I – Introdução
O direito ao devido processo legal
vem consagrado pela Constituição Federal no art. 5º., LIV e LV, ao estabelecer
que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal e ao garantir a qualquer acusado em processo judicial o contraditório e a
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Além destes dois incisos outros há
que também compõem o leque de garantias judiciais estabelecidas na Carta Magna,
a saber: “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou
degradante”, “inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra,
da casa, da correspondência, das comunicações telegráficas, de dados e das
comunicações telefônicas e da imagem das pessoas”, “não haverá juízo ou
tribunal de exceção”, “não há crime sem lei anterior que o defina, nem
pena sem prévia cominação legal”, “a lei penal não retroagirá, salvo
para beneficiar o réu”, “nenhuma pena passará da pessoa do acusado”,
“individualização da pena”, “ninguém será processado nem sentenciado senão
pela autoridade competente”, “inadmissibilidade, no processo, das provas
obtidas por meio ilícitos”, “não culpabilidade até o trânsito em julgado
de sentença penal condenatória”, “publicidade dos atos processuais”,
“direito ao silêncio”, etc.
Todas estas garantias estão
estabelecidas taxativamente no texto constitucional, algumas com ressalvas,
evidentemente.
Assim, do ponto de vista da
Constituição Federal, o devido processo legal pressupõe o contraditório
(paridade de armas, a defesa se pronunciar sempre depois da acusação, etc), a
garantia da ampla defesa (defesa técnica e autodefesa), o duplo grau de
jurisdição, a proibição das provas ilícitas, etc., etc., etc.
II – O código de processo penal
Por sua vez, o nosso velho Código de
Processo Penal, em que pese estar absolutamente ultrapassado, mesmo porque
concebido sob uma ótica não democrática e com sérios resquícios de
inquisitoriedade, de toda maneira, ali e acolá, traz algo garantidor, por assim
dizer. A propósito, os arts. 233 (“as
cartas particulares, interceptadas ou obtidas por meios criminosos, não serão
admitidas em juízo”), 261 (“nenhum acusado, ainda que ausente ou
foragido, será processado ou julgado sem defensor”), 194/262 (“curador
ao réu menor”), 310 (“liberdade provisória”), 366 (“impossibilidade
de julgamento à revelia de réu citado por edital”), 381 (“motivação das
sentenças”, em conformidade com o art. 93, IX da Constituição), etc.
Aliás, não se pode mesmo esperar algo melhor do nosso
Código de Processo Penal, pois sendo do ano de 1941, e tendo sofrido ao longo
desse período poucas alterações, não acompanhou as mudanças sociais ocorridas
no País, bem como a nova ordem constitucional vigente.
O seu surgimento, em pleno Estado-Novo[1], traduziu de certa forma a ideologia de então, mesmo porque “las
leyes son e deben ser la expresión más exacta de las necesidades actuales del
pueblo, habida consideración del conjunto de las contingencias históricas,
en medio de las cuales fueron promulgadas” (grifo nosso).[2]
À época tínhamos em cada Estado da
Federação um Código de Processo Penal, pois desde a Constituição Republicana a
unidade do sistema processual penal brasileiro fora cindida, cabendo a cada
Estado da Federação a competência para legislar sobre processo, civil e penal,
além da sua organização judiciária.
Como notara o mestre Frederico
Marques, “o golpe dado na unidade processual não trouxe vantagem alguma para
nossas instituições jurídicas; ao contrário, essa fragmentação contribuiu para
que se estabelecesse acentuada diversidade de sistemas, o que, sem dúvida
alguma, prejudicou a aplicação da lei penal.”[3]
Até que em 03 de outubro de 1941
promulgou-se o Decreto-Lei nº. 3.689, que entraria em vigor a partir de 1º. de
janeiro do ano seguinte; para resolver principalmente questões de natureza de
direito intertemporal, promulgou-se, também, o Decreto-Lei nº. 3.931/41, a Lei
de Introdução ao Código de Processo Penal.
Este Código, elaborado, portanto,
sob a égide e “os influxos autoritários do Estado Novo”, decididamente
não é, como já não era “um estatuto moderno, à altura das reais necessidades
de nossa Justiça Criminal”, como dizia Frederico Marques. Segundo o genial
mestre paulista, “continuamos presos, na esfera do processo penal, aos
arcaicos princípios procedimentalistas do sistema escrito (…) O
resultado de trabalho legislativo tão defeituoso e arcaico está na crise
tremenda por que atravessa hoje a Justiça Criminal, em todos os Estados
Brasileiros. (…) A exemplo do que se fizera na Itália fascista,
esqueceram os nossos legisladores do papel relevante das formas procedimentais
no processo penal e, sob o pretexto de por cobro a formalismos prejudiciais,
estruturou as nulidades sob princípios não condizentes com as garantias
necessárias ao acusado, além de o ter feito com um lamentável confusionismo e
absoluta falta de técnica.”[4]
Assim, se o velho Código de
Processo Penal teve a vantagem de proporcionar a homogeneidade do processo
penal brasileiro, trouxe consigo, até por questões históricas, o ranço de um
regime totalitário e contaminado pelo fascismo, ao contrário do que escreveu na
exposição de motivos o Dr. Francisco Campos, in verbis: “Se ele (o
Código) não transige com as sistemáticas restrições ao poder público, não o
inspira, entretanto, o espírito de um incondicional autoritarismo do Estado ou
de uma sistemática prevenção contra os direitos e garantias individuais.”
É bem verdade que ao longo dos
seus 60 anos de existência, algumas mudanças pontuais foram marcantes e
alvissareiras como, por exemplo, o fim da prisão preventiva obrigatória com a
edição das Leis de nºs. 5.349/67, 8.884/94, 6.416/77 e 5.349/67; a
impossibilidade de julgamento do réu revel citado por edital que não constituiu
advogado (Lei nº. 9.271/96); a revogação do seu art. 35, segundo o qual a
mulher casada não poderia exercer o direito de queixa sem o consentimento do
marido, salvo quando estivesse separada dele ou quando a queixa contra ele se
dirigisse (Lei nº. 9.520/97); modificações no que concerne à prova pericial
(Lei nº. 8.862/94); a possibilidade de apelar sem a necessidade de recolhimento
prévio à prisão (Lei nº. 5.941/73); a revogação dos artigos atinentes ao
recurso extraordinário (Lei nº. 3.396/58), etc.
Por outro lado, leis extravagantes
procuraram aperfeiçoar o nosso sistema processual penal, podendo citar as que
instituíram os Juizados Especiais Criminais (Leis nºs. 9.099/95 e 10.259/01), e
que constituem, indiscutivelmente, o maior avanço já produzido em nosso sistema
jurídico processual, desde a edição do Código de 1941. Há, ainda, a que
disciplinou a identificação criminal (Lei nº. 10.054/00); a proteção a vítimas
e testemunhas ameaçadas (Lei nº. 9.807/99); a que possibilitou a utilização de
sistema de transmissão de dados para a prática de atos processuais (Lei nº.
9.800/99); a lei de interceptações telefônicas (Lei nº. 9.296/96); a Lei nº
8.038/90, que disciplina os procedimentos nos Tribunais, e tantas outras,
algumas das quais, é bem verdade, de duvidosa constitucionalidade.
Este é o quadro atual. Além de
algumas alterações pontuais, seja no próprio texto consolidado, seja por
intermédio de leis esparsas, nada mais foi feito para modernizar o nosso
diploma processual penal, mesmo após a nova ordem constitucional consagrada
pela promulgação da Carta Política de 1988.
E, assim, o atual código continua
com os vícios de 60 anos atrás, maculando em muitos dos seus dispositivos o
sistema acusatório, o devido processo legal, não tutelando satisfatoriamente
direitos e garantias fundamentais do acusado (vide o seu art. 594, a título de exemplo),
olvidando-se da vítima, refém de um excessivo formalismo (que chega a lembrar o
velho procedimentalismo), assistemático e confuso em alguns dos seus títulos e
capítulos (bastando citar a disciplina das nulidades[5]).
Atento a esta realidade, o então Ministro da
Justiça, Dr. José Carlos Dias, ao assumir o Ministério, editou o Aviso nº.
1.151/99, convidando o Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP, do
qual somos membros, a apresentar uma proposta de reforma do nosso Código de
Processo Penal. Este mesmo Ministro, agora por via da Portaria nº. 61/00
constituiu uma Comissão para o trabalho de reforma, tendo como membros os
juristas Ada Pellegrini Grinover (Presidente), Petrônio Calmon Filho
(Secretário), Antônio Magalhães Gomes Filho, Antônio Scarance Fernandes, Luiz
Flávio Gomes, Miguel Reale Júnior, Nilzardo Carneiro Leão, René Ariel Dotti
(que mais tarde saiu, sendo substituído por Rui Stoco), Rogério Lauria Tucci e
Sidnei Beneti.
Com a
inesperada e lamentável saída do Ministro Dias o novo titular da Pasta, Dr.
José Gregori, pela Portaria nº. 371/00 confirmou a Comissão anteriormente
formada, com a substituição já referida.
Ao final dos trabalhos, a
Comissão de juristas entregou ao Ministério da Justiça, no dia 06 de dezembro
de 2000, sete anteprojetos (todos acompanhados de uma exposição de motivos)
que, por sua vez, originaram os seguintes projetos de lei:
1º.)
Projeto de lei nº. 4.209/01: investigação criminal;
2º.)
Projeto de lei nº. 4.207/01: suspensão do processo/procedimentos;
3º.)
Projeto de lei nº. 4.205/01: provas;
4º.)
Projeto de lei nº. 4.204/01: interrogatório/defesa legítima;
5º.)
Projeto de lei nº. 4.208/01: prisão/medidas cautelares e liberdade;
6º.)
Projeto de lei nº. 4.203/01: júri;
7º.)
Projeto de lei nº. 4.206/01: recursos e ações de impugnação.
Estes projetos
originários da referida Comissão (pois já há outros, absolutamente inaceitáveis
e retrógrados) têm como
finalidades precípuas a modernização do velho código e a sua adaptação ao
modelo acusatório, com os seus consectários lógicos, tais como a distinção
nítida entre o julgador, o acusador e o acusado, a publicidade, a oralidade, o
contraditório, etc.
Sobre o sistema acusatório, assim
escreveu Vitu:
“Ce système procédural se
retrouve à l’origine des diverses civilisations méditerranéennes et occidentales:
en Grèce, à Rome vers la fin de la Republique, dans le droit germanique, à l’époque
franque et dans la procédure féodale.
