Desapropriação judicial por interesse social prevista no art. 1248 §§ 4° e 5° do CCB em contraste com a teoria da usucapião onerosa

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Resumo: O nosso Código Civil de 2002, no seu artigo 1.228, §§ 4º e 5º, criou uma nova modalidade de perda e de aquisição da propriedade, a fim de beneficiar a coletividade de possuidores e não apenas indivíduos isolados. A doutrina discorda quanto à natureza jurídica desse instituto, entendendo alguns que se trata de uma nova espécie de usucapião, a usucapião onerosa, já outros, em grande maioria entendem que é uma desapropriação estabelecida pelo Poder Judiciário, denominada desapropriação judicial por interesse público. Neste trabalho, abordaremos as principais questões que envolvem o artigo 1.228, §§, 4º e 5º, do Código Civil, relacionando-os com a função social da propriedade, que é o elemento central da propriedade quando se trata da mesma no direito de propriedade.


Palavras-Chave: desapropriação judicial por interesse social, usucapião onerosa, função social da propriedade


Abstract: Our Civil Code of 2002, in its article 1.228, §§ 4th and 5th, created a new loss modality and of acquisition of the property, in order to benefit the possessors’ collective and not just isolated individuals. The doctrine disagrees with relationship to the juridical nature of that institute, understanding some that it is a new usucapião species, the onerous usucapião, already other, in great majority they understand that is a dispossession established by the Power Judiciary, denominated judicial dispossession by public interest. In this work, we will approach the main subjects that involve the article 1.228, §§, 4th and 5th, of the Civil Code, relating them with the social function of the property, that is the central element of the property when it is the same in the property right.


Keywords: judicial dispossession for social interest, onerous usucapião, social function of the property


Sumário: 1. A Desapropriação e o Direito de Propriedade no Ordenamento Jurídico Brasileiro; 2. Evolução Histórica da Desapropriação; 3. Evolução Histórica da Desapropriação no Brasil e sua Legislação; 4. Conceito Geral de Desapropriação; 5. Teorias Referentes à Desapropriação; 5.1. Teoria Coletivista; 5.2. Teoria do Domínio Eminente do Estado; 5.3. Teoria do Pacto Social; 5.4. Teoria da Função Social da Propriedade; 5.5. Teoria da Alienação Compulsória; 6. Espécies de Desapropriação; 6.1. Desapropriação Ordinária; 6.2. Desapropriação para Reforma Urbana; 6.3. Desapropriação para Reforma Agrária; 6.4. Desapropriação Confiscatória; 6.5. Desapropriação Judicial; 7. Desapropriação Judicial e os Conceitos Abertos; 8. A Usucapião Onerosa em Contraste com a Desapropriação Judicial por Interesse Social; 9. Comparativo do art. 10 da Lei n° 10.257/01 e o art. 1228, §§ 4° e 5° do CCB; 10. Considerações Finais; 11.Referencias Bibliográficas.


1. A Desapropriação e o Direito de Propriedade no Ordenamento Jurídico Brasileiro


É impossível ao estudioso e aplicador de Direito discorrer a respeito do instituto da desapropriação se não relacionar o mesmo ao instituto da propriedade, já que ambos se relacionam diretamente e impõem eficácia entre si quando se tratam de resolução de litígios, dependendo de valores, posse e casos indefinidos.


A propriedade, exteriorizada pela posse individual ou coletiva sofreu profundas alterações no século passado. A propriedade privada tradicional que tinha como elemento essencial o objetivo de assegurar a subsistência individual e o poder da autodeterminação como fator da ordem social, perdeu muito esse significado nos últimos tempos. Com essa evolução da propriedade privada o conceito constitucional de direito da propriedade se separou, aos poucos, do conteúdo notável civilístico que amplamente era dotado, sendo fundamental para a renúncia da idéia de que é  necessário uma identificação entre o conceito civilístico e conceito constitucional de propriedade de forma uma.


Vemos que o conceito constitucional que protege a propriedade ultrapassa a idéia estrita privatística, abrangendo outros valores de cunho patrimonial, como as participações societárias e as pretensões salariais. Em contraponto, o conceito civilístico protetivo à propriedade abrevia o conceito constitucional a idéia privada da posse, como exteriorização da propriedade, protegendo vigorosamente a posse e a propriedade privada, mas dando aberturas à aquisição da coisa por terceiros, como é o exemplo da usucapião e da desapropriação. Conforme leciona o ilustre doutrinador Gilmar Mendes que “embora integre o conceito de propriedade a definição constante da legislação civil, é certo que a garantia constitucional da propriedade abrange não só os bens móveis ou imóveis, mas também outros valores patrimoniais.”[1]


A Constituição de 1988 dedica inúmeras disposições que disciplinam o direito de propriedade e protege esse direito como garantia, pelo  seu art. 5°, especificando esse direito nos incisos XXII a XXXI, consagrando inclusive o inciso XXIII para que a propriedade atenda sua função social.[2]


A aquisição da propriedade em forma de desapropriação, nosso objeto de estudo, é positivada no inciso XXIV, em que a Carta Magna prevê a desapropriação em casos de necessidade ou por interesse social, mediante previa e justa indenização em dinheiro, mas, impõe ressalva nos casos nela previsto (arts. 184, caput e 182, § 4°).[3] Em nossa codificação civil aparece normatizada o direito de propriedade, proprietário, posse e desapropriação


O presente artigo tem como objetivo examinar a forma de desapropriação prevista no art. 1228, §§ 4° e 5° de nosso Código Civil de 2002:


Art. 1228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.(…)


 §4º O proprietário também pode ser privado da coisa se o imóvel reivindicado consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de 5 (cinco) anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado, em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico relevante.


