Considerações sobre o recurso especial e extraordinário


São os recursos (o extraordinário e o especial) também chamados de estrito direito pois que visam o prevalecimento da ordem constitucional(extraordinário) e a unidade do direito federal, infraconstitucional, em todo o território nacional(especial).


O recurso especial se colima que não sobreviva decisão que tenha violado lei federal(letra a) e nem subsistam simultaneamente interpretações diferentes das mesmas leis federais.


É em prol da unidade de entendimento no aspecto lógico-normativo, e esta se desfaz no plano da atividade jurisdicional ou na aplicação múltipla da lei, por diversos órgãos, porque várias são as cabeças dos julgadores.


É a uniformização da jurisprudência bastante necessária, pois sua ausência pode redundar em séria perturbação a funcionalidade do Direito principalmente quando ocorre a diversidade simultânea de entendimentos.


A circunstância de o objeto específico da atividade do STF ser a inteligência e a aplicação da lei federal não inibe sua atividade interpretativa dessa lei, à luz da Constituição Federal.


Com a criação do STJ ocorreu uma distribuição de competência, do que precedentemente só cabia ao STF embora que a tutela da CF tenha ficado(aliás, como sempre esteve afeta ao STF) no âmbito de sua competência recursal(recurso extraordinário).


Tanto o recurso extraordinário e recurso especial são recursos que se dirigem contra a lesão do direito objetivo (direito federal objetivo/positivo: direito constitucional, no caso do recurso extraordinário) e direito federal no caso de recurso especial.


Apesar da proximidade destes recursos, o cabimento deles está nitidamente diferenciado na própria CF de 1988, donde, por isso mesmo, ser inviável se pretender interpor o princípio de fungibilidade.


Na realidade, essa troca caracteriza erro grosseiro e conduz a que não se conheça daquele. Não se confunde, todavia, com erro material perceptível que conste da interposição, e cuja percepção leva ao conhecimento preciso do que deseja o litigante.


Assim, se houve erro apenas na designação, no nomen iuris, este pode e deve ser reconhecido, desde que esteja correta a sua fundamentação.


O recurso especial tem cabimento quando se houver aplicado lei federal, independentemente da importância intrínseca da matéria ou do tipo de decisão.


A ratio decidendi é a lei federal, do acórdão. De sorte de que, se o acórdão fez apenas menção casual ao artigo da lei federal, não há de falar-se em prequestionamento.


O recurso especial deve ser interposto de decisões de mérito ou não, mas sempre colegiadas e não de órgãos monocráticos.


Tanto o recurso especial como extraordinário possuem requisitos de admissibilidade.


O recurso especial, terá sempre cabimento contra acórdão oriundo de um tribunal, visando a sua reforma ou invalidação conforme o vício que lhe seja imputado( ex vi o art. 105,III da CF).


A expressão “causas decididas” abrange todo e qualquer acórdão, inclusive proferido em sede de agravo de instrumento. A propósito, o STJ editou a Súmula 86 neste sentido.(cabe recurso especial contra acórdão proferido no julgamento de agravo de instrumento).


Estando em pauta lei federal ou divergência de entendimentos sobre essa lei federal. Devem galgar a expressão “causas decididas” sentido mais amplo englobando todo e qualquer acórdão de tribunal local, proferido em sede de apelação, embargos infringentes ou mesmo em agravo de instrumento.


A causa impugnada mediante recurso especial, julgada em única ou última instância por tribunal local. O STF editou a Súmula 281, in verbis: “ É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles.”


O STJ atua apreciando recurso especial como competência originária, foi criado pela CF de 1998, assim como o próprio STJ, quando parte da competência do STF(que era de guardar a CF) passou a ser reservada para o STJ.


A função do recurso especial é laborar a síntese do Estado Federal e de fixar o entendimento da lei federal.


A sua função como sabiamente o Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, é dar a prevalência à tutela de um interesse geral do Estado sobre os interesses dos litigantes(Liebman).


Como bem lembra Buzaid, o erro de direito contagia os demais Juízes podendo servir de antecedente judiciário.


Ao apreciar o recurso especial o STJ mais que o exame do direito das partes, estará a exercer o controle da legalidade do julgamento proferido pelo Tribunal a quo.


Não é possível a interposição de recurso especial para impugnar decisão proferida em embargos infringentes Lei 6.830/80; decisões consideradas irrecorríveis na Justiça do trabalho (Lei 5.584/70, art. 2o., §3o., e 4o.) ou decisões proferidas pelas Turmas Recursais nos Juizados Especiais Cíveis.