“Ce système, qui ne distingue
pás la procédure criminelle de la procédure, se caractérise par des traits
qu’on retrouve dans les différents pays qui l’ont consacré.
“Dans l’organisation de la
justice, la procédure accusatoire suppose une complète égalité entre
l’accusation et la défense.”[6]
Para Afrânio Silva Jardim, “o
devido processo legal está vinculado diretamente à depuração do sistema
acusatório, mormente quando conjugado com a regra do art. 129, I do novo texto
constitucional, bem como com as demais normas que sistematizam e asseguram a
independência do Poder Judiciário, em prol de sua imparcialidade e neutralidade
na prestação jurisdicional e aquelas outras que, igualmente, tutelam a
autonomia e independência funcional dos órgãos do Ministério Público.”[7]
Esta reforma está mais ou menos
consentânea com os princípios estabelecidos pelo Projeto de Código Processual
Penal-Tipo para Ibero América. Neste Código-Modelo há alguns princípios
básicos, a saber:
1) “O
julgamento e decisão das causas penais será feito por juízes imparciais e
independentes dos poderes do Estado, apenas sujeitos à lei.” (art. 2º.).
2) “O imputado ou acusado deve
ser tratado como inocente durante o procedimento, até que uma sentença
irrecorrível lhe imponha uma pena ou uma medida de segurança.” (art. 3º.).
3) “A dúvida favorece o imputado”.
(idem).
4) “É inviolável a defesa no
procedimento.” (art. 5º.).
Tais idéias serviram também de base
para outras reformas feitas (ou por serem realizadas) em outros países, como a
Argentina, Guatemala, Costa Rica, El Salvador, Chile, Venezuela, Bolívia,
Paraguai, Honduras, Equador, Itália e Portugal.[8]
Aliás,
“el Derecho procesal penal de los países latinoamericanos, observado como
conjunto, ingresó, a partir de la década del’80, en un período de reformas
totales, que, para el lector europeo, puede compararse con la transformación
que sufrió el Derecho procesal penal de Europa continental durante el siglo
XIX. No se trata, así, de modificaciones parciales a un sistema ya adquirido y
vigente, sino, por lo contrario, de una modificación del sistema según otra
concepción del proceso penal. Descrito sintéticamente, se puede decir que este
proceso de reformas consiste en derogar los códigos antiguos, todavía
tributarios de los últimos ejemplos de la Inquisición –
recibida con la conquista y la colonización del continente -, para sancionar,
en más o en menos, leyes procesales penales conformes al Estado de Derecho, con
la aspiración de recibir en ellas la elaboración cumplida en la materia durante
el siglo XX.”[9]
Pode-se, portanto, inferir que as
reformas processuais penais já levadas a cabo em vários países da América
Latina e por virem em tantos outros, são frutos, na verdade, de modificações no
sistema político destes países que foram, paulatinamente, saindo de períodos
autoritários para regimes democráticos. É como se a redemocratização
impulsionasse o sistema processual do tipo inquisitivo para o sistema
acusatório. Aliás, é inquestionável a estreita ligação entre o sistema
processual penal de um país e o seu sistema político. Um país democrático[10]
evidentemente deve possuir, até porque a sua Constituição assim o obriga, um
Código de Processo Penal que adote o sistema acusatório, eminentemente
garantidor. Ao contrário, em um sistema autoritário, o processo penal, a
serviço do Poder, olvida os direitos e garantias individuais básicos,
privilegiando o sistema inquisitivo, caracterizado, como genialmente escreveu Ferrajoli,
por “una confianza tendencialmente ilimitada en la bondad del poder y en su
capacidad de alcanzar la verdad”. O
sistema inquisitivo, portanto, “confía no sólo la verdad sino también
la tutela del inocente a las presuntas virtudes del poder que juzga”.[11]
Assim, a “uniformidade
legislativa latino-americana – na verdade compreendendo agora a comunidade
cultural de fala luso-espanhola – apoiada em bases comuns e sem prejuízo das
características próprias de cada região, é uma velha aspiração de muitos
juristas do nosso continente. Além disso, ela foi o sonho de alguns grandes
homens, fundadores de nossos países ou de nossas sociedades políticas. (…)
“Em nossos países, geralmente, a
justiça penal tem funcionado como uma ‘caixa-preta’, afastada do controle
popular e da transparência democrática. O apego aos rituais antigos; As
fórmulas inquisitivas, que na cultura universal já constituem curiosidades
históricas; a falta de respeito à dignidade humana; a delegação das funções
judiciais; o segredo; a falta de imediação; enfim, um atraso político e
cultural já insuportável, tornam imperioso começar um profundo movimento de
reforma em todo o continente.”[12]
É evidente que o ideal seria uma
reforma total, completa, que propiciasse uma harmonia absoluta no sistema
processual penal, com a garantia absoluta do devido processo legal, mas, como
sabemos, se assim o fosse as dificuldades que já existem hoje, seriam ainda
maiores. Preferiu-se, de outro modo, uma reforma que, se não chega a ser total
(o que seria de difícil aprovação, à vista das evidentes dificuldades de
natureza legislativa que todos nós conhecemos), também não chega a ser
simplesmente pontual, até porque, como esclarece Ada, não incide “apenas
sobre alguns dispositivos, mas toma por base institutos processuais inteiros,
de forma a remodelá-los completamente, em harmonia com os outros.” Não é,
portanto, uma reforma isolada, mas “tópica”.[13]
Este movimento reformista não se
limita à América Latina. Na Europa também se encontram em franco
desenvolvimento reformas no sistema processual penal. A título de
exemplo, podemos referir a Alemanha, onde “también el Derecho procesal penal
há sido modificado en varias ocasiones entre 1997-2000”[14], a Itália[15] e a
Polônia, país que “desde hace 12 años se realizan reformas en la
legislación, relacionadas con el cambio de régimen político, económico y
social, que tuvo lugar en 1989 y también con la necesidad de adaptar las
soluciones jurídicas polacas a las soluciones aceptadas en la Unión Europea.
(…) Las reformas de la legislación penal e procesal penal constituyen
una parte esencial del ‘movimiento legislativo reformador’, segundo nos
informa a Drª. Barbara
Kunicka-Michalska, do Instituto de Ciências Jurídicas da Academia de Ciências
da Polônia, em Varsóvia.[16]
III – Os pactos internacionais
Por outro lado, além do texto
constitucional e do Código de Processo Penal, devemos nos referir aos pactos
internacionais subscritos e adotados pelo nosso Direito Positivo.
Assim, o Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos firmado em Nova York, em 19 de dezembro de 1966 e promulgado
pelo Governo brasileiro através do Decreto nº. 592/92, estabelece em suas
cláusulas alguns preceitos garantidores e reveladores de um devido processo
legal, assim como o Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969,
promulgado entre nós pelo Decreto nº. 678/92.
Nestes documentos, verbi gratia,
encontramos o direito à não auto-incriminação, à “presunção de inocência”, a um
julgamento sem dilações indevidas (ver adiante), à ampla defesa (idem), à
publicidade do processo, dentre outras.
IV – A ampla defesa
A ampla defesa compõe-se da defesa
técnica e da autodefesa. O defensor
exerce a defesa técnica, específica, profissional ou processual, que
exige a capacidade postulatória e o conhecimento técnico. O acusado, por sua
vez, exercita ao longo do processo (quando, por exemplo, é interrogado) a
denominada autodefesa ou defesa material ou genérica. Ambas, juntas, compõem a
ampla defesa.
A propósito, veja-se a definição do
jurista espanhol Miguel Fenech:
“Se
entiende por defensa genérica aquella que lleva a cabo la propia parte por sí
mediante actos constituídos por acciones u omisiones, encaminados a hacer
prosperar o a impedir que prospere la actuación de la pretensión.. No se halla
regulada por el derecho con normas cogentes, sino con la concesión de
determinados derechos inspirados en el conocimientode la naturaleza humana,
mediante la prohibición del empleo de medios coactivos, tales como el juramento
– cuando se trata de la parte acusada – y cualquier otro género de coacciones
destinadas a obtener por fuerza y contra la voluntad del sujeto una declaración
de conocimiento que ha de repercutir en contra suya”.
Para
ele, diferencia-se esta autodefesa da defesa técnica, por ele chamada de
específica, processual ou profissional, “que se lleva a cabo no ya por la
parte misma, sino por personas peritas que tienen como profesión el ejercicio
de esta función técnico-jurídica de defensa de las partes que actuán en el
processo penal para poner de relieve sus derechos y contribuir con su
conocimiento a la orientación y dirección en orden a la consecusión de los
fines que cada parte persigue en el proceso y, en definitiva, facilitar los
fines del mismo”.[17]
Ressalte-se
que o defensor não é parte, nem sujeito processual, nem, tampouco, substituto
processual, agindo apenas como um representante técnico da parte; neste mister,
parece-nos que cabe a este profissional exercitar a sua defesa mesmo contra a
vontade do réu, até porque o direito de defesa é indisponível: “En interés
del hallazgo de la verdad y de una defensa efectiva, puede, sin duda, actuar
también en contra de la voluntad del inculpado, por ejemplo, interponer una
solicitud para que se examine su estado mental”.[18]
Admite-se, por exemplo, a
interposição de recurso mesmo contra a vontade do réu, pois “deve, como
regra geral, prevalecer a vontade de recorrer, só se admitindo solução diversa
quando, por ausência do interesse-utilidade, não seja possível vislumbrar, em
face de circunstâncias do caso, vantagem prática para o acusado.” Isto
ocorre por que a regra da disponibilidade dos recursos “sofre exceções no
processo penal, em que a relação jurídica de direito material controvertida é
de natureza indisponível, havendo limitações à disponibilidade dos recursos
quando estejam em jogo os direitos de acusar e de defender.” Assim, “havendo
conflito de vontades entre o réu e o advogado, a opinião mais coerente com as
garantias da defesa é a de que deve prevalecer a vontade do defensor, que recorreu,
não só em razão de seus conhecimentos técnicos, mas sobretudo para melhor
garantia do direito de defesa.” [19]
A respeito deste tema, recentemente
decidiu o STJ no sentido do texto:
“Em homenagem ao princípio
constitucional da ampla defesa, na hipótese de conflito entre o réu, que
renunciou ao direito de recorrer da sentença condenatória, e seu defensor,
prevalece a vontade da defesa técnica, com idoneidade para avaliar as
conseqüências da não impugnação da decisão condenatória.” (STJ, HC
18.400-SP, Rel.: Min. VICENTE LEAL, DJU de 06/05/2002, p. 321).