§5º No caso do parágrafo antecedente, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário; pago o preço, valerá a sentença como título para o registro do imóvel em nome dos possuidores.”


Sendo cerne de divergências no tocante a natureza jurídica desses dispositivos, em que alguns doutrinadores apresentam e classificam como desapropriação judicial por interesse social e outros contrapõem entendendo se tratar de usucapião onerosa. Desta forma, com base nessas classificações doutrinárias e seus argumentos sustentados nos referidos artigos de nosso ordenamento civil, o intuito deste estudo se aprofunda mais ao demonstrar porque o entendimento da desapropriação judicial por interesse social se adéqua melhor em nossa concepção civilista e uma análise do conteúdo dos conceitos abertos presentes nesse dispositivo,  traçando breves considerações a questões que tratem sobre o objeto em exame.  


2. Evolução Histórica da Desapropriação


De forma contrastante à origem da propriedade privada, em que muitos doutrinadores apresentam Roma como genitora deste instituto, quando o objeto de análise seja existência da figura jurídica da desapropriação na história do direito de propriedade, nossos doutrinadores não compactuam da mesma opinião de origem da desapropriação entre os povos mais remotos e, até mesmo entre os gregos e os romanos.


Dessa maneira, existia nos povos antigos a falta de conhecimento sobre a expropriação, que acontecia de maneira evidente, mas, não positivada e sim de maneira hierárquica pelos poderes superiores. O confisco é um exemplo, pois quando a coisa se tornava necessária ao uso público, as autoridades administrativas se valiam dessa forma para obter a propriedade, recurso utilizado também no Oriente, onde era suficiente que o monarca levantasse a voz para que toda a propriedade fosse confiscada.


Na Grécia, seu sistema jurídico foi um forte influenciador dos ordenamentos jurídicos da Europa Ocidental, graças aos seus grandes pensadores políticos e filosóficos. O Direito grego é baseado nas idéias de justiça estabelecidas pelos grandes filósofos, tais como Platão e Aristóteles, estes que vão utilizar a propriedade privada em suas ideologias famosas até hoje.


Platão em sua obra A República, ensinava que para cada cidadão somente seria dado um pedaço de solo, transmissível a um só herdeiro, e a existência de uma propriedade comum dos cidadãos sobre terras, bens, mulheres e crianças, rompendo assim com o tradicional princípio da propriedade privada. Defendia a propriedade privada, mas com a condição de que tal direito não resultasse em sensíveis desigualdades sociais.


Já Aristóteles, tinha menos restrições que Platão, utilizava uma idéia mais realista, voltava-se contra a propriedade comum idealizada por este, dando ênfase ao caráter pessoal do exercício de Direito. Em sua obra, A Política tratava a propriedade como uma condição essencial à vida do homem.


É perfeitamente possível afirmar que os gregos antigos já possuíam uma clara ciência de propriedade privada (apesar da dificuldade em se encontrar fontes escritas). Dessa maneira, pode-se afirmar que havia um grande individualismo, podendo o proprietário dispor de seus bens com um contrato, produzindo efeitos entre as partes, mas com a publicação do ato para a proteção de terceiros.  A descoberta de inscrições na Ilha de Eubréia constatava a existência de apropriações de terras vizinhas, com finalidades vitais para a criação e execução de obras do governo mediante prévio pagamento de valor pecuniário estabelecido como meio de ressarcir o dono da propriedade, foi a maior prova que a desapropriação era conhecida na Grécia, em razão de que a propriedade privada era respeitada por todos.


Já em Roma, até os dias de hoje, existem dúvidas quanto à prática deste meio de intervenção estatal. Existindo correntes que divergem sobre o assunto, em que a primeira corrente expõe que os romanos não conheciam a expropriação, pois os romanos respeitavam a imutabilidade do lar, tido como a base de toda a sua organização social com forte conotação religiosa envolvida pelo direito de propriedade, esses teóricos defendiam que a importância e significativa que o povo de Roma dava à propriedade, seria o fundamento principal do impedimento do exercício da desapropriação.


Em contraponto, a segunda corrente segue o pensamento de que os romanos teriam conhecimento a respeito disso, já que o direito de propriedade para eles jamais foi absoluto e sagrado, quando se cuidava de construir aquedutos ou mesmo estabelecer limites em favor de vizinhos.


A desapropriação era prática existente desde a Lei das XII Tábuas, sob regime da propriedade familiar, era utilizada como meio de exigir dos proprietários aquelas áreas de terrenos necessárias para que o interesse público fosse atingido. A competência ficava a cargo do Senado, o Imperador ou até mesmo as cúrias municipais, sendo efetivado de modo despótico, em que quase sempre as autoridades monopolizavam a propriedade, sem represália e, não era pago ao particular as referidas indenizações.


Os senhores feudais, na Idade Média, possuíam poderes absolutos e dispunham dos bens de seus vassalos e até deles próprios de maneira eventual e despótica. Naqueles tempos, vigorava a lei do mais forte sobre o mais fraco, as grandes propriedades territoriais se aglomeravam nas mãos dos senhores feudais e as propriedades prediais pertenciam a poucos donos, quase sempre corporação religiosa.


