Despesas de condomínio na Lei do Inquilinato

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1 – INTRODUÇÃO

A relação contratual que se desenvolve no âmbito da locação tem suscitado algumas polêmicas no que diz respeito ao pagamento dos encargos relativos ao imóvel locado, sejam eles pactuados ou não.

Diuturnamente, vêem-se as figuras do locador e do locatário às voltas com o conturbado binômio pagar/receber, ou buscando eximir-se o quanto possam das despesas oriundas do imóvel objeto da locação.

 Por óbvio, cada um deles deseja auferir da contratação as maiores vantagens possíveis. Essas vantagens, muitas vezes, estão intimamente ligadas com pequenas despesas, que acabam repercutindo no resultado final esperado da avença.

De um lado, o locatário buscando um aluguel mais acessível, procurando não ser onerado em demasia quando da contratação que irá permitir a satisfação de sua necessidade mais básica: a moradia. Por não ter, ao menos momentaneamente, recursos suficientes para a aquisição da tão sonhada “casa própria”, necessita buscar em imóvel alheio o local onde vai instalar seu reduto doméstico, o lar. Para tanto, almeja a melhor localização, as instalações mais aconchegantes, o maior potencial de conforto, e tudo, se possível, pelo menor preço.

De outro, o  locador que, detentor de posses, emprega seus recursos na aquisição de bens de raiz, transformando-os em investimento.  É claro que este, por sua vez, anela pelo lucro, pelo resultado do capital investido, muitas vezes dependendo desses recursos financeiros para sua própria subsistência. Por ceder a outrem o seu imóvel, empenha-se em transferir o máximo dos  encargos a ele inerentes àquele que vai usufruir de seu patrimônio, pois entende-se merecedor da percepção dos alugueres sem ônus que os consumam ou diminuam.

“Há de se levar em conta, ainda, que no momento em que se firmam os contratos de locação toma-se em consideração não só o aluguel em si, como os encargos, podendo-se obter uma renda maior ou menor em função do que se deve pagar a mais ou a menos, além do aluguel.”1

Surgem daí as imposições de pagamento ao locatário, das mais variadas despesas, mesmo dos impostos e taxas que recaem sobre o bem. Um conflito de interesses, enfim, que se pacifica (ou não) no instrumento contratual, sob os auspícios de uma legislação rígida, que assim se faz para assegurar o equilíbrio ante este dualismo de pretensões.

Mas nem sempre esse contrato formaliza aquilo que vai preceituado na lei. Nos dias atuais, faz-se cada vez mais comum a inserção de cláusulas contratuais que contrariam as disposições da Lei do Inquilinato, sobretudo quando o lado mais fraco convive com a escassez na oferta, em locais de alta demanda.

GILBERTO CALDAS2,  comentando a Lei do Inquilinato, mais precisamente no artigo 22,  elucida que “no item X, o legislador obriga taxativamente o locador a arcar com as despesas extras de condomínio, providência que nunca foi respeitada pelas administradoras na vigência da lei anterior. As despesas de condomínio eram todas englobadas e o locatário, desavisadamente acabava pagando melhorias que só interessavam ao proprietário.”

Como se vê, a ignorância dos postulados legais, em nosso país, é  fator agravante do desequilíbrio nas relações locatícias. Algumas regras de mercado tornam-se práticas tão arraigadas que os contratantes passam a acreditar que são legitimadas pela norma jurídica, quando em regra não o são.

E quando isso acontece, o relacionamento entre as partes tende a tornar-se conflituoso, se uma delas voltar os olhos para a legislação e questionar as despesas que estiver suportando indevidamente.

Sob esse enfoque, realizando um corte metodológico na Lei dos Condomínios, conjugando-a com a Lei do Inquilinato, propomo-nos estudar alguns dos problemas que surgem quando da cobrança das despesas de condomínio, examinando quais delas efetivamente competem ao inquilino e quais são de responsabilidade exclusiva do locador.

Nosso estudo abordará, portanto, as despesas ordinárias e extraordinárias do condomínio e, principalmente,  aquelas que restaram não arroladas, quer por se terem tornado práticas supervenientes à própria lei, ou pela única impossibilidade de o legislador ordinário prever exaustivamente todas as hipóteses de despesas a realizar pelo condomínio.

Esperamos, assim, contribuir para uma mais perfeita compreensão dos direitos e deveres que envolvem a relação locatícia de apartamentos e unidades condominiais.

2 – DESPESAS DE CONDOMÍNIO. A QUEM COMPETEM AS DESPESAS CONDOMINIAIS DA UNIDADE IMÓVEL LOCADA.

As relações jurídicas que se operam entre os que habitam ou utilizam edificações ou conjuntos de edificações, destinadas a fins residenciais ou não residenciais,  estruturadas na forma de condomínio, encontram-se, ainda presentemente, reguladas pela Lei 4.591, de 16 de dezembro de 1964, a qual dispõe sobre o condomínio em edificações e as incorporações imobiliárias.

Em seu artigo 12, ‘caput’, a Lei 4.591/64 estabeleceu quais seriam as despesas obrigatórias para todos os condôminos, visando, assim, garantir o custeio daquelas despesas necessárias ao funcionamento, manutenção e aformoseamento do edifício.

Art. 12. Cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio.

Se, como visto, a lei de condomínios em edificações prevê para o condômino a obrigatoriedade do pagamento das despesas rateadas, certo é que quando este loca sua unidade a terceira pessoa, estabelece com ela uma relação contratual que, nos moldes da Lei 8.245/91, transfere ao locatário usuário um conjunto de encargos relativos ao imóvel locado. Outros, porém, permanecem afetos ao próprio condômino, que por eles continua obrigado.

Na Seção IV, de seu Capítulo I, mais precisamente nos artigos 22 e 23, a Lei do Inquilinato cuidou de delimitar os deveres do locador e do locatário no que pertine às despesas de condomínio, ditando que incumbe ao locador o pagamento das despesas extraordinárias de condomínio (art. 22, X) e ao locatário o das ordinárias (art. 23, XII).

Aqui abrimos o primeiro parêntese, para averiguar até que ponto essas disposições interferem nas relações que se operam entre os condôminos.

3 – QUEM RESPONDE PELAS DESPESAS DO CONDOMÍNIO

No contexto da Lei do Inquilinato em face da Lei de condomínio em edificações, pode o condômino proprietário, no caso o locador, tentar eximir-se das despesas ordinárias, por força do contrato de locação mantido com o locatário, uma vez que a este competem tais despesas?

Por óbvio que não. A responsabilidade pelo pagamento de todas as despesas referentes à unidade condominial são do condômino, pouco importando quem esteja ocupando o imóvel e a que título. Assim, perante o condomínio, responderá o locador, com direito de regresso contra o locatário, no que tange às despesas ordinárias.

Tanto é assim que, no seu artigo 25, a Lei do Inquilinato conferiu ao locador o direito de cobrar as despesas ordinárias de condomínio juntamente com o aluguel do mês a que se refiram, tornando claro que tal cobrança, na verdade, trata-se de mero reembolso daquilo a que o locador está obrigado perante o respectivo condomínio.

Vejamos a jurisprudência acerca do assunto:

Segundo dispõe o art. 12 da Lei nº 4.591/64, cada condômino concorrerá nas  despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na convenção, a  cota-parte que lhe couber em rateio. Desse modo, é irrelevante que a unidade  imobiliária esteja locada a terceiro, persistindo a responsabilidade direta do  condômino frente ao condomínio pelo pagamento das respectivas taxas, em face  da inexistência da relação jurídica entre o locatário e o condomínio. (TA/PR –  Ap. Cível n. 0069325-6 – Comarca de Curitiba – Ac. 5588 – unân. – 3a. Câm.  Cív. – Rel: Juiz Domingos Ramina – j. em 18.10.94 – Fonte: DJPR, 04.11.94, p. 75 – In Bonijuris, 22914).

JORGE TARCHA e LUIZ ANTONIO SCAVONE JUNIOR3 sintetizam a questão:

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No âmbito da locação, o locatário não pode ser considerado condômino para efeito de legitimidade em face do condomínio.

Em verdade, o locatário deve as despesas condominiais ao locador por força do contrato de locação e do art. 23, inciso XII, da Lei n. 8.245 de 18 de outubro de 1991. Não possui, assim, legitimidade em face do condomínio.