Consta do voto do
Relator:
“Examinando-se a hipótese
«sub examen», é de se reconhecer a procedência do pedido. Ora, em homenagem ao
princípio constitucional da ampla defesa, na hipótese de conflito entre o réu,
que renunciou ao direito de recorrer da sentença condenatória, e seu defensor,
prevalece a vontade da defesa técnica, com idoneidade e conhecimento para
avaliar as conseqüências da não impugnação da decisão condenatória. É o que bem
ressalta a ilustre Subprocuradora-Geral da República em seu parecer, «verbis»:
«De fato, embora o réu seja o legítimo titular do direito de recorrer, a defesa
técnica há de preponderar sobre a autodefesa, no que tange ao recurso, tendo em
vista que o profissional especializado possui melhores condições de avaliar a
conveniência ou não das medidas legais a serem utilizadas, para um patrocínio o
mais eficaz possível, dos interesses do outorgante. Para reforçar ainda mais a
tese da ilustre Procuradora de Estado impetrante – que, ressalte-se, apesar de
toda a sobrecarga notoriamente conhecida no âmbito das Defensorias Públicas,
vem, «in casu» zelar firmemente pelos interesses de um paciente que renunciou
ao seu direito -, vê-se que, apesar de o Termo de Renúncia ao Direito de Recurso
haver sido assinado por Ademilton Messias Rosa (fl. 14), não existe, mesmo,
naquele ato, qualquer indício de haver sido o paciente assistido por um
defensor.” (fls. 93/94).
Vejamos outros julgados do mesmo STJ a respeito da
matéria, citados, inclusive, nesta decisão unânime:
“Processual penal. «Habeas corpus». Extorsão.
Apelação. Divergência entre réu e defensor. Havendo conflito entre o réu, que
renunciou ao direito de recorrer da sentença condenatória, e o seu defensor,
que interpôs apelação, deve prevalecer a manifestação deste, tendo em vista
que, por ter conhecimentos técnicos, em tese, está em melhores condições para
avaliar a necessidade da impugnação.
«Habeas
corpus» deferido.” (HC 15.983, Quinta Turma, Rel. em. Min. Félix Fischer, DJ 20/08/2001).
“Criminal. HC. Roubo tentado. Recurso de apelação.
Conflito entre as vontades do réu e de seu defensor. Preponderância da vontade
do defensor. Conhecimento técnico. Apelo em liberdade. Demora
não-razoável no julgamento do recurso. Constrangimento ilegal. Ordem concedida.
I. Na
hipótese de conflito entre a vontade do réu e a de seu defensor, no que se
refere à interposição de recurso, tendo em vista a renúncia do acusado ao
direito de recorrer, prevalece a vontade do defensor, constituído ou nomeado,
em razão do conhecimento técnico para avaliar as conseqüências da não
impugnação da decisão penal condenatória.
II.(…)
III.
Ordem concedida para determinar que o e. Tribunal de Alçada Criminal do Estado
de São Paulo proceda ao julgamento do mérito do recurso de apelação interposto
em favor de Edgar Santos Pereira, permitindo-se-lhe aguardar em liberdade tal
desfecho.” (HC 15.693/SP, Quinta Turma, rel. em. Min. Gilson Dipp, DJ 27/08/2001).
“Processo penal. Direito irrenunciável do réu de
recorrer. 1. Pode o defensor interpor recurso, embora o réu tenha se
manifestado em sentido contrário, posto que irrenunciável o seu direito de
recorrer, em face do princípio da ampla defesa, devendo aquele decidir sobre a
conveniência ou não do exercício da faculdade de apelar.
2.
Recurso do MP não conhecido.” (REsp
120.170/DF, Sexta Turma, Rel. em. Min. Fernando Gonçalves, DJ 30/06/97).
É evidente que todo
acusado deve obrigatoriamente ser defendido por um profissional do Direito, a
fim de que se estabeleça íntegra a ampla defesa, sendo imperioso destacar que o
direito de defesa no Processo Penal deve ser rigorosamente obedecido, sob pena
de nulidade:
“Para
que haya un proceso penal propio de un Estado de Derecho es irrenunciable que
el inculpado pueda tomar posición frente a los reproches formulados en su
contra, y que se considere en la obtención de la sentencia los puntos de vista
sometidos a discusión”.[20]
Mesmo para o réu ausente ou foragido
é indispensável, sob pena de nulidade absoluta, que se lhe nomeie um defensor;
se menor de 21 anos, além do defensor, necessário se faz a presença também de
um curador, ressalvando a súmula 352 do STF.
O defensor nomeado ou dativo será obrigado a
aceitar a defesa, sob pena de responder por infração disciplinar (art. 34, XII,
do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil). Se, porém, o
acusado para o qual o Juiz nomeou um defensor na realidade não for pobre, será
obrigado a pagar os honorários advocatícios arbitrados pelo Juiz (art. 263,
parágrafo único, CPP).
A constituição de
advogado no processo penal pode ser feita por procuração ou por indicação
verbal quando da realização do interrogatório, dispensando-se, neste último
caso, a juntada do instrumento procuratório. Ainda que inicialmente tenha sido
nomeado um defensor dativo, pode o acusado a qualquer momento constituir um
profissional de sua confiança (art. 263, caput).
Aliás, em razão de entendermos
que a ampla defesa pressupõe necessariamente a autodefesa e a defesa técnica é
que pugnamos pela necessidade da presença do advogado no interrogatório, sob
pena de se ferir o devido processo legal.
É bem verdade que se discute na doutrina se, nesta fase, é necessária a
presença de advogado. Boa parte entende que sim tendo em vista o disposto nos
arts. 261 e 263 do CPP. Neste sentido, Tourinho Filho, Frederico Marques e
Espínola Filho. Há quem entenda, porém, a sua desnecessidade por se tratar de
um momento processual típico da autodefesa (e não defesa técnica), podendo,
ademais, haver retratação a qualquer instante. A jurisprudência claramente se
inclina neste segundo sentido, a ponto do próprio Tourinho Filho observar que “nunca
se anulou qualquer processo pelo não-comparecimento do Advogado ao ato do
interrogatório”.[21]
Mirabete, por exemplo, acompanhando esta corrente
jurisprudencial majoritária, sustenta que “a presença do defensor no
interrogatório é apenas facultativa, já que não pode normalmente intervir nesse
ato processual, razão por que a sua ausência não constitui nulidade no processo
(RT 600/369, 610/407, JTACrSP 59/340)”.
Em posição
contrária, defende Ferrajoli “el derecho del imputado a la asistencia y, en
todo caso, a la presencia de su defensor en el interrogatorio, para impedir
abusos o cualesquiera violaciones de las garantias procesales”.[22]
Recentemente, porém, a Suprema Corte, através de um
dos seus mais destacados Ministros, Celso de Mello, através de liminar
concedida em Mandado de Segurança (acima referido) deixou assentado que “cabe
reconhecer, por isso mesmo, que a presença do advogado em qualquer
procedimento estatal, independentemente do domínio institucional em que
esse mesmo procedimento tenha sido instaurado, constitui fator inequívoco de
certeza de que os órgãos do Poder Público (Legislativo, Judiciário e
Executivo) não transgredirão os limites delineados pelo ordenamento positivo
da República, respeitando-se, em conseqüência, como se impõe aos membros e
aos agentes do aparelho estatal, o regime das liberdades públicas e os direitos
subjetivos constitucionalmente assegurados às pessoas em geral, inclusive àquelas
eventualmente sujeitas, qualquer que seja o motivo, a investigação
parlamentar, ou a inquérito policial, ou, ainda, a processo judicial”.
Esperamos que tal decisão seja confirmada no mérito, assentando-se
definitivamente em nossa práxis forense a necessidade do defensor no ato de
interrogatório do réu, como ocorreu no julgamento a seguir descrito:
“NULIDADE. INTERROGATÓRIO. AUSÊNCIA DE ADVOGADO.
Nulo é o processo em que o acusado é interrogado sem a presença de advogado
defensor. Agressão aos princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º.,
LV, da Constituição Federal). Nulidade decretada a partir, inclusive, do
interrogatório.” (Apelação Criminal nº. 70001997402 – TJRGS – 5ª. Câmara
Criminal – Rel. Des. Amilton Bueno de Carvalho – j. 14/02/01).
A propósito, observamos que o acima referido
Projeto de Lei nº. 4.204/01 estabelece a obrigatoriedade da presença de
advogado, nomeado ou constituído, quando do interrogatório do acusado, pois a
nova redação do art. 185 assim prescreve: “O acusado que comparecer perante
a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e
interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado.”
V – O contraditório
Não há devido processo legal sem o contraditório,
que vem a ser, em linhas gerais, a garantia de que para toda ação haja uma
correspondente reação, garantindo-se, assim, a plena igualdade de oportunidades
processuais.
O contraditório, por exemplo, obriga
que a defesa fale sempre depois da acusação. Assim, no Processo Penal as
testemunhas arroladas na peça acusatória são inquiridas em primeiro lugar (art.
396, CPP), as alegações finais do réu são oferecidas também anteriormente as do
acusador (art. 500), e assim por diante…
Questão que se mostra polêmica é o
parecer do Ministério Público na segunda instância.
Como se sabe, na segunda instância o
Ministério Público, por intermédio de um Procurador de Justiça, exara um
parecer escrito antes do respectivo processo criminal ser encaminhado para
julgamento. É um privilégio que parece ferir alguns princípios basilares e
algumas regras orientadoras do processo penal, como tentaremos mostrar a
seguir.
Com efeito, sempre nos pareceu que este pronunciamento do
Procurador de Justiça na segunda instância, ainda que na condição de custos legis, soava
estranho, mesmo porque fiscal da lei também é o Promotor de Justiça atuante
junto à primeira instância e, no entanto, nunca se dispensou a ouvida da
defesa… Para nós, este privilégio fere o contraditório (ação versus reação), a
isonomia (paridade de armas), o devido processo legal (a defesa fala por
último) e a ampla defesa (direito do acusado de ser informado também por
último).