O Princípio da Inviolabilidade do direito de propriedade foi instaurado no período da Revolução Francesa, uma nova ordem política e social, fazendo com que o fato jurídico da expropriação tomasse os contornos que atualmente são adotados na legislação dos povos, ou seja, que se configura como instituto jurídico e estabelecem bases para seu exercício.


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A Constituição francesa de 1791 apresentava em seu texto a necessidade pública e a prévia e justa indenização como os fatores basilares para a consumação da desapropriação, servindo de modelo à legislação contemporânea sobre este instituto.


Entre as legislações que tornaram eficazes este instituto, destacamos: a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que a Assembléia Nacional Constituinte proclamada em 1789, destacava o direito inviolável e sagrado que caracterizava a propriedade.


3. Evolução Histórica da Desapropriação no Brasil e sua Legislação


Em nosso país, antes da Constituição Imperial vigoravam em terras brasileiras as Ordenações do Reino, ou Ordenações Filipinas, publicadas por Felipe II, da Espanha, e Felipe I, de Portugal, no ano de 1603, nas quais o soberano gozava de plenos e absolutos poderes, já que era concedida a ele a faculdade de se apoderar dos bens de seus súditos, mais um exemplo do confisco como forma de desapropriação naquela época.


A Constituição do Império do Brasil de 1824, prescrevia, mesmo excluindo do texto constitucional o caráter sagrado da propriedade, refletia o título predominante na época, seguiu os mesmos princípios garantidores da propriedade. Distinguia-se o processo de desapropriação por duas fases distintas: a avaliação e julgamento da necessidade pública que se dava via pedido do Procurador-Geral da Fazenda ao autoridade responsável do domicílio do proprietário e com a audiência deste.[4]


Após a fase de verificação avaliativa da utilidade ou necessidade pública, feita por ato legislativo, era preciso que fosse feito cálculo do ressarcimento em valores  por árbitros nomeados pelo Procurador da Fazenda Pública e pelo dono da propriedade. Assim, no Brasil não existia qualquer alusão legislativa em relação à desapropriação, antes da primeira Constituição Federal.


Em meados do século XIX, os casos de utilidade pública no Brasil foram ampliados após a entrada em vigor do Decreto nº. 353, de 12 de julho, sendo feitas muitas inovações como a instituição do Júri no processo de expropriação. Logo após, o Governo, com o advento do Decreto nº. 816, de 10 de julho, estabeleceu o processo para a expropriação de prédios e terrenos que fossem necessários para a construção das obras e demais serviços pertencentes à Estrada de Ferro Dom Pedro II e as outras estradas de ferro do Brasil, e a marcar as regras para a indenização dos proprietários.


Até 1993 esses decretos ainda vigoravam em nosso território, ano em que o Decreto nº. 1.021 ordenou aplicar a todas as obras da União, o Decreto nº. 816 e permitiu o Poder Executivo promover a estabilização da legislação expropriatória. Este decreto criou a figura da imissão de posse liminar, o direito de retrocessão entre outras inovações jurídicas, porém, não era aplicável a Estados e a Municípios, só tinha vigência para as obras da União e do Distrito Federal. Em seguida, houve o Regulamento aprovado pelo decreto nº. 4.956 o qual firmou a legislação existente e alterou o processo sobre desapropriações por utilidade ou necessidade pública. Sendo cabíveis ao Procurador da República perante o Juiz secional do domicílio do proprietário, os casos de verificação de necessidade pública.


Até a entrada em vigor do Antigo Código Civil de 1916, nenhuma modificação havia sido feita na legislação, no tocante o instituto da desapropriação, todavia, o Código Civil que entrou em vigor no ano de 1917, dispunha em seu artigo 590 sobre expropriação por necessidade ou utilidade pública como forma de perda da propriedade e, não desapropriação legalmente positivada.


Inovações ao exercício do direito de propriedade apareceram com a promulgação da Constituição Federal de 1934 em que este direito não era mais absoluto e a desapropriação só poderia ocorrer em razão de utilidade ou necessidade pública, e mediante prévio e justo pagamento de indenização.


Com o golpe político de 1937, nova Carta Política foi promulgada, mas, novas alterações quanto ao direito de propriedade, vieram somente em 1942, com a entrada em vigor da Lei Constitucional nº. 5,  a qual modificou o texto do art. 122, acrescentando mais um caso expropriatório: “a suspensão da garantia do direito de propriedade de súditos de Estado estrangeiro que por qualquer forma tivesse praticado atos de agressão de que resultasse prejuízo para os bens e direitos do Estado Brasileiro ou bens e direitos de pessoas físicas ou jurídicas brasileiras.” Observando atentamente o referido artigo observamos que se tratava de um confisco, não propriamente de uma expropriação. Seria uma espécie confiscatória de adquirir as propriedades de súditos estrangeiros, cujo país tivesse praticado qualquer tipo de agressão contra a Nação Brasileira.


O atual Código Civil promulgado em 2002 trouxe ao universo jurídico brasileiro uma nova concepção de Direito ao longo do seu texto. Pode-se perceber que o mencionado diploma civil, seguindo a tendência do Direito Moderno, concede aos juristas amplos poderes na determinação do sentido da norma, valendo-se de conceitos indeterminados em inúmeros dispositivos. Traz alterações e novidades no tocante o direito de propriedade. A desapropriação a parece nessa codificação como uma novidade legislativa árdua aos estudiosos e aplicadores do Direito, por conter conceitos indefinidos e abertos de ampla interpretação, como é o exemplo da chamada Desapropriação Judicial, uma das novidades legislativa trazida pela Carta Civil nos parágrafos 4º e 5º do artigo 1228.