É neste sentido o entendimento do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo:

Despesas condominiais – Ação movida diretamente contra o locatário – Inadmissibilidade –  Ilegitimidade passiva ad causam – Perante o condomínio só responde o condômino – Inteligência do art. 12, da Lei 4.591/64 (in RT-725/256) –( v. no mesmo sentido RT-744/266).

Em complemento, alia-se a observação de GILBERTO CALDAS: “Aliás nenhum liame existe ente o condomínio, como ente jurídico, e o locatário. Tanto que a taxa de condomínio é endereçada diretamente ao proprietário”.4

4 – A NATUREZA JURÍDICA DAS DESPESAS CONDOMINIAIS

Tratam-se as despesas de condomínio de obrigações de pagar, derivadas da propriedade, direito real por excelência.

 ORLANDO GOMES5 discorre sobre as obrigações afirmando que há aquelas que “nascem de um direito real do devedor sobre determinada coisa, a que aderem, acompanhando-o em suas mutações subjetivas. São denominadas obrigações in remob ou propter rem, em terminologia mais precisa, mas também conhecidas como obrigações reais ou mistas”.

Para o autor, “esse cordão umbilical jamais se rompe. Se o direito de que se origina é transmitido, a obrigação o segue, seja qual for o título translativo.”

É hoje ponto pacífico em nossa doutrina e jurisprudência, que a natureza jurídica da obrigação resultante do imóvel em condomínio, como sendo a ele inerente, é de obrigação propter rem. Surge daí, uma indagação no que tange ao momento em que o titular do domínio se obriga ou se desobriga, caso o transfira a terceira pessoa.

Por sua Jurisprudência, os Tribunais de Alçada Civil de São Paulo  e do Rio de Janeiro elucidam:

CONDOMÍNIO – Despesas condominiais anteriores à aquisição da unidade autônoma pelo réu. Obrigação propter rem, tornando-o responsável pelo pagamento, porque titular do direito real, sendo irrelevante que ele e o vendedor não tenham pactuado solidariedade quanto às despesas do condomínio. Inteligência do art. 624 do CC. (1º TACivSP – Ap. 498.277-8 – 2ª C. – Rel. Juiz Ribeiro de Souza – J. 23.09.1992 – JTACSP, 136/84 –Juris Síntese –202471.

Despesas condominiais – Penhora – incidência sobre único imóvel destinado à moradia do devedor e respectivos bens móveis que guarnecem a residência – Admissibilidade – Obrigação de caráter propter rem onde a constrição poderá recair sobre unidade para satisfazer a execução – Inteligência do art. 3o, IV, da Lei 8.009/90 (2o TACivSP – in RT-746/294).6

CONDOMÍNIO – DESPESAS – COTAS CONDOMINIAIS – OBRIGAÇÃO DO CONDÔMINO – ALIENAÇÃO DE UNIDADE AUTÔNOMA – PERMANÊNCIA DA RESPONSABILIDADE ATÉ O REGISTRO – Obrigação do condômino, assim compreendido aquele em cujo nome esta registrado o imóvel no RGI. A alienação da unidade autônoma não exonera o comunheiro das suas obrigações condominiais, enquanto não registrado o título translativo do domínio. (TACRJ – AC 13945/92 – (Reg. 1341-3) – Cód. 92.001.13945 – 2ª C. – Rel. Juiz Carlos Motta – J. 18.02.1993 – Ementa 35842 – in Juris Síntese 11002342).

E o STJ confirma esse entendimento, dispondo:

CONDOMÍNIO – Responsabilidade do adquirente da unidade pelas cotas condominiais em mora – Cabimento – Irrelevância da forma de aquisição.

Condomínio. Cotas condominiais. O adquirente da unidade responde perante o  condomínio pelas cotas condominiais em atraso. O modo de aquisição não assume  relevo. Recurso conhecido pelo dissídio, mas não provido. (STJ – Rec. Especial  n. 67701-7 – Rio Grande do Sul – Ac. 3a. T. – unân. – Rel: Min. Costa Leite –  j. em 20.05.97 – Fonte: DJU I, 16.06.97, pág. 27361).

Estabelecidas essas premissas e bases, quanto ao que são despesas e a quem incumbe responder pelas mesma perante o Condomínio, podemos adentrar na especificação do que são despesas ordinárias e extraordinárias e a quem compete seu pagamento no âmbito da relação contratual locatícia.

5 – AS DESPESAS ORDINÁRIAS

O § 1º do artigo 23, da Lei do Inquilinato apresenta a definição para despesas ordinárias de condomínio, dizendo entender-se por estas “as necessárias à administração respectiva” e arrola as seguintes:

a)   salários, encargos trabalhistas, contribuições previdenciárias e sociais dos empregados do condomínio;

b)   consumo de água e esgoto, gás, luz e força das áreas de uso comum;

c)   limpeza, conservação e pintura das instalações e dependências de uso comum;

d)   manutenção e conservação das instalações e equipamentos hidráulicos, elétricos, mecânicos e de segurança, de uso comum;

e)   manutenção e conservação das instalações e equipamentos de uso comum destinados à prática de esportes e lazer;

f)     manutenção e conservação de elevadores, porteiro eletrônico e antenas coletivas;

g)   pequenos reparos nas dependências e instalações elétricas e hidráulicas de uso comum;

h)   rateios de saldo devedor, salvo se referentes a período anterior ao início da locação;

i)      reposição do fundo de reserva, total ou parcialmente utilizado no custeio ou complementação das despesas referidas nas alíneas anteriores, salvo se referentes a período anterior ao início da locação.

§ 2º. O locatário fica obrigado ao pagamento das despesas referidas no parágrafo anterior, desde que comprovadas a previsão orçamentária e o rateio mensal, podendo exigir a qualquer tempo a comprovação das mesmas.

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§ 3º. No edifício constituído por unidades imobiliárias autônomas, de propriedade da mesma pessoa, os locatários ficam obrigados ao pagamento das despesas referidas no § 1º deste artigo, desde que comprovadas.

Em linhas gerais, as despesas ordinárias são aquelas que se relacionam com o uso, manutenção e conservação das áreas e instalações de uso comum, da edificação em regime de condomínio e devem ser suportadas pelo locatário.

6 – AS DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS

Há, no entanto, outras despesas que refogem à ordinariedade, constituindo gastos que incorporam-se ao imóvel, valorizando-o ou visando restabelecer sua condição de habitabilidade e que não podem ser transferidas ao locatário.

Seu disciplinamento está contido nas alíneas do parágrafo único do artigo 22, da Lei do Inquilinato, a saber:

Art. 22. O locador é obrigado a: (…)

X – pagar as despesas extraordinárias de condomínio.

Parágrafo único. Por despesas extraordinárias de condomínio se entendem aquelas que não se refiram aos gastos rotineiros de manutenção do edifício, especialmente:

a)   obras de reformas ou acréscimos que interessem à estrutura integral do imóvel;

b)    pintura das fachadas, empenas, poços de aeração e iluminação, bem como das esquadrias externas;

c)    obras destinadas a repor as condições de habitabilidade do edifício;

d)   indenizações trabalhistas e previdenciárias pela dispensa de empregados, ocorridas em data anterior ao início da locação;

e)   instalação de equipamentos de segurança e de incêndio, de telefonia, de intercomunicação, de esporte e de lazer;

f)     despesas de decoração e paisagismo nas partes de uso comum;

g)   constituição de fundo de reserva.

Como se pode observar, é do locador a responsabilidade por seu pagamento.

7 – ALGUMAS DESPESAS NÃO ENUMERADAS EXPRESSAMENTE PELOS ARTIGOS 22 E 23 DA LEI DO INQUILINATO

Se o legislador ordinário procurou fazer-se tão minucioso a ponto de enumerar as despesas consideradas ordinárias e extraordinárias, é certo que  não pretendeu ser exaustivo e muito menos atribuir caráter de taxatividade ao rol que apresentou na Lei do Inquilinato.

Exemplo disso é a clara redação utilizada quando define o que sejam despesas ordinárias ou extraordinárias e, logo a seguir, vale-se da expressão “especialmente”, antes de passar a enumerá-las.

Ao assim proceder, acenou de forma cristalina ao intérprete da norma, que disporia de forma exemplificativa e não numerus clausus.

AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA7 adverte que “é necessário alertar para o fato de as hipóteses enumeradas no § 7o do art. 23 da Lei 8.245, de 18.10.1991, não serem as únicas possíveis, ou seja, o referido § 1o não esgota as hipóteses de despesas ordinárias de condomínio, uma vez que outras podem existir e não estarem discriminadas em lei.”

Afigura-se, daí, por estreita consonância lógica, que outras circunstâncias ocorreriam, impondo despesas que não encontravam-se ajustadas com plena identidade na norma, gerando dificuldades ao hermeneuta quando do momento de rotulá-las como tal ou qual despesa.

E não poderia ser diferente, caso se pretendesse atribuir à lei uma existência duradoura, posto que a evolução do comércio e das relações de consumo certamente ditam de tempos em tempos novas tecnologias e confortos, que por sua vez importam em despesas a ratear entre os condôminos, mas cuja classificação como ordinárias ou extraordinárias geram dúvidas, isso sem se falar naquelas já existentes e não visualizadas de pronto no momento da edição da norma.

Não foi necessário transcorrer largo período para que algumas despesas começassem a polemizar as relações locatícias, por ausência de definição precisa.

Algumas delas, que passaremos a analisar, têm gerado extensas divergências e dividido o entendimento dos órgãos e instâncias de julgamento, a saber: a) lavagem e recuperação da fachada; b) instalação de antena coletiva; c) Impermeabilizações; d) substituição corretiva de coluna hidráulica, ramais, outras tubulações e condutores elétricos; e) seguro obrigatório; e f) furto ou roubo de bens, previsto em convenção.

Cuidemos de analisar cada uma delas.

7.1. LAVAGEM E RECUPERAÇÃO DE FACHADA

A necessidade de lavagem e recuperação da fachada de um edifício em condomínio surge como decorrência do uso normal. E não se trata de uma operação de natureza simples. Exige, muitas vezes, a utilização de dispendiosos equipamentos e produtos, além da contratação de mão-de-obra especializada, com montagem de andaimes e estruturas, máquinas de alta pressão, ácidos e detergentes especiais, enfim, um trabalho de vulto.

Em se tratando de serviço cuja finalidade equipara-se à da pintura externa, a doutrina tem entendido tratar-se de despesa extraordinária, a cargo do locador.

7.2. INSTALAÇÃO DE ANTENA COLETIVA

Embora não prevista expressamente, a doutrina entende que esta despesa é igualmente extraordinária, posto que passível de enquadrar-se por analogia, no artigo 22, parágrafo único letra “e”, da Lei do Inquilinato, que atribui ao locador a responsabilidade pelas despesas concernentes à instalação de equipamentos de segurança e de incêndio, de telefonia, de intercomunicação, esporte e de lazer.

Já a manutenção e conservação desse equipamento coletivo configura-se despesa ordinária, a cargo do locatário, por previsão expressa do artigo 23, § 1o, letra f, da Lei 8.245/91.

7.3. IMPERMEABILIZAÇÕES

Nossos Tribunais vêm entendendo que as despesas relacionadas com as impermeabilizações em geral, seja da laje de cobertura ou do andar térreo, pisos e paredes, para evitar infiltrações e umidade, ou da caixa d’água, para evitar vazamentos, destinam-se a repor ou manter o imóvel em perfeitas condições de uso e habitabilidade.

DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS DO CONDOMÍNIO – OBRIGAÇÃO DO LOCADOR INTRANSFERÍVEL AO LOCATÁRIO – A impermeabilização e a pintura de lajes e paredes externos constituem exemplos de despesas extraordinárias do condomínio, que o locador não pode repassar ao locatário. (TACRJ – AC 10528/94 – (Reg. 608-3) – 3ª C. – Rel. Juiz Asclepiades Rodrigues – J. 16.03.1995 -Ementa 39794 –Juris Síntese 11002366).

Nesse contexto, devem ser entendidas como despesas extraordinárias, de responsabilidade do locador.

7.4. substituição de coluna hidráulica, ramais, outras tubulações e condutores elétricos, COM FINS PREVENTIVOS OU DE REPARAÇÃO

TARCHA e SCAVONE JUNIOR lecionam que a instalação hidráulica de um edifício compreende colunas e ramais. Coluna, no dizer dos autores, seria a tubulação central, instalada fora das unidades autônomas. Ramal é a parte da instalação hidráulica que se situa dentro da unidade autônoma, constituindo tubulação secundária.8

Via de regra, qualquer substituição ou reparo nas coluna hidráulicas constitui despesa extraordinária. Nos ramais, por sua vez, a despesa poderá ser ordinária ou extraordinária, dependendo da complexidade e extensão da obra. Tratando-se de obra de pequeno porte, será suportada pelo inquilino. Se destinar-se, porém, a restituir a condição de habitabilidade do imóvel, transferir-se-á ao locador, já que é condição inerente ao uso do imóvel que esteja o mesmo servido de água. A mesma solução deve ser aplicada no caso das despesas efetuadas com outras tubulações, destinadas à passagem de fios elétricos, dutos de telefone ou interfone e canalização de gás.

CONDOMÍNIO – DESPESAS – LOCAÇÃO RESIDENCIAL – ENCARGOS – SUBSTITUIÇÃO DE TUBULAÇÃO D’ÁGUA – A cobrança de cotas extraordinárias, conforme deliberado em Assembléia Geral, para substituição de tubulação d’água compete ao locador. (TACRJ – AC 1531/89 – (Reg. 3495) – Cód. 89.001.01531 – 3ª C. – Rel. Juiz Hudson Bastos Lourenço – J. 29.06.1989 – Ementário TACRJ 46/89 – Ementa 32479, in Juris Síntese 11002410).

7.5. SEGURO OBRIGATÓRIO

Diz-se obrigatório o seguro destinado a indenizar incêndio ou outro sinistro que acarrete a destruição total ou parcial do imóvel. Por destinar-se à reconstrução total do edifício, este seguro abrange não só as partes comuns, como também as unidades autônomas. As demais áreas comuns e de lazer devem ser cobertas por outro seguro complementar.

Tal encargo não consta do rol dos artigos 22 e 23 da Lei 8.245/91, mas tem supedâneo no artigo 13 da Lei 4.591/64 e deve ser tratado como despesa ordinária, de responsabilidade do locatário. E se houver móveis e equipamentos guarnecendo o imóvel, em sendo contratado o seguro complementar para cobrir eventual sinistro sobre tais bens, também será de responsabilidade do inquilino o seu pagamento.

7.6. FURTO OU ROUBO DE BENS COM PREVISÃO DE RESPONSABILIDADE EM CONVENÇÃO

Na ocorrência de furto ou roubo de bens dos condôminos, surge a polêmica questão da reparabilidade do dano pelo condomínio.

Havendo disposição a respeito na convenção de condomínio, seja admitindo a responsabilidade, seja rejeitando-a (cláusula de não-indenizar), prevalece a jurisprudência no sentido de que seja observada a pactuação condominial.

O Superior Tribunal de Justiça tem reiterado este entendimento, que caminha para a pacificação:

Verbete: CONDOMÍNIO – INDENIZAÇÃO por FURTO sofrido em seu interior – Incabimento – CULPA não caracterizada.

Condomínio. Furto. Dever de indenizar. O dever de indenizar  imposto ao condomínio por dano sofrido pelo condômino há que  decorrer da inequívoca demonstração de culpa daquele por ato de  seu preposto. A mera alegação de insuficiência de dispositivos de  segurança não enseja a responsabilidade do condomínio, que,  aliás, poderá ser afastada em cláusula de não indenizar aposta na  convenção. Recurso não conhecido. (STJ – Rec. Especial n. 45.902  – São Paulo – Ac. 3a. T. – unân. – Rel: Min. Cláudio Santos – j.  em 22.08.95 – Fonte: DJU I, 09.10.95, p. 33548 – In Bonijuris,  26291). 9

Não obstante, há julgados que desconsideram a cláusula de não-indenizar10, se verificado sistema pago de vigilância, como se vê do aresto seguinte, da 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo:

INDENIZAÇÃO. Furto de motocicleta. Responsabilidade do condomínio. Caracterização. Fato que se verificou no interior da garagem de edifício. Irrelevância da cláusula de não-indenizar. Sistema de segurança pago. Recurso Provido.” (Ap. Civ. 251.102-1, Rel. Sousa Lima, j. 22.5.96. m.v.).