A propósito, ouçamos a boa doutrina, capitaneada por
Frederico Marques:
“Bem de ver é, porém, que na Justiça criminal, se apresenta
algo esdrúxula essa função consultiva do procurador-geral, uma vez que o
Ministério Público está constituído, precipuamente, como órgão da ação penal e
da pretensão punitiva do Estado. Além disso, não se compadece muito com a
estrutura contraditória do processo penal pátrio, e com as garantias de defesa
plena do réu, que fale em último lugar um órgão investido de funções
nitidamente persecutórias. Daí se nos afigurar errônea e infeliz a disposição
contida no art. 610 do CPP, sobre a abertura de vista ao procurador-geral.”[23]
Vejamos agora outro grande processualista, Tourinho Filho:
“Mal saídos de uma fatigante
atividade combativa, assumem função completamente imparcial, própria dos
fiscais da lei e, muitas vezes, com várias e honrosas exceções, o custos
legis é traído pelo Acusador, quebrando, assim, uma regra decorrente do
devido processo legal, segundo a qual a Defesa fala por último… Ademais, o
Procurador de Justiça, membro que é do Ministério Público, não pode ficar
eqüidistante das partes. Entranhada e psicologicamente tem laços com uma delas.
É difícil o corte desse cordão umbilical. E, para evitar essas traições, a
nosso ver, deveria o Ministério Público, na segunda instância, limitar-se à
análise dos processos sob o aspecto formal, deixando a apreciação do mérito aos
Tribunais.”[24]
Então, pergunta-se: “no processo
penal, quando o processo atinge o grau recursal qual das partes fala por
último? O réu ou o Ministério Público? Os arts. 610 e 613 do Código de Processo
Penal nos dão a resposta: o Ministério Público manifesta-se depois da defesa e,
ordinariamente, a defesa sequer tem vista do que foi oficiado pelo MP – a não
ser que requeira vista dos autos e se lhe for concedida. Alguns autores
fundamentam tais incompreensíveis dispositivos legais com a função de fiscal da
lei que o MP desempenharia nos recursos criminais. Ora, não se pode confundir a
função de parte com a de fiscal da lei. No processo criminal por ação de
iniciativa pública é o MP, uno e indivisível, quem oferece denúncia; é ele quem
postula a aplicação da sanção penal; e é ele quem, mesmo em grau de recurso,
tem legitimidade para sustentar oralmente o recurso do promotor, visando, até,
à majoração da pena. Então, não se pode falar que o mesmo órgão publico, o
mesmo órgão do Estado, possa ser, ao mesmo tempo, fiscal da lei e parte, ao
ponto de, na instância recursal, desaparecer a parte, permanecendo apenas o
fiscal da lei, em uma estranha ação penal sem autor.”[25]
Veja-se este recente julgado do
Superior Tribunal de Justiça:
“Ministério Público. Atuação.
Parte. A Turma, por maioria, concedeu a ordem para anular o processo a partir
do julgamento, por entender que, na hipótese, o Ministério Público, além de
atuar como fiscal da lei, era também parte, e como tal, à luz da Constituição
vigente, não pode proferir sustentação oral depois da defesa. (HC
18.166-SP, Rel. originário Min. Fernando Gonçalves, Rel. para o acórdão Min.
Hamilton Carvalhido, julgado em 19/02/2002).
Observa-se que é possível, ainda que em grau de recurso,
haja a feitura de diligências ordenadas pelo relator, por força do art. 616 do
Código de Processo Penal. Nesta hipótese, perguntamos quem estaria
representando o Ministério Público nesta nova instrução. Evidentemente que se a
diligência (uma acareação, por exemplo) fosse realizada no próprio Tribunal
somente um Procurador de Justiça poderia atuar, o que vem a corroborar o fato
de que, além de fiscal da lei, continua ele como representante da parte
acusadora. Neste aspecto, veja-se a lição de Ada, Scarance e Gomes Filho: “o
tribunal poderá livremente apreciar, no recurso, aspectos que não foram
suscitados pelas partes. Se o entender conveniente, converterá o julgamento em
diligência para a produção de novas provas, destinadas à formação do
convencimento de seus membros e poderá excluir as que considerar ilícitas do
material probatório; se o considerar oportuno, poderá reinquirir o réu e será
livre para levantar novas teses jurídicas. Apenas, deverá garantir que tudo
isso seja feito em contraditório, na presença das partes, dando a estas a
oportunidade de contradizer, inclusive provando. O contraditório, na melhor
doutrina, não se limita às questões de fato, devendo abranger as questões de
direito que o juiz levantar de ofício (Tarzia).”[26]
Por outro lado, simplesmente suprimir o parecer ministerial
não é possível, sob pena de se incorrer em nulidade absoluta, tendo em vista o
disposto no art. 564, III, d do Código de Processo Penal.[27]
VI – O duplo grau de jurisdição
O devido processo legal deve igualmente garantir a
possibilidade de revisão dos julgados. A falibilidade humana e o natural
inconformismo de quem perde estão a exigir o reexame de uma matéria decidida em
primeira instância, a ser feito por juízes coletivos e magistrados mais
experientes.
A Constituição Federal prevê o duplo grau de
jurisdição, não somente no já referido art. 5º., LV, como também no seu art.
93, III (“acesso aos tribunais de segundo grau”) e pressupõe,
evidentemente, uma decisão judicial e a sucumbência (prejuízo). Ademais, para
recorrer deve-se atentar para pressupostos de natureza subjetiva, a saber: o
interesse e a legitimidade.
Há mais de vinte anos, o jurista baiano Calmon de
Passos mostrava a sua preocupação com “a tendência, bem visível entre nós,
em virtude da grave crise que atinge o Judiciário, de se restringir a
admissibilidade de recursos, de modo assistemático e simplório, em detrimento
do que entendemos como garantia do devido processo legal, incluída entre as que
são asseguradas pela nossa Constituição.”
Neste mesmo trabalho, nota o eminente Mestre que “o
estudo do duplo grau como garantia constitucional desmereceu, da parte dos
estudiosos, em nosso meio, considerações maiores. Ou ele é simplesmente negado
como tal ou, embora considerado como ínsito ao sistema, fica sem fundamentação
mais acurada, em que pese ao alto saber dos que o afirmam, certamente por força
da larga admissibilidade dos recursos em nosso sistema processual,
tradicionalmente, sem esquecer sua multiplicidade.”[28]
Tal garantia se encontra também estabelecida na
Convenção América de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), no seu
art. 8º., 2, “h”.
VII – O juiz e o promotor natural
Questão importante, e que se
prende intimamente ao devido processo legal, é o princípio do Promotor Natural[29]
que pressupõe a independência funcional do membro do Ministério Público (art.
127, § 1º., CF), a sua inamovibilidade (art. 128, § 5º., I, b), a investidura
por concurso público e a determinação legal e anterior de suas atribuições.
A independência e a autonomia
funcionais, ambas consagradas no art. 127, §§ 1º. e 2º. da Constituição
Federal, são princípios que compõem a figura do Promotor Natural,
advertindo-se, desde logo, que a “autonomia funcional atinge o Ministério
Público enquanto instituição, e a cada um dos seus membros, enquanto agentes
políticos.”[30]
Sobre o assunto, o velho Bento de
Faria já escrevia:
“O Ministério Público, como fiel
fiscal da lei, não poderia ficar constrangido a abdicar das suas convicções,
quando devidamente justificadas. Do contrário seria um instrumento servil da
vontade alheia.”[31]
O grande Roberto Lyra já afirmava
que “nem o Procurador-Geral, investido de ascendência hierárquica, tem o
direito de violentar, por qualquer forma, a consciência do Promotor Público,
impondo os seus pontos de vista e as suas opiniões, além do terreno técnico ou
administrativo.”
Para este autor (que dedicou toda
a sua vida ao estudo do Direito Criminal e ao Ministério Público, a ponto de
ser chamado por Evandro Lins e Silva de o “Príncipe
dos Promotores Públicos brasileiros”) “quanto
ao elemento intrínseco, subjetivo, dos atos oficiais, na complexidade, na
sutileza, na variedade de seus desdobramentos, como a apreciação da prova, para
a denúncia, a pronúncia, o pedido de condenação, a apelação, a liberdade
provisória ou a prisão preventiva, é na sua consciência livre e esclarecida,
elevada a um plano inacessível a quaisquer injunções ou tendências, que o
Promotor Público encontra inspiração”, concluindo “que a disciplina do Ministério Público está afeta ao Procurador-Geral.
No entanto, esse não intervem na consciência do subordinado.”[32]
O saudoso Esmeraldino Bandeira já
escrevia que o Promotor de Justiça na “sua palavra é absolutamente livre e
independente, e em suas requisições não atende senão à sua consciência.”[33]
Ainda a propósito, certa vez um
antigo Promotor de Justiça do Distrito Federal, Dr. Murillo Fontainha, ao
recusar determinação do Procurador-Geral de oferecer denúncia em um caso,
escreveu:
“No exercício das suas elevadas
funções, o Ministério Público ‘só recebe instruções da sua consciência e da
lei’ (Sentença do saudoso Magistrado Raul Martins, D. Oficial de 10 de outubro
de 1914, p. 10.844) e ‘as ordens que o Chefe do Ministério Público tem o
direito de impor aos seus inferiores são ordens que não afetem à consciência
dos mesmos. E o Promotor, que fugindo aos impulsos da sua convicção, deixar-se
sugestionar pelas imposições extrínsecas, é um que homem ultraja à sua
consciência e um Magistrado que prostitui a lei. Vê, pois, V. Exª., que nas
funções em que entra a convicção do Promotor, como elemento principal, a ordem
do Chefe do Ministério Público não pode ter o caráter de preceito imperativo
obrigatório’ (Auto Fontes, Questões Criminais p. 75-6).”
E continua adiante:
“Todas essas explanações
evidenciam que nas hipóteses em que o Ministério Público tem que opinar da sua
conduta no caso que lhe for concluso, quer de oportunidade ou cabimento de
recurso legal a interpor, quer de apreciação sobre elementos para denúncias ou
arquivamento de processos, só deve receber instruções da sua íntima convicção,
de sua consciência. Nessa esfera, as instruções do Chefe do Ministério Público
não podem penetrar, porque é a própria lei em vigor que o diz quando
terminantemente dispõe que incumbe aos Promotores Públicos oferecer denúncia
quando se convençam da existência de crimes de sua competência.”