Mesmo com o diploma civil positivando as relações reais de propriedade na vida social, as leis complementares ainda vigoram em nosso meio para os casos de divergência entre os aplicadores e as partes  interessadas no conflito, como é o caso do Decreto nº. 3.365, de 21 de julho de 1941, proclamado em meio à vigência da Magna Carta de 1937 e, ainda hoje é o estatuto legal lei complementar que regula a intervenção do Estado na propriedade privada por meio da expropriação no Brasil, mesmo com algumas modificações que lhe tem sido introduzidas com o tempo. Esse decreto vive em uma permanência histórica que alcança décadas, e tal como algumas das reduzidas exceções, não envelheceu naquilo que determinou processualmente, fazendo com que nas lides referentes a desapropriação ocorra conflito entre este decreto e os códigos jurídicos de nosso país, gerando amplas discussões e polêmicas à respeito. 


Nosso ordenamento apresenta de forma clara e coesa as normas referentes a propriedade e desapropriação mas,  deixa lacunas aos aplicadores do direito quando se trata da resolução de lides judiciais referentes ao estudo da desapropriação, por causa que existem em nosso meio legislação ordinária que passaram a vigorar antes da Lei Maior de 1988 e de nosso código Civilista de 2002,  temos: Decreto-Lei nº 3.365, de 21.6.1941, que dispõe sobre desapropriação por utilidade pública; Lei nº 4.132, de 10.9.1962, que define os casos de desapropriação por interesse social e dispõe sobre sua aplicação; Decreto-Lei nº 554, de 25.4.1969, que dispõe sobre desapropriação, por interesse social, de imóveis rurais, para fins de reforma agrária; Decreto-Lei nº 1.075, de 22.1.1970, que regula a imissão de posse, initio litis, em imóveis residenciais urbanos.


É importante lembrar que, mesmo com todas as inovações nos diplomas que regulam o direito de propriedade no âmbito jurídico brasileiro é respeitado o princípio da função social da propriedade prevista na CF-88 (art. 5.o, inc. XXIII e 170 inc. III) quando está voltada a realização de um fim economicamente útil, produtivo, em benefício do proprietário e de terceiros, especialmente quando se dá a interação entre o trabalho e os meios econômicos.[5]


4. Conceito Geral de Desapropriação


Entre os doutrinadores e aplicadores do Direito não há grandes divergências sobre o conceito de desapropriação, a qual, diga-se desde logo, pode incidir sobre bens móveis e imóveis. Pactuando quase sempre de uma mesma opinião não conflitante entre as dos demais, até mesmo por se tratar de objeto de estudo definido nos diplomas e na Lei maior de nosso país. 


De uma forma geral e sucinta podemos conceituar a desapropriação como sendo uma forma originária de aquisição da propriedade, em que acontece uma transferência compulsória da propriedade particular (ou pública de entidade de grau inferior para superior) para o Poder Público ou seus delegados, por utilidade ou necessidade pública ou, ainda, por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro (CF, art. XXIV), salvo as exceções constitucionais de pagamento em títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, no caso de área urbana não edificada, subutilizada ou não utilizada (CF. art. 182, § 4º, III), e de pagamento em títulos da dívida agrária, no caso de Reforma Agrária, por interesse social (CF, art. 184).


O fato de não prover de nenhum título anterior, e, por isso, o bem expropriado torna-se insuscetível de reivindicação e libera-se de quaisquer ônus que sobre ele incidissem precedentemente, é uma das características fundamentais do instituto da desapropriação.


É um procedimento administrativo que se realiza em duas fases: a primeira, de natureza declaratória consubstanciada na indicação da necessidade ou utilidade pública ou do interesse social a segunda de caráter executório, compreendendo a estimativa da justa indenização e a transferência do bem expropriado para o domínio do expropriante. Este procedimento que tem como atos intermediários (declaração de utilidade, avaliação, indenização), visando a obtenção de um ato final, que é a adjudicação do bem ao Poder Público ou ao seu delegado beneficiário da expropriação.


O ilustre doutrinador Pontes de Miranda também nos dá excelente conceituação do que seja a desapropriação: “ato de direito público mediante o qual o Estado transfere direito ou subtrai o direito de outrem, a favor de si mesmo, ou de outrem, por necessidade, ou utilidade pública, ou por interesse social, ou simplesmente o extingue” [6]


5. Teorias Referentes à Desapropriação


Com o objetivo de fundamentar e justificara o instituto da desapropriação nos ordenamentos jurídicos vigentes, existem inúmeras teorias que procuram desempenhar de forma detalhada esse papel, sendo as principais:


5.1. Teoria Coletivista:


 Esta teoria teve bastante repercussão no século passado e afirma que a primeira forma de propriedade existente foi a propriedade coletiva, sendo a  propriedade primitiva comunitária, comunista, da coletividade e, sendo meramente tolerada a propriedade individual pelo Estado, reservou-se este o direito de novamente assumi-la para si, quando necessário.