Problema maior surge quando a convenção é omissa no tocante à responsabilidade, nada prevendo. Nesse caso, há duas hipóteses possíveis a considerar: primeiro, se o condomínio dispunha de sistema da segurança ostensiva no edifício, que restou ineficaz, responde perante o condômino lesado, independentemente de se averiguar culpa.

Se tais dispositivos de segurança eram inexistentes, a responsabilidade do condomínio dependerá da comprovação da ocorrência de culpa, em qualquer de suas modalidades.

Como asseveram TARCHA e SCAVONE JR., “o prejuízo experimentado por um dos condôminos, decorrente da deliberação falha de todos, por todos deve ser suportado.”11 Entendem os autores supracitados que a despesa teria natureza ordinária, posto que não aumenta o valor do edifício, não o embeleza, não aumenta suas condições de habitabilidade e de segurança, enfim, não se inclui naqueles parâmetros apontados para caracterizar despesas extraordinárias, devendo, por conseguinte, ser suportada pelo inquilino.12

O entendimento nos parece acertado, dado que ao locatário também incumbe o pagamento das cotas de seguro do imóvel e despesas de contratação de segurança. Mas sua posição não é pacífica. A natureza jurídica dessa despesa ainda encontra-se indefinida.13

8. É VÁLIDA A DISPOSIÇÃO DE QUE O INQUILINO RESPONDA POR DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS, SE LIVREMENTE PACTUADA?

As disposições referentes às relações locatícias são preceitos de ordem pública, indisponíveis portanto, sendo nulas as disposições que firmem em sentido contrário, especialmente no contrato de locação.

Logo, uma cláusula contratual transferindo para o locatário as obrigações enumeradas pela lei como sendo de responsabilidade do locador, considerar-se-á não escrita, posto que eivada de nulidade (v. RT, 666/128).

IVAN DE HUGO SILVA aduz que “O preceito nulo há de ser considerado como não escrito; inaproveitável, portanto, para qualquer das partes, devendo ser desprezado pelo juiz, independente de solicitação nesse sentido, dado o interesse da justiça em salvaguardar a integridade da lei ser mais forte que o dos litigantes.”14

À guisa de ilustração, cabe observar que as poucas exceções à regra supramencionada vêm expressas na própria lei, como se pode inferir da redação do artigo 35, da Lei 8.245/91, que assim é iniciada: salvo expressa disposição contratual em contrário…. Vale dizer, que em todos os casos em que o legislador abriu para as partes contratantes a faculdade de disposição diversa daquela estabelecida, efetuou literal ressalva da possibilidade de disposição contratual.

Exemplo disso é o que dispõe o artigo 22, VIII: O locador é obrigado a: VIII- pagar os impostos e taxas, e ainda o prêmio de seguro complementar contra fogo, que incidam ou venham a incidir sobre o imóvel, salvo disposição expressa em contrário no contrato;

É o que ocorre com o IPTU.   ARAMY DORNELLES DA LUZ, comenta que este é um dos casos em que há a possibilidade de inversão do ônus, dizendo:

Os impostos e taxas que caem sobre o imóvel são, por óbvio, de responsabilidade do locador, pois o fato gerador é a propriedade. Também o seguro contra fogo. Tradicionalmente, porém, o legislador tem consentido que o locador contrate a inversão do ônus. Não há uma razão bem clara para isso.15

 Em todas as demais situações, prevalece a regra da indisponibilidade.

TARCHA e SCAVONE JÚNIOR entendem que “quando a Lei diz que a despesa de pintura de fachada do edifício é extraordinária (do locador), mesmo que o contrato estabeleça que o locatário concorda em pagar esta despesa, mesmo que ele assine o contrato, não terá que pagá-la, e, se por acaso pagá-la, terá o prazo de vinte anos para ingressar com ação judicial de repetição de indébito pelo rito ordinário ou sumário conforme o valor, pedindo de volta o que pagou.”16

AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA17 complementa a lição:

Duas observações devem ser feitas no momento. A primeira se refere ao fato de se considerar cláusula nula ou completamente inválida, se as partes estipularem no contrato de locação que o locatário arcará com o pagamento das despesas extraordinárias de condomínio, uma vez que a disposição que determinou ser de responsabilidade do locador seu pagamento não é supletiva, portanto não admite estipulação em contrário.

A segunda observação refere-se ao fato de, sendo o locador responsável pelas despesas extraordinárias de condomínio, cabe ao locatário exigir a eliminação de qualquer cobrança indevida neste sentido quando o locador exibir o comprovante relativo à cobrança do suposto encargo.

Não se perca de vista, ainda, que pela norma insculpida no inciso I, do artigo 43 da Lei Inquilinária, constitui contravenção penal, punível com prisão simples de cinco dias a seis meses, cobrar o locador do locatário as despesas extraordinárias de condomínio, posto que configura encargo indevido.

9. OUTRAS QUESTÕES ACERCA DAS DESPESAS DE CONDOMÍNIO:

9.1. SE O IMÓVEL ESTÁ FECHADO, CABE AO CONDÔMINO PARTICIPAR DO RATEIO?

Indagação interessante. Se o rateio das despesas tem relação com o uso, poder-se-ia pensar que o condômino que esteja mantendo sua unidade condominial fechada ou sem utilização, pudesse eximir-se de pagar as despesas gerais.

A Lei 4.591/6418,  entretanto, determina a concorrência dos condôminos para as despesas do condomínio sem excepcionar o fato de estar a unidade condominial fora de uso. Isto porque a estrutura condominial  deve ser mantida e preservada, independentemente de todos a estarem usando ou não. Fica à disposição. O condômino não utiliza porque não quer. Seria de todo ilógico pensar que somente os usuários efetivos das unidades ficassem sujeitos ao rateio das despesas com iluminação e água das áreas comuns, vigilância, serviços de zeladoria do prédio, produtos de limpeza e de expediente, porque alguns, por motivos pessoais, preferem deixar inativo o seu imóvel.

Entendemos, porém, que se os condôminos dispuserem em convenção de condomínio algum tratamento diferenciado, como por exemplo, a não participação no rateio de gás e água, em condomínios em que estes produtos são usados coletivamente, sem medição por registros individuais, tal disposição será válida.

9.2. O CONDÔMINO INADIMPLENTE PODE SER IMPEDIDO DE PARTICIPAR DE ASSEMBLÉIAS QUE DELIBERAM SOBRE DESPESAS OU TER SEU DIREITO A VOTO SUSPENSO? E QUANTO AO USO DAS ÁREAS DE LAZER?

A questão é polêmica no âmbito da doutrina. Prevalece a tese de nulidade de qualquer restrição de direitos, posto que a convenção de condomínio já traz em seu bojo as penalidades pecuniárias (multas) para o descumprimento das obrigações pelo condômino faltoso, não sendo lícito, portanto, restringir ou impedir sua participação nas assembléias gerais, nem cassar-lhe o direito ao voto.

O mesmo raciocínio se impõe à restrição de uso, pelo faltoso, das áreas comuns do condomínio, tais como salão de festas,  churrasqueira, playground, sala de ginástica, etc.

O Tribunal de Alçada do Paraná já decidiu ser arbitrária e passível de indenização por danos morais a determinação pelo síndico de suspensão no fornecimento de gás e da comunicação por interfone de morador inadimplente.19

J. NASCIMENTO FRANCO20 discorda desse entendimento, sustentando que não é justo que o condomínio custeie serviços que aproveitam a todos, sem participação dos condôminos em débito e que estes ainda usufruam das áreas de lazer, sob as expensas dos demais moradores.

JORGE TARCHA e LUIZ ANTONIO SCAVONE JUNIOR afirmam que tais restrições importariam em dupla penalidade pelo mesmo fato e aduzem: “O fato de o condômino estar inadimplente não autoriza, manus militaris, o  rompimento dos serviços, e, tampouco, o impedimento à utilização de salões de festa, piscinas, churrasqueiras, quadras e demais equipamentos comuns, até porque o condomínio possui meios processuais e legais de fazer valer seu direito subjetivo de receber as quotas em atraso.”21

No mesmo diapasão, porém no âmbito da relação locador/locatário, SILVIO DE SALVO VENOSA22 leciona: “o não pagamento das contas constitui grave infração autorizando o despejo dadas as graves conseqüências que pode acarretar. Não pode porém o locador, sem justa causa, solicitar o desligamento da linha telefônica, ou transferi-la de local, porque estará obstando o pleno uso da coisa locada”.

