Limites constitucionais ao direito à prova no processo penal: inutilizabilidade das provas ilícitas e ilegítimas

Resumo: O presente trabalho monográfico versa sobre o direito à prova, visando a abordar, de maneira detalhada e abrangente, as diretrizes existentes acerca das provas ilícitas e ilegítimas, sob o prisma da Constituição Federal de 1988, bem assim do Código de Processo Penal pátrio, discorrendo, pertinentemente, sobre todas as alterações dos dispositivos relativos à prova através da promulgação da Lei 11.690/08, sem olvidar das razões do veto presidencial imanente. Da mesma sorte, o estudo direciona-se à princiopiologia da prova, ponderando-se os limites constitucionais estabelecidos para sua obtenção e, sobretudo, às teorias existentes que corroboram a admissibilidade processual dos elementos probatórios obtidos por meios ilícitos. Não obstante, este trabalho pretender explorar os mais diversos conceitos doutrinários, com o fito de enaltecer a importância, relevância e, acima de tudo, a repercussão do tema na instrução probatória penal, tão contestada e discutida nos tribunais atualmente, a julgar que não há posicionamento jurisprudencial pacífico e consolidado quanto à aplicabilidade do princípio da proporcionalidade, para que se dê, todavia, uma segurança júridica ao jurisdicionado nas limitações e restrições dos direitos fundamentais que, indistintamente, sempre estarão envolvidos.[1]

Palavras-Chave: Direito à Prova, Prova Ilícita, Teorias de Admissibilidade da Prova Ilícita, Inutilizabilidade Prova Ilícita, Prova Ilícita por Derivação.

Abstract: This thesis work deals with the right to prove, in order to address, in a detailed and comprehensive way, the existing guidelines on the illegal and illegitimate evidence, in the light of the 1988 Federal Constitution of Brazil, as well as the Criminal Procedure Code, discoursing, pertinently, about any changes in the related to the evidences through the promugation of Law 11.690/2008, without forgetting the reasons the immanent presidential negative. Likewise, the study is directed to the principiology of proof, pondering the constitutional limits stablished for obtaining and especially to existing theories that support the procedural admissibility of evidence obtained by unlawful means. Nevertheless, this thesis intends to explore the various doctrinal concepts in order of enhancing the importance, relevance and, above all, the impact of the subject in criminal evidential statement, as contested and discussed in court currently, judging that there is no peaceful and consolidated jurisprudential position on the applicability of the principle of proportionality, in order to give, however, legal certainty to the claimants in the limitations and restrictions of the fundamental rights that, indistinctly are always involved.

Keywords: Right to Prove, Unlawful Evidence, Admissibility Theories of Unlawful Evidence, Unusability of Unlawful Evidence, Unlawful Evidence by Derivation.

Sumário: 1. Introdução. 2. Instrução probatória penal. 2.1. Direito à prova. 2.2. Principiologia da prova. 2.2.1. Da busca pela verdade real. 2.2.2. Princípio do contraditório. 2.2.3. Princípio da proporcionalidade. 2.2.4. Princípio da presunção de inocência. 3. Limites constitucionais ao direito à prova. 3.1. Direito à intimidade. 3.2. Inviolabilidade de domicílio. 3.3. Inviolabilidade do sigilo da correspondência e das telecomunicações. 3.4. Inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos. 4. Distinção entre prova ilícita e prova ilegítima. 5. Teorias sobre a admissibilidade da prova ilícita. 5.1. Admissibilidade em razão da teoria da proporcionalidade. 5.2. Repercussão processual da prova ilícita. 5.3. Prova ilícita pro reo. 6. Provas ilícitas por derivação. 6.1. Contexto histórico da teoria fruits of poisonous tree. 6.2. Teoria da fonte independente. 6.2.1. Exceção da descoberta inevitável. 7. Procedimento para apurar a ilicitude da prova. 8. Conclusão. Referências.

1. Introdução

Insculpida na Constituição Federal de 1988, notadamente no artigo 5º, inciso LVI, a vedação às provas obtidas por meios ilícitos é clara. Todavia, a Jurisprudência e Doutrina tratam o tema sob à ótica de diversas vertentes, face à problematização entre o meio utilizado para concretizar a produção da prova e a verdade auferida através dela.

Nessa senda, a relevância do tema é indubitável, pois abrange questão essencial à instrução penal, ou seja, a prova, que, por sua vez, é determinante para a formação do livre convencimento motivado do julgador, segundo o princípio da persuasão racional.

Posto isso, pode-se dizer que a Constituição Federal brasileira baliza o processo penal, no sentido de que qualquer prova que tenha sido obtida de maneira ilícita deve ser desentranhada do processo, reputando-as ineficazes, por não obedecerem ao que reza o nosso ordenamento jurídico e, ainda, face à violação inconcebível de direitos e garantias asseguradas pela Constituição.

A Constituição de qualquer Estado Democrático de Direito procura tutelar e preservar os mais valiosos princípios e direitos fundamentais, protegendo-os de quaisquer atos que possam vulnerá-los.

Acontece que, quando se trata de justiça dentro da nova ordem constitucional, depara-se, além das análises jurídicas, com a sociedade que, não compreendendo a formalidade de um processo penal constitucional, clama por justiça, ansiando pela aplicação de penas rígidas e duradouras. Nesse sentido, defender a tese de que um acusado não será punido em razão de uma produção probatória por meio ilícito, soa, resistentemente, como escusa à impunidade, o que enseja a depreciação social do Poder Judiciário.

Destarte, o presente trabalho monográfico proporciona uma ponderação, contextualizando a evolução do ordenamento processual brasileiro, sobre o conflito existente entre a exclusão, ao longo da instrução probatória, daquelas provas auferidas por meios ilícitos e a finalidade precípua do processo em concretizar a busca da “possível” verdade real, ao passo de valorar a prova em detrimento da ilegalidade na persecução penal.

Frise-se que este trabalho se apresenta, estruturalmente, numa sequência lógica, para melhor compreensão acerca dos temas enfatizados.

Neste sentido, iniciaremos nosso estudo pela análise da instrução probatória penal, pontuando acerca dos métodos disponíveis para viabilizar a apreciação do conjunto probatório, destrinchando cada ponto pertinente aos sistemas da livre convicção, prova legal e persuasão racional. Poder-se-á, da mesma sorte, aferir os princípios basilares e norteadores do direito à prova.

Logo em seguida, estudaremos os objetivos da reforma do Código de Processo Penal, ponderando-se os objetivos primordiais que visam a imprimir celeridade, simplicidade e, sobretudo, economia ao trâmite da instrução processual sem prejudicar a prestação adequada da jurisdição, a fim de explanar a relevância e imprescindibilidade dos limites constitucionais ao direito à prova para que se logre êxito na instrumentalização do processo penal.

Posteriormente, trataremos, com ênfase, as problematizações que versam sobre prova ilegal (gênero), abrangindo, em especial tônica, a relação entre princípios e garantias constitucionais que dizem respeito à obtenção por meios ilícitos da prova. No mesmo capítulo, também apreciar-se-á as diferenças conceituais e práticas entre as provas ilegítimas e ilícitas.

No penúltimo capítulo, analisaremos as correntes doutrinárias acerca da possibilidade jurídica de utilização da prova ilícita no Processo Penal brasileiro, refletindo sobre as teorias da proporcionalidade e da razoabilidade, que escoram a eventual utilização da prova ilícita derivada, quando se abre uma exceção a partir da quebra do nexo de causalidade com a prova ilícita originária, bem assim quando auferida por uma fonte independente.

Por fim, faremos uma breve conclusão acerca da problematização desenvolvida por este trabalho monográfico, enaltecendo os pontos precípuos que são debatidos na doutrina e amparam a formação da jurisprudência no que toca à (in)utilizabilidade da prova ilícita no Processo Penal pátrio.

2. Instrução probatória penal

De fato, a instrução probatória é a principal fase do processo, uma vez ser determinante para a fundamentação da sentença pelo julgador. Tais elementos probatórios, componentes de um conjunto – que, inescusavelmente, deve ser sopesado por quem irá pôr fim ao processo –, são as ferramentas que, num determinado momento, assumirão o embasamento jurídico na medida em que forem valoradas, logrando-se, assim, a construção do convencimento do julgador.

A atividade de valoração da prova é, simplesmente, a percepção sensível do julgador ao buscar o seu convencimento. Ou seja, o questionamento que se faz: Essas provas são suficientes para julgar (im)procedente?

Com efeito, há métodos e variáveis para que essa atividade seja desempenhada pelo julgador, tendo como fim, às vezes, a justificação da decisão, valendo-se de uma ponderação à luz do livre convencimento, da prova legal e da persuasão racional.

Pois bem, infere-se que a livre convicção, ao passo de permitir que o julgador não justifique a sua decisão, é o método mais flexível, haja vista permitir que o julgamento ocorra conforme a íntima convicção, pura e por si só, propiciando uma livre valoração do contexto. Como exemplo, podemos citar a atividade desempenhada pelos jurados do Tribunal do Júri.

Já a prova legal é restrita, pois compreende uma limitação de valor probatório pré-fixada, certo que o julgador estará adstrito ao critério discriminado pela lei, a qual define o valor, a relevância e, sobretudo, a forma daquela prova para o processo. Como exemplo, podemos citar a exigibilidade legal do exame de corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, não sendo superável pela confissão.

O sistema adotado no Brasil, constitucionalmente previsto no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, é o da persuasão racional. Este método é misto, uma vez que a atividade de ponderação probatória está parcialmente atrelada à lei, já que há necessidade de fundamentação; no entanto, é concedido ao magistrado a liberdade de sopesar a prova para formar seu livre convencimento.

Pertinente citar Antonio Scarance Fernandes:

“É o processo o palco no qual devem se desenvolver, em estruração equilibrada e cooperada, as atividades do Estado (jurisdição) e das partes (autor e réu). Nenhuma dessas atividades deve ser o centro, impondo-se sobre as outras. O excessivo realce à predominância da jurisdição sobre as partes é reflexo do valor dado ao intervencionismo estatal na sociedado e na vida dos indivíduos. Prestigiar a ação é ressaltar a atividade do autor em detrimento da atuação do Estado e da defesa. Colocar a defesa como a razão do processo é, também, valorizar uma das partes da relação jurídica processual em prejuízo da outra. O processo é o ponto de convergência e de irradiação. É nele e por meio dele que alguém pode pleitear a afirmação concreta de seu direito. É mediante o processo que o juiz, como órgão soberano do Estado, exerce sua atividade jurisdicional e busca, para o caso, a solução mais justa.” [2]

2.1 Direito à prova

Afere-se que o direito à prova é uma garantia compreendida no exercício do contraditório, extensão do devido processo legal, o qual não objetiva, simplesmente, alegar – como oposição ou resistência –, mas sim, principalmente, oferecer a alegação sob a perspectiva de influência, isto é, como direito à incidência ativa no desenvolvimento da instrução probatória e, por conseguinte, no resultado do processo.