Azcárate leciona que a sociedade primitiva não conheceu outra forma de propriedade a não ser a familiar, a grupal e a tribal. Sendo apoiado por ilustres teóricos como Pérez, Pujol Costa, Ureña, Altamira, etc.[7]


5.2. Teoria do Domínio Eminente do Estado:


Esta doutrina expõe que o Estado, como atributo da própria soberania, desempenha um superdomínio sobre seu território. De acordo com esses poderes, ele pode limitar ou suprimir a propriedade individual, quando achar conveniente.


É uma vantagem do Estado que, em nome da própria soberania, tem o objetivo de restringir a propriedade individual, em nome do interesse público. Lizarralde, citado por Hugo Palacios Mejia, define o domínio eminente como o “direito que tem o Estado, em sua condição de pessoa jurídica, para exercer soberania sobre seu território e sobre os bens nele existentes”. [8]


Esta teoria é tão importante para o estudo em análise pois, em seu âmbito é capaz de apresentar um teoria implícita que trata da  prevalência do interesse público sobre o privado ou teoria da colisão de direitos de forma simplista, mas bem fundamentada: a desapropriação se justifica pela subordinação do direito particular ao direito do Estado.


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5.3. Teoria do Pacto Social:


Conforme observava Rousseau em seu Discurso sobre a Economia Política que o fundamento do pacto social é a propriedade, bem como de todos os direitos civis, não podendo subsistir nenhum outro no caso de abolição da mesma.  A referida teoria afirma como o fundamento do próprio Estado o contrato social entre os cidadãos, de modo a restar implícita a eventualidade de se sacrificar a propriedade de cada um no interesse de todos.


5.4. Teoria da Função Social da Propriedade:


Esta teoria bastante difundida após a promulgação da Carta Magna de 1988 e do Novo Código Civil de 2002, já havia sido indicada Santo Tomás de Aquino em que afirmava que o proprietário de um bem deveria utilizá-lo como um gestor perante a sociedade, de modo a favorecer o maior número possível de indivíduos.


A doutrina da função social da propriedade reconhece a propriedade individual, desde que condicionada ao interesse público. Percebe-se que o conceito de propriedade no Direito brasileiro inspirou-se nestas duas últimas teorias, como se observa nos dispositivos constitucionais inúmeros são os instrumentos de cumprimento da função social da propriedade.


Vale observar que referidos instrumentos emergem fundamentalmente do texto constitucional, são regulamentados por vasta e complexa legislação infraconstitucional especial, bem como dos principais dispositivos apresentados pelo novo Código Civil de 2002.


5.5. Teoria da Alienação Compulsória:


Os doutrinadores que aderiram a essa teoria pecam gravemente ao omitir o acordo de vontades, essencial a qualquer convenção, assim, a lei pode obrigar a dar, a fazer e a suportar, mas não a querer. Para esta teoria, a desapropriação vem a ser uma alienação compulsória, pois no procedimento expropriatório estão presentes a entrega do bem e o pagamento do preço.


6.Espécies de Desapropriação


O direito atual apresenta diversificadas formas de desapropriação, preliminarmente, é fundamental distinguirmos as espécies de desapropriação, previstas na própria Constituição Federal Brasileira e no Código Civil de 2002:


6.1. Desapropriação Ordinária


Também conhecida como desapropriação por necessidade pública ou utilidade pública, interesse social, prevista no art. 5° XXIV da CF/88, trata-se de um procedimento destinado a substituir, compulsoriamente, um direito de propriedade por uma indenização justa e prévia e em dinheiro. A indenização deve preceder a perda da propriedade, e corresponderá ao justo valor do bem, devendo ser efetuada em dinheiro.   


São órgãos competentes para a desapropriação ordinária: a) a União; b) os Estados; c) o Distrito Federal; d) os municípios. Nos termos do art. 14 do Decreto-Lei nº 512/69, em casos de expropriações para finalidades rodoviárias, é também competente o Departamento Nacional de Estradas de Rodagem.


Já, o procedimento na desapropriação ordinária, pode ser administrativo ou judicial, este configurado na ação de desapropriação prevista nos arts. 11 a 30, do Decreto-Lei nº 3.365/41.


6.2. Desapropriação para Reforma Urbana


Encontra-se essa especificação no art. 182, § 4º, da Constituição Federal Brasileira, definindo como o método do Poder Público deflagrado por município ou pelo Distrito Federal, com o escopo de substituir, compulsoriamente, o direito de propriedade sobre um imóvel urbano inadequadamente explorado, mediante indenização em títulos da dívida pública.


A função social da propriedade é o fundamento maior desta espécie, portanto diferencia-se da espécie ordinária na inobservância da função social urbana; nos bens que atinge (apenas imóveis urbanos inadequadamente aproveitados); natureza da indenização (títulos da dívida pública); competência para decretá-la (limitada aos municípios e ao Distrito Federal).


Sendo regulamentado pelo Decreto-Lei nº 3.365/41.


6.3. Desapropriação para Reforma Agrária


O artigo 184 da Constituição Federal define como o processo estatal iniciado pela União e destinado a substituir, compulsoriamente, o direito de propriedade de imóveis rurais improdutivos de grande extensão ou titularizados por proprietários de outros imóveis rurais, por uma indenização prévia, justa e em títulos da dívida agrária.


Não se deve confundir essa espécie com a desapropriação ordinária, porque sua base é a inobservância da função social rural, e os bens que atinge são, exclusivamente, imóveis rurais improdutivos de grande extensão, é diversa a indenização que enseja (títulos da dívida pública, com ressalva do valor das benfeitorias úteis e necessárias) e, finalmente, porque a competência para decretá-la é restrita à União Federal, por si ou por seu delegados.


