Considerações sobre a universalização da educação básica no Brasil

A maior ênfase ao direito à educação formal e, especificamente, a universalização da educação básica cujo conteúdo e objetivo dependem da positiva atuação do Estado.

Mas cabe ressaltar que não se pode reduzir o direito fundamental a educação exclusivamente à educação básica, uma vez que se reconhece a educação como indispensável ao pleno desenvolvimento humano.

Evidentemente que a educação básica é o núcleo essencial do direito à educação mas que representa o primeiro passo desta longa jornada que é o desenvolvimento humano.

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É curial que tenhamos a visão direito à educação[1] além da mera garantia de acesso ao sistema de educação pública e gratuita. O direito à educação é o meio indispensável para se atingir o principal objetivo que é o aprendizado.

E que este seja capaz de construir a autonomia individual visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, sendo capaz de bem exercer a cidadania além de obter a adequada capacitação e qualificação par ao mercado de trabalho.

Atingir maior eficácia do direito social que representa o direito à educação só vem reforçar o perfil de Estado Constitucional que tanto almejamos.

O fato de o conceito de Estado Constitucional admitir um rol aberto de direitos fundamentais e a aplicação direta e imediata requerem uma nova dimensão material, onde a passagem[2] da legalidade para a juridicidade vem ampliar a abrangência de aplicação de normas para além da mera promessa constitucional.

Desta forma, a Administração Pública passa ser responsável, por força constitucional, de promover, garantir e proteger os direitos fundamentais como ente a serviço dos cidadãos.

Desponta o direito fundamental à educação, em primeiro lugar entre os direitos sociais. Sendo também reconhecido como direito fundamental de segunda dimensão, cuja essência formal nasce no Estado Social e se materializa como direito de cunho prestacional.

Há uma desafiadora dificuldade doutrinária e jurisprudencial em se fixar com segurança e precisão o conteúdo[3] e veraz alcance deste direito, bem como verificar com maior certeza as situações em que vige o real status de direitos subjetivo público, uma vez que sua eficácia depende entre outras coisas, da certeza sobre a fundamentalidade dos diversos preceitos e garantias constitucionais.

Na Constituição brasileira[4] vigente, situa-se no capítulo de ordem social, as normas balizadoras para a concretização do direito fundamental à educação.

No bojo constitucional brasileiro consta expressamente previsto que a educação é direito de todos e um dever do Estado, da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade.

Remete-se ao Estado o dever de efetivar o direito à educação mediante a garantia de acesso a educação infantil, ao ensino fundamental e ao ensino médio obrigatório e gratuito perfazendo-lhe o status de direito público subjetivo.

É um dos princípios constitucionais do direito à educação a gratuidade. Mas não é de exclusiva competência da Administração Pública podendo ser exercido pela livre iniciativa, desde que atendidas às exigências e condicionantes constitucionalmente estabelecidas.

Tendo em vista que o Brasil é um Estado Constitucional[5] de regime democrático, o cidadão tem a liberdade de decidir se quer ou não usufruir dos serviços públicos colocados à sua disposição.

Porém, o Estado não goza de liberdade para deixar de oferecer serviços públicos, conforme sua conveniência, quando forem de natureza estratégica, portanto, indelegáveis, tal como é a segurança pública.

Contudo, existem serviços essenciais, como o direito à educação que devem ser exercidos pela administração pública, podendo ser delegados à livre iniciativa.

Na organização constitucional a competência para garantir o acesso ao sistema de educação público em relação à educação básica, principalmente quanto ao ensino infantil é prioritariamente, dos municípios, enquanto que os Estados e o Distrito Federal atuarão no ensino fundamental e médio[6].

Há um dever constitucional da União, Estados e municípios em assegurar a universalização do ensino básico gratuito, organizando seus sistemas educacionais e definindo as formas de colaboração entre os entes da federação brasileira.

A gratuidade da educação básica contida no texto constitucional refere-se ao ensino infantil, fundamental e ao ensino médio perfazendo um direito subjetivo público estabelecido pelo constituinte brasileiro. E, diante do não-oferecimento ou oferta irregular do ensino obrigatório acarreta a responsabilização da autoridade competente.

Juarez Freitas[7] ainda ressalta que cabe ao Estado/Administração executar as políticas públicas à luz da eficiência de forma eficaz, proporcional, bem como reafirma o direito à boa administração pública, respondendo por suas condutas omissivas e comissivas.

