Resumo: Trata o presente artigo da classificação jurídica dos tributos, com base nos ensinamentos do Prof. Paulo de Barros Carvalho, analisando a relevância dos critérios adotados, bem como a destinação do produto da arrecadação tributária. Diferencia-se, ainda, a taxa e o preço público, além de uma breve síntese quanto à contribuição de melhoria.
Palavras-chaves: Teoria da Pentapartição. Teoria da Tripartição. Tributo vinculado e não vinculado. Destinação. Taxa. Poder de Polícia. Serviço Público. Contribuição de Melhoria.
Sumário: 1. Espécies Tributárias. 2. Taxas. 3. Taxa de Serviço Público e Taxa de Polícia. 4. Taxa e Preço Público. 5. Contribuição de Melhoria. 6. Conclusão. 7. Referências Bibliográficas.
1. ESPÉCIES TRIBUTÁRIAS
Em que pese haver várias teorias quanto à classificação dos tributos em espécie, tendo inclusive o STF adotado a teoria da pentapartição: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais; propõe-se, aqui, a adoção da teoria tripartite (ou tricotômica), pela qual os tributos em espécie podem ser divididos em impostos, taxas e contribuições de melhoria, enquadrando-se os empréstimos compulsórios e as contribuições especiais como taxas ou impostos, a depender de como a lei define o fato gerador necessário para caracterizá-los.
Adota-se para essa divisão a mesma teoria adotada pelo art. 5º do CTN e pelo art. 145 da CF, utilizando como critério classificatório a análise do fato gerador (conforme determina o art. 4º do CTN), se vinculado ou não vinculado.
Para classificar o tributo quanto ao fato gerador, é necessário verificar se o Estado tem de realizar, para validar a cobrança, alguma atividade específica relativa ao sujeito passivo. Se a resposta for negativa, o tributo é não vinculado e, portanto, imposto. Se positiva, necessário verificar se referida atividade é diretamente ligada ao sujeito passivo, caso em que estaríamos diante de uma taxa, ou se indiretamente relacionada ao contribuinte, caso em que teríamos uma contribuição de melhoria.
Utilizando-se da teoria tripartite, a destinação do produto da arrecadação é irrelevante para que possamos verificar qual espécie tributária tratada no caso, até mesmo porque o Direito Tributário não se ocupa com momentos ulteriores à extinção do liame fiscal. Corrobora-se, assim, o exposto pelo art. 4º do CTN – a natureza jurídica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualifica-la a denominação e demais características formais adotadas pela lei, bem como a destinação legal do produto de sua arrecadação.
Para os que defendem a teoria pentapartida das espécies tributárias, hoje entendimento majoritário, inclusive adotado pelo STF, o art. 4º do CTN foi parcialmente não recepcionado pela CF/88, importando na classificação da espécie tributária a destinação legal do produto da arrecadação do tributo.
Devemos, ainda, diferenciar os tributos de receita vinculada dos tributos de receita não vinculada, critério este que não se confunde com o critério utilizado para a classificação dos tributos em espécie.
Quando o dinheiro arrecadado com aquele tributo é destinado exclusivamente para determinada despesa, temos que se trata de um tributo de receita vinculada. Já quando o dinheiro arrecadado é destinado para serviços públicos em geral, sem uma vinculação específica, como o que acontece em regra com os impostos, temos que se trata de um tributo de receita não vinculada. Cite-se como exemplo o art. 167, IV, CF, que veda a vinculação de receita de impostos, ressalvando-se alguns casos específicos em que o imposto, embora se trate de um tributo cujo fato gerador é não vinculado, não dependendo de uma atividade estatal, será nesse caso um tributo de receita vinculada.
2. TAXAS
Segundo o Ilmo. Prof. Paulo de Barros Carvalho, taxa são tributos que se caracterizam por apresentarem, na hipótese da norma, a descrição de um fato revelador de uma atividade estatal, direta e especificadamente dirigida ao contribuinte. Diferem assim do imposto, sendo que a análise de suas bases de cálculos deverá exibir, forçosamente, a medida da intensidade da participação do Estado. Se eleger base de cálculo mensuradora de fato estranho a qualquer atividade do Poder Público, então a espécie tributária será outra, um imposto.
