Resumo: Este trabalho consiste em uma pesquisa doutrinária e jurisprudencial, a fim de elucidar todas as características, fases e procedimentos vinculados à fase de investigação e inquérito policial. Associando ainda no entendimento a recente discussão envolvida sobre o projeto de emenda constitucional número 37 de 2011, que tinha como objeto a inclusão de um novo parágrafo ao art. 144 da Constituição Federal de 1988, que atribuiria uma redação firmando a competência exclusiva da polícia judiciária na instauração do Inquérito Policial.
Palavras-chave: inquérito policial; polícia judiciária; Ministério Público; delegado de polícia; PEC 37.
1. INTRODUÇÃO
Na conjuntura do ordenamento jurídico brasileiro podem-se encontrar diversas searas que buscam resolver o conflito de interesses oriundos de nossa sociedade. E quando a sociedade se depara com uma prática de um fato delituoso, é atribuição do Estado tutelar sobre qual medida é cabível para esclarecer o fato e ainda punir como medida educativa a fim de não ocorrer novos delitos.
E neste cenário jurídico é que nos deparamos com certas estruturas, formalidades e órgãos que possuem diferentes atribuições, contudo necessárias para a efetiva prestação jurisdicional do Estado na busca pela verdade real.
Nesse escopo, o inquérito policial será trazido como forma de pesquisa para aclarear o entendimento de sua função e finalidade através de posicionamentos de doutrinadores e jurisprudência. E no sentido de fomentar a discussão e a compreensão sobre o tema, aludimos sobre o projeto de emenda à constituição que no ano de 2011 buscou anexar em nossa carta magna um novo parágrafo que refletia diretamente sobre o inquérito policial, presidido pela polícia judiciária.
2. INQUÉRITO POLICIAL
O inquérito policial consiste ser uma fase pré-processual, onde será apurado através de diligências as circunstâncias da infração penal, suposta autoria e os demais pontos que podem elucidar o fato existente. Por ser uma fase pré-processual, este ato de investigação é encaminhado sempre ao titular da ação penal, que analisará as diligências realizadas, e podendo ainda requerer novas ações a fim de esclarecer a infração. O conceito do inquérito policial e sua fase de investigação podem ser compreendidos através do entendimento de Pacelli[1] que assim menciona;
“O inquérito policial, atividade específica da polícia denominada judiciária, isto é, a Polícia Civil, no âmbito da Justiça Estadual, e a Polícia Federal, no caso da Justiça Federal, tem por objetivo a apuração das infrações penais e de sua autoria (art. 4º,CPP). A denominação de polícia judiciária somente se explica em um universo em que não há a direção da investigação pelo Ministério Público, como é o brasileiro”.
No conceito citado acima, pode-se perceber que a denominação de polícia judiciária não se estabelece em face da ação penal, e sim por ser uma instituição de direito que apura os fatos das infrações penais, de modo que contribui sendo um auxiliar à justiça, além de garantir a segurança individual.
Com o advento da Lei nº. 9.043/95 tornou mais preciso o entendimento sobre o local de atuação das atividades da polícia judiciária, assim estabelecendo que a polícia judiciária atuará no território de suas respectivas circunscrições, para que ao fim possa elucidar os fatos e a possível autoria da infração penal.
Diante do conceito já relatado, deve-se lembrar que além de servir de base para uma possível ação penal, a investigação realizada e formalizada através do inquérito policial servirá como subsídio para possíveis providências cautelares, que necessitem ser impostas pelo órgão judiciário.
A atividade é meramente administrativa, mesmo sendo realizada pela polícia judiciária. Trata-se de um procedimento inquisitorial, e diferentemente da ação penal, não existe ampla defesa durante o seu curso.