O art. 186 da Constituição Federal apresenta os requisitos para o atendimento à função social dos imóveis rurais, quanto à indenização, deve ser prévia, ou seja, anterior à perda da propriedade, e justa, isto é, suficiente a manter indene o patrimônio financeiro do expropriado.


6.4.Desapropriação Confiscatória


O decreto-lei nº 8.257, de 26.11.91 disciplina a desapropriação das glebas onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas. Após a expropriação, conforme o procedimento disciplinado na Lei 8.257/91 são essas áreas destinadas a assentamento de colonos com vistas ao cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos.[9]


6.5.Desapropriação Judicial


Esta éspecie de desaproprição é uma nova figura trazida pelos §§4.º e 5.º do art. 1.228, CC/2002, e motivo de conflito de conceituação entre os doutrinadores. Talvez entre todas as espécies classificatórias da aquisição da propriedade essa seja a que mais encontramos divergências entre os estudiosos e aplicadores, no âmbito da propriedade expropriante, a responsabilidade pela indenização e a sua distinção da usucapião como asseguram alguns doutrinadores, denominando-a Usucapião Onerosa.


Neste tipo de expropriação há a perda da propriedade diante posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, mediante o pagamento de indenização. Embora não se confunda com a usucapião, que não requer contrapartida econômica, essa nova figura também não se identifica por completo com a desapropriação propriamente dita, que tem como expropriante o Poder Público, passando o bem à dominialidade pública (embora posteriormente possa ter destinação diversa). Assim, sua disciplina será dada pelo direito privado, em que pese o seu caráter coletivo, pois se verificará no interesse particular dos possuidores.


7. Desapropriação Judicial e os Conceitos Abertos


Mesmo com proteção jurídica pela Lei Maior de nosso Estado Democrático de Direito, a desapropriação judicial se torna uma dura tarefa no âmbito do direito brasileiro, pois boa parte dos problemas discutidos e examinados nesse instituto é munida de discussões amplas, contestações e polêmicas. Pois, o legislador depositou no magistrado confiança e responsabilidade no sentido de construir a norma da maneira mais justa e adequada ao caso concreto. Em que as normas que expõe contêm elementos abertos a amplas interpretações e significados em alcance dos conceitos de “extensa área”, “boa-fé”, “considerável número de pessoas” e “interesse social e econômico relevante” exigem do julgador grande dose de sensibilidade e bom senso. Acontecendo assim, a linha divisória entre a discricionariedade e a arbitrariedade sendo traçada pelo principio da razoabilidade.


Sobre a adoção de conceitos abertos pelo Código, afirma Miguel Reale, maestro da Carta Cível atual:


“Somente assim se realiza o direito em sua concretude, sendo oportuno lembrar que a teoria do Direito concreto, e não puramente abstrato, encontra apoio de jurisconsultos do porte de Engisch, Betti, Larenz, Esser e muitos outros, implicando maior participação decisória conferida aos magistrados. Como se vê, o que se objetiva alcançar é o Direito em sua concreção, ou seja, em razão dos elementos de fato e de valor que devem ser sempre levados em conta na enunciação e na aplicação da norma”.[10]


Alguns doutrinadores se arriscam a fazer palpites acerca do fechamento dos conceitos apresentados pela lei. Há quem diga que, utilizando como referência o texto constitucional, poder-se-ia sugerir como extensa área algo em torno de dez vezes o terreno de 250 metros quadrados – tratando-se de área urbana, por analogia ao artigo 183 – ou 50 hectares, tratando-se de área rural, tendo por paradigma o artigo 191.[11]


Nesse diapasão, o número “considerável” de pessoas poderia ser proporcional a cada área individualizada, de modo que haveria de existir uma família para cada área de 250 metros quadrados ou cinqüenta hectares, conforme o caso. Considerar-se-ia, ainda, a moradia ou o desenvolvimento de atividades capazes de gerar produtividade econômica como “obras e serviços de interesse social e econômico relevante”.[12]


Numa tentativa de conceituação desses elementos o célebre doutrinador Hely Lopes Meireles afirma:


Necessidade pública surge quando a Administração defronta situações de emergência, que, para serem resolvidas satisfatoriamente, exigem a transferência urgente de bens de terceiros para o seu domínio.


Utilidade Pública- apresenta-se quando a transferência de bens de terceiros para a administração é conveniente, embora não seja imprescindível.


Interesse social- ocorre quando as circunstâncias impõem a distribuição ou o condicionamento da propriedade para seu melhor aproveitamento, utilização ou produtividade em benefício da coletividade ou de categoria sociais merecedoras de amparo específico do Poder Público.”[13]  


8. A Usucapião Onerosa em Contraste com a Desapropriação Judicial por Interesse Social


Essa inovação encontrada nos institutos previstos no art. 1228, § 4° e 5°, tem sido um dos dispositivos que mais tem apresentado discussões doutrinárias sobre a natureza jurídica da regra nele previsto. Com efeito, parte da doutrina entende se tratar de usucapião onerosa, a segunda parte defende a teoria que se trata de desapropriação judicial por interesse social.


É minoritário, por enquanto, os seguidores da corrente que os parágrafos do dispositivo apresenta hipótese da usucapião onerosa, mas tem defensores ilustres e conceituados, como o professor Teori Zavascki.   