(grifo nosso).[34]
Em resposta, eis o que decidiu o
Procurador-Geral de Justiça:
“Entende o Procurador-Geral que,
na espécie, existem fartos elementos para instauração da ação penal, e, não
podendo determinar ao Dr. 1º Promotor Público que ofereça denúncia,
sujeitando-se às sanções legais, em caso de recusa, por haver cessado a sua
competência no juízo da 4ª Vara Criminal, recomendo ao seu substituto
ofereça denúncia contra aqueles indiciados.”[35]
(grifo nosso).
Encerremos, então, com mais esta
lição do grande Lyra:
“Decairia de sua própria
independência moral o Promotor Publico se ficasse sujeito, em matéria
opinativa, às injunções, quer dos juizes, quer dos chefes, esses funcionários
da confiança do Governo. Ocorreria ainda o perigo de, indiretamente,
submeter-se o Promotor Público ao arbítrio oficial no desempenho de uma tarefa
de sutilíssima subjetividade.” (p. 176).
Ao lado do Promotor Natural, fundamental que
tenhamos, também, o Juiz Natural, figura consagrada no art. 5º., XXXVII e LIII
da Constituição, bem como nos arts. 8º. e 10º. da Declaração Universal dos
Direitos do Homem.
O Juiz Natural é aquele
constitucional, legal e previamente competente para julgar determinada causa
criminal, imparcial e independente, garantindo-se-lhe a inamovibilidade (arts.
95, II e 93, VIII, CF/88), a irredutibilidade de vencimentos (art. 95, III,
CF/88) e a vitaliciedade (art. 95, I, CF/88).
VIII – O direito de apelar em liberdade
Compõe também o devido processo
legal a possibilidade de se aguardar em liberdade o recurso interposto contra
uma sentença condenatória penal.
É bem verdade que pela regra imposta
no art. 594 do Código de Processo Penal, “o réu não poderá apelar sem
recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons
antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por
crime que se livre solto.”
Assim, em relação ao condenado que
não seja primário e não tenha bons antecedentes, dois ônus a ele se impõem por
força de lei: a prisão automática decorrente da sentença condenatória (salvo se
se livrar solto ou prestar fiança, sendo esta cabível) e a impossibilidade de
recorrer se não for recolhido à prisão.
Na verdade, se nos limitarmos a
interpretar literalmente este artigo chegaremos forçosamente à conclusão que
ele afronta a Constituição (e, portanto, é inválido) em pelo menos duas
oportunidades: 1ª.) quando o texto constitucional garante a presunção de
inocência[36])
e 2ª.) quando assegura a ampla defesa, com os recursos a ela inerentes.
Ora, se o art. 5º., LVII, da
Constituição proclama que “ninguém será considerado culpado até o trânsito
em julgado de sentença penal condenatória”, é de todo inadmissível que
alguém seja preso antes de definitivamente julgado, salvo a hipótese desta
prisão provisória se revestir de caráter cautelar, independentemente de
primariedade e de bons antecedentes. Soa, portanto, estranho alguém ser
presumivelmente considerado não culpado (pois, ainda não foi condenado
definitivamente) e, ao mesmo tempo, ser obrigado a se recolher à prisão, mesmo
não representando a sua liberdade nenhum risco seja para a sociedade, seja para
o processo, seja para a aplicação da lei penal. Mais estranho se nos afigura ao
atentarmos que aquela presunção foi declarada constitucionalmente.
Desta forma, esta prisão provisória,
anterior a uma decisão transitada em julgado, só se revestirá de legitimidade
caso seja devidamente fundamentada (art. 5º., LXI, CF/88) e reste demonstrada a
sua necessidade (periculum libertatis[37]).
No mesmo passo, há a segunda
questão: se a Constituição também assegura aos acusados em geral a ampla defesa
com os recursos a ela inerentes, parece-nos também claro que uma lei
infraconstitucional não poderia condicionar este direito de recorrer àquele que
não tem bons antecedentes e não é primário, ao recolhimento à prisão.
Observa-se que esta regra legal está complementada no artigo seguinte, segundo
o qual “se o réu condenado fugir depois de haver apelado, será declarada
deserta a apelação.” (art. 595, CPP).
Da mesma forma, agora igualmente soa
estranho para nós não se permitir ao acusado o acesso ao duplo grau de
jurisdição, quando não seja primário e não tenha bons antecedentes.
Não esqueçamos que a “adoção do
duplo grau de jurisdição deixa de ser uma escolha eminentemente técnica e
jurídica e passa a ser, num primeiro instante, uma opção política do legislador.”[38]
Apesar do texto constitucional não
conter expressamente a garantia do duplo grau de jurisdição (como ocorre com a
presunção de inocência), é indiscutível o seu caráter de norma materialmente
constitucional, mormente porque o Brasil ratificou a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica) que prevê em seu art.
8º., 2, h, que todo acusado de delito tem “direito de recorrer da sentença
para juiz ou tribunal superior”, e tendo-se em vista o estatuído no § 2º.,
do art. 5º., da CF/88, segundo o qual “os direitos e garantias expressos
nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios
por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa
do Brasil seja parte.” Ratificamos, também, o Pacto Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos de Nova Iorque que no seu art. 14, 5, estatui que “toda
pessoa declarada culpada por um delito terá o direito de recorrer da sentença
condenatória e da pena a uma instância superior, em conformidade com a lei.”
É bem verdade que a doutrina se
debate a respeito da posição hierárquica que ocupam as normas advindas de
tratado internacional. Parte dela entende que caso a norma internacional trate
de garantia individual, terá ela status constitucional, até por força do
referido § 2º.
Fábio Comparato, por exemplo,
informa que “a tendência predominante, hoje, é no sentido de se considerar
que as normas internacionais de direitos humanos, pelo fato de expressarem de
certa forma a consciência ética universal, estão acima do ordenamento jurídico
de cada Estado. (…) Seja como for, vai-se afirmando hoje na doutrina a tese
de que, na hipótese de conflitos entre regras internacionais e internas, em
matéria de direitos humanos, há de prevalecer sempre a regra mais favorável ao
sujeito de direito, pois a proteção da dignidade da pessoa humana é a
finalidade última e a razão de ser de todo o sistema jurídico”[39]:
é o chamado princípio da prevalência da norma mais favorável.[40]
Ada, Dinamarco e Araújo Cintra, após
admitirem a indiscutível natureza política do princípio do duplo grau de
jurisdição (“nenhum ato estatal pode ficar imune aos necessários controles”)
e que ele “não é garantido constitucionalmente de modo expresso, entre nós,
desde a República”, lembram, no entanto, que a atual Constituição “incumbe-se
de atribuir a competência recursal a vários órgãos da jurisdição (art. 102, II;
art. 105, II; art. 108, II), prevendo expressamente, sob a denominação de tribunais,
órgãos judiciários de segundo grau (v.g., art. 93, III).”[41]
Resta-nos, então, já que legem
habemus, interpretar este dispositivo legal (infraconstitucional e fruto de
uma lei de 1973) à luz da Constituição Federal, a fim de que possamos
entendê-lo ainda como válido, fazendo, porém, uma leitura efetivamente
garantidora.
Ora, se temos a garantia
constitucional da presunção de inocência, é evidente que não pode ser efeito de
uma sentença condenatória recorrível, pura e simplesmente, um decreto
prisional, sem que se perquira quanto à necessidade do encarceramento.
Como sabemos, entre nós, cabível
será a prisão preventiva sempre que se tratar de garantir a ordem pública, a
ordem econômica, ou por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a
aplicação da lei penal. São estes os requisitos da prisão preventiva e que
configuram exatamente o periculum libertatis. Estes requisitos,
portanto, representam a necessidade da prisão preventiva, que não é outra coisa
senão uma medida de natureza flagrantemente cautelar, pois visa a resguardar,
em última análise, a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei
penal (há, ainda, os pressupostos desta prisão, que não nos interessam no
presente estudo).
Se assim o é, fácil é interpretar
este artigo 594 da seguinte forma e nos seguintes termos: a prisão será uma
decorrência de uma sentença condenatória recorrível sempre que, in casu,
fosse cabível a prisão preventiva contra o réu, independentemente de sua condição
pessoal de primário e de ter bons antecedentes; ou seja, o que definirá se o
acusado aguardará preso ou em liberdade o julgamento final do processo é a
comprovação da presença de um daqueles requisitos acima referidos.
Conclui-se que a necessidade
é o fator determinante para alguém aguardar preso o julgamento final do seu
processo, já que a Constituição garante que “ninguém será considerado
culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”
Por outro lado, como a ampla defesa
(e no seu bojo a garantia do duplo grau de jurisdição) também está
absolutamente tutelada pela Carta Magna, o artigo ora analisado não pode ser
interpretado literalmente, porém, mais uma vez, em conformidade com aquele
Diploma, lendo-o da seguinte forma: não se pode condicionar a admissibilidade
da apelação ao recolhimento do réu à prisão, mesmo que ele não seja primário e
não tenha bons antecedentes. Aqui, vamos, inclusive, mais além: mesmo que a
prisão seja necessária (e se revista, portanto, da cautelaridade típica da
prisão provisória), ainda assim, admitir-se-á o recurso, mesmo que não tenha
sido preso o acusado, ou que, após ser preso, venha a fugir.
Observa-se que, agora, mesmo sendo
cabível o encarceramento provisório (por ser, repita-se, necessário), o
não recolhimento do acusado não pode ser obstáculo à interposição de eventual
recurso da defesa, e se recurso houver, a fuga posterior não lhe obstará o
regular andamento (não pode ser considerado deserto).
Não concordamos, outrossim, que a
exigência da prisão para recorrer seja uma “regra procedimental
condicionante do processamento da apelação”, como pensa Mirabete[42],
pois, como contrapõe Luiz Flávio Gomes, “se não ofende a presunção de
inocência ou a ampla defesa, indiscutivelmente ofende o princípio da necessidade
de fundamentação da prisão, inscrito no art. 5º., LXI.”[43]
Vê-se que não optamos pela
interpretação literal do art. 594, o que seria desastroso, tendo em vista as
garantias constitucionais acima vistas. Por outro lado, utilizamo-nos do
critério da interpretação conforme a Constituição, procurando adequar o
texto legal com o Texto Maior e evitando negar vigência ao dispositivo, mas,
antes, admitindo-o válido a partir de uma interpretação garantidora e em
consonância com a Constituição.