E advertem TARCHA e SCAVON JUNIOR,  que o síndico deve acautelar-se de tais atitudes, sob pena de responder pessoalmente pelo delito de exercício arbitrário das próprias razões, capitulado no art. 345 do Código Penal.23

9.3. O CONDÔMINO DEVE PARTICIPAR DO RATEIO DE DESPESAS REFERENTES AO PROCESSO JUDICIAL QUANDO ELE PRÓPRIO LITIGA CONTRA O CONDOMÍNIO?

Consolidou-se na doutrina e jurisprudência o entendimento de que o condômino que move ação contra o condomínio dele se separa, desvincula-se, posto que é inadmissível considerar alguém litigando contra si mesmo.

J. NASCIMENTO FRANCO, citado por TARCHA e SCAVONI JR, tratou do tema de forma esclarecedora:

Quando entram em conflito interesses estranhos à simples administração e conservação do edifício, o condômino dissidente desliga-se da coletividade condominial e passa, no curso dos processos judiciais, a ser considerado terceiro, para todos os efeitos jurídicos”.24

Fácil depreender-se daí, que o condômino dissidente, que figura no pólo ativo ou passivo de ação que tenha como parte contrária o condomínio, não arcará com as despesas decorrentes do processo, seja a condenação no pedido, sejam as custas e honorários advocatícios.

Não haveria lógica em pleitear o condômino uma indenização, sair vencedor na demanda e depois arcar com uma parcela do pagamento no rateio da despesa gerada por sua ação.

Igualmente inconcebível que seja réu em ação de cobrança, pague os valores devidos, os honorários da sucumbência e as custas processuais e, depois, ainda tenha que participar do rateio dos honorários contratados pelo condomínio. Haveria, então, incidência de duplo ônus, caracterizando o bis in idem.

Difícil definir se tais despesas serão ordinárias ou extraordinárias. A doutrina inclina-se a classificá-las de acordo com a natureza da demanda. Se esta versar sobre fatos ou questões que sejam por natureza originadoras de despesas ordinárias, como tal serão consideradas, sendo devidas pelo inquilino. Se versar a lide sobre matéria atinente a questões relacionadas com despesas extraordinárias, assim serão interpretadas, correndo a cargo do locador.

9.4. PODE O INQUILINO DESCONTAR DO VALOR DO ALUGUEL AS DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS QUE PAGOU INDEVIDAMENTE?

Se eram extraordinárias as despesas, não competiam ao locatário e sim ao locador. O pagamento assume o caráter de indevido, passível de restituição. E quando o locador recusa-se a reembolsar o locatário, a questão resolve-se pelo Código Civil, já que sendo credor e devedor um do outro, pode-se exercitar os mecanismos da compensação, previstos nos artigos 1.009 e 1010 do CC, provando o locatário que pagou erroneamente.

Assim, pode efetuar o pagamento do aluguel superveniente deduzindo as despesas extraordinárias a cargo do locador, que indevidamente havia pago.

Havendo recusa no recebimento, por parte do locador, deve o inquilino valer-se da consignatória para desincumbir-se de sua obrigação e não incidir em mora, senão vejamos:

11002689 – CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO – CONDOMÍNIO – DESPESAS – LOCAÇÃO RESIDENCIAL – ENCARGOS – DESPESAS EXTRAORDINÁRIAS DO CONDOMÍNIO – Injusta recusa da locadora em receber e dar a quitação de alugueres, porque o locatário deixou de incluir os custos cobrados com obras da troca da coluna geral de água e troca da coluna de água esgoto. Sendo tais despesas extraordinárias do condomínio, são encargos da locadora pois são tendentes a repor o imóvel locado em condições de habitabilidade. (TACRJ – AC 10958/91 – (Reg. 2663) – Cód. 91.001.10958 – 6ª C. – Rel. Juiz Arruda Franca – J. 14.05.1991 – Ementário TACRJ 20/91 – Ementa 33917 – in Juris Síntese).

9.5. APLICA-SE O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ÀS RELAÇÕES ENTRE CONDOMÍNIO, CONDÔMINO E LOCATÁRIO?

Inicialmente faz-se necessário identificar o que sejam consumidor e fornecedor, nos moldes da Lei 8.078/90, posto que a presença dessas duas figuras é essencial para que se possa falar em aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.

DOMINGOS AFONSO KRIGER FILHO reúne alguns conceitos, que chamou de operacionais, dentre eles o de consumidor e fornecedor, verbis:

CONSUMIDOR – É toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Exclui-se da conceituação o intermediário, aquele que medeia o negócio entre o comerciante que vende e a pessoa que adquire o produto ou serviço, uma vez que não usufrui destes de acordo com a finalidade para os quais foram criados.

FORNECEDOR – É toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como, os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.25

Quando se analisa as relações entre condomínio e condôminos, percebe-se que não se reveste do caráter de relação de consumo, posto que não envolve nem a figura de um consumidor nem de fornecedor, seja de produtos ou serviços, mas sim uma identidade de propósitos e interesses comuns. O síndico não presta serviços aos demais condôminos. Apenas administra e representa o condomínio, voltado a uma finalidade comum, que é a gestão dos interesses da coletividade condominial. Vejamos a jurisprudência a respeito:

CONDOMÍNIO – DESPESAS – COTAS CONDOMINIAIS – MORA DE CONDÔMINO – CÓDIGO DO CONSUMIDOR – INAPLICABILIDADE – Não se aplicam aos condôminos, em mora, as disposições legais do Código do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) mas as da Lei Especial 4.591/1964, posto não se tratar de uma relação de consumo, mas relação decorrente de co-propriedade. (TACRJ – AI 1296/95 – (Reg. 599-3 – Cód. 95.002.01296 – 8ª C. – Rel. Juiz Jayro Ferreira – J. 04.10.1995 – in Juris Síntese 11002341).

CONDOMÍNIO – Multa moratória – Pretendida aplicação do art. 52, § 1o, da Lei 8.078/90 com a nova redação da Lei 9.298/96 – Inadmissibilidade pois não se trata de relação de consumo. (2O TACivSP – in RT-757/220).

Seguindo o mesmo entendimento, RT-747/303, RT-750/418 e RT-751/317.

Diferentemente se dá quando o condomínio contrata uma empresa para administrá-lo. Torna-se, então, consumidor dos serviços daquela, que responde por sua qualidade nos moldes do CDC.

A maior controvérsia está na relação que se opera entre o condômino locador e o locatário. A doutrina e a jurisprudência se dividem, ora admitindo, ora não, a existência de uma relação de consumo nos contratos de locação.

LUIZ ANTONIO SCAVONE JUNIOR posiciona-se pela aplicabilidade da Lei 8.078/90, entendendo presente a relação de consumo tanto entre locador e locatário como entre locador e imobiliária.26

Mas o STJ, por sua 5a Turma, não endossa esta linha de entendimento:

As relações locatícias possuem lei própria que as regule. Ademais, falta-lhes as características delineadoras da relação de consumo apontadas nos arts. 2o e 3o da Lei 8.078/90. O Código de Defesa do Consumidor, no que se refere à multa por inadimplemento, não é aplicável às locações prediais urbanas. (Ac. un. da 5a T. do STJ- REsp 204244-MG – Rel. Min. Felix Fischer – j. 11.5.99 – DJU-e 1 de 1º.07.99, p. 206 – in Repertório IOB de Jurisprudência 15/99, Verbete 3/15814).

9.6. É LÍCITO CONCEDER DESCONTOS ELEVADOS PARA PAGAMENTO EM DIA DAS DESPESAS DE CONDOMÍNIO? QUAL O PERCENTUAL MÁXIMO DE MULTA PERMITIDO?

Esse questionamento merece estudo mais detalhado. A Lei 4.591/64, em seu artigo 12, § 3o, estipulou um teto para a imposição de penalidade pela mora no pagamento, em 20% sobre o valor do débito atualizado.

Logo, qualquer majoração nesse percentual de multa constitui infração à lei. Que dizer então de um desconto substancial concedido para pagamento pontual? Ora, a pontualidade do pagamento já é regra natural das obrigações, tanto que estabelecida multa para o pagamento efetuado a destempo.