Infelizmente ocorre crescente omissão do Estado/Administração em promover, garantir e proteger os direitos fundamentais o que demonstra uma face perversa da realidade social[8] presente, onde o progresso das tecnologias e das riquezas não está em sintonia adequada com as demandas sociais.

Então o status social resta distante das garantias formais inseridas pelo Estado Constitucional. Apesar do aumento da arrecadação tributária e superávit, ocorrido antes da crise financeira em andamento, a concretização material dos direitos sociais revela-se, ainda hoje, insuficiente em reduzir as desigualdades e a exclusão dos menos favorecidos, uma vez que, na prática, estes não usufruem da maioria dos benefícios formalizados constitucionalmente e trazidos pelo progresso econômico da era contemporânea.

Os paradoxos contemporâneos são múltiplos e vão da globalização até a exclusão digital e são desafios a serem enfrentados pelo Estado Constitucional.

E um meio eficaz de mitigar as distorções sociais é a concretização do direito à educação, e inicia exatamente pela efetiva garantia da universalização da educação básica.

É seu objetivo é garantir o acesso ao sistema educacional a todos que desejam deste usufruir, evitar a evasão escolar, criando condições reais para o que o aluno conclua o ciclo de aprendizagem, oferecendo aprendizado de qualidade, capacitando o educando para a cidadania e para o mercado de trabalho.

Somente atendendo de forma plena o direito à educação, a pessoa realmente se encontra inserida na sociedade, galgando ser autônomo, independente e livre.

O Estado Constitucional requer uma Administração Pública mais eficiente e não aceita mais a pura discricionariedade posto que a vinculação do poder público ao texto constitucional vigente e aos princípios administrativos obriga-o, na tomada de suas decisões, a justificar a escolha dos pressupostos de fato, de renda e de poder, com a finalidade de efetivar, na maior medida possível, os direitos fundamentais dos cidadãos.

Os vigentes marcos legais do direito à educação no Brasil, o art. 208 da CF/1988 estabeleceu as diretrizes e mecanismos que devem ser adotados pelo Estado prevendo, no inciso I, expressamente a universalização da educação básica obrigatória e gratuita, dos quatro aos dezessete anos de idade, igualmente assegurada a mesma oferta para aqueles que não tiveram acesso à educação na idade apropriada.

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Inúmeras recentes decisões judiciais têm determinado a garantia de acesso de crianças até cinco anos ao sistema educacional oficial e, em sua falta, ao sistema privado de ensino cabendo ao Município concretizar a garantia constitucional, pagando por vaga no estabelecimento privado de ensino.

Portanto, tal direito público subjetivo, direito à educação mesmo para o ensino infantil (de zero de cinco anos) deve ser cumprido, independente de ter ou não estabelecimento oficial de ensino próximo a residência do educando.

O direito à educação básica está dentre rol de direitos sociais em que não há dúvidas quanto à imperatividade da norma e exigibilidade do bem tutelado.

Entretanto, diante dos posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais majoritários, a universalização do direito à educação gratuita vem sendo relativizada dentro da própria ordem constitucional. Principalmente porque o significado da universalização fica restrita à garantia de acesso à educação infantil, ao ensino fundamental e ao ensino médio nos estabelecimentos oficiais de ensino.

E onde não houver vagas, e os jurisdicionados não puderem recorrer ao sistema privado de ensino restarão sem a devida tutela de seu direito à educação.

Ao Estado incumbe a criação de políticas públicas e condições objetivas e a manutenção desse direito.

Realizando uma interpretação mais extensiva do art. 205 do CF/1988 percebemos que o direito à educação é o direito de todos, o que acarreta o princípio da isonomia e da universalidade. Não pode o direito à educação ficar restrito de educação básica.

Intensificam-se os debates sobre a complexidade da eficácia do direito à educação e do real alcance, que lhe foi atribuído constitucionalmente e sobre a necessidade de implementar a universalização da educação básica.

O art. 21 da atual LDB de 1996 a educação vista como processo de formação integral do cidadão, compõe-se em educação básica, formada pela educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio.
Ratificou o art. 22 da LDB que a finalidade da educação básica é o desenvolvimento do educando para o exercício da cidadania e a capacitando-o para o mercado de trabalho.

Como reforço positivo para melhor viabilizar essa garantia constitucional, a Lei 11.700, de 13 de junho de 2008, acrescentou o inciso X ao caput do art. 4º da LDB (Lei 9.394/1996) visando assegurar a vaga na escola pública de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima a sua residência de toda criança a partir de quatro anos de idade.