Afinal de contas, como já escreveu
Cappelletti, “a conformidade da lei com a Constituição é o lastro causal que
a torna válida perante todas.”[44]
Devemos atentar que o presente
artigo foi inserido em nosso código processual penal pela Lei nº. 5.941/73,
época em que vigiam em
nosso País a Constituição anterior a 1988 (que não trazia o
princípio da presunção de inocência) e um regime político não democrático.
Naquele contexto histórico,
portanto, fácil era entender que uma lei ordinária viesse a dificultar o
direito ao recurso e a prever a prisão automática decorrente de sentença
condenatória recorrível. Bastava a sentença condenatória e a prisão impunha-se
automaticamente, por força de lei, presumindo-se a culpabilidade ou a
periculosidade do réu.[45]
Ocorre que desde 1988 temos outra
Constituição, com outros princípios, muitos dos quais expressamente previstos
(o que não impede a existência de princípios constitucionais implícitos, como, v.g.,
o da proporcionalidade). A lei anterior, então, tem que ser interpretada
segundo este critério, ou seja, em conformidade com a nova ordem constitucional
(sob pena de ser considerada não recepcionada e, logo, inválida), evidentemente
sem ultrapassar o seu sentido literal, apenas conformando-a com a Constituição.
Como dissemos, no tempo em que foi inserida
em nosso sistema jurídico, a lei traduzia, em verdade, o momento histórico em
que vivia o País, cabendo, por isso mesmo, atentarmos, agora, para o elemento
histórico-teleológico (concepção subjetivista da interpretação, ou teoria da
vontade), segundo o qual a lei obedece ao tempo em que foi intencionalmente
(finalisticamente) concebida, devendo ser interpretada preferencialmente
em conformidade com aquela realidade.
James Goldshimidt já afirmava no
clássico “Problemas Jurídicos e Políticos del Proceso Penal” que a
estrutura do processo penal de um país indica a força de seus elementos
autoritários e liberais.[46]
Devemos, então, buscar abrigo neste
elemento histórico, acomodando a lei às “novas circunstâncias não previstas
pelo legislador”, especialmente aos “princípios elevados a nível
constitucional”.[47]
Só poderíamos interpretar este
artigo literalmente se este modo interpretativo fosse possível à luz da
Constituição. Por outro lado, não entendemos ser o caso de, simplesmente,
reconhecer inválida a norma insculpida naquele artigo de lei. A nós nos parece
ser possível interpretá-la em conformidade com o texto constitucional, sem que
se o declare inválido e sem “ultrapassar os limites que resultam do sentido
literal e do contexto significativo da lei.”[48]
Se verdade é que “por detrás da
lei está uma determinada intenção reguladora, estão valorações, aspirações e
reflexões substantivas, que nela acharam expressão mais ou menos clara”,
também é certo que “uma lei, logo que seja aplicada, irradia uma acção que lhe
é peculiar, que transcende aquilo que o legislador tinha intentado. A lei
intervém em relações da vida diversas e em mutação, cujo conjunto o legislador
não podia ter abrangido e dá resposta a questões que o legislador ainda não
tinha colocado a si próprio. Adquire, com o decurso do tempo, cada vez mais
como que uma vida própria e afasta-se, deste modo, das idéias dos seus autores.”
(grifo nosso): teoria objetivista ou teoria da interpretação imanente à lei.[49]
Portanto, não se pode ler o artigo
594 e inferir, hoje, o que se traduz gramaticalmente desta leitura. A
interpretação literal efetivamente deve ser o início do trabalho, mas não o
completa satisfatoriamente.[50]
Em reforço à tese ora esboçada,
ilustra-se dizendo que o projeto de lei de reforma do Código de Processo Penal,
expressamente, revoga os arts. 594 e 595 do atual CPP. Na respectiva exposição
de motivos, justifica-se a revogação afirmando que teve “como objetivo
definir que toda prisão antes do trânsito em julgado final somente pode ter o
caráter cautelar. A execução ‘antecipada’ não se coaduna com os princípios e
garantias do Estado Constitucional e Democrático de Direito.” São os novos
tempos…
Vê-se
que “las leyes son e deben ser la expresión más exacta de las necesidades
actuales del pueblo, habida consideración del conjunto de las contingencias
históricas, en medio de las cuales fueron promulgadas.” (grifo nosso)[51]
Ademais, atentando-se, outrossim,
para o sistema jurídico e fazendo uma interpretação sistemática do dispositivo[52],
assinalamos que, posteriormente a ele, surgiu no cenário jurídico brasileiro a
Lei nº. 8.072/90 (Crimes Hediondos), dispondo que “em caso de sentença
condenatória, o juiz decidirá fundamentadamente se o réu poderá apelar
em liberdade.” (art. 2º., § 2º., com grifo nosso).[53]
Atenta-se, com Maximiliano, que o “Direito
objetivo não é um conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade,
organismo regular, sistema, conjunto harmônico de normas coordenadas, em
interdependência metódica, embora fixada cada uma no seu lugar próprio.”[54]
Veja-se a propósito a seguinte
decisão do STJ:
“HABEAS CORPUS Nº 11.738 – PE
(1999/0120892-0) (DJU 24.09.01, SEÇÃO 1, P. 346, J. 23.05.01)
RELATOR : MINISTRO HAMILTON
CARVALHIDO
IMPETRANTE: C.A.A.
IMPETRADO : PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL
DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
PACIENTE : V.N.A. (PRESO)
EMENTA
DIREITO PROCESSUAL Penal. TRAFICO DE
ENTORPECENTE. CONDENAÇÃO. DENEGAÇÃO DO APELO EM LIBERDADE.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
1. Permanece o entendimento anterior
da 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, quanto à exigência de
fundamentação da negativa do apelo em liberdade de réu condenado por tráfico de
entorpecente, em processo a que respondeu solto, não bastando a simples
referência ao artigo 35 da Lei de Tóxicos (parágrafo 2° do artigo 2° da Lei
8.072/90).
2. Ordem concedida.”
Para finalizar, recorremos, mais uma
vez, a Larenz:
“Mediante a interpretação ‘faz-se
falar’ o sentido disposto no texto, quer dizer, ele é enunciado com outras
palavras, expressado de modo mais claro e preciso, e tornado comunicável. A
esse propósito, o que caracteriza o processo de interpretação é que o
intérprete só quer fazer falar o texto, sem acrescentar ou omitir o que quer
que seja. Evidentemente que nós sabemos que o intérprete nunca se comporta aí
de modo puramente passivo.”[55]
IX – O excesso prazal
O devido processo legal pressupõe,
outrossim, um procedimento sem dilações indevidas. O excesso prazal macula o
processo e obriga a soltura do réu preso, ainda que presentes os requisitos da
prisão cautelar.
É lição antiga da doutrina que tal
situação processual é absolutamente inadmissível, ainda mais se tratando de
acusado preso.
Ary Franco, por exemplo, já
pontificava há tempos:
“A questão relativa ao prazo de
encerramento da instrução criminal sempre foi preocupação máxima dos poderes
públicos, por isso mesmo que é mister acautelar os interesses do réu, que não
pode nem deve, como elemento da sociedade, ficar indefinidamente à espera de
que os órgãos da sociedade que integram o Poder Judiciário ultimem a sua
situação de acusado, para declará-lo inocente, ou não.”[56]
Outro antigo processualista, Câmara
Leal, já indicava como causa justificadora para a concessão de habeas corpus
“quando, estando o réu preso em flagrante ou preventivamente, não é o
processo julgado dentro do prazo legal, exceto se ocorrer legítimo impedimento.”[57]
Vicente de Azevedo, outro saudoso
jurista, enfrentando esta mesma questão, alertava que acaso não concedido, em
tais hipóteses, o habeas corpus acabaria “o réu cumprindo a pena
cominada em abstrato na lei penal antes de julgado”[58]…
A doutrina mais recente, por sua
vez, é uníssona, bastando ser citados, por todos, Frederico Marques e Tourinho
Filho, respectivamente:
“A manutenção do réu sob carcer
ad custodiam não pode, em regra, exceder o prazo legal. (…) No
Direito inglês é observado, com sumo rigor, o preceito que veda manter-se preso
o réu, demoradamente, sem julgamento definitivo. Entre nós, isso nem sempre
acontece, o que é injusto e iníquo.”[59]
É o que vimos neste processo.
“Se o réu não pode ser culpado
pela inobservância do prazo, é o habeas corpus o meio idôneo para pôr
cobro à coação cautelar, por não se conter esta nos limites temporais em que a
lei permite a vulneração da incoercibilidade no âmbito da liberdade de ir e vir.”[60]
Não esqueçamos que há
entendimento jurisprudencial solidamente firmado no sentido de que a instrução
criminal no processo de rito ordinário deve se encerrar em um prazo máximo de
81 dias se o réu estiver preso (se solto, não necessariamente). Este prazo é
contado individuadamente e não conglobadamente, não se podendo compensar o
atraso em uma fase com a agilização em uma posterior (há quem prefira a
contagem global). Ex.: as testemunhas arroladas pela acusação devem ser ouvidas
em vinte dias se o réu estiver preso; se este prazo não for obedecido, não se
compensa o atraso com um posterior adiantamento da fase seguinte e assim por
diante… O constrangimento ilegal pela demora no término do respectivo ato
processual surge imediatamente, independentemente do ato subseqüente.
Acompanhando
este entendimento pretoriano, a Lei nº. 9.034/95, que disciplina o combate às
ações praticadas por organizações criminosas, estabeleceu expressamente o prazo
de 81 dias para o encerramento da instrução criminal em caso de réu preso e de
120 dias se solto ele estiver (art. 8º.).
De toda forma, a injustificada
demora processual acarreta constrangimento ilegal a ser remediado via habeas
corpus, salvo se o atraso foi causado exclusivamente pela defesa. Nesse
sentido, a Súmula 64, do STJ, in verbis: “Não constitui
constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução, provocado pela defesa”.
Este mesmo Tribunal Superior também sumulou que “encerrada a instrução
criminal, fica superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo”
(Súmula 52). Vê-se que nenhuma das duas súmulas pode ser aplicada a este caso.
É verdade que alguns motivos às
vezes justificam o atraso e impedem a alegação de constrangimento ilegal.
Cita-os, exemplificando, Mirabete: processo em que há vários réus envolvidos,
necessidade de instauração de incidente de insanidade mental, citação
editalícia, etc.[61] A
doença do réu ou do seu defensor, a complexidade da causa ou outro motivo de
força maior também justificam a demora (art. 403, CPP). Nada disto, porém, aconteceu
na presente hipótese, tudo a corroborar o evidente constrangimento ilegal ora
suportado, e desde há muito, pelo acusado.