Insta salientar que o direito à prova é de suma importância, vez que a atividade probatória encontra-se no momento central do processo, o que oportuniza às partes a alegação e indicação dos fatos, sobretudo, a demonstração da verdade, revestida de inequívoca significância para o provimento jurisdicional.

Adalberto Camargo Aranha aduz, ipsis litteris:

“As partes provam em seu próprio benefício, visando dar ao juiz os meios próprios e idôneos para formar sua convicção. É uma atividade da parte em proveito próprio, uma condição para a vitória, um meio para obter a pretensão posta em juízo, jamais um dever jurídico. Quem deseja ganhar a demanda deve provar, como quem deseja melhorar deve trabalhar. Daí por que ônus, jamais obrigação”.[3]

A jurisprudência pátria é complacente ao conferir a ambas as partes, em caráter de imprescindibilidade, numa relação processual, todos os recursos disponíveis para viabilizar o oferecimento da matéria probatória. E, se assim não for, é plenamente possível atribuir o cerceamento, seja de defesa ou de acusação.

Face à inércia do Juízo, a atividade jurisdicional necessita de provocação. Em síntese, ao ser provocado, o Juízo competente, especificamente no direito processual penal, afere a responsabilidade e impõe a sanção prevista em lei que, de acordo com a sua convicção, afigura-se responsável pelo fato penalmente relevante. Para tanto, deverá o juiz basear-se nas provas produzidas durante a instrução criminal, formando, assim, o livre convencimento motivado.

O instituto da prova é o fundamento para todo o ordenamento jurídico penal. As partes valem-se da prova para amparar os fatos alegados; o magistrado utiliza-se das provas para motivar seu decisório.

Torquato Avolio pondera acerca do direito à prova, mais precisamente, no que cerne à terminologia, in verbis:

“A disciplina geral da prova está contida no Livro III do novo Código. Interessante notar a escolha terminológica do legislador, reservando a expressão “prova” exclusivamente para o que se refere à fase dos debates, e empregando em outras situações processuais os termos “elementos”, “fontes de prova” e “indícios”, este último atecnicamente compreendendo os dois primeiros. Já os “meios de prova” servem, propriamente, para designar englobadamente as diversas modalidades (testemunhos, perícias, acareações, reconhecimentos, exames de partes, inspeção judicial de documentos); cada meio de prova, individualmente, recebe nomenclatura diversa conforme se refira à fase de debates ou à fase de investigações preliminares. A importância da escolha reside não tanto no apuro terminológico, quanto na eficácia argumentativa do instrumento, e, de qualquer forma, no valor da prova aos fins da decisão, ou seja, o tipo de decisão à qual a prova é preordenada (a expedição de um mandado de prisão, por exemplo, pode legitimamente se fundar em dados que não poderiam ser utilizados para uma sentença na fase de debates).”[4]

Do latim probatio, o termo “prova” tem por significado verificar, examinar, reconhecer. Atine à demonstração efetiva e real da veracidade de um fato e/ou ato, com um viés de comprovação. Sem sombra de dúvida, há inúmeras definições para as mais inusitadas e peculiares ocasiões. No entanto, focaremos exclusivamente no viés jurídico do termo “prova”.

Pode-se confirmar que o conjunto probatório (reunião de provas) é o eixo sobre o qual se ergue toda a dialética processual. Notadamente no processo penal, a prova assume maior relevância, haja vista o contato direto com os direitos e garantias constitucionais que, de uma forma ou outra, sempre estão envolvidos.

Não se busca a certeza absoluta, a qual é intangível, mas a certeza relativa suficiente para convicção do magistrado. Este pode atuar no sentido de buscar a verdade dos fatos, como realmente se deram. A doutrina denominou de busca da verdade real.

No processo penal, prepondera a busca – mais próxima possível – da realidade. Nessa senda, a finalidade da instrução probatória é viabilizar uma reconstrução fática, através de um suporte de provas, que conceda segurança ao julgador e, ainda, embasamento para a sua decisão.

 No que toca às atividades processuais que envolvem os atos probatórios, destaca-se quatro momentos marcantes: a) proposição, momento em que são indicadas ou requeridas; b) admissão, momento em que o juiz verifica a sua pertinência e tempestividade; c) produção, quando integram os autos, efetuando-se a juntada; d) apreciação, momento em que o juiz valora a prova.

Válido ressaltar as palavras de Gustavo Henrique Badaró, in verbis:

“A prova é apontada como o meio pelo qual o juiz chega à verdade, convencendo-se da ocorrência ou inocorrência dos fatos juridicamente relevantes para o julgamento do processo. Atualmente, tem-se consciência de que a verdade absoluta ou ontológica é algo inatingível. Verdade e certeza são conceitos relativos. A verdade atingida no processo – e também fora dela – nada mais é do que um elevado ou elevadíssimo grau de probabilidade de que o fato tenha ocorrido como as provas demonstram. Por outro lado, a certeza, enquanto aspecto subjetivo da verdade, também é relativa. O juiz tem certeza de um fato quando, de acordo com as provas produzidas, pode racionalmente considerar que uma hipótese fática é a preferível entre as possíveis. Ou seja, em linguagem mais simples, o juiz tem certeza quando as provas o fazem acreditar que o seu conhecimento é verdadeiro.”[5]

Como vimos, a prova é essencial para que as partes exerçam influência na convicção do magistrado. É o meio utilizado pelo juiz para averiguação dos fatos sobre os quais as partes fundamentam suas alegações.

Atividade probatória representa o momento central do processo, visto que está estritamente ligada à alegação e indicação dos fatos. A função persuasiva da prova visa a oferecer ao julgador a demonstração da verdade dos fatos deduzidos ou expostos, de modo que, com razoabilidade frente a verossimilhança, pode-se excluir incertezas e incluir certezas para formar o provimento jurisdicional.

Nas palavras de Luiz Francisco Torquato Avolio, ipsis litteris:

“Se o escopo do direito de ação e de defesa é o de dar ao interessado uma adequada oportunidade de interferir sobre o desenvolvimento e o êxito do julgamento, pareceria evidente que o exercício concreto desse direito seja essencialmente subordinado à efetiva possibilidade de servir-se dos instrumentos apropriados, as provas, com as quais se procura verificar aquele determinado evento”.[6]

Assim, a convicção da veracidade das alegações feitas pelas partes decorre, naturalmente, da demonstração dos fatos, isto é, das provas que denotam ou não a sua ocorrência. Além de se comprovar a materialidade e a autoria de um crime, a função persuasiva da prova consiste em oferecer ao julgador o conhecimento de todas as circunstâncias, sejam objetivas ou subjetivas, que envolvem a responsabilidade criminal.

2.2 Principiologia da prova

De início, ressalte-se a ponderação de Aury Lopes Jr., in verbis:

“Quando se está diante de uma lei processual penal como a nossa, que remonta uma racionalidade do final do século XIX, início do século XX, e que possui uma inspiração fascista, além de exalar um ranço autoritário, os princípios constitucionais são imprescindíveis para, através de uma (re)leitura pelo foco constitucional, tentar compatibilizá-las com as exigências atuais.”[7]

Ao passo de o processo penal ser um instrumento de efetivação dos direitos e garantias, conclui-se: quanto mais democrático o processo, melhor assistência aos direitos fundamentais.

Em verdade, o fato de o processo penal viabilizar a retribuição estatal frente à prática de um ato ilícito e antijurídico, o respeito aos princípios processuais constitucionais é inevitável, para que não haja arbitrariedades e, por óbvio, injustiças.

Em verdade, vários são os princípios aplicáveis às provas no âmbito do processo penal. Imperioso tecer que os princípios não se excluem mutuamente. Muito pelo contrário, a aplicabilidade e observância dos princípios devem ser realizadas de forma conjunta.

2.2.1 Da busca pela verdade real

Admitido, entretanto, bastante controverso dentro do processo penal, a busca pela verdade real concerne à atuação excepcional do juiz em relação à produção das provas no momento em que envolve direito individual indisponível. Assim, o juiz atuará, subsidiariamente e de forma atípica, na busca de provas, objetivando a verdade real.

A doutrina moderna tem severamente criticado o dogma da verdade real, pois é um ideal inalcançável, sendo que, na realidade, o que existe é a verdade processual, isto é, aquela construída em um processo legítimo, com a observância do contraditório e da ampla defesa, perante um juiz imparcial.

Gustavo Henrique Badaró nos ensina que:

“A busca da verdade não é o fim último do processo penal, mas um meio para a correta aplicação da lei penal. O processo penal, enquanto instrumento estatal para que o legítimo exercício do poder punitivo, segundo as regras do devido processo penal, necessita verificar a correção ou a falsidade da imputação de um fato definido como crime atribuído a alguém”.[8]

Para isso, as provas permitirão ao julgador, consoante critérios racionais de valoração, concluir se o enunciado constante da imputação tem elementos suficientes que o confirmem. A exordial acusatória será considerada procedente quando as provas fornecerem elementos que a confirmem.

Nessa esteira, há sopesar que a busca da verdade real no processo criminal, ainda que mais pretendida, não comporta a produção probatória a qualquer custo e, por isso, a própria Constituição Federal de 1988 refuta as provas produzidas ilicitamente.

Com efeito, mister os ensinamentos de Marco Antonio de Barros:

“Cuida-se de uma norma que produz visíveis reflexos na busca da verdade, notadamente por estabelecer parâmetros rígidos de licitude aos procedimentos investigatórios que visam desvendá-la, os quais se coadunam com o espírito de legalidade e moralidade dos atos praticados pela Administração Pública.