Súmula 203 STJ bem esclarece que vale frisar que o recurso especial só pode ser interposto de decisão proferida por Tribunal Regional Federal ou Tribunal Estadual, do Distrito Federal ou território e não de decisão proferida por órgão das Justiças Especiais.


Daí decorre a assertiva de que o STJ apenas se articula com as Justiças Comuns e não com as Justiças Especiais. O prequestionamento implica a obrigatoriedade do debate a respeito da alegação contida no recurso.


Em alguns casos, admite-se o recurso especial, mesmo não tendo havido o prequestionamento: a) quando o fundamento para o recurso surge no próprio acórdão recorrido; b) quando interpostos embargos declaratórios o tribunal recusa-se a eliminar a omissão.


A admissibilidade do recurso visando alegação de direito afastando-se que seja feito o reexame de prova. Exige-se regularidade formal, um simples descuido poderá ser fatal para sua pretensão especialmente por se tratar de via excepcionalíssima (arts. 541, 544 § 1o. do CPC, arts. 102 e 105 do CF e Regimentos Internos dos Tribunais).


Contrariar a lei federal significa não atender à vontade da lei, negar-lhe vigência portanto, significa declarar que a norma está revogada ou deixar de aplicar a norma.


Funda-se o recurso especial na existência de conflito entre a lei federal e a lei ou ato do governo federal. O recorrente não deve confundir com a hipótese com a eventual discussão de inconstitucionalidade da lei estadual ou municipal em face da CF.


Para a demonstração do dissídio jurisprudencial, vários pontos devem ser observados.) o acórdão em confrontação não pode não pode ser do mesmo tribunal( Câmaras, turmas e seções).


Súmula 13 do STJ, in verbis: “A divergência entre julgados do mesmo Tribunal não enseja recurso.”


B) o acórdão em confrontação deve ter sido lavrado necessariamente em última instância ordinária. A divergência pode ser contudo, com base em decisão do próprio STJ ou do Supremo Tribunal Federal, ou seja, outros tribunais;


c) a interpretação não apode estar superada pelo próprio tribunal ou pela jurisprudência dos Tribunais superiores. Não se admite a utilização especial se jurisprudência estiver ultrapassada (não importando se nova ou velha) vide a Súmula 83 do STJ.


d) a divergência deve estar explícita no corpo do acórdão e não na ementa que traz uma mera indicação do julgamento;


e) é necessário, para comprovar a divergência, que o acórdão esteja demonstrado por certidão, cópia autenticada ou pela citação do repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, em que tiver sido publicada a decisão divergente com a transcrição dos trechos conflitantes (parágrafo único do art. 541 do CPC);


É necessária a indicação das circunstâncias que tornam os casos confrontados análogos, nos termos da Súmula 291 do STF;


f) em nenhuma hipótese, a orientação do STJ poderá ter firmado no mesmo sentido da decisão recorrida. Aplica-se a Súmula 83 do STJ.


O recurso especial ou extraordinário deve ser interposto no prazo de 15 dias (art. 508 CPC) dirigido ao Presidente do tribunal ou Vice-presidente, em petições distintas, devendo o recorrente indicar, precisamente, o fundamento constitucional, a exposição de fato e do direito, a demonstração do cabimento e as razões do pedido de reforma da decisão recorrida(art. 541 do CPC).


São três as formas de atuação do STF segundo o que consta art. 102 do CF in verbis:


Os requisitos de admissibilidade são: a) prévios ou preliminares; b) pertinentes aos permissivos constitucionais.


O recurso extraordinário ficou reservado para hipóteses de contrariedade à CF e casos de negativa de vigência de tratado ou lei federal, por reconhecimento de sua inconstitucionalidade.


O art. 102, III da CF não exige mais que a decisão recorrida, para fins de recurso extraordinário.


Quanto aos pressupostos relativos aos permissivos constitucionais são previstas três hipóteses:


a)se a decisão recorrida contrariar dispositivo da CF, a violação deve ser frontal e direta para permitir o recurso extremo;


b) se a decisão recorrida tratar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;


c) se a decisão julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face da CF.


O recurso extraordinário não tem efeito suspensivo, e o procedimento é o mesmo do recurso especial nos termos do art. 541 e seguintes do CPC.


O papel da jurisprudência é divido por duas grandes correntes: a primeira que entende que a jurisprudência como fonte criadora de normas e a outras que se limita a reconhecer e declarar a vontade concreta da lei.


A primeira corrente com base na teoria filosófico-jurídica de Hans Kelsen, no processo se reflete como a teoria unitarista na relação entre direito e processo.