Esta questão da demora no
julgamento de um processo criminal, mormente quando se trata de réu preso, é
causa de preocupações inclusive na doutrina alienígena, a ponto de estar
expressamente consignado no Pacto Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos firmado em Nova
York, em 19 de dezembro de 1966 a seguinte cláusula:
“3. Toda pessoa acusada de um
delito terá direito, em plena igualdade, a, pelo menos, as seguintes garantias:
(…)
“c) De ser julgado sem dilações
indevidas” (art. 14, 3, c).
Igualmente lê-se no Pacto de São
José da Costa Rica:
“Art. 8º. – Garantias Judiciais
“1. Toda pessoa tem direito a
ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por
um juiz ou tribunal competente…” (grifo nosso).
No mesmo sentido, confira-se a
Convenção européia para salvaguarda dos direitos do homem e das liberdades
fundamentais, art. 6º., 1.
Na atual Carta Magna espanhola,
art. 24, 2, temos:
“Asimismo, todos tienen derecho (…) a un proceso público sin
dilaciones indebidas y con todas las garantías…” (grifo nosso)
Do mesmo modo a VI Emenda à
Constituição americana:
“Em todas as causas criminais,
o acusado gozará do direito a um juízo rápido e público…” É o direito ao speedy
trial.
Aliás, determina o nosso Código de
Processo Penal dever o Juiz consignar nos autos sempre que a instrução terminar
fora do prazo (art. 402).
Muito a propósito deste processo,
vejamos três julgados do STJ:
“Configura-se o excesso de
prazo, autorizável do habeas corpus, quando constatada a desídia do
Juízo.” (STJ – RHC – Rel. Pedro Acioli – RSTJ 51/370).
“Configurando o excesso de
prazo a que não deu causa a defesa, configurado está o constrangimento ilegal.
Foi a receita do legislador para que o Estado não ficasse indefinidamente com
um acusado sob sua custódia, privado de liberdade, seu bem mais sagrado, sem o
devido processo legal. É a maneira da Lei, denunciando a desídia dos agentes do
poder público, estancar a coação ilegal que vez por outra se perpetra em nome
do Estado.” (STJ – 5ª. Turma – HC 5284 – Rel. Min. Edson
Vidigal – j. 04/03/97 – DJU 05/05/97, p. 17.062).
“Comprovado excesso de prazo
ensejador da impetração, e restando claro que a demora na instrução criminal
ocorre por culpa do Juízo processante, há que ser concedido o benefício
requerido.” (STJ – RHC – Rel. Min. Edson Vidigal – RSTJ 12/138 e
RT 668/345).
X – A peça acusatória
O devido processo legal também
pressupõe uma imputação acusatória certa e determinada, permitindo que o réu,
conhecendo perfeita e detalhadamente a acusação que se lhe pesa, possa
exercitar a sua defesa plena.
Por isso, inadmissível a aceitação
da denúncia genérica no Processo Penal, bem como da chamada imputação
alternativa, assim definida e aceita por Afrânio Silva Jardim: “diz-se imputação alternativa quando a
peça acusatória vestibular atribui ao réu mais de uma conduta penalmente
relevante, asseverando que apenas uma delas efetivamente terá sido praticada
pelo imputado, embora todas se apresentem como prováveis, em face da prova do
inquérito. Desta forma, fica expresso, na denúncia ou queixa, que a pretensão
punitiva se lastreia nesta ou naquela ação narrada.
“Por outro lado, como
veremos mais adiante, a alternatividade também pode referir-se ao sujeito ativo
da infração penal, acarretando um litisconsórcio no pólo passivo da relação
processual penal.”[62]
Para o autor carioca, a
imputação alternativa, portanto, poderá ser real (objetiva) quando por mais de
um fato delituoso é acusado alguém; ou pessoal (subjetiva) quando mais de uma
pessoa é acusada, alternativamente. É a chamada cumulação imprópria de pedidos.[63]
Entre nós poucos
doutrinadores enfrentaram esta questão. Frederico Marques, ainda que sem muita
fundamentação, admite-a, afirmando que não há nada que a impeça, “pois que
em face de uma situação concreta, que se apresenta equívoca, pode o acusador
atribuir um ou outro fato ao réu. Não será motivo de escândalo – diz Pasquale
Saraceno – a citação ‘de Tício como acusado de furto ou de receptação’.
“Também Luigi Sansò
admite la imputazione alternativa, uma vez que se traduza
em acusação explícita, dizendo, por isso, que é perfeitamente ‘concebível a
imputação alternativa do fato delituoso’. E isto quer se trate de alternativa
entre um aliud e um aliud, e de alternativa entre
um majus e um minus, visto que em ambos os casos há fatos
diversos imputados ao réu.”[64]
Não admitimos qualquer
imputação alternativa, pois estamos convencidos que toda acusação, seja
pública, seja de iniciativa privada, deverá sempre ser determinada,
especificando-se, inclusive, o mais possível, em que consistiu a conduta
delituosa e a participação de cada um dos autores do fato, salvo absoluta
impossibilidade.[65]
Se o “quadro probatório
relativamente incerto constante do inquérito policial”[66]
não permite uma imputação certa, que sejam devolvidos os autos para novas e
esclarecedoras diligências.
O que não podemos admitir
é que o réu tenha que se defender não se sabe exatamente de que, ou que alguém
tenha que enfrentar todos os percalços de um processo criminal sem que tenha
sido imputado a ele, de uma maneira mais ou menos certa (a denúncia exige, no
mínimo, indícios da autoria) um fato delituoso.
Ademais, nos moldes em
que se dá a imputação alternativa, não poderá o acusado defender-se
satisfatoriamente, já que dois fatos lhe foram imputados não cumulativamente. O
réu precisa (e tem o direito) de saber qual a infração penal que se lhe
atribuem, a fim de que possa, com o seu advogado, exercer a defesa em sua
plenitude (defesa técnica + autodefesa).
Por tudo quanto exposto, não entendemos possível, à luz do devido
processo legal, a imputação alternativa, seja a real (ou objetiva) seja a
pessoal (ou subjetiva).
XI –
Conclusão
Estes são, em linhas
gerais, os aspectos mais importantes que envolvem o direito ao devido processo
legal. É evidente que há outros e muito mais poderíamos escrever. Não
esquecemos, evidentemente, das provas ilícitas, do ne procedat judex ex officio, do princípio da
correlação entre acusação e sentença, e tantos outros.
De toda maneira,
importante extrairmos esta lição de Bobbio e o faremos a título de conclusão:
“Não é difícil prever
que, no futuro, poderão emergir novas pretensões que no momento nem sequer
podemos imaginar, como o direito a não portar armas contra a própria vontade,
ou o direito de respeitar a vida também dos animais e não só dos homens. O que
prova que não existem direitos fundamentais por natureza. O que parece
fundamental numa época histórica e numa determinada civilização não é
fundamental em outras épocas e em outras culturas.”[67]
Notas:
[1]
Período que abrange parte do governo de Getúlio Vargas (1937 – 1945) que
encomendou ao jurista Francisco Campos uma nova Constituição,
extra-parlamentar, revogando a então Constituição legitimamente outorgada ao
País por uma Assembléia Nacional Constituinte (1934).
[2]
Fiore, Pascuale, De la
Irretroactividad e Interpretación de las Leyes, Madri: Reus,
1927, p. 579 (tradução do italiano para o espanhol de Enrique Aguilera de Paz).
[3]
Marques, José Frederico, Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p.
104.
[4] Ob. cit. p. 108.
[5]
Comentando a respeito do Título que trata das nulidades no processo penal, o
saudoso Frederico Marques adverte que “não primou pela clareza o legislador
pátrio, ao disciplinar o problema das nulidades processuais penais, pois os
respectivos artigos estão prenhes de incongruências, repetições e regras
obscuras, que tornam difícil a sistematização coerente de tão importante
instituto. (…) Ainda aqui, dá-nos mostra o CPP dos grandes defeitos de
técnica e falta de sistematização que pululam em todos os seus diversos
preceitos e normas, tornando bem patente a sua tremenda mediocridade como
diploma legislativo” (ob. cit., Vol. II, p. 366/367).
[6] Vitu,
André, Procédure Pánale, Paris: Presses Universitaires de France, 1957, p.
13/14.
[7]
Direito Processual Penal, Rio de Janeiro: Forense, 10ª. ed., 2001, p. 318.
[8]
Grinover, Ada Pallegrini, “A reforma do Processo Penal”, in www.direitocriminal.com.br,
15.01.2001.
[9] Maier, Julio B. J.. e
Struensee, Eberhard, Las Reformas Procesales Penales en América Latina, Buenos
Aires: Ad-Hoc, 2000, p. 17.
[10]
Norberto Bobbio assinala, muito a propósito,
que “Direitos do homem, democracia e paz são três momentos
necessários do mesmo movimento histórico: sem direitos do homem reconhecidos e
protegidos, não há democracia; sem democracia, não existem as condições mínimas
para a solução pacífica dos conflitos. Em outras palavras, a democracia é a
sociedade dos cidadãos, e os súditos se tornam cidadãos quando lhes são
reconhecidos alguns direitos fundamentais” , in A Era dos Direitos,
Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992, p. 1.
[11] Ferrajoli, Luigi, Derecho y
Razón, Madrid: Editorial Trotta, 3ª. ed., 1998, p. 604.
[12]
Exposição de Motivos do Projeto de Código Processual Penal-Tipo para
Ibero-América, com a colaboração dos Professores Ada Pellegrini Grinover e José
Carlos Barbosa Moreira, in Revista de Processo, nº. 61, p. 111.
[13]
Grinover, Ada Pallegrini, “A reforma do Processo Penal”, in www.direitocriminal.com.br,
15.01.2001.
[14] Walter, Tonio, Professor da
Universidade de Friburgo, in Revista Penal, “Sistemas Penales
Comparados”, Salamanca: La Ley,
p. 133.
[15] Segundo Daniele Negri, da
Universidade de Ferrara, “quizá nunca como en estos últimos cinco años había
sufrido el procedimiento penal italiano transformaciones tan amplias, numerosas
y frecuentes. (…) La finalidad de dotar de eficiencia a la Justicia se ha presentado
como la auténtica meta de las innovaciones normativas que se han llevado a cabo
en los últimos años (1997-2001).”, in Revista Penal, “Sistemas
Penales Comparados”, Salamanca: La
Ley, p. 157.