Desse modo, o descobrimento da verdade deve arrimar-se em atos, diligências e outras providências essencialmente lícitas e moralmente legítimas, pois nenhum preceito legal autoriza a obtenção da verdade a qualquer preço

Sobressai disso uma nova linha delimitadora, de alcance superior, inspirada sob a reflexão de que o modo de agir não pode valer mais do que o resultado, fazendo prevalecer o entendimento de que os fins não justificam os meios. Essa nova sistemática nos faz distanciar ainda mais do antigo Direito, que, como vimos, pactuava até com formas cruéis de produção de prova.”[9]

O processo tem por finalidade a reconstrução fática, todavia, essa reconstrução nunca é perfeita e exata. Nesse raciocínio, a verdade absoluta perde espaço, ponderando-se com mais razoabilidade e proximidade da realidade humana (falível, portanto), para a aceitação da verdade possível, frente o conjunto probatório.

Considerando os posicionamentos antagônicos e conflitantes das partes numa relação processual, a verdade, como princípio, tem por finalidade precípua diminuir o máximo possível dos pontos controvertidos e, com isso, conceder o mínimo de certeza alcançável pelo juiz, através dos elementos probátorios, para este julgar a causa, e, assim, concretizar a função do instrumento.

Nas palavras de De Brito, Fabretti e Ferreira Lima:

“Contudo, ao se permitir o ideal da verdade real, se tenta, na verdade, justificar a atuação ex officio do juiz na produção da prova, o que, como já expusemos acima, pode comprometer a sua imparcialidade, outro cânone processual. Uma fórmula racional seria permitir apenas a produção de provas pelas artes, e a atuação do juiz como fiel da balança da paridade de armas. Atuações ex officio seriam desnecessárias por dois motivos: se a prova feita pela acusação – que tem esta obrigação – é suficiente para a condenação, o juiz não precisará fazer mais nada para decretar a condenação; agora, se a prova é deficiente ou o juiz não está seguro da prova trazida, bastará sempre invocar o topos do in dubio pro reo, e absolver o imputado. Portanto, a utilização da “busca pela verdade real” não tem mais do que o condão de tentar justificar por que em um sistema processual contraditório ainda se permite tal intromissão”.[10]

2.2.2 Princípio do contraditório

O contraditório é uma característica inerente ao processo, visto ser imprescindível para a própria existência de sua estrutura dialética. Tal princípio consiste na promoção de igualdade entre as partes dentro do processo, oportunizando, de forma igualitária, a influição no convencimento do juiz, com a produção de provas.

Conforme disposto na Constituição Federal:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)

LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”

Como bem salienta Aury Lopes Jr.:

”[…] o contraditório pode ser inicialmente tratado como um método de confrontação da prova e comprovação da verdade, fundando-se não mais sobre um juízo potestativo, mas sobre o conflito, disciplinado e ritualizado entre partes contrapostas: a acusação (expressão do interesse punitivo do Estado) e a defesa (expressão do interesse do acusado [e da sociedade] em ficar livre de acusações infundadas e imune a penas arbitrárias e desproporcionadas)”[11].

Percebe-se, assim, que o princípio do contraditório é uma garantia constitucional que propicia ao acusado o exercício pleno de seu direito de defesa, encontrando guarida em razão da obrigatoriedade do caráter imparcial do órgão jurisdicional.

De fato, o juiz, por força de seu dever de imparcialidade, coloca-se entre as partes, no entanto, equidistante delas: ao passo de ouvir uma, reputa-se inconcebível deixar de ouvir a outra; somente assim dar-se-á a ambas a possibilidade de expor suas razões, de apresentar provas, ou seja, de influir sobre o convencimento do juiz.

Do exposto, a necessidade de informação e a possibilidade de reação são elementos inerentes ao contraditório, que deverá, plena e efetivamente, ser exercido na esteira de toda a instrução probatória processual, para que seja oferecido condições reais de contrariedade dos atos praticados.

Nesse sentido, é possível concluir que o contraditório não admite exceções e que, em virtude de sua natureza constitucional, deve ser substancialmente observado e não apenas formalmente, devendo as normas que o desrespeitem serem consideradas inconstitucionais[12], como bem pontuado por Cintra, Grinover e Dinamarco.

A análise de Américo Bedê Júnior e Gustavo Senna acerca do tema destaca dois elementos essenciais, que são a necessidade de informação e o direito à participação:

“Não resta dúvida que a informação é inerente ao princípio do contraditório, pois sem conhecimento da existência da demanda, dos argumentos da parte, não há possibilidade de defesa de direitos, impossibilitando, inclusive, a intervenção da parte ex adversa, sendo, portanto, pressuposto para a efetiva participação. Portanto, no processo penal, o contraditório não se completa com a simples ouvida da parte, sendo imprescindível ensejar oportunidade de rebater as alegações da outra parte, com argumentos e provas.”[13]

Destarte, com previsão no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, compreende-se que esse princípio consiste na ciência bilateral das partes a respeito da realização dos atos processuais. Com a ciência do denunciado da existência de um processo crime em seu desfavor, cria-se a possibilidade de contestar as provas produzidas pela parte contrária, ou melhor, a possibilidade de exercer o contraditório.

Gustavo Henrique Badaró nos ensina:

“Além do valor político de permitir que os sujeitos do ato de poder possam participar da elaboração de tal ato, o contraditório possui também um valor heurístico. O contraditório, possibilitanto o funcionamento de uma estrutura dialética, que se manifesta na potencialidade de indagar e de verificar os contrários, representa um mecanismo eficiente para a busca da verdade. Mais do que uma escolha política processual, o método dialético é uma garantia epistemológica na pesquisa da verdade. As opiniões contrapostas dos litigantes ampliam os limites do conhecimento do juiz sobre os fatos relevantes para a decisão e diminuem a possibilidade de erros. No processo penal necessariamente haverá o contraditório, em razão da importância dos bens em jogo, pois a solução deste conflito de interesses relevantes exige, sempre, uma decisão oficial e segura, uma vez que a escolha da parte pode ser, e frequentemente o é, errada.”[14]

2.2.3 Princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade é um princípio constitucional implícito, uma vez que denota caráter formal. É possível, de uma maneira simplória, dizer que o princípio da proporcionalidade consiste em impor a justificação metódica de eventuais intervenções em direitos fundamentais.

Constitucionalmente previstos, nenhum dos princípios e valores são tidos como absolutamente intangíveis, de modo que mesmo aqueles de fundamental importância devem ser coordenados com outros valores constitucionais, na medida que poderão sofrer limitações por força destes, quando sejam prevalecentes e seja inviável a incidência conjunta de ambos.

É por isso que se fala em limites implícitos a todo princípio, vez que viável a ponderação e confronto com os vários outros valores insculpidos na Constituição Federal. Sendo assim, destarte, não há excluir de tal aferição, balanceamento ou análise de proporcionalidade, os princípios processuais penais.

De toda sorte, as doutrinas estrangeiras e nacionais têm firmado o princípio da proporcionalidade em sentido amplo como subdividido em subprincípios: princípio da adequação ou da idoneidade, princípio da necessidade e princípio da proporcionalidade em sentido estrito.

O princípio da adequação ou da idoneidade (Grundsatz der Geeignetheit, em alemão, ou idoneità del provvedimento, em italiano) concerne à adequação e à aptidão dos meios disponíveis para lograr êxito na persecução penal.

Já o princípio da necessidade (Grundsatz der Erforderlichkeit ou Grundsatz der Notwendigkeit) volta-se à utilização do meio que menos interfira em um direito fundamental, não sendo muito relevante a viabilização entre meios e fins.

E, por fim, o princípio da proporcionalidade em sentido estrito (Grundsatz der Verhältnismäßigkeit im engeren Sinne) que abarca a ponderação de valores em conflito cujo julgador deverá privilegiar e preferir aquele de maior relevância.

Acerca deste princípio, de extrema relevância citar o entendimento de Antonio Scarance Fernandes:

“Importa muito a atuação do princípio da proporcionalidade nos casos de conflitos entre regras e princípios. O conflito entre princípios soluciona-se de forma diversa do conflito entre regras. Este conduz a uma incompatibilidade da qual resulta a exclusão de uma das regras do sistema, com permanência da outra. A colisão de princípios, que encerram em seu bojo valores, não enseja a eliminação de um deles, mas a descoberta, em cada caso, do princípio prevalente.”[15]

De fato, deve haver superação do risco do subjetivismo do julgador através de fixação de critérios de prevalência, a serem estabelecidos pela jurisprudência, bem como pela doutrina.

Frise-se o que Luiz Francisco Torquato Avolio salienta a respeito:

“A aplicação do princípio da proporcionalidade sob a ótica do direito de defesa, também garantido constitucionalmente, e de forma prioritária no processo penal, onde impera o princípio do favor rei, é de aceitação praticamente unânime pela doutrina e pela jurisprudência.

Até mesmo quando se trata de prova ilícita colhida pelo próprio acusado, tem-se entendido que a ilicitude é eliminada por causas de justificação legais da antijuridicidade, como a legítima defesa”[16].

Na mesma esteira, também discorrem Ada Pellegrini Grinover, Antonio Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes, em obra doutrinária clássica:

“A teoria hoje dominante, da inadmissibilidade processual das provas ilícitas, colhidas com infringência a princípios ou normas constitucionais, vem, porém, atenuada por outra tendência, que visa a corrigir possíveis distorções a que a rigidez da exclusão poderia levar em casos de excepcional gravidade”[17].

O critério que norteou os julgamentos de casos extremamente graves nos tribunais da então Alemanha Federal, denominado de Verhaltnismassigkeitsprinzip, consistia em praticar a proporcionalidade, ou seja, objetivar o equilíbrio entre valores fundamentais contrastantes.

 Não há olvidar, também, que princípio alemão da proporcionalidade consolidou, jurisprudencialmente, o conceito de razoabilidade, tão relevante e presente nas manifestações da Suprema Corte americana.

Imperioso salientar o texto de Aury Lopes Jr., in verbis:

“Entendemos que a sociedade deve ser compreendida dentro da fenomenologia da coexistência, e não mais como um ente superior, de que dependem os homens que o integram. Inadmissível uma concepção antropomórfica, na qual a sociedade é concebida como um ente gigantesco, no qual os homens são meras células, que lhe devem cega obediência. Nossa atual Constituição e, antes dela, a Declaração Universal dos Direitos Humanos consagram certas limitações necessárias para a coexistência e não toleram tal submissão do homem ao ente superior, essa visão antropomórfica que corresponde a um sistema penal autoritário. Em suma, no processo penal, há que se compreender o conteúdo de sua instrumentalidade, recusar tais construções.”[18]

Destarte, o princípio da proporcionalidade, no que toca à prova ilícita, confere uma prevalência do interesse público frente ao interesse privado, assegurado pelas demais garantias processuais. Nessa linha, admitir-se-ia a prova ilícita, em casos excepcionais e graves, quando a forma de colheita for tida imprescindível e única, pautando-se pela razoabilidade e possibilidade, para tutelar alguns valores fundamentais em detrimento de outros.

A aplicação da regra da proporcionalidade tem sido encarada como inerente ao sistema de coexistência dos direitos fundamentais, não obstante, é um mecanismo de reforço ou de maior tutela a estes direitos, certo que faz prevalecer, no caso de colisão, o de maior relevância ou importância no caso concreto.

Dessarte, não haveria uma violação ou desrespeito do direito fundamental de menor peso no caso concreto, na medida em que se estará, ao contrário, respeitando e proporcionando efetividade a outro direito fundamental, de maior valor e importância.

Acontece que a aplicação pura e simples de tais conceitos no campo das garantias processuais penais, em muitos casos, fará com que se corra risco de não se aceitar ou compreender o próprio conceito de garantia, ou aceitá-lo em palavras, mas desrespeitá-los em atitudes. Não se pode esquecer que as garantias, incluindo as processuais, têm por objetivo eliminar riscos e não apenas reparar destroços ou resultados nocivos.

Numa análise conclusiva, Ada Pellegrini Grinover diz:

“E o que releva dizer é que, embora reconhecendo que o subjetivismo ínsito no princípio da proporcionalidade pode acarretar sérios riscos, alguns autores têm admitido que sua utilização poderia transformar-se no instrumento necessário para a salvaguarda e manutenção de valores conflitantes, desde que aplicado única e exclusivamente em situações tão extraordinárias que levariam a resultados desproporcionais, inusitados e repugnantes se inadmitida a prova ilicitamente colhida”.[19]

Em tempo, faz-se relevante reproduzir uma parte do voto proferido por Eros Grau, enquanto Ministro do Supremo Tribunal Federal, acerca da banalização do princípio em alusão:

“No caso em que ora cogitamos esse falso princípio, estaria sendo vertido em máxima, segundo a qual “não há direitos absolutos”. E, tal como tem sido em nosso tempo pronunciada, dessa máxima se faz gazua apta a arrombar toda e qualquer garantia constitucional. Deveras, a cada direito que se alega, o juiz responderá que esse direito existe, sim, mas não é absoluto, porquanto não se aplica ao caso. E assim se dá o esvaziamento do quanto construímos ao longo de séculos para fazer, de súditos, cidadãos. Diante do inquisidor, não temos qualquer direito. Ou melhor, temos sim, vários, mas como nenhum deles é absoluto, nenhum é reconhecível na oportunidade em que devia acudir-nos. Primeiro essa gazua, em seguida despencando sobre todos, a pretexto da “necessária atividade persecutória do Estado”, a “supremacia do interesse público sobre o individual”. Essa premissa que se pretende prevaleça no Direito Administrativo – não obstante mesmo lá sujeita a debate, aqui impertinente – não tem lugar em matéria penal e processual penal. Essa Corte ensina (HC 80.23, rel. Min. Ilmar Galvão) que a interpretação sistemática da Constituição “leva à conclusão de que a Lei Maior impõe a prevalência do direito à liberdade em detrimento do direito de acusar”. Essa é a proporcionalidade que se impõe em sede processual penal: em caso de conflito de preceitos, prevalece o garantidor da liberdade sobre o que fundamenta a supressão. A nos afastarmos disso, retornaremos à barbárie.”[20]

Insta asseverar, então, quando do emprego do princípio da proporcionalidade pelo magistrado, imprescindível ter cautela face à subjetividade deste princípio, mormente quando da aplicação para aceitar ou rejeitar prova obtida por meios ilícitos. Em verdade, o embasamento jurídico no princípio da proporcionalidade, que visa a recepcionar no processo uma prova tida como ilícita, somente deve incidir em situações extraordinárias, sem olvidar da consideração dos valores em conflito.

2.2.4 Princípio da presunção de inocência

Segundo Aury Lopes Jr., a complexidade do conceito de presunção de inocência faz com que dito princípio atue em diferentes dimensões no processo penal. Contudo, a essência da presunção de inocência pode ser sintetizada na seguinte expressão: dever de tratamento.[21]

Nos ensina o autor, em pertinente texto:

“Esse dever de tratamento atua em duas dimensões, interna e externa ao processo. Dentro do processo, a presunção de inocência implica um dever de tratamento por parte do juiz e do acusador, que deverão efetivamente tratar o réu como inocente, não (ab)usando das medidas cautelares e, principalmente, não olvidando que a partir dela se atribui a carga da prova integralmente ao acusador (em decorrência do dever de tratar o réu como inocente, logo, a presunção deve ser derrubada pelo acusador). Na dimensão externa ao processo, a presunção de inocência impõe limites à publicidade abusiva e à estigmatização do acusado (diante do dever de tratá-lo como inocente).”[22]

Expressamente consagrada no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, este princípio rege o processo penal e, através de sua observância, é possível aferir a qualidade e eficácia da prestação jurisdicional, uma vez que é pressuposto, inclusive, para o desempenho de um processo.

Deveras, a presunção de inocência garante, irrestritamente, a todo e qualquer indivíduo, um prévio estado de não culpabilidade, que somente poderá ser afastado com o surgimento de prova plena da perpetração do delito. Há ressaltar que a presunção de inocência é uma presunção política que garante a liberdade do acusado frente ao interesse social à repressão penal.

Para Gustavo Henrique Badaró:

“A presunção de inocência funciona como regra de tratamento do acusado ao longo do processo, não permitindo que ele seja equiparado ao culpado. É manifestação clara deste último sentido da presunção de inocência a vedação de prisões processuais automáticas ou obrigatórias. A presunção de inocência não veda, porém, toda e qualquer prisão no curso do processo. Desde que se trate de uma prisão com natureza cautelar , fundada em um juízo concreto de sua necessidade, e não em meras presunções abstratas de fuga, periculosidade e outras do mesmo gênero, a prisão será compatível com a presunção de inocência.”[23]

Ao passo de considerar o imputado presumidamente inocente, razoável inferir que não lhe incumbe provar, em todos os aspectos, absolutamente nada.

Isto é, a presunção de inocência deve ser abatida pelo acusador, pois este é o seu ônus indissociável à propositura da ação penal, sem que o acusado (e muito menos o julgador) tenha qualquer dever de contribuir nessa empreitada. Referimos, aqui, ao direito de silêncio – nemo tenetur se detegere.

Muito bem, incumbe à acusação descobrir indícios de autoria e materialidade, com a produção de provas, e à defesa o direito (não dever) de contradizer e impugnar, criando-se controvérsia com a finalidade de afastar sua responsabilidade penal, com a produção de contraprovas.

O julgador, por sua vez, com imparcialidade, tem a tarefa de aferir o suporte probatório, vindo a aceitar os argumentos descritos na exordial acusatória, caso haja prova suficiente que a escore, ou vindo a não aceitar, tendo duas possibilidades para fundamentação: os fatos descritos foram refutados, sendo comprovada a tese defensiva, ou não há prova considerável a amparar a procedência, consagrando-se o in dubio pro reo.

Sendo assim, encaramos indispensável o ensinamento de Aury Lopes Jr.:

“Ao adotarmos a teoria do processo como situação jurídica, de James Goldschmidt, entendemos que no processo penal o acusador inicia com uma imensa “carga probatória”, constituída não apenas pelo ônus de provar o alegado (autoria de um crime), mas também pela necessidade de derrubar a presunção de inocência instituída pela Constituição. Para chegar à sentença favorável (acolhimento da tese acusatória sustentada), ele deve aproveitar as chances do processo (instrução etc.) para liberar‑se dessa carga. À medida que o acusador vai demonstrando as afirmações feitas na inicial, ele se libera da carga e, ao mesmo tempo, enfraquece a presunção (inicial) de inocência, até chegar ao ponto de máxima liberação da carga e consequente desconstrução da presunção de inocência com a sentença penal condenatória. Caso isso não ocorra, a absolvição é um imperativo (regra para o juiz).”[24]

3. Limites constitucionais ao direito à prova

Ao longo da instrução probatória, tanto o magistrado quanto as partes analisam, de maneira intensa e frequente, questões que versam sobre a liberdade, legalidade e, de uma forma mais incisiva, sobre a admissibilidade da prova. Como objeto central de análise deste estudo, há inegável choque entre o direito da produção probatória com o óbice vedativo do meio de produção.

Afirma-se, com convicção, que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal). Nessa toada, abstrai-se do princípio da legalidade de que o Estado-Juiz, sem isentar nenhuma seara da Administração Pública, só poderá fazer aquilo que é permitido por lei, e o indivíduo, não obstante, poderá fazer aquilo que a lei não veda.

Indubitável que alguns direitos fundamentais estão protegidos pela inviolabilidade constitucional, bem assim pelo sigilo.

Como bem salienta Marco Antonio de Barros:

“Destarte, no exercício do seu poder-dever de distribuir justiça, o Estado-Juiz está impedido de sobrepor-se à lei. Sem embargo dos incontáveis instrumentos processuais que podem ser utilizados na execução da tarefa estatal de descobrir a verdade, o certo é que ao juiz não é permitido o vezo de ultrapassar os limites da legalidade na apuração da legalidade.”[25]

3.1 Direito de intimidade

A intimidade pode ser valorada como um direito essencial e inalienável, pois abarca caráter de exclusividade e individualidade, o que remete ao pleno exercício da liberdade numa sociedade.

Pode-se dizer que a privacidade é um direito fundamental do cidadão, vez que é conferido a todos, indistintamente, o isolamento.

O preceito de sigilo vislumbra resguardar a privacidade e a intimidade do homem, também de eventuais intromissões do Estado, para assegurar a todos, o direito de guardar apenas para si aquilo que não pretende compartilhar a terceiros

Mariano da Silva esclarece:

“O sigilo está relacionado com a vontade do interessado de manter secreto um fato. Quando o Estado proíbe a divulgação de um fato, ele entendeu que a violação desse segredo poderia prejudicar a pessoa interessada e de modo reflexo a sociedade, cujos participantes têm o direito de proteção à sua intimidade. Não haveria como o legislador pensar em todos os casos de sigilo existentes, daí por que o conteúdo dele não está discriminado por lei. Logicamente, só haverá a punição daquele que revelar um segredo se os fatos narrados forem verdadeiros”.[26]

Todavia, os direitos fundamentais, sejam eles abarcados por Tratados Internacionais, Pactos, Convenções ou Constituições exemplares, não podem ser vistos como elementos absolutos e, não obstante, irrestringíveis.

Vejamos o que o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 16 de dezembro de 1966, nos artigos 14 e 17, dispõe:

“Art. 14 – Todas as pessoas são iguais perante os tribunais e as cortes de justiça. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida publicamente e com as devidas garantias por um tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei, na apuração de qualquer acusação de caráter penal formulada contra ela ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil. A imprensa e o público poderão ser excluídos de parte ou de totalidade de um julgamento, quer por motivo de moral pública, de ordem pública ou de segurança nacional em uma sociedade democrática, quer quando o interesse da vida privada das Partes o exija, em circunstâncias específicas, nas quais a publicidade venha a prejudicar os interesses da justiça; entretanto, qualquer sentença proferida em matéria penal ou civil deverá tornar-se pública, a menos que o interesse de menores exija o procedimento oposto ou o processo diga respeito a controvérsias matrimoniais ou à tutela de menores.”

Depreende-se deste artigo que, com o viés de garantir a privacidade do jurisdicionando, não será viável a participação da imprensa e, também, do público em julgamentos que denotem uma intromissão à vida privada. Com isso, vislumbra-se fortalecer os ideiais de uma sociedade democrática, em congruência com os interesses da justiça.

Já o artigo 17 concerne à proteção da vida privada:

“Art. 17 – Ninguém poderá ser objeto de ingerências arbitrárias ou legais em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra e reputação. Toda pessoa terá direito à proteção da lei contra essas ingerências ou ofensas.”

A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, assinada em São José da Costa Rica, em 1969, prevê, em seu artigo 11, a proteção à intimidade:

“Art. 11 – Proteção da honra e da dignidade.

§1º – Toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade.

§2º – Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na de sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação.”

Por consequência da tutela ao longo do tempo, inseriu-se, de maneira mais expansiva, a previsão de proteção ao direito de intimidade na Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, inciso X: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Com isso, estabeleceu-se que é exigível o limite à sociedade para a preservação da individualidade do cidadão. A interferência estatal deve respeitar certos parâmetros ocasionais, bem como extraordinários, para obter informações de ordem privada, que, tão somente, pertinem ao próprio indivíduo.

 Contrario sensu, o indivíduo não é obrigado a compartilhar e publicitar todos os atos de ordem pessoal que o atinem, certo que a acessibilidade a tais atos carece de autorização, sem nenhuma possibilidade de intervenção curiosa.

O sacrifício do direito que protege a privacidade só deve ocorrer quando se está numa situação de extrema necessidade e pertinência, através de legítima investigação do Estado, ao passo deste ato ser inevitável para alcançar o bem maior.

Ada Pellegrini Grinover salienta:

“Como vimos, a intimidade representa um aspecto vital do qual o indivíduo necessita para poder desenvolver sua personalidade livre e harmoniosamente, ao abrigo de interferências arbitrárias. Com base nesse conceito, o direito à intimidade há de ser reconhecido como fator primordial em qualquer sistema de liberdades públicas, e no ordenamento do nosso país, sua constitucionalização é feita por intermédio do disposto no § 36 do art. 153, o qual, em última análise, configura a proibição de considerar como numerus clausus o elenco constitucional de determinados direitos.”[27]

Portanto, é plenamente admissível que a privacidade, honra e imagem do suspeito de estar envolvido com o crime não sejam intocáveis, pois, do contrário, o sucesso da investigação criminal estaria vulnerável. Todavia, o curso da investigação criminal deve observar as garantias constitucionais que tangem à privacidade, sob pena de nulidade.

As autoridades policiais devem agir em consonância com o estrito cumprimento do dever legal e respeitar os limites basilares da necessidade e adequação dos atos públicos, visto que a superação de tais valores não se opera por arbítrio do agente, e sim pelas normas de Direito que orientam a procedibilidade do jus puniendi.

Grinover conclui:

“O ordenamento jurídico não pode ser concebido senão como um sistema de limitações recíprocas dos diversos direitos subjetivos nele existentes, a fim de que possam coexistir em plena harmonia. Por outro lado, não se pode descurar a função social das liberdades públicas, a ser assinalada também no que concerne ao direito à intimidade.”[28]

3.2 Inviolabilidade de domicílio

Com previsão na Constituição Federal, a inviolabilidade de domicílio é um dos direitos fundamentais mais antigos da história. A casa é o asilo do indivíduo, um dos componentes de dignidade da vida privada, sendo certo que a omissão de tal inviolabilidade acarretaria em vulnerar, por completo, a preservação da intimidade pessoal.

O professor Adalberto Camargo Aranha preleciona que:

“Constitucionalmente, a casa é o local onde exercido o direito à privacidade, à intimidade e à vida privada, assegurada a sua proteção e segurança ao ser proibido que nela se penetre, salvo com o consentimento do morador, a não ser no flagrante delito (segurança individual) ou desastre, ou para prestar socorro, ou por determinação judicial (durante o dia), esta última com a finalidade específica de busca e apreensão de criminosos ou de objetos do crime”.[29]

Sendo assim, é de se constatar que a Lei Maior não impôs tal restrição à inviolabilidade de domicílio como absoluta, excepcionando-a, por sua vez, nos casos previstos no próprio artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal, ou caso a entrada seja franqueada pelo morador.

Todavia, uma pergunta surge com a explanação discorrida acima: A prova auferida em flagrante, no interior da residência, sem a autorização de entrada pelo morador ou mandado judicial, é considerada ilícita?

Na doutrina atual e majoritária, afere-se inquestionável que os indícios do acontecimento de um crime devem estar bem fundados e evidentes para legitimar a entrada na casa e, por via de consequência, a prova da materialidade obtida em flagrante, senão cai por terra a imprescindibilidade da ação.

Pois bem, para a validade da prova obtida através de invasão de domícilio, sem a imperiosa e condicionante autorização judicial, estipula-se, consonante entendimento de Camargo Aranha, dois requisitos:

a) Primeiramente, o crime em alusão deve exigir a imediata intervenção de um terceiro (não sendo, necessariamente, policial) como medida de proteção à vítima, visto que só assim se estará cumprindo, com rigor, a excepcionalidade constitucional que se vincula à segurança.

b) Que haja, ao menos, convicção suficiente e razoável, instruídas com elementos preexistentes capazes de demonstrar a ocorrência efetiva e imediata de um crime naquele local, ou seja, não basta uma mera suspeita.

Válido citar Aury Lopes Jr.:

“Dessarte, não se deve pensar em busca (e apreensão) desconectada do direito fundamental da intimidade e vida privada (art. 5º, X), até porque a tutela do domicílio guarda uma conexão instrumental com esses direitos fundamentais e, todos eles, com o valor dignidade da pessoa humana. Isso gera reflexos na eficácia dos limites legais estabelecidos para a busca (e apreensão), na medida em que não se tutela apenas o espaço físico ou a propriedade. Também impõe, entre outros, limites à divulgação do material encontrado, diga ele respeito ao fato investigado ou não”.[30]

Portanto, deve-se manter o foco no ideal de equilíbrio, de aferição entre os direitos e interesses em xeque, numa perspectiva de se evitar, à luz da proporcionalidade, o excesso de intervenção e restrição dos direitos fundamentais.

Se já é considerada exceção, a violação de domicílio amparada por um mandado judicial, cuja autorização – visto a pertinência e necessidade – é emitida por um magistrado que realiza um juízo de valor, num contexto de investigação criminal, o que dizer da exigência de uma violação a domicílio cujo amparamento está vinculado a um flagrante delito, ou seja, exceção da exceção? A demonstração do fumus comissi delicti deve estar evidente e sólido, pautado na certeza, com suficiente lastro fático, senão a ilicitude que é flagrante.

A inviolabilidade do domicílio é tão relevante, aos olhos da Constituição da República, que está previsto o crime de violação de domicílio no artigo 150 do Código Penal, nos casos em que não há observância dos requisitos para sua excepcionalidade.

3.3Inviolabilidade do sigilo da correspondência e das telecomunicações

O direito à intimidade, numa análise ampla, abarca a preservação do segredo, que é nada mais do que a reserva de um conhecimento particular, isto é, oculto. Por sua vez, o sigilo é, especificamente, um meio ou instrumento utilizado pelo interessado para manter inacessível, em sua integralidade, uma informação ou fato.

O sigilo está relacionado com a vontade e interesse do indivíduo ou, até mesmo do Estado. Acontece que, ante a imperiosidade de garantir ao indivíduo a liberdade de comunicar-se sem a fragilidade desse ato ser utilizado como prova contra si, firmou-se, no texto constitucional, a inviolabilidade do sigilo da correspondência e das telecomunicações:

“XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;”

A complementação do referido inciso veio por intermédio da promulgação da Lei 9.296/96.

Especial é o tratamento de Torquato Avolio referente à matéria:

“Os mesmos princípios que informam o estabelecimento da inadmissibilidade e ineficácia das provas obtidas por meios ilícitos atuam, pois, em relação às captações eletrônicas da prova, com consequências, todavia, diversas para as interceptações telefônicas e as gravações clandestinas. Como valores de fundo, voltam a se confrontar, de modo geral, de um lado, a necessidade de se prover o Estado de meios eficazes de luta à criminalidade organizada e, de outro lado, as liberdades públicas; e, em determinados casos, dando margem à aplicação da teoria da proporcionalidade,a liberdade pessoal em face do direito à intimidade.”[31]

Logo, patente o confronto entre a inadmissibilidade e ineficácia processuais das provas obtidas por meios ilícitos com a necessidade de não privar o Estado dos instrumentos necessários à luta contra a criminalidade organizada. Nessa toada, criou-se a regulamentação para disciplinar, rigorosamente, os meios eletrônicos de captação.

Busca-se, assim, no ordenamento jurídico, uma forma de resolução das diversas indagações decorrentes da utilização do conteúdo de comunicação – seja via correspondência ou via telefônica – como prova. Afere-se que o artigo 183 do Código Penal pune a divulgação de segredo, delimitando a sua licitude. Conforme o aludido artigo, depreende-se que é criminosa e, portanto, ilícita a conduta do terceiro – estranho à relação – que divulga ou obtém acesso (vez que é restrito) do conteúdo da comunicação.

Com efeito, apesar do direito fundamental da inviolabilidade, a interceptação de uma correspondência deve ser admitida quando justificada por questões de segurança pública ou nos casos em que estiverem sendo utilizadas como instrumento para práticas ilícitas. Assim, a apreensão de cartas no âmbito domiciliar somente pode ser admitida quando houver determinação específica no mandado judicial ou quando houver clara e inequívoca pertinência com o crime objeto da investigação.

Ada Pellegrini Grinover reflete sobre o objetivo da tutela constitucional:

“Por outro lado, a natureza privada do pensamento assim comunicado é relevante no que concerne ao segredo da correspondência, de modo que o sigilo é garantido constitucionalmente, como direito fundamental, em inúmeros ordenamentos, porque se quis tutelar a vontade do sujeito no sentido de que determinadas notícias fossem conhecidas somente por parte daquele a quem se desejou comunicá-las. Deriva daí que a tutela constitucional não depende do fato de as notícias comunicadas ou transmitidas serem secretas, no sentido de dar a conhecer alguma notícia apenas a outro sujeito, por ele determinado.

De acordo com a tutela constitucional, trata-se, portanto, de uma presunção absoluta de intimidade pessoal sobre aquilo que é comunicação por carta, telegrama ou telefone a determinado destinatário”.[32]

Neste raciocínio, a aferição da justa causa abarca a aplicação do princípio da proporcionalidade, certo que a utilização do conteúdo ali resguardado só é justificável quando há necessidade de se protegar um bem de maior valor do que o objeto preservado pelo sigilo, desde que esteja, sobretudo, sob a égide da Constituição Federal.

A propósito, o provimento que autoriza a interceptação tem natureza cautelar, visando a assegurar as provar pela fixação fática (no exato momento em que acontecem, de modo que não se perca a possibilidade de acesso). Ao passo disso, a operação só pode ser autorizada quando presentes os requisitos que justificam as medidas cautelares (fumus boni juris e periculum in mora), sem olvidar de que a ordem, imprescindivelmente, deve ser motivada.

Com propriedade, Aury Lopes Jr. afirma:

“Ademais, quando se trata de restrição de direitos fundamentais, a leitura deve sempre ser restritiva e a aplicação devidamente legitimada, pois não se presume a legitimidade da restrição, todo o oposto. A regra é a liberdade, em sentido amplo, ou seja, ‘el derecho al libre desarrollo de la personalidad’, sendo as formas de restrição, exceções, que devem sempre ser legitimadas e restritivamente aplicadas”.[33]

A Lei n. 9.296/96 disciplina a interceptação telefônica em sentido estrito, isto é, em que um terceiro capta os sinais de comunicação telefônica alheia, sem a ciência dos seus interlocutores. Todavia, a lei não define as hipóteses em que é cabível a interceptação telefefônica, mas, no art. 2º, define os casos em que não comporta a decretação da medida.

Entedemos, data vênia, que esta não é a melhor forma de disciplinar uma medida de intervenção, a julgar, inclusive, que esta medida acarreta em restrição de direito fundamental (livre comunicação). Ora, se a regra é a liberdade de comunicação, deveria o legislador disciplinar, de maneira estrita e expressa, as hipóteses em que seria admitível a quebra do sigilo.

Importa mencionar, por fim, Ada Pellegrini Grinover:

“Para nós, “direito à intimidade”, genericamente, compreende tanto o direito ao segredo quanto o direito à reserva, reconhecendo-se nele dois momentos de um único direito, que é um só, como também um só é o bem tutelado. As infrações a este único direito é que podem tomar contornos diversos, consoante se trate de atos de devassa, clandestina ou abusiva, ou de atos de divulgação de dados obtidos lícita ou ilicitamente. Violada, nesse caso, será sempre a intimidade, ainda que se prefira falar, em sentido estrito, em segredo, no primeiro caso, e em reserva, no segundo.”[34]

3.4 Inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos

Pois bem, agora começaremos a tratar com mais intimidade o tema escolhido como objeto principal deste trabalho monográfico.

A questão em tela tange, juridicamente, no que toca à investigação da relação entre o ilícito e o inadmissível no procedimento probatório e, sob a ótica da política legislativa, no que cerne à encruzilhada entre a busca da verdade em defesa da sociedade e o respeito a todos os direitos fundamentais (constitucionais) que podem ser mitigados em razão da investigação.

A doutrina brasileira tem empregado a distinção proposta por Ada Pellegrini Grinover que, com base em Nuvolone, considera que provas contrárias à lei pertencem ao gênero “provas ilegais”, que, por sua vez, dividem-se em duas espécies: provas ilegítimas e provas ilícitas.

Posto isso, a vedação estebelece-se quer pela lei processual, quer pela norma material (constitucional ou penal); pode, ainda, ser expressa ou pode, implicitamente, ser deduzida dos princípios gerais.

A Constituição Federal, ao passo de assegurar a inadmissibilidade processual da prova ilícita, estabeleceu uma ponte entre os planos do direito material e processual. Acontece que a inadmissibilidade é uma sanção, afigurada por uma violação de regra material. Com isso, uma violação de regra material (como vimos antes, por exemplo, no caso de violação de correspondência) passou a ter, inobstante uma sanção material (a pena pelo crime de violação de correspondência), também uma sanção processual.

Em suma, as provas ilícitas, atualmente, são sancionadas tanto no plano material, com pena pelo delito correspondente, como no campo processual, com a inadmissibilidade de tal prova.

Nas palavras de Gustavo Badaró:

“Poder-se-ia imaginar que a vedação da utilização da prova ilícita representa uma indevida limitação à busca da verdade material e ao próprio livre convencimento do juiz. Todavia, como já destacado, a própria busca da verdade real não é ilimitada e não representa um fim que possa ser atingido a qualquer custo. No processo e, principalmente, na atividade probatória, os fins são tão importantes quanto os meios. Por outro lado, a livre valoração da prova deve ser entendida no contexto do material probatório validamente produzido. A valoração da prova, como momento do processo dinâmico da atividade probatória, se insere na última etapa, após a admissão e a produção da prova. Nas fases prévias, porém, devem ser inadmitidas ou excluídas as provas por meios ilícitos “.[35]

 Nessa senda, a despeito de a Constituição considerar, expressamente, as provas obtidas por meios ilícitos inadmissíveis no processo, a Lei Maior não estabelece, entretanto, de forma explícita, a consequência que deriva da admissão dessa prova ilícita no processo, mesmo esbarrando em tal vedação constitucional.

Diante disso, a doutrina posicionava-se consoante entendimento de Grinover, Magalhães Gomes Filho e Scarance Fernandes, no sentido de que “as provas ilícitas, sendo consideradas pela Constituição, e agora pela lei, inadmissíveis, não são tidas como provas. Trata-se de não ato, de não prova, que as reconduz à categoria de inexistência jurídica. Elas simplesmente não existem como provas: não tem aptidão para surgirem como provas. Daí sua total ineficácia”.[36]

Com o advento da nova redação do artigo 157 do Código de Processo Penal, o desentranhamento da prova ilícita foi expressamente prevista.

A corroborar a inadmissibilidade, bem como a inflexibilidade do tema em testilha, numa interpretação literal do texto constitucional, Humberto Fabretti, Alexis Brito e Marco Antônio nos ensinam:

“Entendemos que a prova ilícita jamais poderá ser utilizada.Diante da literalidade do texto constitucional, qualquer outra interpretação seria flexibilizar demais uma cláusula pétrea, o que impossibilitaria qualquer limitação a outras flexibilizações. E em qualquer caso, seja a favor ou contra o réu. O que não se pode permitir é que o Estado atue ilegalmente, seja na produção da prova ou em sua aceitação, no caso, pelo juiz que, ao considerá-la, estará legitimando a ilegalidade. É um contrasenso e aberração jurídica permitir que o Estado atue ilegalmente, sob pena de negar sua própria existência.”[37]

Todavia, também há mencionar a crítica feita por Aury Lopes Jr.

“A crítica é exatamente em relação à “absolutzação” da vedaçõ, num momento em que a ciência (desde a teoria da relatividade) e o próprio direito constitucional negam o caráter absoluto de regras e direitos. Para nós, desde Einstein, não há mais espaço para tais teorias que têm a pretensão de serem “absolutas”, ainda mais quando é evidente que todo saber é datado e tem prazo de validade e, principalmente, que a Constituição, como qualquer lei, já nasce velha, diante da incrível velocidade do ritmo social. Logo, a inadmissibilidade absoluta tem a absurda pretensão de conter uma razão universal e universalizante, que pode(ria) prescindir da ponderação exigida pela complexidade que envolve cada caso na sua especificidade”.[38]

Há coerência e nexo nessa análise, visto que, nos casos em que o juiz se depara com a prova ilícita ou ilegítima, na esteira da instrução processual, esta não pode exercer nenhuma influência em seu decisório, a julgar inexistente sua aptidão de fazer parte do conjunto probatório amealhado aos autos.

Ainda que retirada dos autos, apresentando-se inservível para formação da persuasão racional, a prova ilícita pode interferir na consciência do julgador, que é ser humano, vulnerável à intromissão de emoções e sensações que podem surgir, ao descobrir fato relevante obtido por meio ilícito; entretanto, se não houver provas lícitas e legítimas que escorem a condenação, a consagração do princípio do in dubio pro reo é de rigor.

Posto isso, podemos depreender que, sob a expressa vedação (inadmissibilidade processual) das provas ilícitas, a Constituição Federal encara a prova materialmente ilícita da mesma sorte que processualmente ilegítima. No tópico seguinte, destrinchar-se-á a diferenciação entre as provas ilícitas e ilegítimas.

4. Distinção entre prova ilícita e prova ilegítima

Partindo do princípio de que a prova ilegal é o gênero, do qual são espécies a prova ilícita e a prova ilegítima, pode-se dizer que a prova ilegítima é aquela que abarca violação de uma regra de direito processual penal no momento da sua produção em juízo, na esteira do processo.

Entende-se por ilegitimidade probatória aquela proibição de natureza unicamente processual, quando há interferência nos interesses concernentes à lógica, bem como à finalidade do próprio processo. É, de maneira simples e objetiva, a inobservância às formalidades dos atos processuais.