E a segunda consagra uma posição dualista, como afirma Gustav Radbrush: “os atos jurídicos e as sentenças realizam o direito mas não influem em sua existência lógica, podendo influir em sua compreensão histórico-cultural.”


A posição dominante na doutrina processualista é a posição dualistas conforme as lições de Liebman, Cândido Rangel Dinamarco.


A jurisprudência no direito brasileiro é a reiteração de julgados interpretando o direito em certo sentido, mesmo quando consagrada em súmula, não tem força normativa.


A ordem jurídica rejeita o fenômeno onde casos iguais são decididos de maneira diferente, mas por outro lado é preciso evitar a estagnação que poderia ocorrer com a uniformização perene.


E por isto foi criado o instituto da uniformização da jurisprudência dos arts. 476 a 479 do CPC.


Já na appellatio e nos rescriptum aos romanos, é possível encontrar a preocupação da unificação da jurisprudência. Na primeira por meio do poder jurisdicional, o imperador fazia valer a exata aplicação da lei e, pelo segundo, resolvia pontos duvidosos como poder legislativo, com força de interpretação autêntica.


No sistema anglo-saxão da common law as decisões têm força normativa de precedentes, revelando, também, uma preocupação de unificação.


Na Itália existem as máximas consolidadas da Cassação instituto, aliás, de criticado por Carnelutti. Em Portugal, desde as Ordenações Manuelinas (Livro V, Título 58, § 1o) e Filipinas(Livro I, Título V,§ 5o.) até o Código vigente (art. 763 a 769) existe a figura do “assento”, isto é, decisão normativa com força d lei.


No Brasil, a figura do “assento” ingressou por meio das Ordenações e sobreviveu, nos Decretos 2.684/1875, e 6.142/1876, bem como na Consolidação das Disposições Concernentes ao processo Civil do Conselheiro Ribas.


Nos Códigos Estaduais, foi previsto no Código de Processo de São Paulo. Com a unificação processual de 1939, a preocupação de uniformização se manteve em vários institutos: o prejulgado, o recurso de revista e o recurso extraordinário.


O nosso instituto de uniformização da jurisprudência, como no atual Código vigente, tem contornos próprios, não gera norma com força vinculante, guardando semelhança com os institutos que lhe serviram de origem, como “assento” português, bem como as figuras análogas do direito alemão (Lei de Organização Judiciária, § 137) e italiano( art. 374,§ 2o. do CPC).


Pontes de Miranda considera à uniformização da jurisprudência como recurso porque aprecia matéria de recurso.


O entendimento dominante é o de que a uniformização de jurisprudência, é apenas um incidente no julgamento de recurso ou processo de competência originária dos tribunais.


Mauro Capelletti reconhece que a criação formal dos modernos sistemas de controle jurisdicional de constitucionalidade das leis é americana, com o judicial review of legislation, mas enxerga antecedentes remotos em Antenas, na Igreja(o que São Tomás de Aquino denominou de Lex aeterna e outros).


É possível classificar os diversos sistemas de controle jurisdicional de constitucionalidade das leis sob dois critérios quanto ao órgão que pode declarar a inconstitucionalidade e quanto à forma.


Por primeira: podem ser sistema difuso ou americano (todos os órgãos jurisdicionais podem declarar a inconstitucionalidade de leis).


Por segunda: é o sistema concentrado ou austríaco, apenas um órgão tem o poder de declarar a inconstitucionalidade (é o sistema da Alemanha Federal).


Quanto à forma de declaração pode ser: via incidental que corresponde ao sistema difuso ou americano por via principal ou por ação própria ou provocação judicial que corresponde ao sistema concentrado ou austríaco.


O sistema brasileiro vigente é misto porque resulta da soma dos dois descritos, podendo a declaração se dar por via incidental ou por via principal, de maneira difusa e concentrada.


A declaração incidental se dá no curso de um processo como prejudicial do julgamento da lide. Em primeiro grau não há sequer declaração formal pelo juiz, o qual apenas afasta ou deixa de aplicar a lei que considera inconstitucional.


A regra geral estabelece que quanto aos efeitos tais recursos devem ser recebidos apenas no efeito devolutivo, possibilitando a execução provisória da decisão recorrida.


Mas a regra geral não é absoluta excepcionalmente na hipótese de lesão grave, de difícil ou incerta reparação ao recorrente, tem-se admitido também os efeitos suspensivo aos recursos especial e extraordinário(art. 288 do RJSTJ).


A finalidade da medida cautelar que visa conceder efeito suspensivo aos recursos, visa a proteção do próprio resultado útil do processo, evitando-se, por exemplo, o perecimento pela qual as partes litigam.