Apesar de excluir as crianças na faixa etária de zero a três anos deste benefício, tal alteração impôs à Administração Pública a obrigação de criar condições materiais que garantam à criança o acesso ao estabelecimento de ensino próximo à sua moradia. Tal acessibilidade garante também a redução de evasão escolar e propicia maior controle da escola sobre a frequência discente.

Já está cientificamente comprovado que se iniciando o processo educativo na primeira infância se aumentam enfaticamente as possibilidades de se obter positivos resultados eficazes. Assim quanto mais cedo for iniciado o processo educativo, melhor será a qualidade de absorção e aproveitamento por parte do educando e, também serão maiores os benefícios para toda a sociedade.

A garantia de acesso à educação e a faixa etária do discente é relevante frisar que a universalização bem como a obrigatoriedade e gratuidade também atingem os que não estão em idade apropriada, a fora isto, tais garantias restam confirmadas no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei 8.069, de 13/07/1990 e também no art. 5º da LDB (Lei 9.394/96).

Reafirmam os ditames constitucionais que a distribuição de recursos públicos dará prioridade ao atendimento das necessidades do ensino obrigatório no que se refere à universalização, a garantia de padrão de qualidade e a equidade conforme o plano nacional de educação.

No plano internacional os líderes do mundo em 2000 assumiram o compromisso de alcançar os objetivos do desenvolvimento do milênio e que incluem a universalização do ensino básico e a redução da pobreza extrema, pela metade até 2015 (estes objetivos foram elaborados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD e todos os cento e noventa e um Estados-membros das nações unidas assumiram concretizar este, entre oito metas do milênio).

Para se entender o porquê da universalização da educação básica basta ler o que Celso Furtado[9] explicou a respeito da formação econômico-social brasileira e a especificidade de nosso desenvolvimento, onde sintetizou sua visão crítica sobre os rumos das opções que o Brasil reiteradamente tem pautado dentro de clássico dilema: a construção de uma sociedade ou de uma nação onde os seres humanos possam produzir dignamente a sua existência, ou a permanência do projeto de sociedade que tanto aprofunda sua dependência, subordinada aos grandes interesses dos centros hegemônicos do capitalismo mundial.

De maneira mais enfática, Florestan Fernandes[10] e Francisco de Oliveira rechaçam a tese dual que atribui nossos impasses para nos desenvolvermos a existência de um país cindido entre o tradicional, o atrasado, o subdesenvolvido e o moderno e desenvolvido, sendo as características primeiras impeditivas do avanço das segundas. Ressaltando os supracitados autores a relação dialética entre o arcaico, atrasado, tradicional e subdesenvolvido e, o moderno e o desenvolvido na especificidade ou particularidade de nossa formação social capitalista.

Quase meio século depois de publicar "Crítica à razão dualista", Francisco de Oliveira[11] atualizou a sua análise com adendo de um novo capítulo chamado em seu título "O ornitorrinco". Para o referido autor, o ornitorrinco traz a síntese emblemática das mediações do tecido estrutural de nosso subdesenvolvimento e a associação subordinada ao centro hegemônicos do capitalismo e os impasses a que fomos conduzidos no presente.

Portanto, a metáfora do ornitorrinco nos remete, então, a particularidade estrutural de nossa formação econômica, social, política e cultural, que nos transforma num monstrengo em que a "exceção" se constitui em regra, como forma de manter o privilégio de minorias.

As relações de poder e de classe que foram sendo construídas no Brasil, observou o autor, permitiram apenas parcial e precariamente a vigência do modo de regulação fordista, tanto no plano tecnológico quanto no plano social. Da mesma forma, a atual mudança técnico-científica de natureza digital-molecular, que imprime uma grande velocidade à competição e à obsolescência dos conhecimentos, torna nossa tradição de dependência e cópia ainda mais inútil.

Advindo do ciclo de reformas educativas do golpe civil-militar centrado na ideologia do capital humano[12], transitamos para um ciclo de reformas sob a ditadura do capital. Efetivou-se a passagem, perversamente, pela profunda regressão das relações sociais e com asseveramento da mercantilização da educação em seu plano institucional e no plano pedagógico.

No âmbito do pensamento pedagógico, o discurso em defesa da educação é dominantemente retórico e colocado de forma inversa tanto na ideologia do capital humano (a conjuntura da década de 1960 a 1980), quanto nas teses, igualmente ideológicas, da sociedade do conhecimento, da pedagogia das competências, e da empregabilidade (décadas de 1980 e 1990).

No primeiro momento, a noção de capital humano[13] mantinha, no horizonte da classe dominante, a ideia da educação como forma de integração, ascensão e mobilidade social.

No segundo momento, com a crescente incorporação de capital morto com a ciência e a tecnologia, como forças produtivas diretas, e a ampliação do desemprego estrutural e de um contingente de trabalhadores supérfluos, as noções de sociedade do conhecimento, qualidade total, cidadão produtivo, competências e empregabilidade indicam que não há lugar para todos e o direito social e coletivo se reduz ao direito individual.

Tais noções, porém, possuem um poder ideológico fatal e apresentam a realidade de forma duplamente invertida: o nosso desenvolvimento está freado porque temos baixos níveis de escolaridade e os trabalhadores não possuem emprego porque não investiram em sua empregabilidade, isto é, o quantum de educação básica e de formação técnico-profissional que os constitua reconhecidos e desejáveis pelo mercado como "cidadãos produtivos".

Foi no ensino médio, definido na Constituição Brasileira de 1988 e pela LDB de 1996 que podemos melhor perceber o quanto a sua universalização e a democratização que são necessárias ao projeto de sociedade. E, o Decreto 2.208/97 veio a restabelecer o dualismo entre a educação geral e específica, humanista e técnica, destroçando, de forma autoritária, o pouco ensino médio integrado existente, mormente da rede CEFET.

A educação que oferece as bases materiais de desenvolvimento politécnico e tecnológico e que oferece também os fundamentos científicos gerais de todos os processos de produção e das diferentes dimensões da vida humana.

Os resultados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica[14] (Ideb) divulgado em 09 de setembro de 2014 e referente aos dados do ensino fundamental de 2013, mostraram novamente um quadro alarmante da educação brasileira. Pois há uma cruel estagnação dos indicadores, e até mesmo sensível queda na etapa final (do sexto ao nono anos) desse módulo e no ensino médio, este com índices ainda mais desanimadores.

E também, visto o ciclo médico como fase de estudos preparatórios para o acesso à universidade, o perfil do Ideb projeta a chegada às faculdades de grande contingente de analfabetos funcionais portando graves deficiências no aprendizado.

Desde 2005 não se registrou o avanço na média final de aferição, que ficou em 3,7 num escala até dez. Apesar de que o Brasil continua registrando positivos saltos na qualidade de ensino na primeira etapa do módulo (de primeiro ao quinto anos).

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Porém tal esforço não se reflete nos ciclos seguintes, apesar de que o ensino médio fluminense passou da décima-quinta posição para a quarta colocação no Ideb entre as vinte e sete redes públicas estaduais do Brasil.

No Sudeste, o Rio de Janeiro, ficou atrás apenas de São Paulo, e registrou o segundo maior crescimento das médias do país. Apontando ainda que a taxa de evasão decresceu, de 16,5% para 7,3%.

Afinal para galgarmos a plena universalização da educação básica é preciso decifrar a esfinge, e trazer a lume um projeto de desenvolvimento sustentável que se afaste do consenso neoliberal, o que demandará um grande investimento em ciência e tecnologia como condição indispensável para efetiva universalização democrática da educação básica.

 

Referências
FRIGOTTO, Gaudêncio. A relação da educação profissional e tecnológica com a universalização da educação básica. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302007000300023. Acesso em 07.09.2014.
COSTA, Deise Souza. A universalização da educação básica no Estado Constitucional. Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em São Paulo, nos dias 04, 05, 06 e 07 de novembro de 2009.
MORAIS JUNIOR, João Nunes. Estado Constitucional de Direito: breves considerações sobre o Estado de Direito. Londrina, Paraná: Revista de Direito Público, v.2, n.3, p. 199-136, set./dez.2007.
BONAVIDES, Paulo. Do Estado liberal ao Estado Social. 7. ed., São Paulo: Malheiros, 2004.
FURTADO, Celso. Formação econômica do Brasil. 14. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1976.
DE OLIVEIRA, Francisco. Crítica à razão dualista/O ornitorrinco. São Paulo: Editora Boitempo, 2003.
­­­­­­­­­­­____________________. A Economia Brasileira: Crítica a razão dualista. Disponível em: http://www.cebrap.org.br/v2/files/upload/biblioteca_virtual/a_economia_brasileira.pdf Acesso em 07/09/2014.
Portal G1: http://g1.globo.com/educacao/noticia/2014/09/veja-notas-do-ideb-2013-no-ensino-medio-em-todos-os-estados.html “Veja as notas do Ideb 2013 no ensino médio em todos os estados”. Acesso 07.09.2014.
 
Notas:
[1] O direito à educação é parte de um conjunto de direitos denominados de direitos sociais, que têm como principal inspiração o valor da igualdade entre as pessoas. Tal direito fora reconhecido apenas na Constituição Federal de 1988. Anteriormente o Estado brasileiro não assumira a obrigação formal de garantir a educação de qualidade a todos os brasileiros, o ensino público era tratado como mera assistência e amparo dado àqueles que não podiam pagar. A responsabilidade do Estado foi finalmente repensada e promoveu-se a educação fundamental passou a ser o seu dever.

[2]Em decorrência dessa afirmação de normatividade da Constituição, a relação entre poder político e Direito passou a ter um novo enfoque: a passagem do Estado Legislativo para o Estado Constitucional. O que implicou na transferência da garantia contra o uso arbitrário do poder do Legislativo para o Judiciário, órgão este encarregado de assegurar o respeito à Constituição e a unidade do ordenamento jurídico.

[3] A Constituição da República vigente, quando adota como princípio a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, compreendido como efetivação do objetivo republicano de “promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”, prevê uma sociedade com escolas abertas a todos, em qualquer etapa ou modalidade, bem como o acesso a níveis mais elevados de ensino. A importância de fazer do direito de todos à educação um movimento coletivo de mudança aponta para a adoção de políticas públicas inclusivas, para a transformação dos sistemas educacionais e das práticas sociais, que envolvem as relações com as famílias e a comunidade. As políticas educacionais devem prever a eliminação das barreiras à educação dos alunos com deficiência, com síndromes, com altas habilidades/superdotação prevendo o atendimento às necessidades educacionais especiais, promovendo a participação a partir de novas relações fundamentais para uma socialização humanizadora.

[4] Além da Constituição Federal Brasileira de 1988 existem ainda duas outras leis que regulamentam e complementam o direito à educação, a saber: o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) de 1990 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996. Tais legislações consagram a escola pública fundamental a todos os brasileiros, já que nenhuma criança, jovem, adolescente ou adulto não poderá deixar de estudar por falta de vaga.

[5] O Estado constitucional de direito, portanto, assegura a centralidade da pessoa humana e a garantia de seus direitos fundamentais como vínculos estruturais de toda a dinâmica política que implica o princípio democrático. A passagem do Estado legislativo para o Estado constitucional pressupõe a afirmação do caráter normativo das constituições, que integram um plano de juridicidade superior, vinculante e indisponível para todos os poderes do Estado. Peña Freire afirma que “essa refundação ou configuração do ordenamento jurídico, não supõe, no fundo, senão um redimensionamento do princípio da legalidade".

[6] O direito à educação aponta para a educação inclusiva que pressupõe novas relações pedagógicas centradas nos modos de aprender das diferentes crianças e jovens e de relações sociais que valorizam a diversidade em todas as atividades espaços e formas de convivência e trabalho. Dessa forma, na efetivação do direito de todos à educação, o direito à igualdade e o direito à diferença são indissociáveis e os direitos específicos servem para eliminar as discriminações e garantir a plena inclusão social.

[7] Professor Titular e Coordenador da Pós-Graduação em Direito da PUCRS, Professor da UFRGS e da Escola Superior de Magistratura – AJURIS, Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo – IBDA, Membro da Diretoria de Pesquisa do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito. Conselheiro da SBDP. Advogado, Consultor e Parecerista.

[8] A supremacia constitucional atribui à Constituição função de ser a norma conformadora da ordem jurídica. De modo que a produção normativa decorre da própria constituição e é nesta, portanto, que se encontra o fundamento de validade, tanto formal como substancial, das normas do Estado. Isso acarreta que, no exercício da atividade jurisdicional, a subordinação à legalidade existe somente em função de leis que atendam as formas, os limites e os conteúdos determinados pela constituição. Ao Poder Judiciário, portanto, caberá, em último caso, a função de aproximar o modelo normativo existente na constituição da prática efetiva do Estado, função esta a ele atribuída pelo próprio modelo do Estado constitucional de direito.

[9] Celso Monteiro Furtado (1920-2004) foi um economista brasileiro e um dos mais destacados intelectuais ao longo do século XX.