Para a defesa deste posicionamento, os teóricos utilizam vários argumentos, tais como, os requisitos da posse ininterrupta e de boa-fé, exigidos para a perda da propriedade, são típicos do instituto da usucapião.


Para eles não seria adequado se falar em desapropriação, pois esta é um ato administrativo, e não judicial, como previsto no art. 1.228, § 4º. Apresenta também como argumento a responsabilidade no pagamento da indenização prevista no art. 1.228, § 5º só pode caber aos possuidores, tratando se de usucapião onerosa.


Suas ideologias têm como núcleo o §5° que institui a responsabilidade de indenização devida ao proprietário, que defendem os atuais possuidores da propriedade como interessados na lide, portanto, os responsáveis pelo pagamento.


O aclamado doutrinador Teori Zavascki defende seus argumentos em sua obra:


 “A desapropriação é ato de natureza administrativa e, no caso, o ato do juiz é tipicamente jurisdicional: ele simplesmente resolve um conflito de interesses entre particulares, decidindo num sentido ou em outro, segundo estejam atendidos ou não os pressupostos legais.


O juiz não poderá desapropriar sem que os interessados o peçam expressamente, até porque eles é que sofrerão os ônus correspondentes, de pagar o preço, e serão eles, e não o poder público, que adquirirão a propriedade. O Estado nem sequer é parte no processo, atuando nele como órgão jurisdicional. Se fôssemos comparar a com algum instituto já formado e sedimentado em nosso sistema, haveríamos de fazê-lo não com o da desapropriação, mas com o da usucapião. Pelos seus requisitos (“posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos”) assemelha-se à usucapião, com a única diferença de que, para adquirir a propriedade, os possuidores usucapientes ficam sujeitos a pagar um preço. Ou seja: é espécie de usucapião onerosa. “[14]


Analisando profundamente o posicionamento do doutrinador, podemos perceber uma dissociação do principio da função social da propriedade, objetivo principal a ser atingido no instituto da usucapião, assim notamos um pensamento equivocado do ilustre professor, ao fazer embate de seus pensamentos com a principal função da propriedade. Em seu entendimento, se os possuidores não tiverem condições de arcar com a indenização fixada pelo juiz, deverão devolver o imóvel ao seu proprietário, mais uma vez havendo ofensa ao principio da função social e uma situação não ensejada pelo Código Civil, caso esse posicionamento for considerado exato.


Em virtude do principio da função social, o instituto da usucapião não traz em sua particular formação o pagamento de qualquer indenização aos possuidores. Para reforçar essa idéia do principio central da propriedade a Lei n° 10.257/01, Estatuto das Cidades, expõe em seu art. 10 que a posse coletiva deve provocar a perda da propriedade em face dos possuidores, caracterizando essa coletividade como população de baixa renda e impondo limite mínimo a área urbana a ser desapropriada. Esta lei é taxativa sobre se tratar de usucapião e não fixa qualquer forma de indenização ao proprietário.[15]


9. Comparativo do art.10 da Lei n° 10.257/01 e o art. 1228, §§ 4° e 5° do CCB


Observando o art. 10 da Lei n° 10.257/01 e fazendo uma comparação com o art. 1228, §§ 4° e 5° do nosso atual Código Civil, fica evidente a semelhança que ambos artigos trazem objetivos de atendimento e atenção à função social da propriedade, que conforme citado anteriormente, trata-se do princípio-núcleo do direito de propriedade.


É encontrada distinção entre os artigos no tocante a indenização. A desapropriação tratada no Estatuto das Cidades não exige indenização, assim reforça a teoria contrária a usucapião onerosa, já a desapropriação tratada nos parágrafos 4° e 5° do art. 1228 do CCB exige a indenização fixada pelo juiz. Tratando assim de usucapião na primeira e desapropriação judicial na segunda, conforme ensina o admirável doutrinador Silvio de Salvo Venosa:


“Em ambas as situações encontramos a busca pelo sentido social da propriedade, sua utilização coletiva. Em ambas há necessidade de posse ininterrupta por cinco anos.(…) Na situação enfocada do Código Civil, porém, a aquisição aproxima-se da desapropriação, pois de acordo com o art.1.228, §5º, o juiz fixará a justa indenização devida ao proprietário;”[16]


Ainda contrapondo a teoria da usucapião onerosa quando argumenta se tratar de um ato administrativo, e não judicial, novamente mostra-se equivocados seus argumentos, pois analisando a desapropriação indireta, aquela em que ocorre sem observância do devido processo legal, que o Poder público se apossa do imóvel e este passa a integrar de forma irregular o patrimônio público pela destinação pública que lhe foi dada, cabendo ao Judiciário, em caso de ação judicial, reconhecer a existência da desapropriação e fixar a indenização por perdas e danos.


Os estudos de Carlos Alberto Maluf ensinam neste sentido que:


“(…) os múltiplos casos de “desapropriação indireta”, que são casos típicos de “desapropriação pretoriana”, resultantes das decisões de nossos tribunais, estão aí para demonstrar que o ato expropriatório não é privilégio nem prerrogativa exclusiva do Executivo ou do Legislativo. Nada existe que torne ilegítimo que, por lei, em hipóteses especiais, o poder de desapropriar seja atribuído ao juiz, que resolverá em função das circunstâncias verificadas no processo, em função do bem comum.”[17]


Destarte, analisando as duas teorias em exposição de nosso estudo e considerando os tipos de desapropriação existentes (por necessidade/utilidade pública e por interesse social), podemos verificar que os parágrafos 4° e 5° do artigo 1228 tratam a idéia de desapropriação judicial por interesse social, conforme a definição do art. 1° da Lei n°4.132/62, que é aquela com  objetivo de promover a justa distribuição da propriedade ou condicionar o seu uso ao bem-estar social”.