SÍLVIO DE SALVO VENOSA, ao discorrer sobre a Lei do Inquilinato, por ocasião de sua edição, já identificava uma tentativa de burla que vinha da legislação passada, em relação à concessão de desconto elevado para pagamento do aluguel com pontualidade, situação esta análoga à da prestação do condomínio, que conduz às mesmas conclusões:

“Converteu-se em prática generalizada estipular-se no contrato que o locatário gozará de certo desconto se efetuar o pagamento antecipadamente, antes de determinado dia. Embora existam opiniões em contrário, as quais entendem que aí existe um verdadeiro incentivo para a pontualidade e pagamento antecipado, temos para nós que as partes aí erigem uma cláusula penal ao inverso.”27

E a jurisprudência, atenta às práticas irregulares, tem servido de instrumento regulador e protetor do equilíbrio contratual, versando:

CONDOMÍNIO – DESPESAS – CONDOMÍNIO – MULTA – COTAS CONDOMINIAIS – DESCONTO DE 45%. MULTA – O desconto de 45% concedido pelo condomínio para o pagamento das cotas condominiais efetuado até o dia 05 do mês equivale à imposição de uma multa para os pagamentos efetuados após essa data. Provimento parcial do recurso para excluir do débito o acréscimo de 45%, referente ao pagamento efetuado após o dia 05 de cada mês. (TACRJ – AC 6540/95 – (Reg. 4227-3) – 8ª C. – Rel. Juiz Cássia Medeiros – J. 11.10.1995 – Ementa 41327 – in Juris Síntese 11002243).

Assim, a concessão de “desconto” de pontualidade é, em verdade, pena disfarçada, multa exorbitante camuflada, posto que o valor normal da despesa de condomínio (ou do aluguel, no que pertine às relações locatícias) realmente pactuado, é, na generalidade dos casos, aquele previsto para pagamento pontual com desconto e não o valor cheio.

Finalmente, inocorrendo relação de consumo entre condomínio e condômino, a multa devida em caso de mora rege-se pela Lei 4.591/64 e pode ser fixada em  até 20%, não havendo que se falar em incidência da limitação de 2%, de que trata o Código de Defesa e Proteção do Consumidor.

9.7. IMÓVEIS NO ANDAR TÉRREO DEVEM PARTICIPAR DO RATEIO DE DESPESAS COM ELEVADOR?

O elevador destina-se a servir ao conjunto de unidades condominiais. As despesas com sua instalação, reforma ou manutenção são devidas pelo locador ou pelo locatário, dependendo da situação. E a obrigação de pagá-las não se prende à efetiva utilização e sim, à utilização potencial.

Pode-se conceber que o lojista instalado no andar térreo ou o morador de apartamento situado nos primeiros pavimentos utilize pouco ou raramente o elevador, posto que a facilidade de acesso direto ou por escadas dispensa esse uso. Mas isso, a rigor, em nada o diferencia dos demais condôminos e moradores quando do rateio das despesas.

Isto porque, poderá valer-se do elevador para visitar outras unidades do condomínio, situadas em andares mais elevados e, não raramente, será o elevador usado para que se realizem serviços em áreas comuns, como caixas d’água e antenas, situadas na cobertura do prédio.

A questão suscitou controvérsias na jurisprudência. Hoje a tese mais aceita é a da participação de todos os condôminos no rateio, não obstante haja diversas decisões reconhecendo validade à estipulação da convenção de condomínio que isente ou reduza a quota-parte de estabelecimentos térreos, quando estes possuam acesso independente à via pública.28

É o que se extrai dos julgamentos proferidos pelos Tribunais de Justiça do Distrito Federal e de Alçada do Rio Grande do Sul:

Verbete: CONDOMÍNIO – PROPRIETÁRIO de IMÓVEL térreo – Participação das DESPESAS CONDOMINIAIS – Necessidade – Não estipulação em contrário pela convenção.

Condomínio. Convenção. Não dispondo a convenção em contrário, antes prevendo  expressamente, a participação dos proprietários das lojas e dos apartamentos  do pavimento térreo, nas despesas comuns do edifício, não podem eles, moto  próprio se eximir dessa obrigação. Precedentes do TACív. RJ. (TJ/DF – Ap.  Cível n. 33536 – Brasília – Ac. 76603 – unân. – 2a. T. Cív. – Rel: Des. Paulo  Evandro – Fonte: DJU III, 31.05.95, pág. 7295 – In Bonijuris,   25125).

Despesas condominiais – Condômino localizado no andar térreo – Alegação de não se beneficiar de muitos serviços – Inadmissibilidade – Inteligência do art. 9o da Lei 4.591/64 (TA/RS  – in RT-749/435).29

TARCHA e SCAVONE JR, aduzem coerentemente que, “Interpretação diversa levaria ao absurdo de ratear-se despesas de elevador proporcionalmente ao andar em que se encontra a unidade, uma vez que aquela localizada no primeiro andar utiliza menos que aquela que se encontra no último”.30

9.8. A UNIDADE AUTÔNOMA PODE SER ALIENADA JUDICIALMENTE EM RAZÃO DE DESPESAS DE CONDOMÍNIO?

Esta, talvez, uma das mais controvertidas e polêmicas questões que se desdobra do estudo acerca das despesas de condomínio.

Citando mais uma vez J. NASCIMENTO FRANCO, TARCHA e SCAVON JR, sustentam que sim, afirmando ainda ser ineficaz a cláusula de impenhorabilidade e aplicável o disposto no inciso IV, do art. 3o, da Lei 8.009/90, ao dizer que fica afastada a proteção a penhora do imóvel familiar por motivo de cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função desse imóvel.31

Nesse diapasão o Tribunal de Alçada Civil do Rio de Janeiro, por sua 1ª Câmara:

EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL – EXECUÇÃO DE TÍTULOS EXTRAJUDICIAIS –ALUGUÉIS/CONDOMÍNIO – PENHORA – LEI Nº 8.009/1990 – APARTAMENTO RESIDENCIAL DO DEVEDOR – DÉBITO DECORRENTE DE DESPESAS E TAXAS CONDOMINIAIS – PENHORA – POSSIBILIDADE – A Lei nº 8.009/1990 visa impedir ou cancelar a penhora de bem tido como impenhorável. No-lo é o imóvel de que resulta o débito condominial. Logo, apartamento residencial de devedor pode ser penhorado em execução dessas despesas e taxas. Desimportante a alegação de que o condomínio credor não estaria regularmente registrado, pois a execução é contra o condômino e não em face de terceiros. (TACivRJ – AC 9977/95 – (Reg. 589-3) – 1ª C. – Rel. Juiz Mauro Fonseca Pinto Nogueira – J. 27.02.1996 – in Juris Síntese – 11005745).

O Primeiro  e Segundo Tribunais de Alçada Civil de São Paulo também pacificaram esse entendimento:

As despesascondominiais, em face da obrigatoriedade do artigo 12 da Lei nº 4.591/64, não estão amparadas pelas benesses da Lei nº 8.009/90, ficando sujeitos à penhora o imóvel e os bens que o guarnecem. (1º TACIVIL – 1ª Câm. Civil; Ap. nº 604.042-6-SP; Rel. Juiz Ademir de Carvalho Benedito; j. 14.08.1995; v.u.; ementa. – in Boletim AASP, 1964/65-e, de 14.08.1996 e RT-726/295).

PENHORA – Bem de família – Condomínio – Despesas condominiais – Evocação da Lei 8.009/90 para evitar a constrição sobre a unidade devedora – Inadmissibilidade – Obrigações de natureza propter rem – Interpretação do art. 3o, IV, da referida lei (1o TACivSP – in RT-739/307).

Despesas condominiais – Penhora – Impenhorabilidade de unidade autônoma de condômino inadimplente – Inadmissibilidade, uma vez que é dívida inerente à própria coisa (2o TACivSP – in RT-747/303).

No mesmo sentido: RT-746/294, RT-748/296, RT-749/328 e RT-753/289 e RJ IOB-15808, esta última versando sobre penhorabilidade de box de garagem.

Mas não foi este o entendimento da 4a Turma do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, quando julgou em sede de Recurso Especial caso semelhante:

BEM DE FAMÍLIA – O inciso IV do artigo 3º da Lei nº 8.009/90 não compreende as despesasordinárias de condomínio. Recurso especial atendido em parte. Unânime (STJ-4ª T.; Rec. Esp. nº 52.156-SP; Rel. Min. Fontes de Alencar; j. 23.08.1994; v.u.). BAASP, 2023/313-j, de 06.10.1997.

