto sobre grandes fortunas não se subsume ao aludido significado de fortuna tal qual a sua abstração, ao menos semântica, nos provoca.”
De outro lado, importante salientar que cada projeto de Lei Complementar proposto com o objetivo de regulamentar o Imposto sobre Grandes Fortunas estabeleceu um quantum mínimo para sua incidência, além de situação de compensações do imposto. A compensação é uma exigência constitucional, uma limitação ao poder de tributar, porque o fato gerador do IGF inclui bens e direitos sujeitos à incidência de outros impostos, fato este que sobrelevaria o impacto da exação.
No entanto, a grande variável entre a zona de certeza positiva e a zona de certeza negativa resulta numa grande “zona cinzenta ou nebulosa”. Mesmo diante das variações de cada projeto, Olavo Nery Corsatto[11] fez uma didática explanação sobre “grande fortuna”, conforme se verifica abaixo:
“Guardadas as variações de projeto a projeto, verifica-se que, em linhas gerais, grande fortuna – fato gerador do imposto – seria o patrimônio da pessoa física, apurado anualmente, cujo valor ultrapassasse determinado limite. Sua apuração quase sempre obedeceria a mecanismo, previsto em cada projeto, de acréscimos e deduções. Tal patrimônio seria constituído, portanto, de bens, móveis e imóveis, físicos e financeiros, e direitos do contribuinte[12].”
Neste diapasão, observa-se que a questão da definição jurídica do que vem a ser “grande fortuna” é um dos grandes problemas para instituição desse imposto, mas o autor acima transcrito demonstra a possibilidade de uma composição, na busca da superação das grandes controvérsias conceituais, já que se trata de um tema primordial para a busca da implantação ou instituição do imposto previsto na Constituição Federal de 1988.
3. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E O IGF
A possibilidade de cobrança do imposto sobre grandes fortunas foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, em 5 outubro de 1988. A Carta Maior previu esse imposto no Título “Dos Impostos da União”, como sendo de competência da União Federal e dependendo de Lei Complementar para sua aplicação.
O imposto está previsto no art. 153, VII, com a seguinte redação:
“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:[…]
VII – grandes fortunas, nos termos de lei complementar.”
Apesar de passados mais de 28 anos do término da Assembleia Nacional Constituinte, o mandamento constitucional ainda não foi regulamentado por Lei Complementar, mas diversos projetos foram apresentados ao Congresso Nacional com essa finalidade.
Cabe destacar que, após a vigência da Constituição de 1988, o primeiro Projeto de Lei Complementar apresentado (23 de junho de 1989)[13] ao Congresso Nacional, visando regulamentar o IGF no Brasil, é de autoria do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, à época Senador.
Esse PLS (Projeto de Lei do Senado nº 162/1989) foi aprovado pelo Senado Federal e enviado à Câmara dos Deputados sendo apensado em diversos outros Projetos, tramitando atualmente sob a rubrica PLP nº 202/1989[14].
Desde então diferentes propostas legislativas surgiram para delinear e instituir o IGF, mas nenhuma prosperou até o momento, talvez em decorrência daquela velha dificuldade encontrada ainda na Idade Antiga e Média, qual seja, os grandes “afetados” por este novo imposto seriam exatamente aqueles que detêm o poder de tributar.
Atualmente a proposta mais avançada encontra-se em discussão na Comissão de Assuntos Sociais, trata-se do Projeto de Lei do Senado – PLS nº. 534/2011 de autoria do Senador Antônio Carlos Valadares. O texto encontra-se pronto para ser votado na comissão e tem como relator o Senador Pernambucano Armando Monteiro.
Pelo texto do PLS nº. 534/2011[15] passa a ser tributável o patrimônio superior a R$ 2,5 milhões. A cobrança do imposto se dará por faixas de contribuição, a exemplo do que ocorre com o Imposto de Renda. Pelo texto, o patrimônio até R$ 2,5 milhões fica isento. A partir desse montante, incide alíquota de 0,5%. Outras quatro faixas patrimoniais para incidência do imposto foram definidas: mais de R$ 5 milhões até R$ 10 milhões — alíquota de 1%; mais de 10 milhões até R$ 20 milhões — alíquota de 1,5%; mais de R$ 20 milhões até R$ 40 milhões — alíquota de 2%; e mais de R$ 40 milhões — alíquota de 2,5%.
4. IMPLANTAÇÃO DO IGF COMO ALTERNATIVA A CRISE FINANCEIRA
O imposto sobre grandes fortunas é o único dos sete impostos federais que ainda não foi implantado em nosso sistema tributário. Isso revela que que o velho problema ainda persiste, pois aqueles que são responsáveis pelo poder de tributar serão os mais afetados por esta medida.
Em um país de dimensões continentais como o Brasil, que possui uma das piores distribuições de renda do mundo, a taxação de grandes fortunas revela-se como um importante instrumento de arrecadação, mas também de justiça social. Estudos recentes revelaram que o impacto na arrecadação seria de aproximadamente R$ 100 bilhões de reais por ano[16].
É fato que se trata de um imposto de grande impacto para a realização de justiça social no Brasil, pois sua existência e regulação possibilita a redistribuição de renda em favor dos segmentos da população mais vulneráveis social e economicamente.
A inclusão do produto da receita obtida pelo IGF no rol das receitas que compõe o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, prevista no art. 80 dos Atos e Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT revela o nítido caráter social que se reveste essa tributação. In verbis:
“Art. 80. Compõem o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza:[…]
III – o produto da arrecadação do imposto de que trata o Art. 153, inciso VII, da Constituição.”
O Brasil atravessa a sua pior crise econômica da história e o Imposto sobre Grandes Fortunas – IGF se apresenta como um importante instrumento para o aumento da arrecadação e a realização de justiça social. Todos os esforços e cortes de gastos que foram e estão sendo feitos no país na atualidade não conseguem, se somados, chegar à cifra dos R$ 100 bilhões de reais por ano.
CONCLUSÃO
Portanto, a implementação do Imposto sobre Grandes Fortunas – IGF no Brasil reclama agilidade e urgência. É preciso que a população se conscientize acerca do tema e vá as ruas exigir uma posição firme do nosso Congresso Nacional que durante quase 30 anos vem se omitindo cedendo às pressões dos grandes conglomerados empresariais e aos seus próprios desejos.
Caso nossos principais defensores da liberdade de expressão, guardiões autonomeados da liberdade de imprensa, optem por uma sintonia realmente fina com os anseios da sociedade brasileira, logo nos habituaremos a ver a temática acerca do Imposto sobre Grandes Fortunas nas capas de revistas, jornais e nos noticiários televisivos.
Informações Sobre o Autor
Thiago Henrique Costa de Almeida
Advogado. Assessor Jurídico do Governo do Estado da Paraíba. Mestrando em Sociologia pela Universidade Federal da Paraíba UFPB com linha de pesquisa em Políticas Públicas. Pós-Graduado em Direito Público pela PUC/MG. Especialista em Gestão e Auditoria Pública IESP