Pela análise dos arts. 145, II, CF e 77 do CTN, temos que as taxas são tributos cujo fato gerador é vinculado. São tributos retributivos ou contraprestacionais, uma vez que não podem ser cobradas sem que o Estado exerça o poder de polícia ou preste ao contribuinte, ou coloque a sua disposição, um serviço público específico e divisível.
O ente competente para instituir e cobrar a taxa é o que presta o respectivo serviço ou que exerce o respectivo poder de polícia.
Sabendo que, conforme art. 25, § 1º, CF, os Estados possuem competência material residual, podendo prestar os serviços públicos não atribuídos expressamente à União nem aos municípios, temos como consequência que, indiretamente, a Constituição Federal atribuiu a competência tributária residual para a instituição de taxas aos Estados.
Portanto, são dois fatos que podem ensejar a cobrança de taxas: a) o exercício regular do poder de polícia, que legitima a cobrança da taxa de polícia e, b) a utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição, que possibilita a cobrança de taxa de serviço.
3. TAXA DE SERVIÇO PÚBLICO E TAXA DE POLÍCIA
O poder de polícia é uma atividade administrativa fundada no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, pelo qual o bem comum, o interesse público, podem justificar a restrição ou o condicionamento do exercício de direitos individuais.
O CTN, em seu art. 78, conceitua o poder de polícia como a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
O serviço público caracteriza-se pela prestação de serviços disponibilizados pelo Estado em favor da população. Porém, para que possa ser criada uma taxa de serviço, necessário que se preencham alguns requisitos: os serviços precisam ser específicos, o que ocorre quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade públicas, ou seja, é possível ao contribuinte saber por qual serviço está pagando; e também divisíveis, devendo ser suscetíveis de utilização separadamente, por parte de cada um dos usuários, ou seja, quando é possível ao Estado identificar os usuários do serviço a ser financiado com a taxa.
Não bastasse, necessário que o serviço seja utilizado pelo contribuinte de forma efetiva, quando por ele usufruído a qualquer título; ou potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à disposição do contribuinte mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento – utilização potencial.
A cobrança de taxa por serviço público pode decorrer tanto quando houver a prestação de serviço público propriamente estatal quanto na prestação de serviço público essencial ao interesse público (prestados no interesse da comunidade).
Conforme art. 145, II, CF, a possibilidade de cobrança de taxa por atividade estatal potencial ou efetiva refere-se apenas às taxas de serviço, de forma que só se pode cobrar taxa de polícia pelo efetivo exercício deste poder.
No entanto, em que pese seja necessária a comprovação da efetiva fiscalização para a cobrança da taxa de poder de polícia, nos termos da CF, o STF vem presumindo a existência do serviço de fiscalização nos casos de notoriedade do exercício do poder de polícia prestado, bem como quando, embora não se comprove o efetivo exercício desse poder, esteja em funcionamento órgão administrativo responsável por aquela determinada fiscalização.
Veja que a existência de órgão administrativo não é condição para o reconhecimento da constitucionalidade da cobrança da taxa de polícia, mas constitui um dos elementos admitidos para se inferir o efetivo exercício do poder de polícia, exigido constitucionalmente.
Dessa forma, vem o STF adaptando o Direito às inovações tecnológicas atuais, em que certas fiscalizações podem ser feitas apenas por meio da internet ou outros meios.
4. TAXA E PREÇO PÚBLICO
A taxa e o preço público (tarifa) possuem caráter contraprestacional, remunerando uma atividade prestada pelo Estado. Em ambos os casos é possível identificar o beneficiário do serviço.
Porém, enquanto a taxa está submetida ao regime jurídico tributário, tipicamente público, as tarifas estão sujeitas ao regime contratual, privado. Em decorrência dessa diferenciação de regime jurídico provém várias outras diferenciações.
Sendo tributo, a taxa é prestação pecuniária compulsória, tanto que o próprio CTN permite a cobrança da taxa não só pela utilização efetiva do serviço público, mas também pela utilização potencial, desde que, sendo definido em lei como de utilização compulsória, seja posto à disposição do contribuinte mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento.
Já no preço público a relação é contratual, sendo imprescindível a manifestação de vontade do particular para que surja o vínculo obrigacional.