È indispensável a demonstração da presença do fumus boni iuris e do periculum in mora.


A jurisprudência dos tribunais superiores diverge quanto à concessão do efeito suspensivo aos recursos especial e extraordinário que não tenham sido submetidos ao juízo de admissibilidade no tribunal de origem.


Alguns doutrinadores classificam os juízos de admissibilidade destes recursos com “desdobrado” ou bipartido, pela circunstância de ser desmembrado ou distribuído entre os tribunais a quo e ad quem.


É dupla e distinta a análise d a análise da admissibilidade destes recursos pois que ainda que admitido pelo presidente do tribunal de origem não vincula exame que será realizado pelo ministro relator do STJ ou STF.


A inadmissibilidade do recurso proferida pelo presidente do tribunal de origem poderá ser revista pelo ministro relator, por meio de agravo de instrumento interposto contra o despacho denegatório de seguimento dos recursos.


A valoração da importância do juízo de admissibilidade para aqueles que entendem não ser ele necessário para a tutela cautelar leva em consideração aquilo que ocorre na prática forense, em virtude do acúmulo de recursos endereçados aos tribunais superiores, pode demorar até um ano, enquanto, em tese, a decisão recorrida pode estar sendo executada provisoriamente.


No STJ duas correntes jurisprudenciais opostas convivem sem qualquer indicação de que a matéria está para ser pacificada.


A primeira corrente apóia-se a orientação aparentemente pacificada do STF hoje é aquela que entende que o juízo de admissibilidade no tribunal de origem é essencial ao exame da medida cautelar que visa atribuir efeito suspensivo aos recursos especial e extraordinário.


A outorga de efeito suspensivo a tais recursos é excepcionalidade absoluta, e servir para legitimar-se a jurisdição cautelar do STF.


O principal fundamento apóia-se na impossibilidade de concessão do efeito suspensivo quando não houve juízo de admissibilidade é o de que isto representaria uma invasão de competência do tribunal de origem, a quem lei atribuir poderes para a admissão ou não do recurso (art. 542,§1o. do CPC).


Ressalta o Min. Moreira Alves que o suspensivo não seria possível pois o recurso ainda estaria no âmbito da competência do STF.


Outras turmas do STJ entendem que o efeito suspensivo aos recursos especial e extraordinário pode ser atribuído antes mesmo da realização do juízo de admissibilidade pelo tribunal a quo.


A decisão do STJ é fundamentada no poder geral de cautela do juiz, desde que preenchidos os pressupostos imprescindíveis para cautela(fumus boni iuris e periculum in mora), o juiz deve concedê-la.


O Supremo Tribunal Federal já expressamente refutou a aplicabilidade de dispositivos processuais sob a alegação de que implicaria pré-julgamento da admissão do recurso extraordinário pelo relator da petição de medida cautelar.


O Min. Moreira Alves sustenta: a impossibilidade de deferir liminar para dar efeito suspensivo ao recurso extraordinário ainda não admitido permite que, entre a interposição desse recurso e a prolação desse juízo de admissibilidade, não haja autoridade ou órgão judiciários que, por força de dispositivo legal, tenha competência para o exame de liminar dessa natureza ….


Para suprir essa lacuna que pode acarretar danos irreparáveis ou de difícil reparação em casos em que é relevante a fundamentação jurídica do recurso extraordinário, seria atribuir-se ao Presidente do Tribunal a quo, que competente a sua admissibilidade, competência para conceder, ou não, tal liminar, e se concedesse, essa vigoraria, se o recurso extraordinário viesse a ser admitido, até que essa Corte a retificasse, ou não.


Essa solução encontra óbice em que assim haveria invasão na competência deste Supremo tribunal, certo que, antes da admissão do recurso extraordinário e por causa do sistema do juízo dessa admissibilidade, não é possível a ele decidir esse pedido de liminar(PET 1872-9/RS, questão de ordem, 07.12.99).


A sua eficiência, entretanto, depende da fixação da competência dos presidentes dos tribunais superiores para apreciar os pedidos de suspensão da possível execução da decisão recorrida ou recorrível que só devem ser deferidos se demonstrada a existência concreta do fumus boni iuris e do periculum in mora.


É necessário que os tribunais superiores unifiquem o seu entendimento, e que se desenvolvem mecanismos que impeça que os jurisdicionados fiquem desprotegidos de uma situação de risco.


O efeito suspensivo e o juízo de admissibilidade no recurso especial e no extraordinário dividem opiniões nos tribunais superiores, gerando controvérsia quanto aos pressupostos da tutela cautelar.



Informações Sobre o Autor

Gisele Leite

Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.


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