3. ATRIBUIÇÃO DE INVESTIGAÇÃO
A fim de fomentar mais ainda o entendimento sobre o inquérito policial, deve-se lembrar que a polícia judiciária não é a única responsável pela realização de investigação criminal e ao fim o inquérito. Diante do art. 4º, parágrafo único do CPP percebe-se que a justiça militar através de sua competência pode realizar o inquérito policial militar (IPM), assim como o Ministério Público o inquérito civil público (ICP) exposto no art. 129, III da CF. Essas possibilidades de inquérito não conduzidas pela polícia judiciária são chamadas de inquéritos extrapoliciais[2].
4. CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL
O inquérito policial, por ser um procedimento formal não admite a possibilidade de ser realizado e apresentado de forma verbal, assim quando citamos suas características é indispensável que se mencione que o inquérito policial é escrito. Além desta característica o inquérito é sigiloso, conforme aduz a Constituição Federal em seu art. 5º, XXXIII.
Somente a polícia judiciária possui capacidade legal de realizar a investigação e o inquérito policial, e essa característica é vista pela oficialidade que o inquérito policial possui. Uma das características também inclusas quando se fala em inquérito é o da oficiosidade, que sinteticamente aduz que a autoridade policial independente de provocação, ou seja, deve instaurar o inquérito de modo ex office, sempre que tiver conhecimento da prática de um crime. Nos crimes de ação penal pública condicionada à representação e nos crimes de ação penal privada o inquérito só poderá ser iniciado a requerimento do ofendido ou de quem tenha qualidade para requerer, conforme disposto no art. 5º, §§ 4º e 5º do CPP.
Conforme previsto na Constituição Federal, precisamente em seu art. 144, § 4º o inquérito será presidido por delegado de polícia de carreira, assim esta característica da autoritariedade é a que delimita de quem será o responsável legal pela condução do inquérito. Como citado inicialmente por Pacelli, na justiça estadual pelo delegado de polícia civil, e na justiça federal pelo delegado de polícia federal.
Após iniciado o inquérito policial, este não pode ser arquivado pela autoridade, representando assim uma indisponibilidade por parte da polícia judiciária de arquivar o inquérito sem envio ao Ministério Público, e diante desta impossibilidade de arquivamento é que temos a característica da indisponibilidade presente nos inquéritos policiais.
O Código de Processo Penal, especificamente em seu art. 14, discorre que o ofendido ou seu representante legal, no curso do inquérito poderão requerer qualquer diligência à autoridade, contudo fica facultado a este a realização ou não. E diante deste artigo e entendimento é que se menciona a última característica do inquérito policial, a forma inquisitorial do inquérito.
5. REFLEXO DO INQUÉRIO POLICIAL NA AÇÃO PENAL
Por ser um procedimento pré-processual, de caráter inquisitorial, não oferecendo ao suspeito de autoria qualquer possibilidade de ampla defesa, conforme rege nossa Constituição Federal em curso de uma ação penal, o inquérito policial torna a ter um valor probatório relativo, ou seja, tem um valor meramente informativo para a elucidação dos fatos que compõe a infração penal.
Assim, mesmo que o suposto autor do crime tenha confessado em fase de inquérito policial, essa confissão só terá valor ao juiz; em ação penal; se composto de outros elementos probatórios que caracterizem a real confissão. E diante disto preceitua o art. 155 do CPP, que assim menciona:
“O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.”
O inquérito policial por se tratar de uma fase pré-processual na linha da persecução penal, e não sendo um ato de manifestação do poder jurisdicional, não possui finalidade de instruir ou influenciar na ação penal, e por ser um ato totalmente informativo para a formação da opinio delict do titular da ação penal, não carrega consigo vícios para a ação penal, pois diante de um processo penal o suspeito terá possibilidade de contestar as provas, e o poder jurisdicional de produzir novas provas para a busca da veracidade dos fatos. Assim como os vícios, as nulidades no curso do inquérito policial também não geram nulidades no curso da ação penal, pois será renovado todo o conjunto da prova.
Diante da persecução penal em face do inquérito policial, se percebe que o inquérito é dispensável quando o ofendido ou Ministério Público possui fortes elementos para a propositura da ação penal como explica Tourinho Filho[3]:
“O inquérito policial é peça meramente informativa. Nele se apuram a infração penal com todas as suas circunstâncias e a respectiva autoria. Tais informações têm por finalidade permitir que o titular da ação penal, seja o Ministério Público, seja o ofendido, possa exercer ojus persequendi in judicio, isto é, possa iniciar a ação penal.Se essa é a finalidade do inquérito, desde que o titular da ação penal (Ministério Público ou ofendido) tenha em mãos as informações necessárias, isto é, os elementos imprescindíveis ao oferecimento de denúncia ou queixa, é evidente que o inquérito será perfeitamente dispensável.”
Cabe salientar que para a propositura da ação penal, não pode a acusação valer-se de elementos oriundos somente de convicção, e sim de elementos que demonstrem claramente a justa causa da imputação, mesmo quando dispensado o inquérito policial pelo ofendido ou titular da ação.
6. INCOMUNICABILIDADE
O suspeito pela prática de infração penal que esteja preso na fase de inquérito policial estará sujeito à incomunicabilidade externa, salvo quando esta comunicação for com seu advogado, conforme dispõe o Estatuto da OAB, em seu art. 7º, III. Esta característica não é regra, porém pode ser requerida ao juiz, que fundamentará e obedecerá ao prazo do art. 21 do CPC, que estipula o prazo máximo de 3 dias. E diante desta discussão explica Fernando Capez[4]:
“Para muitos doutrinadores, a incomunicabilidade do preso foi proibida pela atual ordem constitucional, que a vedou durante o estado de defesa (CF, art. 136, § 3º, IV). Ora se não se admite a incomunicabilidade durante um estado de exceção, o que não dizer da imposta em virtude de mero inquérito policial. Também o art. 5º, LXII e LXIII, do mesmo texto teria revogado o dispositivo infraconstitucional, já que a incomunicabilidade tornaria as garantias ali consagradas inócuas”.
É compreendido então que esta incomunicação esta extinta pelo fato de que, se no período de exceção a incomunicabilidade não é admitida, não será então imposta em fase do inquérito policial.
7. CONHECIMENTO DA INFRAÇÃO PENAL
Anteriormente citamos conceitos, característica, titularidade do inquérito policial, contudo não se pode falar de inquérito policial sem citar a forma do conhecimento do crime, ora motivo de uma investigação e apuração dos fatos. A expressão “notitia criminis” que significa a notícia do crime, é o reconhecimento do fato pela autoridade policial de forma espontânea ou provocada, e tão somente a este reconhecimento é que se dará início as investigações. O conhecimento de forma espontânea do fato delituoso, também encontrado na doutrina de Fernando Capez[5] como Notitia criminis de cognição direta ou imediata, é onde a autoridade policial possui contato direto com a infração penal diante das suas atividades do dia a dia.
A forma provocada de ter conhecimento do fato, também encontrada na doutrina em duas possibilidades, tais como: a) notitia criminis de cognição direta ou mediata, que se caracteriza por ser uma forma de conhecimento do fato através de um ato formal, como por exemplo, a representação do ofendido; b) notitia criminis de cognição coercitiva, na qual ocorre quando há prisão em flagrante do autor.
8. INICÍO DO INQUÉRITO POLICIAL
Nos crimes de ação penal pública incondicionada, a autoridade tem obrigação de dar início ao inquérito policial, independentemente de provocação, através de portaria, explica Norberto Avena[6]:
“[…] Tal forma de instauração independe de provocação de interessados, devendo ser procedida sempre que tiver a autoridade ciência da ocorrência de um crime, não importando a forma de que se tenha revestido a noticia criminis (registro de ocorrência, notícia veiculada na imprensa etc.).”
Também deverá dar início ao inquérito policial, quando esta atribuição for requisitada por autoridade judiciária ou o Ministério Público, conforme dispõe o art. 40 do CPP.
A iniciativa de instaurar o inquérito pode ser dar também através da solicitação da vítima ou de seu representante legal, não possuí natureza de ordem, ao contrário da última possibilidade citada, mas sim de mera solicitação. Presente a possibilidade de iniciar o inquérito a autoridade policial, deverá incluir se possível, algumas informações no inquérito, e para tornar claro quais são estas informações cita-se trecho da obra de Norberto Avena[7] “[…]o qual deverá conter, sempre que possível, a narração do fato, a individualização do indiciado, as razões de convicção ou presunção da autoria e o rol de testemunhas (art. 5º, § 1º, do CPP)[…]”.
Quando a autoridade policial judiciária se deparar com uma prisão em flagrante, esta deve iniciar imediatamente, pois o auto de prisão em flagrante (APF) é forma inequívoca de instauração de inquérito, dispensando até a portaria inicial dos demais inquéritos.
Na ocorrência de crimes de ação penal pública condicionada, o inquérito policial iniciará diante da representação do ofendido ou de seu representante legal, iniciará também por requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público (MP), desde que observada a existência de representação prévia do ofendido ou de quem lhe represente legalmente, e ainda nos casos de prisão em flagrante deve ser observada a presença do ofendido ou representante do auto de prisão e que ainda tenha este manifestado junto a autoridade a apuração da infração penal.
A ação penal pública condicionada é subdivida em duas possibilidades de representação, tais como: a) representação do ofendido; e b) à requisição do Ministro da Justiça. E a requisição do Ministro da Justiça é também considerada forma inequívoca de início do inquérito diante dos crimes que necessitem de tal representação.
Nos crimes de ação penal privada, conforme preceitua o art. 5º, § 5º do CPP, a autoridade policial só poderá dar início ao inquérito diante de requisição do ofendido ou de seu representante legal, e no caso de morte ou ausência de representante legal, poderá o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Vale ressaltar que se não preenchida esta formalidade de requisição, poderá o suspeito arguir habeas corpus, visando o trancamento do inquérito policial.
O ofendido ou seu representante legal diante de um fato delituoso que encena a possibilidade de uma ação penal de natureza privada, e que requerer junto à autoridade judiciária ou Ministério Público a instauração de inquérito policial ou providências que desta derivem, atribuirá a este a capacidade de requerer junto a polícia judiciária a instauração do inquérito, lhe fornecendo a representação da vítima.
A prisão em flagrante é passível de ocorrência nas infrações de ação penal privada, desde que haja autorização da vítima ou seu representante, e que seja realizado no prazo de 24 horas contado da prisão o auto de prisão em flagrante.
9. FORMALIDADES DO INQUÉRITO
O inquérito policial será composto por peças inaugurais, sendo elas: a) portaria; b) auto de prisão em flagrante; c) requerimento do ofendido ou seu representante; d) requisição do MP ou da autoridade judiciária; e e) representação do ofendido ou de seu representante legal, ou requisição do ministro da justiça, quando se tratar de ação penal pública condicionada.
Não há uma ritualística por trás dos atos durante o inquérito policial, ou seja, não existem ordens que devem ser seguidas, o delegado de polícia pode seguir a ordem de investigação que lhe for pertinente para que no fim possa elucidar no inquérito os fatos e a suposta autoria. Mas, mesmo inexistindo uma ordem de atos, poderá a autoridade policial tomar algumas providências durante o inquérito policial, e estas providências estão dispostas no art. 6º do CPP.
O delegado de polícia poderá deixar de realizar alguma destas providências se achar necessário, contudo a única providência que não pode ser deixada de realizar, é o procedimento do inciso VII do art. 6º do CPP, quando a infração penal for em face do estado físico do ofendido, sendo esta providência matéria indispensável para conclusão final e elucidação do fato, como aponta Norberto Avena[8] (2014, p. 170) “[…] Esta relação não é exaustiva – ao contrário, é meramente exemplificativa -, mesmo porque o próprio art. 6.º, em seu inciso III, é genérico[…]” .
10. PRAZOS
A policia judiciária tendo conhecimento da infração penal terá o prazo de 30 dias para conclusão do inquérito caso o suspeito se encontrar em liberdade, e o prazo de 10 dias se o suspeito pela prática da infração estiver preso. Ressalta-se que o prazo tem como marco inicial o dia da prisão, enquanto que na hipótese do suspeito estiver em liberdade o marco inicial iniciará a partir da expedição da portaria, quando se tratar de inquérito instaurado pela autoridade policial ex officio (art. 5º, I, do CPP) ou a partir do recebimento da autoridade policial a requisição do Juiz ou MP (art. 5º, II e §§ 4º e 5º, do CPP).
Quando a autoridade se deparar com uma infração penal que teve como lesão a economia popular, o prazo para conclusão do inquérito independente do suspeito estar preso ou não será de 10 dias, tal prazo é encontrando especialmente na Lei nº 152/51. Diante da Lei de Drogas, Lei nº 11.343/2006, precisamente em seu art. 51, caput, estabelece que o prazo para a conclusão do inquérito policial será de 30 dias quando o suspeito encontra-se preso, e de 90 dias quando o mesmo estiver solto.
A Lei nº 5010/66, em seu art. 66 estabelece que no caso de preso, o prazo de 15 dias estipulado poderá ser prorrogado por mais 15 dias, assim sendo, é uma lei que estabelece a possibilidade de prorrogação do prazo para findar o inquérito policial.
11. INDICIAMENTO
A última fase do inquérito policial, em sua conclusão é o indiciamento, que consiste a imputação a alguém pela prática da infração penal. Isso só ocorre se houver indícios de sua autoria. O Código de Processo Penal vigente não faz referência expressa do ato de indiciar, e tal questão foi consolidada pela Lei nº 12.830/2013, precisamente em seu art. 2º, § 6º, que assim estabelece o ato de indiciar como privativo do delegado de polícia.
Fernando Capez (2014, p.)[9] em sua obra cita esse ato de forma transparente, assim ele diz:
“É a declaração do, até então, mero suspeito como sendo o provável autor do fato infringente da norma penal. Deve (ou deveria) resultar da concreta convergência de sinais que atribuam a provável autoria do crime a determinado ou a determinados suspeitos. Com o indiciamento, todas as investigações passam a se concentrar sobre a pessoa do indicado.”
Conforme entendimento se percebe que o suspeito, quando indiciado sobre tal fato, não necessita ser comprovado o envolvimento do mesmo na prática criminosa, pois essa comprovação se dará na apuração da instrução criminal, ora em curso.
Como explica Mirabete[10] “Não é o ato arbitrário nem discricionário, visto que inexiste a possibilidade legal de escolher indiciar ou não”.
Diante de tal posicionamento fica claro que mesmo não sendo comprovado o envolvimento do indiciado na prática do fato infringente, deve haver elementos que apontem de forma materializada a sua autoria, pois bem sabemos que o simples fato de comunicar ou ter conhecimento do crime não aduz de forma direta a quem lhe pertence à autoria. Por isso, deve o delegado de polícia no ato de indiciar estar calçado de elementos que possam, sem discricionariedade, imputar a alguém a autoria do fato.
Após o indiciamento, o delegado investido no fato delituoso procederá em declarar ao indiciado a garantia legal, de que ele poderá estar assistido de advogado devidamente habilitado, assim sendo, permitindo se quiser o contato com o advogado para lhe acompanhar na fase de interrogatório. Esta garantia legal é constitucional e esta expressa no seu art. 5º, LXIII da CF.
Iniciada a fase de interrogatório, assistido ou não de advogado, o delegado procederá com os questionamentos, e ao final deverá colher assinaturas do escrivão, do interrogado, por duas testemunhas que acompanharam o interrogatório, e pelo próprio delegado. Note-se que a assinatura do indiciado não é obrigatória, mas se o delegado estiver diante da recusa deverá consignar no termo tal negativa.
O indiciamento comporta algumas formalidades, que são: o despacho de indiciação, auto de qualificação, que ocorrerá logo após o interrogatório, boletim da vida pregressa e prontuário de identificação criminal se houver alguma das situações previstas na Lei nº 12.037/09.
12. RELATÓRIO FINAL E ENDEREÇAMENTO
Ao final das investigações o delegado de polícia deverá redigir minucioso relatório da apuração no inquérito policial. Este relatório não poderá conter qualquer opinião, julgamento ou algum juízo de valor, sendo um relatório imparcial de todos os atos da investigação realizados. As diligências não realizadas deverão ser arroladas no relatório, assim como, deverá incluir as testemunhas que por ventura não foram ouvidas. Na conclusão do relatório deverá o delegado de polícia fundamentar a respectiva classificação do fato. Note-se que esta fundamentação não é inalterada, e pode o Ministério Público após o recebimento alterar se entender fundamental outra classificação legal.
Conforme dispõe o art. 10, § 1º, do CPP, o inquérito policial concluído e relatado deverá ser encaminhado ao juízo competente, contudo o art. 129, incisos I e VIII da CF, estabelece que umas das funções dos Ministério Público é o oferecimento da denúncia ao juízo competente, portanto entende-se não recepcionado pela Constituição Federal este procedimento disposto no artigo citado do Código de Processo Penal.
A prática do envio do relatório concluído se origina com o envio ao Juízo competente, este diante do relatório, reenviará este para o Ministério Público, na qual avaliará o relatório podendo ainda requerer novas diligências à autoridade policial, acolher o relatório e oferecer denúncia ao Juízo competente, e por fim poderá solicitar o arquivamento ao juízo. Ressalta-se que o Juiz não entendendo pelo arquivamento encaminhará o inquérito ao Procurador Geral de Justiça; quando a matéria for da Justiça Estadual; e este se posicionará sobre o inquérito, podendo determinar o arquivamento pelo Juiz, também designando outro Promotor de justiça ou ainda poderá este procurador oferecer diretamente a denúncia.
Quando depara-se com crimes no âmbito da Justiça Federal, o arquivamento do Inquérito solicitado pelo MP, e desacolhido pelo Juiz, será remetido a um órgão colegiado para a apreciação, conforme estabelecido e regido pela Lei Complementar 75/1993.
13. PROJETO DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO 37/2011
Na Câmara dos Deputados, no dia 08/06/2011 foi apresentado pelo Deputado Lourival Mendes o projeto de emenda à constituição sob o nº 37, chamado popularmente de PEC 37.
O projeto buscava incluir um novo parágrafo no art. 144 da CF, para definir a competência para a investigação criminal pelas polícias federal e civis dos Estados e do Distrito Federal, a proposta do novo parágrafo teria a seguinte redação: "A apuração das infrações penais de que tratam os §§ 1º e 4º deste artigo, incumbem privativamente às polícias federal e civis dos Estados e do Distrito Federal, respectivamente".
A proposta de emenda trouxe uma grande discussão jurídico – política – sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade de tornar expresso a quem incumbe tal atribuição de apurar as infrações penais. O relator do projeto argumenta que esta proposta visa solucionar problemas enfrentados diante dos tribunais acerca daqueles que possuem investidura para a realização dessa atividade. Argumenta ainda que o projeto visa repudiar os procedimentos realizados em desconformidade da forma que se caracteriza e compõe a investigação criminal. Entende o mesmo que o inquérito policial deve ser taxado como uma atribuição exclusiva do operador de direito investido no cargo de delegado de polícia.
Inicialmente estudado, o inquérito policial tanto na justiça federal quanto na justiça estadual é presidido pelo delegado de polícia de carreira, e tal disposição é encontrada em nossa Constituição Federal, precisamente no art. 144, §§ 1º e 4º.
O que ocorre no caso da PEC 37 é uma busca para deixar expresso o termo inquérito policial, além do termo das infrações penais, como atribuição exclusiva da polícia judiciária.
O Ministério Público tem como uma de suas atribuições à possibilidade de promover o inquérito civil, e requerer a polícia judiciária a realização de diligências investigatórias ou a instauração do inquérito policial; já analisado anteriormente. Contudo já há entendimento do Supremo Tribunal Federal, através de julgado, que não exclui de outras autoridades o poder de investigação.
Conforme Julgado do STF:
“(…) a denúncia pode ser fundamentada em peças de informação obtidas pelo órgão do Ministério Público sem a necessidade do prévio inquérito policial, como já previa o Código de Processo Penal. Reputou-se não haver óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente a obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respeito de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal, especialmente em casos graves como o presente que envolvem altas somas em dinheiro movimentadas em contas bancárias. Aduziu-se, tendo em conta ser princípio basilar da hermenêutica constitucional o dos “poderes implícitos”, segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios, que se a atividade fim — a promoção da ação penal pública — foi outorgada ao parquet em foro de privatividade, não haveria como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que peças de informação embasem a denúncia. Dessa forma, concluiu-se pela possibilidade de, em algumas hipóteses, ser reconhecida a legitimidade da promoção de atos de investigação por parte do Ministério Público, especialmente quando se verifique algum motivo que se revele autorizador dessa investigação.”(RE 535478/SC, rel. Ministra Ellen Gracie, julgamento em 28.10.2008)
O julgado do Supremo Tribunal Federal, e o projeto de Emenda Constitucional discutido, é possível visualizar a origem da devida proposta. É importante ressaltar a boa intenção do projeto visto de forma ordinária, contudo em um estudo mais aprofundado tal projeto trazia consigo uma forma de excluir do Ministério Público possíveis possibilidades de investigação, que ocorre normalmente em crimes de grande repercussão ou da grave ameaça que tal fato delituoso pode acarretar.
Assim como o Ministério Público pode receber através do ofendido a requisição e a alegação dos fatos de forma direta, e este tendo a atribuição de remeter a polícia judiciária à requisição do inquérito policial, não merece ser desacolhido o julgado do STF, no sentido de permitir ao Ministério Público a possibilidade de realizar investigações, pois visa garantir uma ordem, e uma segurança além da prevista no ordenamento.
Ponto importante deve ser agregado sobre este tema, pois desde o ano de 1994, existe e se disseminou por outros estados um órgão que se destina a investigação e combate ao crime organizado, além do controle externo da atividade policial. O órgão chamado de GAECO foi instituído pela Resolução nº 97 de 20 de janeiro de 1994, com o nome de Promotoria de Investigação Criminal (PIC). O grupo de investigação é composto por membros do Ministério Público, Polícia Civil e Polícia Militar. Essa disseminação nacional deste órgão ocorreu por meio da Resolução nº 1801, de 19 de setembro de 2007, do Procurador-Geral de Justiça. Posteriormente, a regionalização foi reformulada pela Resolução nº 1930, de 1º de SETEMBRO de 2009.
Como visto, já existe no cenário brasileiro órgão com o condão de investigação promovido ou acompanhado pelo Ministério Público e por estar acompanhado em sua composição de membros da Polícia Civil e Polícia Militar, poderá dispensar a comunicação prévia de investigação a outras autoridades.
Se promulgada fosse a alteração do art. 144 da CF, através da PEC 37, haveria a exclusão deste órgão, pois estaria contrariando a restritiva atribuição do delegado de polícia judiciária de investigar e promover o inquérito policial. Contudo a PEC 37 foi rejeitada com uma votação maçante de votos contra, sendo 430 votos contrários ao projeto, 9 votos a favor da alteração do artigo citado, e apenas 2 abstenções, tendo por fim o arquivamento.
14. CONCLUSÃO
Por fim, concluímos que o projeto de Emenda à Constituição número 37 não merecia ser aprovado, haja vista que, a Constituição Federal em seu art. 144, §§ 1º e 4º não torna omissa a atribuição de legitimado para a realização do inquérito policial ao delegado de polícia, e o que ocorre por vezes é uma leitura superficial do artigo sem entender o contexto instaurado através da doutrina e a prática da determinada questão.
Conforme anexado anteriormente o julgado do STF, não se pode delimitar somente à polícia judiciária a natureza de investigar, pois diante de determinados crimes complexos poderá o Ministério Público tomar frente para apuração do fato delituoso, e conforme correlacionado já há a existência de órgão conjunto entre as polícias e o Ministério Público para apuração destes crimes complexos e na grande maioria de grande repercussão. Assim o STF já decidiu algumas vezes sobre a aplicabilidade do poder investigatório ao MP, conforme julgado:
“HABEAS CORPUS” – CRIME DE TORTURA ATRIBUÍDO A POLICIAL CIVIL – POSSIBILIDADE DE O MINISTÉRIO PÚBLICO, FUNDADO EM INVESTIGAÇÃO POR ELE PRÓPRIO PROMOVIDA, FORMULAR DENÚNCIA CONTRA REFERIDO AGENTE POLICIAL – VALIDADE JURÍDICA DESSA ATIVIDADE INVESTIGATÓRIA – CONDENAÇÃO PENAL IMPOSTA AO POLICIAL TORTURADOR – LEGITIMIDADE JURÍDICA DO PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – MONÓPOLIO CONSTITUCIONAL DA TITULARIDADE DA AÇÃO PENAL PÚBLICA PELO “PARQUET” – TEORIA DOS PODERES IMPLÍCITOS – CASO “McCULLOCH V. MARYLAND” (1819) – MAGISTÉRIO DA DOUTRINA (RUI BARBOSA, JOHN MARSHALL, JOÃO BARBALHO, MARCELO CAETANO, CASTRO NUNES, OSWALDO TRIGUEIRO, v.g.) – OUTORGA, AO MINISTÉRIO PÚBLICO, SOBRE A ATIVIDADE POLICIAL – LIMITAÇÕES DE ORDEM JURÍDICA AO PODER INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – “HABEAS CORPUS” INDEFERIDO (Habeas Corpus 89.837/DF, 2º Turma, Rel. Min. Celso de Mello, j. 20/10/2009).
Cabe salientar que o STF não se manifestou até o momento sobre a constitucionalidade deste poder de investigação, e faz através de julgados sobre causas urgentes a permissão ou proibição, ou seja, agindo conforme a necessidade do momento. Nesta mesma linha de raciocínio o causídico Aury Lopes Jr[11].(2014, p. 343) se manifesta:
“Talvez parte da opacidade da discussão derive da velocidade da urgência, marcas indeléveis das sociedades (complexas) contemporâneas e que também afetam os juristas e o direito, na medida em que o presenteísmo e a cultura da urgência fazem com que (até inconscientemente) não queiramos “perder” tempo com longas e profundas análises (verdadeira anamnese). A ditadura da urgência é terreno fértil para discussões superficiais, reducionistas e soluções epidérmicas e sedantes”.
Concluí-se que a PEC 37, foi de forma correta vetada, pois se percebe que o grande problema quanto ao poder de investigação não está no órgão que o realiza, e sim como o Estado gerencia este sistema, que na qual atualmente se encontra fracassado. Ainda é importante frisar que em uma sociedade com inúmeras espécies de crimes, é inadmissível que somente um órgão possua este poder de forma exclusiva, haja vista que a polícia judiciária não está subordinada ao Poder Judiciário ou ao Ministério Público.
Informações Sobre o Autor
Tiago Madruga da Silva
Bacharel em Direito pela Faculdade Anhanguera do Rio Grande. Discente do Curso de Ciências Econômicas pela Universidade Federal do Rio Grande