Conclui-se, assim, conforme especificado pelo Ministro Carlos Velloso no RE 209.365-3/SP, que:
“a) nos casos de serviços públicos propriamente estatais, em cuja prestação o Estado atue no exercício de sua soberania, visualizada sob o ponto de vista interno e externo, esses serviços são indelegáveis, porque somente o Estado pode prestá-lo. São remunerados, por isso, mediante taxa. Exemplos: emissão de passaportes e serviço jurisdicional;
b) nos serviços públicos essenciais ao interesse público, que são os serviços prestados no interesse da comunidade, são remunerados também mediante taxa. E porque as atividades remuneradas são essenciais ao interesse público, à comunidade ou à coletividade, a taxa incidirá sobre a utilização efetiva ou potencial do serviço. Exemplos: serviços de coleta de lixo e sepultamento.
c) quanto aos serviços públicos não essenciais, que quando não utilizados disso não resulta dano ou prejuízo para a comunidade ou para o interesse público, temos que eles são, em regra, delegáveis, vale dizer, podem ser concedidos e podem ser remunerados mediante preço público. Exemplo: serviço postal, telefônico, distribuição de energia.”
Quanto aos serviços de energia elétrica e de telefone, por se tratar de serviços públicos não essenciais, temos que são remuneráveis mediante preço público, mesmo que haja concessão do serviço, já que se trata de um serviço público não essencial que, se não utilizado, não resultará dano ou prejuízo para a comunidade ou interesse público.
No que se refere ao serviço de água e esgoto, por se tratar de serviço público essencial ao interesse público, sendo inclusive obrigatória a ligação de toda construção considerada habitável à rede de canalização de esgoto, conforme art. 11 da Lei 2.312/94, entendemos que, ao contrário do que decidido no AgRg no AG n. 819.677/RJ e no Ag.Rg. no RE 429.664, deve este serviço ser remunerado mediante taxa, mesmo em caso de concessão, já que a natureza jurídica da remuneração decorre da essência da atividade realizadora, conforme exposto, não sendo afetada pela existência da concessão.
5. CONTRIBUIÇÃO DE MELHORIA
Trata-se a contribuição de melhoria de tributo o qual, para que possa ser instituído e cobrado, necessária atuação estatal específica de realizar obra pública que tenha, como consequência, um incremento do valor de imóveis pertencentes aos potenciais contribuintes. O fato gerador da contribuição de melhoria é, justamente, a valorização imobiliária, e não a realização da obra em si.
Tendo-se em vista a vedação do enriquecimento sem causa, a contribuição de melhoria encontra dois limites (art. 81 CTN), um é o limite total para a cobrança do tributo, pelo qual o Estado não pode cobrar mais do que gastou com a obra, ou seja, somando-se o valor pago por todos os contribuintes, o Estado não pode receber mais do que gastou, o que geraria enriquecimento sem causa do próprio Estado.
Além do limite total há um limite individual, pelo qual o contribuinte não pode ser compelido a pagar mais do que o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.
Para que seja possível a tributação, necessário cumprir o art. 82 do CTN. Mesmo sendo a hipótese de incidência do tributo a valorização do imóvel e sendo determinante saber o quantum da valorização e o custo da obra, tem-se admitido a fixação da base de cálculo da contribuição mediante a utilização de montantes presumidos de valorização, indicados pela administração pública, desde que facultada a apresentação, pelo sujeito passivo, de prova em sentido contrário. Entende o STJ que nessas hipóteses, a valorização presumida do imóvel não é o fato gerador da contribuição de melhoria, mas tão somente o critério de quantificação do tributo (base de cálculo), que pode ser elidido pela prova em sentido contrário apresentada pelo contribuinte.
Verifica-se que a lei que cria a contribuição de melhoria deve anteceder o fato gerador (valorização imobiliária), e não o início da obra, mas só será exigido o tributo após aferição do quantum da valorização, sob pena de desrespeitar o princípio da irretroatividade da lei tributária – art. 150, III, a, CF.
6. CONCLUSÃO
Como exposto, a destinação do produto da arrecadação dos tributos não importa ao Direito Tributário, que não se ocupa com momentos ulteriores à extinção do liame fiscal. Distingue-se, nesse ponto, o Direito Tributário do Direito Financeiro.
Ademais, diferenciou-se no presente trabalho a as hipóteses em que incidem a taxa das quais incidem a contribuição de melhoria, distinguindo-se também a incidência da taxa quando do poder de polícia e quando da prestação de serviço público.
Por fim, explanamos um pouco sobre a contribuição de melhoria.
Informações Sobre o Autor
Hugo Cabral Victorio
Procurador da Fazenda Nacional; Pós-graduando em Direito Tributário pelo IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários