Resumo: O objetivo deste trabalho é avaliar a possível incidência do Imposto de Importação sobre a baixa de aplicativos realizada por meio de sítio internacional. Iremos inicialmente determinar o conteúdo do termo programa de computador pela avaliação da legislação correspondente e a partir disto, iremos avaliar a incidência tributária deste imposto.
INTRODUÇÃO
Com o avanço da tecnologia, o ser humano fica mais e mais dependente para a realização das tarefas do dia a dia, das mais básicas até as mais complexas. Neste contexto, os programas de computador possuem grande valia para a redução de atividades manuais, eliminação de riscos por erros de imputação de informação, bem como agilidade na troca de informações entre pessoas, dentre as diversas possibilidades de utilização de programas para o bem estar de uma sociedade.
Muito se avançou no século passado para automatizar as atividades, com o objetivo na redução dos custos empresariais, seja pela eliminação dos custos de trabalho, seja pela redução de erros no processamento de dados de forma manual.
Neste evoluir e em função da criação de uma realidade virtual antes quase incipiente, deu-se também uma aceleração na troca de dados são que são feitos de forma instantânea, alterando o comportamento de toda uma população. Exemplo simples são os telefones celulares que conectam pessoas localizadas em quase qualquer lugar do mundo de forma instantânea, sem contar os inúmeros aplicativos que estes aparelhos têm, os quais facilitam a vida de seus usuários, tais como agenda eletrônica, calendário, acesso à internet, etc.
Neste contexto também nascem novas situações onde o direito se materializa, em decorrência de novos tipos de relações jurídicas criadas nesse novo cenário.
Os contratos que em sua grande maioria eram firmados entre pessoas e de forma física, passam a contar com praticidade das assinaturas eletrônicas. Informações que levavam dias a serem transmitidas, pois contavam somente como o meio físico passou a ser livremente transmitidas entre duas ou mais pessoas de forma instantânea.
Destas novas relações que se instauram, novas obrigações também são criadas. Em certos casos são relações jurídicas comuns como, por exemplo, a importação de produtos onde as relações comerciais são fechadas de forma eletrônica.
Com estes novos horizontes, novas situações são criadas as quais não possuem clara definição legal e conseqüentemente questões tributárias também são identificadas, e passam a ser discutidas pela doutrina e jurisprudência, com o objetivo de se tentar determinar qual a natureza jurídica de determinada relação e assim a determinação da incidência tributária.
Dado esse cenário, nosso objetivo é o de avaliar a natureza jurídica do termo “programa de computador” que no nosso dia a dia chamamos de ‘software”. Em função desta determinação, estudarmos a carga tributária incidente sobre a baixa dos programas efetuados pela internet.
DELIMITAÇÃO DO TERMO: PROGRAMA DE COMPUTADOR
A delimitação do termo deve necessariamente passar pela utilização de ferramentas que possam ajudar o aplicador do direito a extrair corretamente de um dado signo, este entendido com unidade de um sistema que permite a comunicação inter-humana, signo é um ente que tem o status lógico da relação. Nele, um suporte físico se associa a um significado e a uma significação, para aplicarmos a teoria husserliana[1].
Por esta teoria, suporte físico é a coisa física que nossos sentidos registram. É a coisa em si, sua composição física. Já o significado é o nome que atribuímos a este objeto. Este nome é atribuído de forma arbitrária pelo ser humano que passa a creditar a determinado objeto um título qualquer, referência esta que é tomada por um universo da população que concorda em relacionar um determinado objeto físico com aquele nome, o que tratamos como significado.
Dada esta identificação entre o nome atribuído à coisa, que é representada por uma palavra e a própria coisa física que se trata, nasce a significação. A significação é a identificação da coisa na mente do ser cognoscente. Quando pensamos na coisa, temos a significação.
Este curto intróito nos ajuda a pensar no que pode significar o verbete “programa de computador”. Significa uma relação de comandos elaborada em linguagem própria computacional, com o objetivo de ser processado por um computador e conseqüentemente a realização de tarefas.
Esta delimitação é importante neste caminho que começamos a traçar as linhas que delimitam o objeto do estudo, dado que diversas significações serão importantes para a construção da regra matriz de incidência. Neste sentido, iremos investigar os seguintes significados: o de programa de computador, produto e mercadoria,
Programa de computador então são ordens definidas de forma lógica e organizada para serem executadas por equipamento de informática. Estas ordens são determinadas com de linguagem própria de programação computacional e tem como objetivo a realização de diversas atividades.
A partir da década de 80 a computação teve seu acesso facilitado à grande maioria da população em função do barateamento dos equipamentos envolvidos neste seguimento econômico e, neste esteio, nosso sistema de direito positivo buscou definir com legislação própria a questão tratada.
Na lei 7.609/87, foram inicialmente determinados os contornos do que o direito positivo resolveu por determinar como programa de computador.
“Art. 1º São livres, no País, a produção e a comercialização de programas de computador, de origem estrangeira ou nacional, assegurada integral proteção aos titulares dos respectivos direitos, nas condições estabelecidas em lei.
Parágrafo único. Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.
Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programas de computador é o disposto na Lei nº 5.988, de 14 de dezembro de 1973, com as modificações que esta lei estabelece para atender às peculiaridades inerentes aos programas de computador.”
Esta lei foi alterada pela lei 9.609/98 que manteve na integridade o significado determinado no caput do artigo 1º.
“Art. 1º Programa de computador é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.”
Segue em mesma direção a Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE):
“Definition: Computer software is an asset consisting of computer programs, program descriptions and supporting materials for both systems and applications software; included are purchased software and software developed on own account, if the expenditure is large.”[2]
Notamos aqui que se trata primordialmente do produto intelectual que objetiva estabelecer um conjunto organizado de instruções em linguagem apropriada, de forma que a maquina possa interpretar os comandos e realizar uma ou mais tarefas determinadas.
Esta definição posta na lei leva a primeira conclusão que os programas de computador são produtos intangíveis, fruto do exercício intelectual do ser. Desta forma, quando vemos a relação tríade da semiótica, vemos que o programa é onde estão armazenadas de forma lógica as ordens a serem cumpridas pelo equipamento de informática e a significação é a existência de uma seqüência de ordens para solução de um determinado problema existente.
A lei 9.609/98 enfatiza esta conclusão quando em seu artigo 2º determina que programas de computação têm natureza de obras literárias gozando deste mesmo regime de proteção.
“Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei”.
Em certos momentos, este programa é encontrado residente em arquivos físicos portáteis como mídias, disquetes, pen drives, ou em outras circunstâncias é obtido por baixa diretamente de endereço eletrônico de provedor.
Se tratarmos de propriedade intelectual, devemos então avaliar como o Instituto de Propriedade Intelectual define o que é um programa de computador.
Este instituto determina que software é o que está disposto na lei 9464/98:
“Definição: De acordo com o artigo 1° da Lei 9.609/98 (Lei de Software), Programa de Computador “é a expressão de um conjunto organizado de instruções em linguagem natural ou codificada, contida em suporte físico de qualquer natureza, de emprego necessário em máquinas automáticas de tratamento da informação, dispositivos, instrumentos ou equipamentos periféricos, baseados em técnica digital ou análoga, para fazê-los funcionar de modo e para fins determinados.”[3]
Tendo então estabelecida significação do termo programa de computador, cabe então ser estabelecida uma distinção entre os softwares preparados por encomenda e aqueles para distribuição em massa ou os chamados softwares de prateleira.
DEFINIÇÃO DO OBJETO JURÍDICO: MERCADORIA OU CESSÃO DE USO
DISTINÇÃO ENTRE PROGRAMAS DE COMPUTADOR
Os softwares por encomenda são aqueles onde o contratante do serviço define as premissas do aplicativo a ser desenvolvido para o contratado. Este por sua vez desenvolve as rotinas contratadas e entrega o resultado do seu trabalho integralmente, tendo o contratante direito sobre os arquivos fonte do programa de computador, o seja adquire a propriedade sobre aquela funcionalidade.
Do sítio do Instituto Nacional de Propriedade Intelectual – INPI, extraímos valiosas notas sobre a questão do direito do autor do programa de transferir a propriedade para terceiros, podendo em certas situações se opor a alterações que possam deformar, mutilar ou prejudicar a honra ou reputação do autor.
Titularidade e Criador
Somente a pessoa física ou um grupo delas pode criar um programa de computador. O titular é aquele que detém o direito de exploração da obra, podendo ser uma ou mais pessoas físicas ou jurídicas.
Se o titular do direito não for o criador, o pedido deverá ser instruído com documentos que comprovem a transferência de direitos, devendo ser apresentado um documento de cessão ou de comprovação de vínculo (empregatício ou prestação de serviços) com a empresa.
No caso de apresentação de documento de cessão, este deverá ser claro e explícito na delimitação dos direitos, pois em se tratando de direito de autor, os negócios jurídicos são sempre interpretados de forma restritiva.
Direitos
Como a proteção dos programas de computador é afeta ao Direito Autoral, esta compreende direitos morais, que são inalienáveis e irrenunciáveis, e patrimoniais.
Os direitos morais que se aplicam aos programas de computador são o direito do autor de reivindicar a paternidade do programa e o direito de se opor a alterações não-autorizadas, quando estas impliquem em deformação, mutilação ou que prejudiquem a sua honra ou reputação. Desta forma, se o titular não é o criador, é aconselhável obter do criador autorização para modificações futuras.
Os direitos patrimoniais que se aplicam aos programas de computador são o direito exclusivo de utilizar, fruir e dispor de sua obra, incorrendo em ilícito quem, por qualquer meio, no todo ou em parte, reproduz, vende, expõe à venda, importa, adquire, oculta ou tem em depósito para fins de comércio, original ou cópia de programa de computador produzido com violação de direito autoral, ou seja, sem a autorização expressa do autor ou de quem o represente.[4]
Neste caso, quanto há uma relação jurídica estabelecida entre partes independentes para a elaboração de rotinas de programação afeitas a confecção de um programa de computador cuja propriedade será transferida para o contratante, tem-se aqui uma prestação de serviços.
Em breve síntese, prestação de serviço é a relação jurídica firmada entre partes onde não há subordinação de trabalho, há remuneração pela entrega da coisa, há a entrega da coisa para terceiros, são realizadas por pessoas sem vínculo de relação de emprego.
Para Aires Barreto em palestra proferida no V Congresso de Direito Tributário, apresentou seu entendimento sobre a determinação dos elementos necessários da prestação de serviço. Diz o prestigioso parecerista:
“Serviço é o resultado da prestação de esforço humano a terceiros, com conteúdo econômico, em caráter negocial, sob regime de direito privado, tendente à obtenção de um bem material ou imaterial”
O que se transfere neste contrato é então o programa sem reservas, ou seja, o novo titular possui direito de alterá-lo desde que não resulte em afronta à honra ou reputação do autor. Temos então que nesta relação jurídica, o contratante passa a poder usar, gozar e dispor sobre o ativo, ou seja, passa a ter direito de propriedade sobre o software.
PROPRIEDADE,POSSE E DIREITO DE USO
O direito de usar (Jus utendi) corresponde a possibilidade poder extrair da coisa todos os serviços que se pode realizar, sem que haja alteração de seus elementos fundamentais.
O direito de fruir (Jus fruendi) destaca-se pela possibilidade do recebimento dos frutos e na utilização dos produtos, podendo explorar a coisa para os fins a que se propõe este ativo.
Já o direito de dispor (Jus abutendi ou disponendi) significa o poder que o titular possui de alienar, doar, gravar, alterar, mutilar a coisa.
Nos termos do Código Civil de 2002, temos:
“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”
De outro lado, aqueles aplicativos que têm como fonte originária a idéia do próprio autor e se destina a utilização do mercado em geral, sem que estes tenham acesso ao programa fonte, ou seja, a pessoa tem acesso às funções do aplicativo de forma a resolver seus problemas, mas não pode alterar deformar ou mutilar suas funções. São os chamados softwares de prateleira.
Estes programas são desenvolvidos de forma que possa ser útil a uma coletividade e que esta seja somente usuária do aplicativo, sem que seja possível alterar suas funções essenciais de controle nas rotinas do programa de computador.
Neste grupo normalmente se incluem jogos eletrônicos, planilhas de cálculo, gerenciadores de bases de dados, etc.
Questão interessante se abre neste tipo de situação é: qual o tipo de contrato que será firmado entre as partes, uma vez que o usuário poderá somente gozar e fruir do aplicativo sem que se possa dele dispor.
Sem poder dispor, o usuário somente poderá fruir e gozar da coisa e seus frutos dado que nesta relação não há a transferência da propriedade, mas tão somente a posse.
Nos termos do Código Civil:
“Art. 1.196. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.”
Se a relação é de posse e não de propriedade, a relação contratual é caracterizada como uma relação onde o usuário pode somente gozar do bem, ocorrendo então uma concessão de licença de uso do programa de computador.
QUESTÃO DO CONTRATO: LOCAÇÃO OU CESSÃO DO USO
Cabe-nos então tentar elucidar qual o contrato que melhor enquadra a relação de cessão. Duas parecem ser as respostas. Ou estamos tratando de um contrato de locação ou falamos sobre a remuneração de royalties, os quais passaremos a definir abaixo dada a importância deste conceito na definição da hipótese de incidência do tributo.
O contrato de locação pressupõe a relação jurídica onde o contratado tem obrigação de ceder num determinado período o direito de gozar e fruir de determinado ativo.
Nas palavras de Sílvio Rodrigues,
“A locação é o contrato pelo qual uma das partes, mediante remuneração que a outra paga, compromete-se a fornecer-lhe, durante certo lapso de tempo, ou o uso e gozo de uma coisa infungível (locação de coisas); ou a prestação de um serviço (locação de um serviço); ou a execução de algum trabalho determinado (empreitada). Trata-se de contrato bilateral, oneroso, consensual, comutativo e não solene. Bilateral, porque envolve prestações recíprocas de cada uma das partes. Oneroso, dado seu propósito especulativo. Consensual, porque independe da entrega da coisa para seu aperfeiçoamento, opondo-se, assim, aos contratos reais, em que a tradição é elemento constitutivo do contrato.Comutativo, porque cada uma das partes, desde o momento da feitura do ajuste, pode antever e avaliar a prestação que lhe será fornecida e que, pelo menos subjetivamente, é equivalente da prestação que se dispõe a dar. Não solene, porque a lei não impõe forma determinada para o seu aperfeiçoamento.”
Nesta avaliação descartaremos a possibilidade de locação de serviços e a empreitada, uma vez que quando tratamos de serviço ou mesmo a empreitada entendemos que há a tradição da coisa por inteiro, isto é, o direito de dispor da coisa, transferindo-se então as fontes do programa o que já tratamos anteriormente.
De outro lado, a lei 9.609/98 que tratou especificamente dos programas de computador, estabelece que estes devam ser tratados como direitos autorais.
“Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei”.
Ainda, em seu artigo 9º, está determinado que o uso do aplicativo será objeto de contrato de licença.
“Art. 9º O uso de programa de computador no País será objeto de contrato de licença.”
Da leitura do artigo 10 desta mesma lei, extraímos que haverá a remuneração do titular dos direitos do programa.
“Art. 10. Os atos e contratos de licença de direitos de comercialização referentes a programas de computador de origem externa deverão fixar, quanto aos tributos e encargos exigíveis, a responsabilidade pelos respectivos pagamentos e estabelecerão a remuneração do titular dos direitos de programa de computador residente ou domiciliado no exterior”. (grifos nossos)
A remuneração do autor em face da cessão de direitos autorais pela utilização de programa de computador é chamado de royalty. Em que pese a utilização de terminologia estrangeira, este foi o significado, utilizando a conceituação de Husserl, para designar a forma de pagamento sobre este tipo de remuneração.
Reproduzimos abaixo através da Solução de Consulta Receita Federal Nº 86 de 08 de Julho de 2009 o conceito acima descrito.
“ASSUNTO: Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE
EMENTA: PROGRAMAS DE COMPUTADOR. LICENÇA DE USO. IMPORTAÇÃO DE SOFTWARE. Até 31 de dezembro de 2005, a empresa signatária de contratos de cessão de licença de uso de software, independentemente de estarem atrelados à transferência de tecnologia, era contribuinte da Cide, relativamente às remessas efetuadas ao exterior a título de royalties. A partir de 1º de janeiro de 2006, à vista do disposto nos arts. 20 e 21 da Lei nº 11.452, de 2007, apenas a remuneração pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador (software) que envolver a transferência da correspondente tecnologia estão sujeitas à incidência da Cide.”
Quando confrontamos o contrato de aluguel com o contrato de cessão de licença de uso de software, percebemos que a lei determinou que fosse utilizada essa modalidade específica de relação e não um simples contrato de aluguel.
Ademais, aplicativos não se deterioram, mas se desatualizam quando avaliamos o ativo pela ótica de utilização. Somente no caso de aluguel isto ocorre e é tutelado pelo Código Civil:
“Art. 567. Se, durante a locação, se deteriorar a coisa alugada, sem culpa do locatário, a este caberá pedir redução proporcional do aluguel, ou resolver o contrato, caso já não sirva a coisa para o fim a que se destinava”.
Concluindo, caso seja contratado programa de computador cujo aplicativo for transacionado sem reservas ou seja terá este direito de fruir, gozar e dispor do bem, trataremos de contrato de prestação de serviços.
De outro modo, caso haja somente a possibilidade do usuário fruir e de gozar do ativo, então tratamos de contrato de cessão de licença de uso de software cuja remuneração será chamada de royalty.
PROGRAMA DE COMPUTADOR: PRODUTO OU MERCADORIA?
Outra questão que se abre é a possibilidade de demarcar o aplicativo de computador como produto ou mesmo mercadoria de forma a estar compreendido na matriz constitucional ou em leis inferiores que regulamentaram a regra matriz de incidência tributária.
Analisando a questão, Paulo de Barros comenta da seguinte forma:
“ Não se presta o vocábulo (mercadoria) para designar, nas províncias do direito, senão coisa móvel, corpórea, que está no comércio.” [5]
Na obra Tributação na Internet, Hugo de Brito Machado traz à colação, inúmeros juristas para delimitar o aspecto físico de produto e mercadoria.
Para Américo Lacombe,
“Produto é, portanto um bem móvel e corpóreo, enquanto que mercadoria tem um conceito mais restrito, pois é um bem móvel, corpóreo destinado ao comércio.”[6]
Continuando seus comentários sobre o tema, cita Sebastião de Oliveira Lima, nos seguintes termos:
“Sabendo-se que produto é gênero do qual mercadoria é espécie e conceituados o primeiro como sendo um bem corpóreo, enquanto que o segundo é bem corpóreo e destinado ao comércio. (….)[7]
Na mesma linha seguem José Eduardo Soares de Melo, Aliomar Baleeiro, Cleber Giardino, Carvalho de Mendonça, que atribuem a produto e mercadoria uma qualidade física, corpórea, de tangibilidade.
As discussões sobre a natureza material da regra matriz de incidência do Imposto de Importação é de extrema relevância dado que a partir da definição de seu objeto (produto, mercadoria ou cessão de direitos) teremos o correto entendimento da incidência deste imposto na baixa de programas de computador.
Tributação sobre a baixa de programas de computador
Sistema Constitucional Brasileiro
Antes de iniciarmos as análises da incidência propriamente dita pela composição da avaliação da regra matriz de incidência tributária, faremos breve digressão sobre o sistema Constitucional brasileiro com o objetivo de entendermos o processo de positivação do sistema tributária brasileiro.
Tomando como aprendizado o ensinamento de Hans Kelsen, nosso sistema jurídico é baseado em um sistema legislativo positivo onde as normas primárias estão fincadas na Constituição Federal e as normas inferiores buscam fundamento de validade na norma superior. Este fundamento de validade da norma está residente na existência de uma norma fundamental pressuposta e insofismável.
Neste sentido, para que a norma seja válida deve esta buscar seu fundamento de validade em norma superior.
Determina a Constituição Federal em seu artigo 1º
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I – a soberania;
II – a cidadania;
III – a dignidade da pessoa humana;
IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V – o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.”
Nosso sistema republicano é baseado numa Federação onde a União, os Estados, Municípios e o Distrito Federal convivem harmonicamente em função da observação das regras de conduta determinadas no texto constitucional. O poder é transferido à República através da outorga destes entes com o objetivo de um bem maior a ser conquistado em conjunto.
O texto constitucional é uma carta que define as linhas mestras de conduta entre as pessoas, sejam elas entre pessoas públicas e privadas, entre pessoas públicas e entre pessoas privadas. Nela estão estabelecidas as competências exclusivas e as que podem ser partilhadas entre os entes da federação bem como a forma de resolução de conflitos entre elas.
Prescreve o artigo 18, da autonomia dos entes federativos. Esta autonomia é limitada às prescrições do texto constitucional.
“Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição”.
É o ensinamento do ilustre Professor Roque Carrazza,
“Os Estados-membros editam, também suas próprias leis, que devem harmonizar-se com a Constituição Federada e com os princípios sensíveis da Constituição do Estado Federal (não com as leis da União)
Demais disto, num Estado Federal, ao Legislativo da União é interdito anular, mutilar ou, mesmo, usurpar as competências estaduais que, repitamos, estão perfeitamente desenhadas na Constituição da República.”[8]
Legalidade não nos parece ser um princípio isolado, mas ao contrário, acredito estar diretamente conectado com a sensação de segurança que as pessoas querem ter, de forma com que possam planejar suas atividades sem percalços. Como já dizia Aristóteles: A lei é ordem; uma boa lei é uma boa ordem.[9]
Algumas leis são melhores do que outras, isto ninguém duvida, seja pela facilidade de aplicação, seja pela percepção de harmonia quando trata de forma isonômica aqueles em mesmas condições mas, dado sua sujeição, deve ser seu comando obedecido exceto pela tutela dada pelo poder judiciário. Sócrates tomou cicuta por obediência à lei.
Segurança é a própria Constituição Federal onde determina os direitos e deveres da Republica e aqueles a ela tutelados. Em seu preâmbulo, já informa a necessidade de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais da pessoa dentre outros de forma a resguardar esta garantia. [10]
Sistema Constitucional Tributário Brasileiro
A partir da leitura do texto constitucional, nos deparamos com uma vastidão de princípios e regras que tem como objetivo a determinação das competências dos entes federados. Quando tratamos da competência tributária, esta é concorrente quando tratamos de matéria tributária.
“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
I – direito tributário, financeiro.”
A explicação para isto é que todos os entes federativos possuem capacidade para tributar naqueles tributos determinados no texto constitucional e a instituição, ou seja, o nascimento do tributo saem dos diplomas infra-constitucionais.
Optou o legislador pátrio por gravar o sistema tributário na Constituição Federal. Neste sentido, qualquer regra tributária nova somente pode ser positivada quando observados todos os ditames do diploma constitucional brasileiro. Sejam estes ditames os princípios constitucionais plasmados nos direitos e garantias fundamentais bem como no capítulo do sistema tributário ou qualquer outro princípio implícito ou explícito trazido neste diploma.
Roque Carrazza nos ensina que:
“A Constituição, como já vimos, é a base de todo o nosso direito público, notadamente de nosso direito tributário. De fato, no Brasil, por força de uma série de peculiaridades, as normas tributárias são, por assim dizer, o corolário dos princípios fundamentais consagrados na Lei Maior.[11]
Os princípios têm como principal característica nortear a pessoa quanto à a sua conduta. São como linhas mestras que esculpem uma obra, atribuindo ao ordenamento jurídico uma estrutura firme e concatenada de forma que a mais simples ordem seja facilmente executada com a ajuda dessas linhas mestras.
No artigo 150 da Constituição Federal estão descritos diversos princípios gerais que trataremos neste trabalho. Trata-se dos princípios da legalidade, anterioridade, isonomia, anualidade, não confisco e princípio republicano.
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
III – cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
IV – utilizar tributo com efeito de confisco;
V – estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;
VI – instituir impostos sobre:
a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.”
O princípio da legalidade impõe ao poder legislativo que a instituição ou aumento de tributos somente poderá ser feito por lei. Esta determinação, também insculpida no artigo 5º inciso II do texto constitucional que impõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei, traz em seu altiplano a noção de segurança, pois para que haja incremento da carga tributária, deve haver um processo democrático previamente determinado com publicidade dos atos, com das discussões em comissões parlamentares, votação feita pelos representantes do povo e dos Estados, a chancela presidencial e a publicidade em mídia pública.
Ao mesmo tempo, o respeito à lei é uma obrigação de todos, principalmente ao Estado que tem suas atribuições e obrigações vinculadas à lei. (Durum hoc est sed ita Lex scripta est)
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte (…)”
O princípio da legalidade em matéria tributária excetua a alguns tributos específicos a obrigação de sua majoração ser feita por lei. São os tributos que possuem como natureza o controle da economia. Regulam os fluxos de capital, entrada, produção e saída de materiais e produtos. Esta exceção é descrita no § 1º do artigo 153.
“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
I – importação de produtos estrangeiros;
II – exportação, para o exterior, de produtos nacionais ou nacionalizados;
IV – produtos industrializados;
V – operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários;
§ 1º – É facultado ao Poder Executivo, atendidas as condições e os limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas dos impostos enumerados nos incisos I, II, IV e V.”
A isonomia é princípio basilar de convivência harmônica entre pessoas. Por este caminho, restringe-se o tratamento desigual. É com muita normalidade que se confunde as bases valorativas deste princípio. Isonomia não significa tratar todos da mesma maneira, mas tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual.
A Constituição Federal brasileira em diversos momentos afirma tal situação. Seja para aqueles proprietários de pequena propriedade rural (artigo 5º XXVI), sejam juros subsidiados e incentivos fiscais para empresas localizadas em zonas incentivadas (§ 2º do artigo 43) ou mesmo, dentre diversos outros exemplos, a emissão de certidões de forma gratuita para aqueles comprovadamente pobres (artigo 5º, inciso LXXVI).
O que este princípio visa é evitar que pessoas que possuam mesma capacidade econômica sejam tratadas de forma diferente. Este tratar de forma igual os iguais e desigualmente os desiguais pressupõe uma igualdade relativa, dentre faixas relativamente flexíveis de riqueza.
A progressividade no imposto de renda tem exatamente este papel. Quanto mais uma empresa aufere de renda, maior será a alíquota. É claro que os critérios são arbitrários até porque é impraticável critérios muito subjetivos para definir grupos.
Para fins de imposto de renda da pessoa jurídica, estão sujeito ao adicional de 10% as empresas que auferirem lucro tributável maior que R$ 240.000,00.
Critérios como este, desde que sujeitos a proporcionalidade e razoabilidade, fazem com que o princípio da isonomia seja plenamente aplicável.
De outro lado, a concessão de benefícios para pessoas específicas e não para outras contidas no mesmo grupo fere frontalmente o princípio da isonomia. Exemplo claro são os incentivos fiscais dados a algumas empresas que possuem características similares. Duas indústrias que fabricam o mesmo produto sendo que apenas a uma foi concedido um benefício fiscal. É patente que neste caso uma das empresas sucumbirá rapidamente dado o efeito danoso do tributo em sua linha de produtos que não possui correspondência com este eventual concorrente.
O objetivo do princípio da anterioridade é o de evitar surpresas dado que a lei não pode tributar fatos já ocorridos, pois, nos termos do inciso XXXVI do artigo 5º da Constituição Federal, a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.
Nem sempre é de fácil visualização a aplicação destes princípios nos casos do inciso XXXVI. Tomemos como exemplo uma importação de produto. A lei determinou que o aspecto temporal para nascimento da obrigação de pagar o Imposto de Importação é a entrada do bem no País. Passados quatro meses após a operação mercantil contratada chegam os produtos no porto do destino do adquirente. Ocorre que a alíquota que era 5%, passou a ser 40%. Como fica esta situação? Em que pese a clara desobediência ao ato jurídico bem como insegurança jurídica, o Supremo Tribunal Federal no RE 224.285-9 decidiu que não haveria irretroatividade, pois o aspecto temporal é o registro da declaração de importação.
Outro exemplo gritante são os chamados pacotes econômicos publicados no último dia do ano para que tenha sua vigência e eficácia para o próximo ano. Em suma, o que a lei deve trazer é segurança para que o contribuinte, possa fazer suas devidas programações financeiras mas nunca ter surpresas no fechamento do ano. Surpresas estas que impactarão de frente com sua estratégia negocial podendo gerar grandes prejuízos para as empresas.
É de se perceber que tal procedimento adotado pelos entes federativos foi relativamente amenizada com a publicação da Emenda Constitucional nº 42, mas foram excluídos alguns tributos desta lista que são impactantes no resultado da empresa. Cito o caso do Imposto de Renda que representa 34% do lucro tributável de empresa ou, pela ótica da pessoa física, 27,5% também representativo.
Regra Matriz de incidência – contornos da teoria
Feitas estas breves digressões sobre estes princípios gerais, passaremos a comentar o conceito da estrutura da regra matriz, elaborada por Paulo de Barros Carvalho.
Paulo de Barros Carvalho em sua obra Direito Tributário, Linguagem e Método, estabelece com maestria a conformação da regra matriz de incidência, tecendo os seguintes comentários:
“As leis não trazem normas jurídicas organicamente agregadas, de tal modo que nos seja lícito desenhar com facilidade, a indigitada regra matriz de incidência, que todo o tributo hospeda, como centro catalisador de seu plexo normativo. Pelo contrário, sem arranjo algum, os preceitos se dispersam pelo corpo do estatuto, compelindo o jurista a um penoso trabalho de composição. Visto por esse prisma, o labor científico aparece como árduo esforço de procura, isolamento de dados, montagem e construção final do arquétipo da norma jurídica.[12]
O tema apresentado pelo nobre jurista fez revolução no meio acadêmico, pois desmistificou a chamada “escola de glorificação do fato gerador” onde tudo gravitava em torno desse signo.
O que fez foi segmentar a relação tributária entre a hipótese e a conseqüência, subdividindo cada um destes grupos em aspectos independentes que, quando integrados passam a formar os elementos necessários da relação tributária.
Fazendo suas considerações sobre a regra-matriz de incidência, Raquel Novais faz preciso comentário, explicando que a enunciação da regra matriz de incidência:
“É o resultado da identificação, seguida da reunião de vários enunciados, colhidos dos textos legislados e que culminam com a formulação do juízo hipotético condicional, que traz: (i) no seu antecedente ou hipótese, a descrição de um evento – indicando os elementos que permitam averiguar a sua ocorrência, pela descrição de um núcleo no qual se encontra a própria materialidade do evento, associado a condicionantes espaço-temporais; e (ii) no seu conseqüente implicado pela previsão da ocorrência do evento, a prescrição de uma relação, de cunho obrigacional, que coloca dois sujeitos em posição de credor e devedor quanto ao tributo, definido materialmente pela associação de dois elementos: a base de cálculo e alíquota.[13]
Tomando-se como exemplo o ICMS. pela hipótese teremos então o aspecto material, formado por verbo mais seu complemento (Circular mercadoria); aspecto temporal, num determinado período de tempo (hoje) e um aspecto espacial (em São Paulo).
Pelo lado da conseqüência, temos dois aspectos. O aspecto pessoal onde localizamos os sujeitos relacionados ao evento. Sujeito passivo é aquele que possui o liame obrigacional pela realização do aspecto material e o sujeito ativo aquele tem o direito-dever de receber o tributo.
Quanto ao segundo, temos o aspecto quantitativo, formado pela base de cálculo e alíquota. Nestes aspectos o que temos, resumidamente. é a eleição de um signo presuntivo de riqueza para qualificar o tributo a ser cobrado. Mercadoria neste caso será o valor da operação com a mercadoria. A alíquota é o percentual que, aplicado à base de cálculo, resultará o quantum devido aos cofres públicos.
Esta alíquota é importante, pois é baseado nisto que se abre a discussão para o não confisco. Quando se apropria por parte relevante do bem, isto poderá ser considerado confisco.
Dada estas brevíssimas linhas sobre a regra matriz de incidência, trataremos de avaliar a incidência de tributos sobre a baixa eletrônica de arquivos magnéticos que é o objetivo final deste trabalho.
Imposto de Importação:
Breve histórico do tributo:
O Imposto de importação é um dos mais antigos tributos instituídos no Brasil. No Brasil-Colônia, a tributação era concentrada nos tributos sobre a exportação (pau Brasil, ouro) ou eventuais explorações de portos. A partir da abertura dos portos no País, nasce a oportunidade da exploração do comércio internacional e com isto a tributação sobre as importações de produtos estrangeiros.
“Por outro lado, pertencia à receita provincial todas as importações, que não estivessem listadas no Art. 11, por serem da competência do Governo Central. Em termos gerais, contudo, pode-se dizer que a maior fonte de receita das províncias estava no imposto de importação”. [14]
Nesta época, o imposto sobre as importações era extremamente relevante para os cofres do governo como mostra este estudo tendo hoje sua representação reduzida para 2.5% do total arrecadado.[15]
Naquele momento, as receitas foram dividas entre os entes federativos da seguinte forma: a União ficava com o imposto de importação, consumo e selos e às Províncias, vindo a se tornarem Estados, foi atribuído o Imposto de Exportação, o que acabou por influenciar a distribuição de rendas, uma vez que a produção de café no sul era bem mais relevante do que no nordeste, podendo ser uma das causas das diferenças econômicas atuais entre estas duas regiões do País.
Conformação da regra matriz de incidência tributária do Imposto de importação
A competência tributária para a criação do imposto de Importação está depositada na Constituição Federal em seu artigo 153 nos seguintes termos:
“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
I – importação de produtos estrangeiros;”
Iniciamos logo informando que para a correta criação deste tributo, deverá o ente estatal competente, respeitar todos os princípios constitucionais atinentes a este tributo. Sejam estes os que regem o sistema republicano, sejam os que tratam das garantias individuais e coletivas bem como aqueles específicos determinados no Capítulo do Sistema Tributário Nacional.
No caso deste específico tributo, informamos de plano que identificamos a implicação dos seguintes princípios: Segurança jurídica pela impossibilidade de retroagir a aplicação da norma; quanto à igualdade, ser aplicado em situações equivalentes e entre pessoas equivalentes e com referência à legalidade, ou seja, a criação ou majoração de tributos imposta por lei, no caso deste Imposto, há uma regra específica que outorga poderes ao Poder Executivo para alteração das alíquotas[16],
Outra exceção aos princípios constitucionais tributários, situação sobremaneira importante, é que esse tributo não está subordinado ao princípio da anterioridade da lei nos termos do artigo 150, III b e c.
Isto porque o Imposto de Importação tem como característica sua extrafiscalidade, do qual também fazem parte o Imposto de Exportação, Imposto sobre Produtos Industrializados e Imposto sobre Operações Financeiras de Câmbio e Valores Mobiliários.
A extrafiscalidade consiste na utilização do tributo para controlar, incentivar ou mesmo inibir determinadas situações ao invés de simplesmente servir para arrecadar valores aos cofres públicos da União.
Abaixo decisão do Ministro Carlos Veloso no RE 225602 onde disserta sobre a questão da extrafiscalidade.
Identificamos também a aplicação do não confisco, princípio de difícil classificação dada a dificuldade de determinar o limite a qual o particular pode ter seu patrimônio expropriado de forma legal pelo Poder Público.
Aspecto Material do Imposto de importação:
O aspecto material busca determinar a materialidade do evento, ou seja, qual a atividade exercida por pessoa física ou jurídica que o legislador tomou de empréstimo, para indicar existência do liame obrigacional para o nascimento do Imposto de Importação.
Este aspecto material é composto por um verbo de ação mais seu complemento de forma a dar correta percepção do átimo preciso na constituição do liame obrigacional.
Discutimos sobre o imposto de importação, ou seja, o verbo importar mais seu complemento, o produto. Em outras palavras, trazer produto produzido no exterior para nosso País.
Mas não é qualquer movimentação de produto que deve ser considerada como importação. Há situações onde a internalização de produtos não deve ser considerada como importação. São aquelas que têm natureza temporária, não ocorrendo desta forma, a entrada definitiva no País, como por exemplo, a consignação, devolução e afins[17].
Questão interessante aparece quando analisamos o signo produto. Já indicamos que a Constituição Federal elegeu o signo produto como o complemento do verbo importar.
Produto significa o resultado de uma atividade, seja ela fabril ou intelectual, que é criado por de um sistema próprio e definido de forma a atender uma necessidade qualquer.
Então teremos que a importação de uma coisa ou idéia, estará sujeita à incidência deste imposto. Veja que o termo produto aqui escrito não tem uma subclasse industrializado como é o caso do Imposto sobre produto industrializado (IPI). O termo é simplesmente produto. Como tal termo é amplo, é de se entender que a entrada de qualquer bem, corpóreo ou não se sujeitaria ao imposto de importação.
A avaliação comporta análise histórica legislativa do referido imposto. Até a publicação da Emenda Constitucional no. 18 de 1965, a Constituição Federal discriminava a incidência do imposto de importação através do complemento mercadorias.
Com a emenda no. 18, o texto constitucional foi alterado para importação de produtos industrializados, isto porque é termo de maior abrangência do que o signo mercadoria.
Tanto produto como mercadoria, como muito já tratou a jurisprudência e a doutrina, e que foi explorado no início deste trabalho, é objeto físico, móvel e corpóreo,
Podemos entender que dado o dinamismo da linguagem, produto do intelecto humano pode ser entendido como contido no complemento “produto”, mas quando nos deparamos com o verbo importar, este prevê permanência, perenidade.
Essa perenidade somente se aplica ao software por encomenda dado que o importador adquire o produto com suas fontes de programação, direito a propriedade da coisa, ou seja, carrega esta característica de perpetuidade. Neste caso estaria sujeito o imposto de importação.
Mais adiante, verificaremos que o poder legislativo optou por restringir mais ainda o complemento “produto” determinando o aspecto material como mercadoria, em lei ordinária que criou o tributo. Com esta restrição, mais ainda se complica a possibilidade da incidência do imposto de importação sobre a baixa de aplicativos de sítio internacional.
De outra forma, no caso dos softwares de prateleira não há esta relação de perenidade dado que a forma de negócio é praticada distintamente de uma contratação de serviços. Esta relação jurídica ocorre por contrato de cessão de uso do aplicativo, o qual não possui característica definitiva, sendo então excluída a possibilidade de ser tratada como importação.
Interessante verificar que mesmo a Constituição Federal posterior a 1965 e o Código Tributário Nacional tenham sido publicados se utilizando o complemento “produto”, as legislações que instituíram o tributo posteriormente mantiveram o termo mercadoria. Extraímos do Código Tributário Nacional, a estrutura da regra matriz de incidência do tributo em tela:
“Art. 19. O imposto, de competência da União, sobre a importação de produtos estrangeiros tem como fato gerador a entrada destes no território nacional.
Art. 20. A base de cálculo do imposto é:
I – quando a alíquota seja específica, a unidade de medida adotada pela lei tributária;
II – quando a alíquota seja ad valorem, o preço normal que o produto, ou seu similar, alcançaria, ao tempo da importação, em uma venda em condições de livre concorrência, para entrega no porto ou lugar de entrada do produto no País;
III – quando se trate de produto apreendido ou abandonado, levado a leilão, o preço da arrematação.
Art. 21. O Poder Executivo pode, nas condições e nos limites estabelecidos em lei, alterar as alíquotas ou as bases de cálculo do imposto, a fim de ajustá-lo aos objetivos da política cambial e do comércio exterior.
Art. 22. Contribuinte do imposto é:
I – o importador ou quem a lei a ele equiparar;
II – o arrematante de produtos apreendidos ou abandonados.”
Posteriormente, leis inferiores que regularam a matéria, mantiveram em seu texto legal o signo mercadoria, a despeito do que havia inovado a Constituição Federal a partir daquela emenda.
Abaixo artigo 69 do Decreto 6.759 publicado em 2009 cujo objetivo é o de regulamentar a administração das atividades aduaneiras e a fiscalização, o controle e a tributação das operações de comércio exterior:
“Art. 69. O imposto de importação incide sobre mercadoria estrangeira.” grifos nossos.
Questão que se abre é se esta distinção poderia conviver, harmonicamente, no sistema jurídico tributário. Produto é o resultado do esforço humano, mecânico ou a combinação de ambos havendo a transformação de sua condição original. No caso de mercadoria, não há nenhuma alteração em sua forma original, mas tão somente é objeto de revenda.
Produto e mercadoria possuem divergências em suas classificações, mas podem se inter-relacionar naquilo que não se conflitam. Neste sentido, quando confrontamos as noções impostas aos dois signos, poderemos perceber que à “mercadoria”, cabe toda a sorte de operações com produtos físicos ou tangíveis mas não cabe negociação de intangíveis.
Mercadorias são aquelas destinadas ao comércio. Neste sentido, quando colocamos em perspectiva produto e mercadoria, verificamos que não caberia a incidência do imposto de importação sobre baixa de arquivo de programa pela impossibilidade jurídica da classificação deste ativo como mercadoria, objeto este móvel, corpóreo destinado ao comércio.
Infelizmente não é bem esta a posição do Supremo Tribunal Federal que classifica os programas para revenda (softwares) como mercadorias. No RE 285.870 que abaixo reproduzimos, temos a incidência do ICMS dado que há um instrumento físico para manuseamento pelo comprador.
Este meio físico, que é a base de incidência serve somente como veículo para o transporte das informações e não é o contrário. No caso de pagamento pela cessão de uso, o que alguns tratam de forma leiga como “compra de software”, o aplicativo é carregado em um computador que irá executar os comandos, em função deste software e muitas das vezes este meio físico é descartado.”
Não se adquire esta mídia, mas tão somente se paga pelo direito de usar o aplicativo. Construir a norma de forma a entender que se adquire o meio físico atenta contra os princípios da lógica. Seria como entender que a caixa que transporta produto de limpeza deveria ser base para o ICMS.
Trata-se de meio físico para transporte de mercadorias e não a mercadoria propriamente dita. Não há mercadoria, há a comercialização dos direitos de uso do bem.
Aspecto Temporal do Imposto de importação
Tratando sobre a questão do aspecto temporal do tributo, este incide no momento da entrada no território nacional. Ocorre que dada a impossibilidade de se controlar esta entrada, uma vez que esta linha divisória marítima, aera ou terrestre é de difícil acompanhamento pelas autoridades fazendárias, optou-se pela atribuição de momento distinto ao da entrada para fins da determinação desta ocorrência.
A lei estabeleceu o momento da ocorrência é o do desembaraço alfandegário, ou seja, no momento do registro da declaração de importação, ao invés da entrada no território nacional.
Muito já se discutiu sobre o momento onde o tributo é devido, pois o registro da declaração de importação não coincide com o momento da compra. Diferentemente de uma compra onde as partes situam-se um uma mesma região, a importação resulta em partes localizadas em Países diferentes e normalmente com distâncias relevantes entre o comprador e o vendedor. Neste sentido, o prazo entre o pedido, produção e entrega dos produtos é maior que numa rotineira operação interna. Ocorre que, celebrada a operação interna, fica sujeita às regras tributárias estabelecidas naquele átimo de tempo, nos termos do artigo 116 do Código Tributário Nacional.
“Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:…
II – tratando-se de situação jurídica, desde o momento em que esteja definitivamente constituída, nos termos de direito aplicável.”
De forma diferente, a alíquota aplicável para o Imposto de Importação pode ser alterada a qualquer momento e este momento que determina a situação jurídica é o desembaraço aduaneiro.
Se por exemplo, uma empresa importa sapatos da China, a alíquota do Imposto de Importação aplicável a esta operação não é aquela no momento da assinatura do contrato de importação, mas no momento do registro do contrato de câmbio que ocorre em período não maior que noventa dias da chegada da mercadoria no porto.[18]
Tal situação gera insegurança dado que a alíquota pode ser diferente entre a data do fechamento do negócio e a data do registro do fechamento de câmbio, o que poderá gerar distorções no custo do produto que, como conseqüência, poderá inviabilizar a venda da mercadoria no mercado local.
Caso de grande repercussão nacional foi o aumento de alíquotas do Imposto de Importação sobre veículos. Em breves linhas, na década de 90, houve grande demanda sobre veículos importados. Nesta batida, o Governo Federal resolveu aumentar a alíquota de imposto de forma a refrear este impulso de compras. Ocorre que diversos importadores possuíam pedidos em curso, muitos deles com mercadorias paradas nos portos, prontas para desembaraço e conseqüente registro das declarações de importação.
Sendo o aspecto temporal o registro da declaração e o aumento da alíquota ocorreu entre a compra e o desembaraço, diversos importadores ajuizaram ação com o objetivo de que a alíquota do Imposto de Importação, válida nestas operações, fosse aquela vigente na data da aquisição e não na data do registro do contrato de câmbio, momento este que representa a internalização da mercadoria.
Os tribunais rechaçaram a demanda baseada no entendimento que o aspecto temporal é o desembaraço e não a aquisição, conforme podemos verificar no RE 224.285-9.
Aspecto Espacial do Imposto de importação
Quanto ao aspecto espacial, maior ainda sua complexidade. Esse implica em demarcarmos o lugar físico onde se ultrapassa as fronteiras e se adentra no Estado Brasileiro.
As fronteiras brasileiras foram estabelecidas pela Lei Nº 8.617, de 4 de janeiro de 1993 que dispõe sobre o mar espacial, a zona contígua, a zona econômica exclusiva e a plataforma continental brasileiras.
Em seu capítulo primeiro, determina os limites territoriais brasileiros.
“Do Mar Espacial
Art. 1º O mar espacial brasileiro compreende uma faixa de doze milhas marítima de largura, medidas a partir da linha de baixa-mar do litoral continental e insular, tal como indicada nas cartas náuticas de grande escala, reconhecidas oficialmente no Brasil.
Parágrafo único. Nos locais em que a costa apresente recorte profundos e reentrâncias ou em que exista uma franja de ilhas ao longo da costa na sua proximidade imediata, será adotado o método das linhas de base retas, ligando pontos apropriados, para o traçado da linha de base, a partir da qual será medida a extensão do mar espacial.
Art. 2º A soberania do Brasil estende-se ao mar espacial, ao espaço aéreo sobrejacente, bem como ao seu leito e subsolo.”
Neste sentido, uma vez dentro do espaço brasileiro determinado por lei, seria devido o imposto de importação. Imaginemos uma embarcação que carrega minério de ferro importado da Índia para o Brasil. Uma vez entrada a embarcação neste perímetro, seria devido aos cofres públicos o imposto de importação.
São diversas as questões que se abrem quando a incidência é transferida para a entrada da mercadoria no território nacional. A primeira questão é sobre o responsável pelo recolhimento, pois atingindo a linha demarcatória brasileira, somente os tripulantes da embarcação poderiam recolher o tributo. Ocorre que o sujeito passivo descrito no conseqüente da norma é o importador, o que trataremos neste trabalho. Parece ser pouco provável que atingindo determinado ponto, fosse enviado nota ao importador para que este providenciasse o pagamento.
Outra questão é a identificação das doze milhas náuticas. Em que pese o alto nível de sofisticação da tecnologia, pode ocorrer que os controles da embarcação não sejam tão confiáveis incorrendo em erro de identificação do dia preciso e com isto, a taxa da moeda de conversão pode não representar a realidade bem como a alíquota, gerando prejuízos para qualquer um dos sujeitos da relação tributária.
Poderíamos listar outras questões sobre a fragilidade deste quesito, mas o que importa é que é de difícil controle e fiscalização haver a incidência neste lugar e tempo, uma vez que tanto o aspecto temporal quanto o espacial estão intimamente ligados.
O mundo jurídico trabalha com ficções e presunções. Tais critérios são necessários para que se dê operatividade ao direito. A cerca da distinção entre presunção e ficção Alfredo Augusto Becker esclarece:
“A distinção entre presunção e ficção existe apenas no plano pré-jurídico, enquanto serviam de elemento intelectual ao legislador que estava construindo a regra jurídica. Uma vez criada a regra jurídica, desaparece aquela diferenciação porque tanto a presunção, quanto a ficção, ao penetrarem no mundo jurídico por intermédio da regra jurídica, ambas entram como VERDADES (realidades jurídicas).” [19]
Ou seja, a verdade é que o imposto de importação é devido no momento do desembaraço da mercadoria e não quando do atingimento do ponto divisório das milhas náuticas brasileiras.
O aspecto espacial determinado pela lei é o desembaraço aduaneiro, nos termos do artigo 23 e 44 do Decreto Lei 37/66.
“Art. 23 – Quando se tratar de mercadoria despachada para consumo, considera-se ocorrido o fato gerador na data do registro, na repartição aduaneira, da declaração a que se refere o artigo 44.
Art.44 – Toda mercadoria procedente do exterior por qualquer via, destinada a consumo ou a outro regime, sujeita ou não ao pagamento do imposto, deverá ser submetida a despacho aduaneiro, que será processado com base em declaração apresentada à repartição aduaneira no prazo e na forma prescritos em regulamento.” (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01/09/1988)
São momentos diferentes ou há possibilidade de convívio destas normas objetivas no mesmo sistema jurídico? Acreditamos que a resposta se encontra na determinação do lugar relativo ao aspecto espacial e no momento da eleição do lançamento fiscal.
Se o marco territorial para fins de validação da hipótese da incidência é a entrada no território brasileiro, isto ocorre a partir daquele lugar. Como o aspecto temporal caminha de mãos dadas com este elemento, então no momento do atingimento deste lugar, seria o momento do nascimento da obrigação tributária.
Como já mencionamos, haveria uma grande dificuldade para o controle deste marco territorial dada a fragilidade deste limite. Quando tratamos de controles terrestres, realmente o controle é mais simples, mas neste caso a dualidade se encontra entre a determinação legal e a validação deste lugar.
De outro lado, a constituição da obrigação tributária pode ocorrer e normalmente ocorre posteriormente ao nascimento do fato jurídico tributário que deu origem a obrigação, normalmente porque o instituto da substituição tributária tem sido entendido pelos tribunais superiores como definitiva, ocorrendo ou não o fato, nos termos praticados no elo anterior da cadeia.
Isto é nítido nos tributos por auto-lançamento, onde a declaração é feita em momento posterior à ocorrência do fato. Tomamos como exemplo o Imposto Sobre Serviços (ISS). Imaginando uma empresa prestadora de serviços que realiza suas atividades normais com diversos clientes. A cada serviço prestado, há o nascimento da obrigação tributária. De acordo com Paulo de Barros a incidência se dá de forma automática e infalível no momento da prestação do serviço. Ocorre que seu lançamento acontece em momento posterior por de declarações municipais determinadas em lei, ou seja, existe um descasamento entre as datas da ocorrência da hipótese e a declaração da obrigação.
Há um terceiro momento que é o do pagamento. Este momento ocorre posteriormente ao momento da ocorrência da hipótese bem como da constituição da obrigação. É a partir deste momento que ocorre a liquidação da obrigação tributária.
Ou seja, há três momentos distintos que devemos avaliar. A relação jurídica propriamente dita; o ato de declaração e constituição da obrigação tributária e o pagamento. São situações distintas que deveriam ser tratadas de forma diferente.
Se o fato jurídico ocorreu na compra do bem, mais ainda certo deveria ser a incidência do imposto de importação ter sobrevindo neste momento. Este é o fundamento da segurança jurídica. É a previsibilidade dos resultados dos atos.
Situação esdrúxula como esta seria o uma pessoa domiciliada e residente no Acre que adquire um veículo no Rio Grande do Sul, ficar sujeito à incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços no momento em que a mercadoria chegasse ao destino. Não tenho dúvida que o primeiro argumento que se usaria nesta questão é que o ICMS está sujeito ao princípio da anualidade e nonagesimalidade. Desta forma, qualquer alteração na alíquota somente seria possível por lei e válida no próximo ano e eventualmente decorrido noventa dias, caso a lei tenha sido publicada no último dia do ano.
O que se busca é ter certeza de que o custo contratado é adequado aos possíveis preços a serem praticados na revenda destes produtos.
Neste sentido, discordamos da decisão publicada pelo argumento aqui apresentado. A bem da verdade, a única forma de se compatibilizar segurança com a entrada do bem em território nacional é, no momento da disponibilidade jurídica da mercadoria, ou seja, no momento da compra.
Já trabalhamos com os conceitos de posse e propriedade e percebemos que o direito de propriedade é bem mais amplo do que o de posse pelo direito do proprietário de dispor do bem.
Neste sentido então, a operatividade da norma estaria condicionada à aquisição da mercadoria no exterior, o que facilitaria por demais o processo por diversos ângulos. Evitaria uma série de riscos cambiais dado que não haveria mudança na taxa de conversão da moeda, pois a referência para cálculo seria feita no próprio dia; Evitaria riscos com despachantes que atuam por conta do importador em uma grande maioria das vezes recebendo o dinheiro para liquidar a operação e mais importante que tudo, evitaria surpresas pela possibilidade da União aumentar a alíquota do tributo no curso da entrega da mercadoria no País.
Aspecto pessoal do Imposto de importação
Passemos então para a avaliação das conseqüências do nascimento de uma relação tributária. O nascimento da obrigação tributária manifesta-se pela existência do fato (aspecto material) em um determinado espaço de tempo (aspecto temporal) e num determinado lugar (aspecto espacial).
Dada esta ocorrência, a conseqüência é determinada pela conexão entre duas pessoas sendo uma aquela que tem a obrigação de pagar e a outra o direito-dever de receber o tributo. Mas pagar e receber o quê? Como se calcula esta obrigação? Será a junção entre base de cálculo e alíquota.
Nas palavras de Paulo de Barros, tratando a Regra Matriz de Incidência, comenta que:
“Já na conseqüência, observaremos um critério pessoal (sujeito ativo e passivo) e um critério quantitativo (base de cálculo e alíquota). [20]
Mais adiante o autor tece comentários interessantes sobre o assunto, onde menciona:
“A faculdade de exigir o objeto dá a substância do direito subjetivo, de que é titular o sujeito ativo da relação e, ao passo que a conduta de prestá-lo define o dever jurídico a cargo do sujeito passivo.”[21]
Neste sentido, a competência constitucional de instituir o Imposto sobre Importação é da União, nos termos do artigo 153, I da Constituição Federal.
De outro lado da relação tributária temos o sujeito passivo. Este representa a pessoa que deve pagar o tributo. Poderíamos dividir este sujeito passivo em dois grupos. O contribuinte do imposto e terceira pessoa que a lei determinar, nos termos do Código Tributário Nacional:
“Art. 121. Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao pagamento de tributo ou penalidade pecuniária.
Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:
I – contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;
II – responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.”
Quando avaliamos a determinação legal sobre a responsabilidade de recolhimento do Imposto de Importação, ou seja, o sujeito passivo da relação tributária da importação, temos uma quantidade relativamente extensa de contribuintes.
“Art.31 – É contribuinte do imposto:
I – o importador, assim considerada qualquer pessoa que promova a entrada de mercadoria estrangeira no Território Nacional;
II – o destinatário de remessa postal internacional indicado pelo respectivo remetente;
III – o adquirente de mercadoria entrepostada.
Art . 32. É responsável pelo imposto:
I – o transportador, quando transportar mercadoria procedente do exterior ou sob controle aduaneiro, inclusive em percurso interno;
II – o depositário, assim considerada qualquer pessoa incumbida da custódia de mercadoria sob controle aduaneiro.
Parágrafo único. É responsável solidário:
I – o adquirente ou cessionário de mercadoria beneficiada com isenção ou redução do imposto;
II – o representante, no País, do transportador estrangeiro;
III – o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora.
c) o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora
d) o encomendante predeterminado que adquire mercadoria de procedência estrangeira de pessoa jurídica importadora.”
Quando avaliamos a questão da baixa de programas de computador, analisando estritamente pela ótica do sujeito passivo, aplicar-se-ia o disposto no inciso I do artigo 31 deste Decreto Lei dado que será então aquele que promoverá a entrada da mercadoria no Território Nacional.
Aspecto quantitativo do Imposto de importação
Tendo este quadro delineado, passaremos a analisar a medida quantitativa da relação tributária tendo em vista a ocorrência do fato jurídico tributário. Quando falamos em medidas, nos referimos a mensuradores. É o objetivo destes mensuradores a determinação exata do valor devido.
Em outros termos, tratamos de dívida calculada pela aplicação de uma determinada alíquota sobre uma base de cálculo determinada ou valores fixos ligados a medidas de peso, litros, metros, etc.
Explorando o binômio base de cálculo e alíquota, percebemos que esta deve ter clara relação com o aspecto material da hipótese de incidência, dada a implicação lógica entre estes dois aspectos.
A base de cálculo apresenta funções determinantes na obtenção do valor devido. Tem função de validar o aspecto material de incidência, dado que o fato jurídico tributário deve ter estreita relação com a sua base de cálculo. Neste sentido, a base de cálculo para fins de determinação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica somente poderia ser o lucro líquido ajustado, ou em outras palavras, o lucro real.
Caso fosse determinado que a base de cálculo deste imposto fosse o faturamento, incorreríamos em uma incongruência lógica, pois a renda é o resultado das operações da companhia, diferentemente de faturamento que exprime o valor das vendas da empresa.
São duas riquezas distintas que servem para funcionar como mensuradores de hipóteses de incidência também distintas.
A base de cálculo deve combinar adequadamente com o aspecto material, de forma que a eleição da base de cálculo possa traduzir adequadamente o interesse do legislador em gravar como signo presuntivo de riqueza, um determinado fato jurídico.
Neste sentido, quando tratamos do ICMS, a base de cálculo é o valor da operação da mercadoria. Há aqui correlação lógica dos aspectos, pois o valor da mercadoria é exatamente a base de cálculo do tributo.
Quando avaliamos a base de cálculo do Imposto de Importação, nos deparamos com duas situações tipificadas no Decreto-Lei 37/66, as quais descreveremos abaixo:
“Art.2º – A base de cálculo do imposto é:
I – quando a alíquota for específica, a quantidade de mercadoria, expressa na unidade de medida indicada na tarifa;
II – quando a alíquota for “ad valorem”, o valor aduaneiro apurado segundo as normas do art.7º do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio – GATT.”
Em breves comentários, o acordo informado no inciso II trata das regras acordadas na Rodada Uruguai onde diversos Países fixaram regras gerais para prática do comércio internacional.
Estas regras de convivência visam evitar a transferência de resultados entre Países que será fundamentada por critérios equitativos, uniformes e neutros.
Estas regras foram incorporadas à legislação brasileira pelo Decreto Legislativo no. 30 de 15 de novembro de 1994 e diplomas infra-legais posteriores.
Neste sentido, em se tratando de importação de mercadorias, ficam estas subordinadas às regras estabelecidas na Rodada Uruguai.
Por último, trataremos da alíquota. Esta por sua vez representa o percentual que aplicado a um signo presuntivo de riqueza define o quanto será retirado do contribuinte para ser entregue ao poder público.
Como vimos anteriormente, este imposto possui uma característica distinta da maioria dos tributos que estão sujeitos à publicação de lei para majoração de alíquota. A alíquota pode ser alterada a por ato normativo do poder executivo, nos termos do § 1º do artigo 150 da Constituição Federal, onde seus limites foram definidos nos termos da Lei 3.244 de 1957.[22]
As alíquotas se encontram determinadas na TEC – Tarifa Externa Comum as quais foram incorporadas ao nosso sistema jurídico pelo Decreto Legislativo no. 350 de 1991 e ratificada pelo Decreto no. 1.343 de 1994 que foi revogado pelo Decreto no 2.376 de 1997.
Conclusão:
Programas de computador rotinas são produtos da criação humana onde ordens são transcritas de forma lógica de forma que o computador, quando em contato com estas ordens possa executá-la.
O aspecto material do Imposto de Impostação é importar produto. Leis ordinárias que regulam a incidência do Imposto de Importação incorporaram ao sistema jurídico o complemento do verbo mercadoria em substituição a produto. Produto é termo amplo onde mercadoria está contida, desta forma ambos signos convivem harmonicamente nos textos legais.
Mas mercadoria é coisa física com finalidade de comércio, o que não é o caso de softwares baixados uma vez que o se comercializa é a cessão de uso desta idéia.
Não bastasse isto, o termo importar tem natureza permanente o que não corresponde a baixa de software para usuário objeto deste estudo dado que não há a transferência da propriedade do software mas somente a cessão dos direitos de uso.
Neste sentido, entendemos que a atividade de baixar de programa de computador de site internacional não está sujeita ao imposto de importação.
Informações Sobre o Autor
Roberto Perez Fragoso
Mestrando em direito tributário pela PUC-SP. Especialista em direito tributário pelo IBET-RJ. Especialista em processo civil – Cândido Mendes – RJ. Advogado, contador e administrador de empresas. Professor coordenador do curso de pós-graduação da FADISP/ALFA. Sócio do Marafon & Fragoso advogados