Vejamos os votos proferidos pelo Exmo. Ministro FONTES DE ALENCAR, que figurou como relator no acórdão em referência, e dos que o acompanharam à unanimidade:

VOTO – O EXMO. SR. MINISTRO FONTES DE ALENCAR (RELATOR):
(..) No entanto, quanto à aplicação do art. 3º, inciso IV, da Lei nº 8.009/90, entendo que a interpretação extensiva dada pelo aresto violou a disposição ora referida que assim estabelece: “IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar.”
O inciso IV do art. 3º da Lei nº 8.009/90 não compreende as despesasordinárias de condomínio. Com efeito a norma referida faz paralelo com a ressalva final do art. 70, caput, do Código Civil. Portanto, tenho como correta a decisão monocrática que assim concluiu: “Inaplicável o disposto no artigo 3º, inciso IV, da Lei nº 8.009/90, pois há referência aos tributos (impostos, taxas e contribuições de melhoria), e não às contribuições outras, inclusive condominiais. Dessa forma, insubsistente a penhora do imóvel familiar. Manifeste-se o Exeqüente sobre o prosseguimento, indicando, se o caso, bem para penhora.” (fl. 17). Em face do exposto, conheço do recurso em parte, e nessa parte lhe dou provimento, para restaurar a decisão singular, arredando a penhora do imóvel residencial pertencente ao executado.

VOTO – O SR. MINISTRO SÁLVIO DE FIGUEIREDO: Confesso que preferiria ver a matéria disciplinada de forma diversa em hipóteses como a retratada na espécie. Não vejo, no entanto, como divergir em face da legislação vigente, como demonstrado pelo Sr. Ministro Relator, a quem acompanho.

 VOTO – O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO: Sr. Presidente, acompanho o voto de V. Exa., por considerar que atribuiu à norma em questão a interpretação escorreita.

VOTO – O SR. MINISTRO ANTÔNIO TORREÃO BRAZ: – Sr. Presidente, a lei, neste caso, é protetiva. Não se pode, então, interpretar um dos seus dispositivos, cuja clareza me parece indiscutível, de modo ampliativo, em desfavor da pessoa que ela visa proteger. Contribuição não pode ser tomada na acepção de despesa de condomínio. Acompanho V. Exa.

Como se percebe, a questão ainda suscitará muitas divergências, mas seu deslinde já começa a ser delineado na instância superior, diferentemente do que vinha entendendo a maioria dos Tribunais Estaduais.

9.9. CONTRA QUEM O CONDOMÍNIO DEVE PROPOR AÇÃO PARA RECEBER AS DESPESAS E QUAL O  RITO PARA SUA COBRANÇA? 

Conforme já mencionamos, a obrigação direta pelo pagamento das despesas de condomínio, sejam elas ordinárias ou extraordinárias, é do condômino.

O locatário não possui obrigações em face do condomínio, posto que sua responsabilidade decorre do contrato firmado com o condômino locador.

Se o primeiro não cumprir com suas obrigações, de pagar as despesas ordinárias de condomínio, poderá o locador exercitar seu direito de rescindir o contrato de locação, movimentando a ação de despejo por falta de pagamento.32

Mas o condomínio não pode cobrar as despesas do locatário, já que carece de legitimidade para tanto, posto que com ele não mantém qualquer relação de direito material.

Logo, deverá o condomínio voltar sua pretensão em ação de conhecimento contra o condômino titular da unidade condominial, visto tratar-se de obrigação propter rem, instruindo a ação com o demonstrativo das despesas do condomínio.

Esta ação, nos moldes do artigo 275, II, b, do CPC, segue o rito sumário.

THEOTONIO NEGRÃO33, em nota ao artigo 275, do Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, aponta uma divergência jurisprudencial quanto à vigência da parte final do art. 12, § 2o,34 da Lei 4.591, que estaria, segundo julgados majoritários, revogada.

Com efeito, decidiu o Tribunal de Justiça da Bahia:

Encargos de Condomínio. Título líquido, certo e exigível. Exeqüibilidade. A existência de condomínio regular, bem assim de despesas orçadas e aprovadas pela assembléia geral, legitima o processo de execução para a cobrança de encargos, vez que não há responsabilidade a apurar, mas obrigação a exigir.” (Ap. 186/83 – 1ª C. – j. 28.9.83 – rel. Des. Paulo Furtado. v.u. RT- 583/199).

Dentre os diversos arestos que se posicionam em sentido contrário, destacamos o proferido pelo 1o Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, que aduz:

“É tranqüilo o entendimento de que o art. 12, § 2o , da Lei 4.591/64 acha-se revogado pelo art. 275, II, “c”, do CPC, devendo o condomínio reclamar do condômino em atraso o pagamento das cotas vencidas e vincendas pelo disposto no mencionado dispositivo do Código de Processo Civil, ressalvada ao locador a via executiva para que, por força do contrato, lhe caiba regressivamente pagar, nos termos do art. 585, IV, do mesmo diploma legal.” (Ap. 332.383 – 1ª Câm. j. 13.11.84 – rel. Juiz Guimarães e Souza, in RT-594/116).

THEOTONIO NEGRÃO, desta vez em seu Código Civil e Legislação Civil em Vigor, é mais taxativo ao apontar, na nota 1, ao artigo 12, da Lei 4.591/64, que “A via executiva é, atualmente, incabível. Aplica-se à hipótese o art. 275-II-“b”35 do CPC. A execução com base no CPC 585-IV só tem lugar quando o condômino locador, fundado em contrato escrito, cobra as despesas condominiais ao locatário”.36

Portanto, o rito para a ação de cobrança, seria o sumário. O STJ, no entanto, abriu recentemente ao credor uma interessante faculdade, de optar pela ação  monitória para cobrar as despesas de condomínio. É o que se extrai do seguinte acórdão:

CONDOMÍNIO – COBRANÇA DE DESPESAS – AÇÃO MONITÓRIA – MEIO HÁBIL. Processual Civil. Cobrança de despesas de condomínio. Art. 275, II, b, do CPC. Procedimento monitório ou sumário. Faculdade do credor. Recurso desacolhido. I – O procedimento monitório, também conhecido como injuntivo, introduzido no atual processo civil brasileiro, largamente difundido e utilizado na Europa, com amplo sucesso, tem por objetivo abreviar a formação do título executivo, encurtando a via procedimental do processo de conhecimento. II – A ação monitória tem a natureza de processo cognitivo sumário e a finalidade de agilizar a prestação jurisdicional, sendo facultada a sua utilização, em nosso sistema, ao credor que possuir prova escrita do débito, sem força de título executivo, nos termos do art. 1.102 a, CPC. (Ac. un. da 4a T. do STJ – REsp 208.870-SP – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira. DJU-e 1 de 28.06.1999, p. 124 – in Repertório IOB de Jurisprudência, Bol. 15/99, verbete 3/15826).

9.10. COMO DEVEM SER COBRADAS AS DESPESAS EM CONDOMÍNIO DE UM SÓ DONO?

Quando se trata de edifício em condomínio que possui um só dono, não surgem maiores dificuldades para a cobrança das despesas, posto que o § 3o do artigo 23 tratou expressamente do assunto.

Difere a sistemática de cobrança no que tange à fundamentação das despesas, que não se baseará em previsão orçamentária mas, sim, nas despesas efetivamente realizadas e comprovadas.

CARLYLE POPP37 entende que nesses casos não haverá propriamente um condomínio e afirma: “Na hipótese de ser o edifício onde reside o locatário de propriedade de uma única pessoa, inexistirá condomínio, pois pressuposto legal para tanto é a divisão dos domínios. Neste caso, a possibilidade de cobrança dos encargos mencionados no § 1o do presente dispositivo ficará condicionada à prévia comprovação. Ou seja, o pagamento não pode ser exigido anteriormente ao gasto efetivado.”

Estas, como se percebe, são apenas algumas das incontáveis situações que assolam o dia-a-dia daqueles que se enquadram na posição de condômino/locador ou locatário de unidade imóvel condominial. É evidente a evolução da lei reguladora das relações locatícias e certamente, a jurisprudência cuidará de ajustar situações conflituosas, apontando as soluções mais justas e resguardando o equilíbrio nas relações contratuais.

