Repetição de Indébitos de Tributos declarados Inconstitucionais

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Sumário: 1. Noções gerais. 1.1. Fundamento da ação de repetição. 1.2. Prazo para propor ação de repetição. 2. Natureza jurídica da declaração de inconstitucionalidade pelo STF. 3. Declaração de inconstitucionalidade. 3.1 Modulação de efeitos em geral. 3.2 Modulação de efeitos em matéria tributária. 4. Contagem do termo inicial do prazo qüinqüenal para propositura de ação de repetição de indébito fundada na declaração de inconstitucionalidade do tributo pelo STF. 4.1. Antigo posicionamento do STJ. 4.2. Posição atual do STJ. 4.3. Posição do STF. 4.4. Falta de previsão no CTN para regular a hipótese de declaração de inconstitucionalidade do tributo.


1. Noções Gerais


Antes da abordagem do tema é conveniente fazer breves considerações preliminares sobre a matéria. 


1.1. Fundamento da ação de repetição


O que fundamenta a ação de repetição de   indébito   é  o princípio da legalidade tributária. Tudo que foi pago além do limite legal há de ser repetido, assim como o que foi pago aquém do limite legal há de ser complementado com o pagamento da diferença com os acréscimos de juros e correção monetária, além da multa.


Daí  a  irrelevância   da   repercussão     econômica   do     encargo financeiro do tributo previsto no art. 166 do CTN em  relação  aos chamados tributos indiretos: RTJ 132/370;  RTJ 149/870; RE nº 170.830, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ de 30-05-1997.


1.2. Prazo para propor ação de repetição


Conforme art. 168 do CTN é de cinco anos a contar:


a) da data da extinção do débito tributário (pelo pagamento) (incisos I e II do art. 168).


Nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação – ICMS, IPI, ISS, COFINS etc. – esse prazo conta-se a partir do pagamento antecipado, conforme art. 3º da LC nº118/2005. O STJ editou a Súmula nº 436 prescrevendo que a entrega da declaração pelo contribuinte reconhecendo o débito constitui o crédito tributário.


b) da data da decisão administrativa definitiva ou da data do trânsito    em julgado da decisão judicial que tenha reformado, anulado, revogado ou rescindido a decisão condenatória (inciso III, do art. 168).


2. Natureza jurídica da  declaração de inconstitucionalidade pelo STF


Os doutrinadores   clássicos com apoio na teoria norte-americana reconhecem a natureza meramente declaratória da declaração de inconstitucionalidade. Daí o efeito ex tunc por eles proclamado (Francisco Campos, Ruy Barbosa, Alfredo Buzaid e outros).


Para os que prestigiam a doutrina de Kelsen a decisão declaratória de inconstitucionalidade tem o caráter constitutivo negativo à medida que desconstitui o ato normativo acoimado de inconstitucional. Daí o efeito ex nunc  por eles proclamado (José Afonso da Silva, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Temístocles Brandão Machado e outros). Trata-se, na verdade, de efeito constitutivo negativo. O efeito ex nunc resulta da modulação de efeitos que a lei permite.


3. Declaração de inconstitucionalidade


Quando a inconstitucionalidade é pronunciada no controle concentrado a decisão atinge a lei ou ato normativo no plano de sua vigência, surtindo efeito erga omnes.


Quando a inconstitucionalidade é pronunciada no âmbito do controle difuso a decisão não atinge o plano de vigência da lei ou ato normativo. Atinge apenas o plano da eficácia intra partes. A suspensão da aplicação da lei ou ato normativo considerado inconstitucional depende de Resolução do Senado Federal (art.52, X, da CF).


 Em ambos os casos, as  leis    consideradas   inconstitucionais   pelo Supremo Tribunal Federal não se confundem  com leis  inexistentes no mundo jurídico ou leis nulas como pretende a doutrina clássica.


3.1 Modulação de efeitos em geral


A decisão que declara a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo pode ter o seu efeito modulado, por decisão de 2/3 dos membros da Corte Suprema, conforme permitem o art. 27 da Lei nº 9.868/99 que regula a ADI e o art. 11 da Lei nº 9.882/99 que disciplina a  ADPF.


Tem-se entendido que a modulação se impõe  apenas nos casos em que  a inaplicação do preceito cuja inconstitucionalidade se reconheceu poderia resultar em grave ameaça a todo o  sistema jurídico vulnerando o princípio de segurança jurídica.


Costuma-se citar o caso da inconstitucionalidade da composição da Câmara Municipal de Mira Estrela em que a Corte reconheceu a sua inconstitucionalidade, mas proclamou que  aquela composição continuasse até o final da legislatura, quando, então,  seriam realizadas as eleições em que se elegeria apenas o número de Vereadores permitido pela Constituição: RE nº 197.917/SP. Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ de 7-5-2004. No mesmo  sentido em relação à Câmara de Vereadores de Porto Ferreira: RE nº 300.343/SP.