[16] Revista Penal, “Sistemas
Penales Comparados”, Salamanca: La
Ley, p. 164.
[17] Miguel Fenech, Derecho Procesal Penal, Vol. I, 2ª. ed., Barcelona:
Editorial Labor, S. A., 1952, p. 457.
[18] Klaus Tiedemann, Introducción al Derecho Penal y al Derecho Penal Procesal,
Barcelona: Ariel, 1989, p. 185.
[19]
Ada Pellegrini Grinover e outros, Recursos no Processo Penal, São Paulo:
Editora Revista dos Tribunais, 3a. ed., 2001, págs. 42 e 130. Nesta
matéria trava-se séria divergência jurisprudencial (veja-se na obra citada a
página 79). Conferir também excelentes trabalhos de Sergio Demoro Hamilton,
publicado na Revista Consulex, nº. 18, junho/1998, Afrânio Silva Jardim,
Revista do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, nº. 07, 1998 e de
Ana Sofia Schmidt de Oliveira, Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais – IBCCrim, nº. 48, junho/1996.
[20] Klaus Tiedemann, Introducción
al Derecho Penal y al Derecho Penal Procesal, Barcelona: Ariel, 1989, p. 184.
[21] Ob. cit., p. 273.
[22] Ob. cit., p. 608.
[23]
Elementos de Direito Processual Penal, Vol. IV, 1ª. ed., 2ª. tiragem, Campinas:
Bookseller, 1998, p. 213.
[24]
Código de Processo Penal comentado, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 4a.
ed., 1998, p. 351.
[25]
Castanho de Carvalho, Luis Gustavo Grandinetti, O Processo Penal em face da
Constituição, Rio de Janeiro: Forense, 2ª. ed., 1998, p. 85. Nesta obra, em
carta dirigida ao autor, Tourinho Filho reafirma a sua posição acima
transcrita, nos seguintes termos: “Todos sabemos que os Procuradores eram
Promotores. Como podem eles, da noite para o dia, perder a agressividade
acusatória para adquirir a serenidade da toga? Com raríssimas exceções, os
Procuradores quando se manifestam nas apelações e nos recursos em sentido
estrito deixam entrever, com clareza, que o cordão umbilical que os liga à
parte acusadora não foi cortado… Sendo assim, como podem atuar com
imparcialidade? Ademais, como a defesa deve falar por último, a rigor, os autos
deveriam sair da Procuradoria e ser encaminhados à OAB…” (p. 1).
[26]
Recursos no Processo Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 3ª., ed,
2001, p. 52.
[27]
Sobre o assunto, conferir Dóro, Tereza Nascimento Rocha / Grecco, Leonardo. O
parecer acusatório do Procurador de Justiça nos autos da apelação criminal (Da
notória desigualdade de armas no duelo entre promotor de justiça e advogado).
Disponível na internet: http://direitocriminal.com.br
, 05/10/2001.
[28]
Estudos Jurídicos em Homenagem à Faculdade de Direito da Bahia, São Paulo:
Saraiva, 1981, p. 88.
[29] A
propósito, veja-se no STF o HC nº. 67.759, rel. Min. Celso de Mello.
[30] Hugo
Nigro Mazzilli, Regime Jurídico do Ministério Público, São Paulo: Saraiva, 3ª.
ed., 1996, p. 94.
[31] Código
de Processo Penal, Vol. I, Rio de Janeiro: Record, 2ª. ed., 1960, 120.
[32] Teoria
e Prática da Promotoria Pública, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor,
2ª. ed., 1989, p. 158.
[33] Apud
Roberto Lyra, obra citada, p. 160.
[34] Apud
Roberto Lyra, obra citada, p. 164.
[35] Idem,
p. 165.
[36]
Tucci, respaldado pelas lições de Guglielmo Sabatini, prefere a expressão não-consideração
prévia de culpabilidade, pois “l’imputato è sempre e solo imputato
ai fini dello svolgimento del processo. Quindi non va considerato nè come
innocente, nè come colpevole.” (in Direitos e Garantias Individuais
no Processo Penal Brasileiro, São Paulo: Saraiva, 1993, p. 401). Outros
autores falam em princípio da não-culpabilidade e, como Dotti, em princípio da
incensurabilidade.
[37]
Expressão preferida pelos italianos, ao invés do periculum in mora (cfr.
Delmanto Junior, Roberto, in As
Modalidades de Prisão Provisória e seu Prazo de Duração, Rio de Janeiro:
Renovar, 1998, p. 67).
[38]
Moraes, Maurício Zanoide de, Interesse e Legitimação para Recorrer no Processo
Penal Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 29.
[39] Apud
Sylvia Helena de Figueiredo Steiner, A Convenção Americana sobre Direitos
Humanos e sua Integração ao Processo Penal Brasileiro, São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000, p. 91.
[40] “Este
princípio, perseguido pelo direito internacional geral, e vigorosamente
defendido por setores da doutrina brasileira, parece não haver ganho, até o
presente, expressiva concreção na jurisprudência brasileira, devendo ser
lembrada a questão do depositário infiel.”
(Bahia, Saulo José Casali, Tratados Internacionais no Direito
Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 116). O STF, reiteradamente,
combate-o.
[41] Teoria
Geral do Processo, São Paulo: Malheiros Editores, 1999, 15ª. ed., p. 74.
[42]
Processo Penal, São Paulo: Atlas, 10ª. ed., 2000, p. 649.
[43]
Direito de Apelar em Liberdade, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2ª. ed., p.
32.
[44] Apud
José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal,
Campinas: Bookseller, 1998, Vol. I, p. 79.
[45]
Ocorre que “nenhuma presunção emanada do legislador infraconstitucional pode
prevalecer sobre a presunção constitucional”, como diz Luiz Flávio Gomes,
ob. cit., p. 26.
[46] Apud
José Frederico Marques, in Elementos de Direito Processual Penal,
Vol. I, Campinas: Bookseller,
1998, p. 37.
[47] “Estes
são, sobretudo, os princípios e decisões valorativas que encontram expressão na
parte dos direitos fundamentais da Constituição, quer dizer, a prevalência da
‘dignidade da pessoa humana’ (…), a tutela geral do espaço de
liberdade pessoal, com as suas concretizações (…) da Lei Fundamental.”
(Larenz, Karl, Metodologia da Ciência do Direito, Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 3ª.
ed., 1997, p. 479).
[48] Idem,
p. 481
[49] idem,
ibidem, p. 446.
[50] “Toda
a interpretação de um texto há-de iniciar-se com o sentido literal” (idem,
p. 450).
[51]
Fiore, Pascuale, De la
Irretroactividad e Interpretación de las Leyes, Madri: Reus,
1927, p. 579 (tradução do italiano para o espanhol de Enrique Aguilera de Paz).
[52] “Consiste
o processo sistemático em comparar o dispositivo sujeito a exegese, com outros
do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto”,
segundo nos ensina Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, Rio
de Janeiro: Freitas Bastos S/A, 1961, 7ª. ed., p. 164.
[53]
Infelizmente já houve um retrocesso, pois a nova lei de tóxicos (Lei nº.
10.409/02, art. 46, § 12), estabelece que terão apenas efeito devolutivo os
recursos interpostos contra as decisões proferidas no curso do respectivo
procedimento, o que é lamentável.
[54] Idem,
p. 165.
[55]
Ob. cit., p. 441.
[56] Código
de Processo Penal, Vol. II, Rio de Janeiro: Forense, 7ª. ed., 1960, p. 157.
[57]
Comentários ao Código de Processo Penal Brasileiro, Vol. IV, 1943, p. 178.
[58] Curso
de Direito Judiciário Penal, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 1958, p. 377.
[59]
Elementos de Direito Processual Penal, Vol. IV, Campinas: Bookseller, 1ª. ed., 1998, págs. 370/371.
[60] Código
de Processo Penal Comentado, Vol. II, São Paulo: Saraiva, 6ª. ed., 2001, p.
460.
[61] Ob. cit., p. 476.
[62] Direito
Processual Penal, Rio de Janeiro: Forense, 10ª. Ed., 2001, 149.
[63] A
cumulação própria existe normalmente no Direito Processual Penal, seja nos
casos de co-autoria, seja na hipótese de concurso de crimes.
[64]
Elementos de Direito Processual Penal, Vol. II, Campinas: Bookseller, 1998, p. 153/154.
[65]
Admitimos a chamada denúncia genérica, excepcionalmente, no caso, por exemplo,
de um roubo praticado por várias pessoas, em concurso, sem que se possa
estabelecer exatamente que Fulano se dirigiu ao caixa, Sicrano imobilizou o
vigilante, Beltrano subtraiu o dinheiro dos caixas, etc.
[66]
Afrânio, idem.
[67] A
Era dos Direitos, Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992, p. 18.
Informações Sobre o Autor
Rômulo de Andrade Moreira
Procurador de Justiça no Estado da Bahia. Foi Assessor Especial do Procurador-Geral de Justiça e Coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais. Ex- Procurador da Fazenda Estadual. Professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador-UNIFACS, na graduação e na pós-graduação (Especialização em Direito Processual Penal e Penal e Direito Público). É Coordenador do Curso de Especialização em Direito Penal e Processual Penal da UNIFACS. Pós-graduado, lato sensu, pela Universidade de Salamanca/Espanha (Direito Processual Penal). Especialista em Processo pela Universidade Salvador-UNIFACS (Curso coordenado pelo Professor J. J. Calmon de Passos). Membro da Association Internationale de Droit Penal, da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais e do Instituto Brasileiro de Direito Processual. Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim e ao Movimento Ministério Público Democrático. Integrante, por duas vezes consecutivas, de bancas examinadoras de concurso público para ingresso na carreira do Ministério Público do Estado da Bahia. Professor convidado dos cursos de pós-graduação da Fundação Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, do Curso JusPodivm e do Curso IELF. Autor das obras “Curso Temático de Direito Processual Penal”, “Comentários à Lei Maria da Penha” (em co-autoria com Isaac Sabbá Guimarães) e “Juizados Especiais Criminais”– Editora JusPodivm, 2009, além de organizador e coordenador do livro “Leituras Complementares de Direito Processual Penal”, Editora JusPodivm, 2008. Participante em várias obras coletivas. Palestrante em diversos eventos realizados na Bahia e no Brasil.