10. CONCLUSÃO

1 – Pela atual legislação reguladora do condomínio de edificações, o condômino obriga-se a contribuir com sua parcela no rateio das despesas. Tratam-se as despesas de condomínio de obrigação propter rem, que prende-se ao imóvel e vincula o adquirente, em caso de transferência do domínio.

2 – A Lei do Inquilinato e a Lei de Edificações em Condomínio deixam margem para a discussão de um sem número de casos, por não abordar diversas questões polêmicas, que inclusive lhe eram preexistentes, nas relações entre locador e locatário.

3 –  O locatário não está ligado por relação jurídica de direito material ao condomínio. Em função disso, o condômino locador responde diretamente perante o condomínio pelo rateio de todas as despesas, podendo cobrar do inquilino as despesas ordinárias de condomínio.

4 – As despesas extraordinárias de condomínio correm por conta do locador, que não as pode transferir ao locatário no instrumento contratual celebrado, posto que a disposição legal que as regula não possui caráter supletivo, tratando-se de preceito de ordem pública, indisponível e que não admite disposição em sentido contrário.

5 – Em havendo pagamento por parte do locatário, das despesas extraordinárias de condomínio,  devidas pelo locador, poderá deste solicitar reembolso ou efetuar o pagamento do aluguel abatendo o que indevidamente pagou, dispondo ainda da ação de consignação em pagamento para desonerar-se da obrigação de pagar, caso o locador ou a administradora do imóvel recusem-se a receber o aluguel com tais descontos.

6 – Há diversas despesas que a Lei do Inquilinato não contemplou expressamente, cabendo à doutrina e à jurisprudência investigar sua natureza e apontar seu caráter de ordinárias ou extraordinárias, bem como por quem serão suportadas (locatário ou locador, respectivamente).

7 – São consideradas extraordinárias as despesas decorrentes de lavagem e recuperação da fachada; instalação de antena coletiva;  Impermeabilizações;  substituição corretiva de coluna hidráulica, ramais, outras tubulações e condutores elétricos. Entende-se ordinárias as despesas decorrentes de seguro obrigatório do imóvel  e  furto ou roubo de bens, quando prevista a responsabilidade dos condôminos em convenção do condomínio.

8 – O rito para a cobrança das despesas condominiais pelo condomínio é o sumário, estabelecido no art. 275, II, b, do CPC, não mais se justificando a via executiva de que trata o § 2o do artigo 12 da Lei 4.591/64.

9 – O condômino titular de imóvel situado no andar térreo, participa do rateio das despesas condominiais. Igualmente quando não utiliza as áreas comuns, quando seu imóvel permanece fechado. Deixa, entretanto, de participar do rateio das despesas originadas de ação judicial onde litiga contra o condomínio, como autor ou como réu.

10 – Não se consideram lícitas as disposições que imponham ao condômino quaisquer outras penalidades além das previstas na Lei 4.591/64, especialmente a restrição do direito de participar de assembléias gerais ou utilizar as áreas comuns e de lazer do condomínio.

11- São tidos  como fraudulentos os descontos concedidos para pagamento das prestações condominiais com pontualidade, entendendo tratar-se de cláusula penal disfarçada, o que é vedado.

12 – ­ Ainda pende de solução a controvérsia sobre a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às relações entre locador e locatário, bem assim a aplicabilidade ou não da Lei 8.009/90, com o fito de afastar a penhora do bem de família e sua alienação para atender despesas de condomínio. Quanto a este último item, o Superior Tribunal de Justiça tem sustentado a proteção legal, uma vez que as despesas condominiais não entrariam no rol das exceções à impenhorabilidade.

 

Bibliografia

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711/186, 716/201, 725/256, 726/295, 733/294, 739/307,744/266, 745/290,
746/273, 746/294, 747/303, 748/296, 749/328, 749/435, 750/418, 751/317,
753/289 e 757/220.

 

Notas:

1. SILVA, Ivan de Hugo. Renovatória de Locação, Revisional de Aluguel e Despejos. Rio de Janeiro: Aide, 1981, pp. 252-253.

2. CALDAS, Gilberto. Nova Lei do Inquilinato Comentada. São Paulo: Ediprax Jurídica, 1992, p.69.

3. TARCHA, Jorge e SCAVONE JUNIOR, Luiz Antonio. Despesas Ordinárias e Extraordinárias de Condomínio. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999, p. 7.

4. Cf. op. cit., p.77.

5. GOMES, Orlando. Obrigações. 12a ed.,  Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 21.

6. V. no mesmo sentido RT-739/307 e RT-745/290.

7. SILVA, Américo Luís Martins da.. As Locações Imobiliárias. 1a ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1997, p. 195.

8. Cf. op. cit., pp. 40 e 41.

9. No mesmo sentido:. REsp 31.124/92, 3ª T., publ. no DJU de 17/05/93, p. 9334 e Resp 45.902/94, da 3ª T., publ. no DJU de 09/10/95, p. 33.548.

10. V. RT-680/97, RT-696/173 e RT-733/294.

11. Cf. op. cit., p. 137.

12. Cf. op. cit., p.140.

13. O Tribunal de Alçada de Minas Gerais considerou a despesa extraordinária, em julgamento havido aos 23/09/91, na Ap. Civ. 117251-0/00, da 5ª Câm. Cív., por votação unânime, sendo relator o MM. Juiz José Marrara.

14. SILVA, Ivan de Hugo. Op. cit., p. 243.

15. LUZ, Aramy Dornelles da. Nova Lei do Inquilinato na Prática. São Paulo: RT, 1992, p. 61.

16. Cf. op. cit., p. 47.

17. Cf. SILVA, Américo Luís Martins da., op. cit., p. 185.

18. V. art.12.

19. Apelação Cível 106032800 – Ac. 8190 da 1a Câm. Cív. do TA/PR, juiz Ronald Schulman, j. 1o/07/97, publ. DJPR 1o/08/97.

20. FRANCO, J. Nascimento. Condomínio. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997, p. 49.

21. Cf. op. cit., p. 126.

22. VENOSA, Sílvio de Salvo. Nova Lei do Inquilinato Comentada. São Paulo: Atlas, 1992, p. 108.

23. Cf. jurisprudência do TACrimSP, 1ª Câm., Ap. 909.125, j. 15/12/94, rel. Damião Cogan, citada na p. 126.

24. FRANCO, J. Nascimento. Despesas de condomínioIn  Revista de Direito Imobiliário n. 4, jul-dez/79,  p. 47.

25. KRIGER FILHO, Domingos Afonso. A Responsabilidade Civil e Penal no Código de Defesa e Proteção do Consumidor. Porto Alegre: Síntese, 1998, p. 15.

26. Cf. op. cit., pp. 45-46.

27. VENOSA, Sílvio de Salvo., op. cit., p. 101.

28. Como é o caso do julgado do 2o TACivSP, que admitiu o rateio dos gastos segundo critério com peso diferenciado em função do grau de benefício auferido por unidade autônoma, inclusive pelas lojas situadas no térreo do imóvel, em caso de Apart-hotel. (RT-746/273).

29. Somam-se ao entendimento: RT-711/186 e RT-716/201.

30. Cf. op. cit., p. 101.

31. Cf. op. cit., pp. 69-70.

32. ver artigos 9o, III e 62, da Lei 8.245/91.

33. NEGRÃO, Theotonio. Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. São Paulo: Saraiva, 1999, 30a ed., p. 340 em nota 18 ao art. 275.

34. Chamamos a atenção para um erro de grafia existente na nota 275:18 e que vem se perpetuando desde edições passadas, fazendo referência à revogação do § 3o e não do § 2º, ao qual efetivamente corresponde a redação apontada.

35. Outro erro de identificação do dispositivo legal: no texto original consta a letra “c”  e não “b”.

36. NEGRÃO, Theotonio. Código Civil e Legislação Civil em Vigor.18a ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 459.

37. POPP, Carlyle. Comentários à Nova Lei do Inquilinato. 2a ed. Curitiba: Juruá, 1992, p. 95.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Helder Martinez Dal Col

 

Advogado no Paraná
Especialista em Administração Universitária pela UEM
Professor de Direito Administrativo na FECILCAM

 


 

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