[10] Florestan Fernandes (1920-1995) foi sociólogo e político brasileiro. Foi deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores. O nome de Florestan Fernandes está obrigatoriamente associado à pesquisa sociológica no Brasil e na América Latina. Sociólogo e professor universitário, com mais de cinquenta obras publicadas, ele transformou o pensamento social no país e estabeleceu um novo estilo de investigação sociológica, marcado pelo rigor analítico e crítico, e um novo padrão de atuação intelectual. O ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que foi orientado em seus trabalhos acadêmicos por Florestan, estabeleceu com ele forte relação afetiva, mantida até a morte do sociólogo.

[11] Francisco Maria Cavalcanti de Oliveira, mais conhecido como Chico de Oliveira (1933) é sociólogo brasileiro, um dos fundadores do Partido dos Trabalhadores. Formou-se em Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia da Universidade do Recife, atual Universidade Federal de Pernambuco. Professor aposentado de Sociologia do Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), foi um dos fundadores do Cebrap. Coordenador-executivo do Centro de Estudos dos Direitos da Cidadania – Cenedic – da USP, deixou o Partido dos Trabalhadores e filiou-se ao PSol (Partido Socialismo e Liberdade).Em 2006 foi-lhe concedido o título de doutor honoris causa na UFRJ, por iniciativa do Instituto de Economia da UFRJ. Em 2008, o de professor emérito pela FFLCH-USP e, em 2010, o de doutor honoris causa na UFPB.

[12] Capitual humano é o conjunto de capacidade, conhecimentos, competências e atributos de personalidade que favorecem a realização de trabalho de modo a produzir valor econômico. São atributos adquiridos por um trabalhador por meio da educação, perícia e experiência. Muitas das primeiras teorias da Economia referem simplesmente a força de trabalho, um dos três fatores de produção, como recurso fungível, isto é, homogêneo e facilmente intercambiável. Adam Smith definiu o capital humano da seguinte forma:"Em quarto lugar, as habilidades adquiridas e úteis de todos os habitantes ou membros da sociedade. A aquisição de tais talentos, por meio da manutenção do adquirente durante a sua educação, estudo ou aprendizagem, sempre custa uma despesa real, que é capital fixo e realizado, por assim dizer, em sua pessoa. Esses talentos, fazem parte de sua fortuna, tal como também da sociedade à qual ele pertence. A destreza melhorada de um trabalhador pode ser considerada a mesma que uma máquina ou um instrumento de comércio, que facilita o trabalho, e que, embora os custos, que reembolsa as despesas com um lucro. " Logo, Smith argumentou, que a força produtiva do trabalho é dependente da divisão do trabalho:"O maior aprimoramento nas forças produtivas do trabalho, e a maior parte da habilidade, destreza, e julgamento com o qual é dirigido em qualquer lugar, ou aplicada, parecem ter sido os efeitos da divisão do trabalho".

[13] A importância do capital humano é explícito na abordagem alterada das Nações Unidas para avaliação comparativa do desenvolvimento económico das diversas nações da economia mundial. As Nações Unidas publicaram o Relatório de Desenvolvimento Humano sobre o desenvolvimento humano em diferentes países com o objetivo de avaliar a taxa de formação de capital humano nesses países. O indicador estatístico de estimativa de Desenvolvimento Humano de cada nação é o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). É a combinação do "Índice de Esperança média de Vida", "Índice de educação" e o "Índice de Rendimento". O índice de Esperança média de vida revela o padrão de saúde da população no país, índice de educação revela o padrão de ensino e a taxa de alfabetização da população; e o índice de rendimento revela o padrão de vida da população. Se todos estes índices têm a tendência de crescimento durante um longo período de tempo, é refletido em tendência crescente no IDH. O Capital Humano é desenvolvido pela educação, saúde e qualidade de vida. Portanto, os componentes do IDH a saber são o, Índice de Esperança média de Vida, Índice de Educação e Índice de Rendimento estão diretamente relacionadas à formação do capital humano dentro da nação. IDH é o índice de correlação positiva entre a formação de capital humano e o desenvolvimento econômico.

[14] O Ideb é indicador da qualidade da educação básica brasileira e revela a situação do ensino tanto nas instituições públicas como privadas. A aplicação do Ideb é atribuição do Inep, órgão subordinado ao MEC. A nota do Ideb é obtida a partir da combinação de médias obtidas por estudantes em exames nacionais tais como Prova Brasil ou Saeb e das taxas de aprovação: o resultado varia entre zero a dez. Os exames são aplicados a cada dois anos (o primeiro dado disponível é de 2005).


Informações Sobre o Autor

Gisele Leite

Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.


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