10. Considerações Finais


Em síntese, podemos chegar a conclusão que a denominação de desapropriação judicial por interesse social no art. 1248 §§ 4° e 5° de nosso Código Civil se adéqua de forma mais equivalente do que o conceito de Usucapião Onerosa, conforme desejam alguns doutrinadores.


Várias distinções entre a teoria nos levam a esse arremate definitivo, pois, os argumentos utilizados pelos teóricos que defendem a forma de usucapião onerosa contradizem o principio fundamental do direito de propriedade, ou seja, a teoria da função social da propriedade, elemento principal do direito de propriedade.


A discussão se torna aceitável, devido o grande número de conceitos abertos presentes nos dispositivos apresentados, que torna ampla a interpretação dos parágrafos do art. 1248 do nosso Código Civil de 2002.


 


Referências bibliográficas

CAMPOS, Diogo Fontes dos Reis Costa Pires de, Desapropriação como instrumento de execução da política urbana, disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=14924. Acesso em 31 de Maio de 2010.

Zerbes Marcelo Inda, Desapropriação e aspectos gerais da intervenção do Estado na propriedade privada, diponivel em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9394. Acesso em 04 de Junho de 2010.

RICCITELLI Antônio,  Função social da Propriedade,  disponível   em: http://www.lopespinto.com.br/adv/publier4.0/texto.asp?id=373 . Acesso em 30 de Maio de 2010.

Filho Jose Barroso, A função Social da Propriedade A Quem Serves,  disponível em http://www.facs.br/revistajuridica/edicao_setembro2001/corpodocente/social.htm. Acesso em 02 de Junho de 2010.

CASTRO, Mônica. A desapropriação judicial no Novo Código Civil, Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, São Paulo, ano IV, n. 19, set. – out. 2002.

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RIBEIRO, Alex Sandro. Posse pro labore do Novo Código Civil: anotações, Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, ano IV, n. 23, mai-jun 2003.p.150

 

Notas:

[1] Gilmar Mendes, Curso de Direito Constitucional, 4 Ed. Saraiva, 2009, p.469

[2] XXII – é garantido o direito de propriedade;

XXIII – a propriedade atenderá a sua função social;

XXIV – a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nesta Constituição;

[3]  § 4º – É facultado ao Poder Público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, que promova seu adequado aproveitamento
Art. 184 – Compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até vinte anos, a partir do segundo ano de sua emissão, e cuja utilização será definida em lei.

[4]  ” Art. 179, item 22:É garantido o direito de propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem público, legalmente verificado, exigir o uso e emprego da propriedade do cidadão, será ele previamente indenizado do valor dela. A lei marcará os passos com que terá lugar esta única exceção e dará as regras para se determinar a indenização”. 

[5]  Miguel Reale Júnior. Casos de direito constitucional. São Paulo: RT, 1992. Pág. 14.

[6] Comentários à Constituição de 1946, 1953, 2ª ed., t. 4º, p. 216

[7] TOBEÑAS, José Castán. La propiedad y sus problemas actuales. 2ª ed., Madrid: Reus, 1963. 

[8] Palacios Mejia, Hugo, Introducción a la Teoria del Estado, Bogotá, Editorial Temis, 1965, p. 58. 

[9] “Art. 243. As glebas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e especificamente destinadas ao assentamento de colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e medicamentosos, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”.

[10] REALE, Miguel. Visão geral do novo Código Civil . Jus Navigandi, Teresina, a. 6, n. 54, fev. 2002. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=2718>. Acesso em: 03 ago. 2005.

[11] RIBEIRO, Alex Sandro. Posse pro labore do Novo Código Civil: anotações, Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, ano IV, n. 23, mai-jun 2003.p.150

[12] RIBEIRO, Alex Sandro. Posse pro labore do Novo Código Civil: anotações, Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil, ano IV, n. 23, mai-jun 2003.p.150

[13] Hely Lopes Meirelles, Direito administrativo brasileiro, 32. Ed., São Paulo: Malheiros, 2006, p. 607-608

[14] Teori Albino Zavascki, A tutela da posse na Constituição e no projeto do novo Código Civil, in A reconstrução do direito privado: reflexos dos princípios, diretrizes e direitos fundamentais constitucionais no direito privado, Coord. Judith Martins-Costa, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, pp. 850-5.

[15] “Art. 10. As áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são susceptíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.

§ 2º A usucapião especial coletiva de imóvel urbano será declarada pelo juiz, mediante sentença, a qual servirá de título para registro no cartório de registro de imóveis. 

[16] Sílvio de Salvo Venosa, Direito Civil: Direitos Reais, São Paulo: Atlas, 3ª ed., 2003, pp. 205-8

[17] Carlos Alberto Dabus Maluf, Código Civil comentado,  São Paulo: Saraiva,2002, pp.1.097-9.


Informações Sobre o Autor

Francisco Fernando Ferreira Felipe

Acadêmico de Direito na Universidade Regional do Cariri


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