3.2 Modulação de efeitos em matéria tributária


Os princípios constitucionais da legalidade tributária, da tipicidade cerrada  e da moralidade na administração pública impede a modulação de efeitos em matéria tributária, salvo para favorecer o contribuinte. Não se pode permitir que a Fazenda Pública se aproprie definitivamente de valor cobrado a título de tributo, mas que a Corte Suprema reconheceu não se revestir aquela exação de natureza tributária por desobedecer o princípio da legalidade tributária.


Entretanto, o STF vem concedendo efeito prospectivo, inclusive, em casos de declaração de inconstitucionalidade no exercício do controle difuso de constitucionalidade. Foi o que aconteceu no julgamento do RE nº 560.626/RS, no qual foi   declarada  a inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/91 que versavam sobre matéria reservada à lei complementar. Essa decisão resultou na edição da Súmula vinculante nº 8.


No  RE nº 363.852/MG, que declarou a inconstitucionalidade do Funrural cobrado do produtor rural pessoa física, não se obteve o quorum necessário para modular os efeitos.


No RE nº 377.457/PR, que julgou válida a cobrança da Cofins de profissionais liberais e das sociedades por eles formadas, a questão da modulação pende ainda de decisão por força da interposição de embargos declaratórios.


4. Contagem do termo inicial do prazo qüinqüenal para propositura de ação de repetição fundada na declaração de inconstitucionalidade do tributo pelo STF.


4.1.O antigo posicionamento do STJ


Até o início do ano de 2004 o Superior Tribunal de Justiça a quem cabe dar a última palavra sobre o assunto mantinha o seguinte posicionamento:


a) Quando  a decisão     de  inconstitucionalidade   tiver       sido pronunciada no controle difuso, o prazo conta-se a partir da data da publicação da Resolução do Senado Federal que suspender a aplicação de lei considerada inconstitucional;


b) Quando a inconstitucionalidade   for pronunciada no controle concentrado, o prazo conta-se a partir do  trânsito em julgado da decisão que decretar a inconstitucionalidade.


Nesse sentido o Resp nº 534.986/SC, Rel. p/acórdão Min. Franciulli Netto, DJ de 15-3-2004; REsp nº 423.999/MG. Rel. Min Francisco Peçanha Martins, DJ de 5-4-2004. É o posicionamento que no nosso entender  resulta da interpretação sistemática do ordenamento jurídico.


4.2. Posição atual do STJ


A Primeira Seção   do    STJ   provocou   uma   reviravolta na jurisprudência da Corte, passando a sustentar que o prazo de cinco anos conta-se sempre a partir da extinção do débito tributário pelo pagamento ao teor do art. 168, I, c.c., art. 156, I do CTN, sendo despicienda distinguir a inconstitucionalidade decretada no controle concentrado daquela decretada no controle difuso, conforme ementa abaixo:


“Ementa.


TRIBUTÁRIO.  RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. TRIBUTO DECLARADO INCONSTITUCIONAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. TERMO INICIAL. PAGAMENTO INDEVIDO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO DE OFÍCIO. 1. O prazo de prescrição quinquenal para pleitear a repetição tributária, nos tributos sujeitos ao lançamento de ofício, é contado da data em que se considera extinto o crédito tributário, qual seja, a data do efetivo pagamento do tributo, a teor do disposto no artigo 168, inciso I, c.c artigo 156, inciso I, do CTN.  (Precedentes: REsp 947.233/RJ, Rel. Ministro  LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/06/2009, DJe 10/08/2009; AgRg no REsp 759.776/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/03/2009, DJe 20/04/2009; REsp 857.464/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/02/2009, DJe 02/03/2009; AgRg no REsp 1072339/SP, Rel. Ministro  CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/02/2009, DJe 17/02/2009; AgRg no REsp. 404.073/SP, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, DJU 31.05.07; AgRg no REsp. 732.726/RJ, Rel. Min.  FRANCISCO FALCÃO, Primeira Turma, DJU 21.11.05). 2. A declaração de inconstitucionalidade da lei instituidora do tributo  em controle concentrado, pelo STF, ou a Resolução do Senado (declaração de inconstitucionalidade em controle difuso) é despicienda para fins de contagem do prazo prescricional tanto em relação aos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, quanto em relação aos tributos sujeitos ao lançamento de ofício.” (Precedentes: EREsp 435835/SC, Rel. Ministro  FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, Rel. p/ Acórdão Ministro  JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/03/2004, DJ 04/06/2007; AgRg no Ag 803.662/SP, Rel. Ministro  HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/02/2007, DJ 19/12/2007)


3. In casu, os autores, ora recorrentes, ajuizaram ação em 04/04/2000, pleiteando a repetição de tributo indevidamente recolhido referente aos exercícios de 1990 a 1994, ressoando inequívoca a ocorrência da prescrição, porquanto transcorrido o lapso temporal quinquenal entre a data do efetivo pagamento do tributo e a da propositura da ação.


4. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008”. (Resp nº  1110578/SP, Rel. Min. Luiz Fux, data do julgamento 12-05-2010, DJe de 21/05/2010; RT vol. 900 p. 204).


No mesmo sentido o AgRg nº 958.908/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe de 24-2-2010; EResp nº 435.835/SC, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, Rel. p/ acórdão Min. José Delgado, DJ de 4-6-2007; AgRg no Ag nº 803.662/SP, Rel. Min. Herman Benjamim, DJ de 19-12-2007.


Essa jurisprudência mostra-se praticamente irreversível.


4.3 Posição do STF


O Supremo Tribunal Federal mantém o entendimento de que a discussão acerca do termo inicial para contagem do prazo prescricional para ajuizamento de ação de repetição de indébito tributário não tem caráter constitucional: AgRg no RE nº 417379/PE, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 22-10-2004.


Como é sabido, aquela Alta Corte de Justiça do País não tem aceito a tese da inconstitucionalidade por violação oblíqua de preceito constitucional, exigindo-se a alegação e comprovação da violação frontal do dispositivo constitucional guerreado.


É remota a possibilidade de levar essa questão ao Supremo Tribunal Federal por intermédio de ação rescisória de acórdão que nega o direito de repetição. O fundamento dessa ação rescisória seria a violação d os princípios da legalidade tributária e da moralidade pública. Como se sabe, na ação rescisória não se exige o requisito do pré-questionamento.


4.4. Falta de previsão no CTN para regular a hipótese de declaração de   inconstitucionalidade do tributo


Há, na verdade, uma lacuna no art. 168, do CTN que deixou de regular a contagem do prazo prescricional na hipótese de declaração de inconstitucionalidade de tributo pelo Supremo Tribunal Federal, gerando instabilidade da jurisprudência e, por conseguinte, afetando o princípio da segurança jurídica.


A aplicação do inciso I, do art. 168, do CTN, como tem feito a jurisprudência atual do STJ, considerando que a Corte Suprema costuma levar tempo considerável para decretar em definitivo a inconstitucionalidade de determinado tributo, impossibilitará a repetição na maioria dos casos. Dessa forma, vulnera-se o princípio da legalidade tributária e da tipicidade fechada, bem como o princípio da moralidade da administração pública, permitindo que a Fazenda Pública se aproprie definitivamente de um tributo indevido.


Na realidade, na repetição de tributo considerado inconstitucional não tem aplicação o disposto no inciso I, do art. 168, do CTN que cuida da hipótese de pagamento de tributo maior do que o devido em face da legislação, ou da hipótese de pagamento por erro.


Toda lei que institui um tributo nasce com presunção de constitucionalidade. Seu cumprimento pelo contribuinte se impõe até que seja declarada sua inconstitucionalidade, sob pena de cobrança coativa com imposição de sanções pecuniárias, sem prejuízo das sanções políticas diversas, apesar de condenadas por nada menos que três Súmulas do STF (Súmulas 70, 323 e 547). Daí porque não há que se falar em tributo indevido no momento em que o contribuinte promove seu pagamento. A constatação de que o tributo era indevido somente ocorre com o pronunciamento do STF, após decorridos vários anos, o que torna absolutamente inaplicável o inciso I, do art. 168, do CTN que alude à data da extinção do crédito tributário (pelo pagamento).


Por outro lado, tributo considerado inconstitucional não é um indébito tributário, porque implica reconhecer que a exação cobrada não era tributo.


Como sustentado pelo Min. Franciulli Neto no Resp nº 534.988/SC, “a declaração de inconstitucionalidade de lei instituidora de um tributo altera a natureza jurídica dessa prestação pecuniária, que, retirada do âmbito tributário, passa a ser de indébito sem causa do Poder Público e não de indébito tributário. Com efeito, aquela lei declarada inconstitucional desaparece do mundo jurídico, como se nunca houvesse existido”.


Portanto, o termo inicial do prazo qüinqüenal   para  repetição  de


indébito só pode ser a data do  fato   ou  do ato   que   deu  origem  à dívida. É nesse momento que nasce o direito de ação de repetição, e não antes.


É exatamente a declaração de inconstitucionalidade do tributo que faz nascer a dívida pública objeto de repetição. Antes, não há dívida e, por conseguinte, não há que se cogitar de inércia do contribuinte a ensejar a consumação do prazo prescricional. Portanto, aplicável ao caso o prazo prescricional de cinco anos para cobrança de dívidas passivas da Fazenda Pública previsto no Decreto nº 20.910/32, porém, não lembrado pela jurisprudência de nossos tribunais.


É de todo conveniente que essa matéria seja regulada no art. 168, do Código Tributário Nacional, de sorte a propiciar tratamento uniforme e contribuir para a maior segurança jurídica dos contribuintes. Para tanto bastará acrescentar o inciso III ao referido art. 168 com a seguinte redação:


“III –  na hipótese de recurso extraordinário, a partir da publicação da Resolução do Senado Federal suspendendo a aplicação da lei, e, tratando-se de declaração de inconstitucionalidade ou no caso de repercussão geral, a contar da data da publicação do acórdão.”


Dessa forma, o direito de pleitear a restituição de tributo declarado inconstitucional extinguir-se-ia com o decurso do prazo de cinco anos, a contar da data em que surgiu para o sujeito ativo da obrigação tributária a dívida pública a ser restituída.


 



Informações Sobre o Autor

Kiyoshi Harada

Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.


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