Por sua vez, a prova ilícita é aquela cuja violação está atrelada à uma regra de direito material ou constitucional no momento de se perfazer, anterior ou concomitante ao processo, todavia, sempre exterior a este (fora do processo).

Não obstante servir, com imediatidade, a interesses processuais, a prova ilícita está atrelada, substancial e fundamentalmente, aos direitos que o ordenamento reconhece aos indivíduos, de maneira independente do processo.

Pois bem, Gustavo Badaró pondera que:

“Quanto ao momento, afirma-se que, na prova ilícita, o vício ocorre quando de sua obtenção (por exemplo, no momento em que se capta a conversa telefônica), enquanto na prova ilegítima a ilegalidade ocorre na sua produção (por exemplo, no momento em que se indefere a pergunta à testemunha). Embora normalmente a ilicitude se dê relativamente à obtenção de uma prova, isto é, durante a execução de um meio obtenção de prova (por exemplo, uma interceptação telefônica ou busca e apreensão), é possível que a ilicitude ocorra no próprio processo, durante a produção da prova. Basta tomar o “soro da verdade”, durante seu interrogatório. Haverá ilicitude na produção de um meio de prova durante a instrução processual. Se um padre prestar depoimento sobre algo que teve conhecimento durante uma confissão, o vício que acarretará a ilicitude da prova testemunhal se dará na própria produção do meio de prova”.[39]

 Sob o prisma do convencimento do julgador, há de se ressaltar que tanto a prova obtida por meios ilícitos quanto a prova produzida ilegitimamente não poderão ser utilizadas para fundamentar o decisum.

Não podemos, portanto, ignorar que a regulamentação processual, no que toca, mais precisamente, à admissão e produção das provas, tem por objetivo precípuo uma correta seleção do material que o juiz terá contato para a formação de seu convencimento (persuasão racional).

Já no que diz respeito à sanção processual, pertinente afirmar que a prova ilícita é inadmissível, de modo que o seu ingresso ao processo é evitável, enquanto a prova ilegítima será alvo de uma nulidade, ou seja, será taxada como nula – ex post factum.

Outra distinção importante a ser analisada vem ao encontro do art. 573 do Código de Processo Penal, vez que o ato que compreende a prova ilegítima pode ser renovado, o que não acontece quando se trata de uma prova ilícita, que é, por sua vez, irrenovável.

Acerca disso, o douto Gustavo Badaró aduz:

“Mesmo no campo probatório, não é desarrazoado considerar que, em relação a determinados meios de prova, a violação de uma regra processual poderá comprometer definitivamente a capacidade epistêmica de tal meio. Por exemplo, um reconhecimento pessoal realizado sem a observância do rito probatório do art. 226 do CPP, em que o único suspeito seja levado à presença da vítima para que esta o reconheça – ou não – como autor do crime. Mesmo que tal prova, com resultado positivo, seja anulada, é de se questionar a possibilidade de repetir tal ato posteriormente, segundo o rito adequado, em virtude do grande potencial de sugetionabilidade que a prova ilegitimamente produzida causa. No segundo ato de reconhecimento, a vítima provavelmente reconheceria o acusado não porque se lembraria dele na cena delitiva, mas porque se recordaria dele no reconhecimento ilegítimo anterior.”[40]

Deveras, a inadmissibilidade impede o ingresso de uma prova ilícita no processo, fato que não ocorre nas teorias das nulidades, já que o âmbito deste último é estritamente processual – nasce e morre no bojo do processo.

Entretanto, há uma grande incidência do reconhecimento de provas ilícitas a posteriori, quando o meio proibido já foi empregado para trazer a prova contaminada ao processo (por exemplo, reconhece-se a ilicitude de uma interceptação telefônica só depois de já estar nos autos o laudo de degravação com o conteúdo das conversas). Neste caso, a inadmissibilidade (vedar a entrada da prova no processo) não será a consequência afigurada no reconhecimento da ilicitude, e sim o desentranhamento (excluir dos autos).

Portanto, pode-se concluir que, numa perspectiva de dinâmica procedimental, mais relevante que distinguir, conceitualmente, a aplicação entre nulidade e inadmissibilidade, é contemplar a previsão da inutilizabilidade da prova ilícita, impossibilitando a sua valoração.

Posto isso, imperioso tecer, com altíssima relevância, que não há olvidar de que as linhas que demarcam a distinção entre prova ilícita e prova ilegítima, ao passo de estarem abstratamente bem demarcadas, na prática, muitas vezes mostram-se apagadas ou inseguras. Isso acontece porque, em muitos casos, ocorre violações de dispositivos constitucionais ou legais que teriam um aspecto bifronte, sendo viável a interpretação, de um lado, como uma garantia constitucional de proteção das liberdades públicas, e, de outro, como um regramento processual delimitando os mecanismos para realização de um meio de prova ou de obtenção de prova.

Por exemplo: Uma interceptação telefônica autorizada por um juiz incompetente será considerada prova ilícita ou ilegítima?

Neste exemplo, será que se violou uma regra constitucional que assegura a liberdade de comunicação, a qual somente pode ser restringida mediante uma autorização do juízo competente? Ou a regra constitucional foi observada, vez que há autorização judicial, entretanto, desrespeitou-se uma regra processual de repartição de competência?

Substancialmente, não há negar que os meios de obtenção de provas foram abrangem a violação de regras constitucionais e legais, prejudicando os direitos do acusado ou investigado. De modo que, por si só, já impede que a prova auferida seja utilizada para a formação de convencimento judicial, que somente pode se fundar em meios legais de produção probatória.

Nessa esteira, certa e convictamente, podemos aduzir que entre os direitos constitucionais cuja violação configura uma prova ilegal – ilícita ou ilegítima –, devem estar elencados os direitos processuais, em especial as garantias constitucionais dos acusados, que formam o devido processo legal: contraditório; juiz natural; persuasão racional; presunção de inocência; ampla defesa; publicidade.

5. Teorias sobre a admissibilidade da prova ilícita

Consoante a doutrina, há duas teorias que se destacam pelo viés de admissibilidade da prova ilícita, certo que uma é radicalmente a favor e outra busca um equilíbrio entre os valores em jogo – princípios fundamentais a serem restringidos em prol do sucesso da investigação.

Pois bem, para a primeira corrente (Cordero, Tornaghi, Mendonça Lima), somente as provas violadoras de uma norma instrumental (ilegítimas) podem ser rejeitadas no processo, visto que são as únicas que dispõem de uma sanção eminentemente processual.

Com isso, acredita-se que violação de uma norma materialtraz a sua sanção específica, que está longe de sua inutilização no processo. Camargo Aranha nos esclarece:

“[…] na prova ilícita reconhece-se a ofensa ao direito material, devendo ser aplicada ao ofensor a sanção correspondente, a penalidade adequada; todavia, não pode ser afastada do processo, pois neste só podem ser rejeitadas as ofensas com sanção especificamente processual”.[41]

Nessa senda, a corrente pugna pela aceitabilidade da prova obtida através, por exemplo, de uma conversa telefônica interceptda, processando-se, no entanto, o ofensor pela inobservância dos requisitos da lei. Então, criou-se uma expressão: male captum, bene retentum (mal colhida porém bem produzida).

 Noutra perspectiva, para a segunda corrente (Baur, Barbosa Moreira, Renato Maciel, Hermano Duval, Camargo Aranha, Moniz Aragão), admite-se a produção de uma prova obtida por meios ilícitos, violando-se, portanto, uma norma constitucional, em situações excepcionais quando, no caso, objetiva-se tutelar valores mais relevantes do que aqueles infrigidos na colheita da prova.

A partir disso, exercer-se-á o juízo do princípio da proporcionalidade, como apreciaremos, com mais propriedade, agora.

5.1 Admissibilidade em razão da teoria da proporcionalidade

Para esta corrente, a prova ilícita, em determinados casos, face à relevância da preservação e proteção do interesse público, poderia ser admitida. Portanto, há um abrandamento da regra (proibição) para promover a utilização da prova ilícita, em casos excepcionais e urgentes, quando o meio selecionado para obtenção da prova for considerado o único viável, em proteção a outros valores fundamentais.

Na visão de Aury Lopes Jr.:

“[…] o perigo dessa teoria é imenso, na medida em que o próprio conceito de proporcionalidade é constantemente manipulado e servera qualquer senhor. Basta ver a quantidade imensa de decisões e até de juristas que ainda operam no reducionismo binário do interesse público x interesse privado, para justificar a restrição de direitos fundamentais (e, no caso, até a condenação) a partir da “prevalência” do interesse público.”[42]

Realmente, há destacar o perigo de produzir um grave retrocesso no âmbito processual, a julgar que se trata de um conceito jurídico indeterminado e, assim, torna-se manipulável, vulnerando a direitos fundamentais.

Uma vez que a irrebatível eliminação da prova ilícita do processo pode ensejar graves distorções para a justa aplicação do direito, o princípio da proporcionalidade viabiliza a utilização dessas provas maculadas no processo, logicamente que em caráter excepcional e, sobretudo, em casos extremamente graves, nas circunstâncias sensíveis em que o direito tutelado é mais importante.

 Por meio do critério da proporcionalidade, afere-se a ilicitude e, por via de consequência, a inutilização da prova colhida ilegalmente; ao mesmo tempo, é possível abrandar-se a proibição, quando a prova ilícita versar sobre outros valores fundamentais.

Com efeito, trata-se de uma questão de ponderação, sempre sob o norte da excepcionalidade do caso concreto, entre os valores que foram feridos pela ilicitude da prova e aqueles protegidos na seara processual.

5.2 Repercussão da prova ilícita

Ao passo de a prova ilícita imiscuir-se no conjunto probatório coligido no processo, a solução mais coerente e plausível é a sua exclusão, por meio de desentranhamento dos autos.

Sendo assim, caso o juiz não determine o desentranhamento de ofício, reputa-se plenamente cabível a parte requerê-lo. Conforme nos ensina Antonio Scarance Fernandes:

Quando a prova ilícita foi obtida no inquérito policial, pode haver duas situações: na primeira, a prova é fundamental para o oferecimento da denúncia que, sem ela, não seria ofertada; na segunda, a prova não impediria a acusação porque outros elementos indiciários a justificavam

Na primeira situação, o Ministério Público sem a prova não conseguiria acusar, e, assim, se o desentranhamento impossibilitar a renovação da prova, pode a parte, desde logo, pleitear por habeas corpus a declaração de ilicitude da prova, o seu desentranhamento e o trancamento do inquérito policial por falta de justa causa para a continuidade da investigação. Isso pode suceder, por exemplo, quando a apreensão de substância entorpecente foi feita por meio ilícito, pois, sem essa apreensão, considerada ilícita, não haveria como demonstrar a materialidade do crime”.[43]

Em continuação ao raciocínio e desenvolvimento do processo, nas ocasiões em que a prova ilícita adentra ao processo após o recebimento da denúncia, poder-se-á levantar a questão da ilicitude em qualquer momento por petição ou em sede de alegações finais.

Nesse diapasão, também pertine destacar a interação que o juiz faz com a prova ilícita, independente de um eventual desentranhamento dos autos. Alexis Brito, Humberto Fabretti e Marco Antônio tratam disso com singularidade:

Contudo, o desentranhamento da prova ilícita do processo pode não garantir a imparcialidade do juiz, já que se houver tomado conhecimento da prova, esta poderá tê-lo influenciado de alguma forma. Foi pensando nisso que, para garantir a imparcialidade do julgamento, na alteração legal promovida pela Lei n. 11.690/08 existia a previsão, no § 4º do art. 157 do Código de Processo Penal, de que o juiz que tomasse conhecimento da prova declarada ilícita estaria impedido de julgar o feito. Tal previsão configuraria uma demonstração de enorme avanço e respeito ao devido processo legal e ao Estado de Direito que se pretende atingir no âmbito processual. Contudo, houve veto presidencial ao dispositivo nos seguintes termos: “o objetivo primordial da reforma processual penal consubstanciada, entre outros, no presente projeto de lei, é imprimir celeridade e simplicidade ao desfecho do processo e assegurar a prestação jurisdicional em condições adequadas. O referido dispositivo vai de encontro a tal movimento, uma vez que pode causar transtornos razoáveis ao andamento processual, ao obrigar que o juiz que fez toda a instrução processual deva ser, eventualmente, substituído por outro que nem sequer conhece o caso” (…)

Não podemos concordar com tais motivos, pois entender que a razão primordial da reforma é a celeridade e não a prestação jurisdicional correta é desfigurar a própria natureza do processo. Ademais, alegar que a substituição do juiz provocaria tumulto processual é insinuar que o Estado tem por praxe utilização de provas ilícitas e não o contrário.”[44]

Muitos doutrinadores abordam a temática sob a ótica de que se trata, prioritariamente, de um respeito ao devido processo legal, de modo que o processo penal não pode compactuar a prática de atos ilegais, afigurando-se como insrumento de legitimação para tanto.

Sem olvidar, contudo, que a maioria dos casos cuja discussão da prova ilícita está presente abrange atos ilegais praticados por agentes do Estado.

Aury Lopes Jr. enfatiza muito bem a problematização vivida na prática forense:

“A desconsideração de que se opera uma grave contaminação psicológica (consciente ou inconsciente) do julgador faz com que a discussão seja ainda mais reducionista. Esse conjunto de fatores psicológicos que afetam o ato de julgar deveria merecer atenção muito maior por parte dos juristas, especialmente dos tribunais, cuja postura até agora tem se pautado por uma visão positivista, cartesiana até, na medida em que separa emoção e razão, o que se revela absolutamente equivocado no atual nível de evolução do processo”.[45]

Sendo assim, haja vista o posicionamento dos tribunais, que não anulam a sentença sob a justificativa de que a prova ilícita, uma vez que não foi mencionada na decisão, não integrou o convencimento do julgador, sendo irrelevante, portanto.

Nessa senda, compreende-se que se o juiz não fundamentar, de maneira expressa, a sua decisão na prova ilícita, demonstrando, inequivoca e indubitavelmente, que aquela prova teve relevante participação na formação de seu livre convencimento, muit improvável que aquela sentença será reformada, sob a alegação da incidência de prova ilícita.

Segundo as palavras do aludido doutrinador:

Não concordamos com o entendimento de que, se no processo existir alguma prova ilícita, a sentença condenatória somente será anulada se ficar demonstrado que ela se baseou exclusivamente nessa prova. Tampouco podemos admitir a tal “exclusão mental”, fruto de uma visão positivista e cartesiana, como se o ato de julgar fosse algo compartimentalizado, mecânico, de que se pudesse excluir alguma peça sem comprometer o funcionamento do motor…quando, na verdade, é todo o oposto!”[46]

De fato, a nulidade da sentença deve ocorrer, nos casos em que há constatação da prova ilícita, mesmo quando a decisão não a mencione, vez que não se pode concluir que o convencimento do juiz foi formado, única e exclusivamente, pelo suporte probatório lícito coligido nos autos.

O que está em jogo, na verdade, é a garantia da jurisdição – que vai muito além da observância do juiz natural, imparcial, etc. – uma vez que o seu reconhecimento está diretamente ligado com a própria qualidade da prestação jurisdicional.

Necessário que se proteja o sistema como um todo, ao passo de se ter a certeza de que o jurisdicionando somente será julgado com base em provas judicializadas (e não com base nos atos pré-processuais, no âmbito investigativo), com o pleno cumprimento das regras inerentes ao devido processo legal.

5.3 Prova ilícita pro reo

A prova ilícita pro reo é uma manifestação do princípio da proporcionalidade, sob a ótica do direito de defesa, visto que sua incidência reside em infringência a direitos fundamentais – podendo ser próprio ou de terceiros – para comprovar no processo sua inocência.

Nessa esteira de raciocínio, a admissibilidade da prova ilícita versa sobre uma ponderação entre o direito de liberdade de um susposto inocente e um eventual direito inobservado na obtenção da prova, prevalecendo, portanto, o primeiro.

Não obstante, depreende-se que, na ocasião de a prova ser colhida pelo próprio acusado, a ilicitude é eliminada por causas legais, isto é, a antijuridicidade é excluída com fundamento na legítima defesa.

Salienta Aury Lopes Jr.:

“[…] deve-se recordar que o réu estaria, quando da obtenção (ilícita) da prova, acobertado pelas excludentes da legítima defesa ou do estado de necessidade, conforme o caso. Também é perfeitamente sustentável a tese de inexigibilidade de conduta diversa (excluindo agora a culpabilidade). Tais excludentes afastariam a ilicitude da conduta e da própria prova, legitimando seu uso no processo”.[47]

Da mesma sorte, destaca-se que a vedação à utilização da prova obtida por meio ilícito é uma garantia do particular em face do Estado, certo que, partindo desse pressuposto, a prova eivada de vício só não poderia ser utilizada pelo Estado em desfavor do acusado.

Guilherme de Souza Nucci assevera no que toca à ponderação de princípios atrelados à liberdade individual, inclusive, a presunção de inocência e a ampla defesa, in verbis:

“Abre-se, entretanto, a indispensável exceção, quando se estiver inserido no cenário do confronto entre a prova ilícita e a inocência do réu. Neste caso específico, continua a ser utilizado o critério da proporcionalidade, devendo-se, se necessário, utilizar a prova ilícita para garantir a absolvição do acusado, independentemente das medidas que possam ser tomadas contra o autor da obtenção da referida prova. A vedação à utilização da prova ilícita no processo se choca com a presunção de inocência e com a ampla defesa, merecendo prevalecer estes últimos princípios, pois vinculados à liberdade individual. O outro princípio conecta-se ao processo e à atuação do Estado, razão pela qual, axiologicamente, é menos relevante”.[48]

A corrente que entende a viabilidade de utilizar-se a prova obtida por meio ilícito pro reo enaltece que os princípios e remédios constitucionais sobrepõem-se à norma constitucional que veda a utilização de prova ilícita, nos casos que esta é usada em favor do réu.

Mariano da Silva aduz que:

“Portanto, se for possível ao acusado demonstrar sua inocência através de uma prova obtida ilicitamente, certamente ela poderá ser utilizada no processo, haja vista a preponderância do direito à liberdade sobre a inadmissibilidade da prova ilícita no âmbito processual. Trata-se da aplicação do princípio da proporcionalidade em benefício do acusado.”[49]

A despeito da relevância dos fundamentos expostos, há outro aspecto pendente de comentário, a saber, o reconhecimento de crime cometido pelo acusado que, por meio ilícito, age para provar sua inocência.

Quem agrega ao tema é Guilherme Madeira Dezem, pois, apesar de a maioria da corrente doutrinária não reconhecer o crime cometido pelo acusado para lograr êxito em sua absolvição, por meio de prova ilícita, já que há a incidência de excludente de ilicitude, o autor aduz:

“Entendemos, porém, de maneira isolada, que a questão não pode ser tratada desta forma. A causa excludente de ilicitude, seja ela a legítima defesa, seja ela o estado de necessidade, não admite o sacrifício do bem de maior valor em detrimento do de menor valor.

A questão reside exatamente aí. Quando Pacelli analisa a liberdade neste conflito de valores, faz a analise da liberdade em abstrato. No entanto, esta análise não nos parece a melhor. Não nos parece razoável, por exemplo, que se admita o uso de tortura para provar a inocência de alguém que seja acusado de crime contra a honra.

Ora, a liberdade não pode ser analisada de maneira abstrata. É preciso que se analise de que tipo de liberdade se está a falar. Nas hipóteses em que a liberdade é apenas abstratamente considerada não se pode admitir o cometimento de crime em que haja efetiva ofensa a bem jurídico que conduz a restrição concreta da liberdade.”[50]

Portanto, depreende-se que, sem sombra de dúvidas, é necessário fazer-se uma aferição quanto aos direitos que estarão sendo alvos da excludente de ilicitude, via juízo de proporcionalidade e razoabilidade, para que o sacrifício seja válido e, sobretudo, não legitime um desequilíbrio da conduta pro reo.

6. Prova ilícita por derivação

Antes do ano de 2008, a proibição da prova ilícita pro derivação era defendida e exposta apenas em sede doutrinária e jurisprudencial. Todavia, com a reforma do Código de Processo Penal, passou-se a considerar inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, com previsão expressa no art. 157, § 1º.

Mais um tema polêmico e controvertido nas discussões jurídicas, a julgar que se trata, objetivamente, da validade ou não de uma prova que, no âmbito processual, afigura-se lícita, todavia, contaminda na sua origem.

Para Adalberto Camargo Aranha:

“[…] em razão da necessária obediência ao princípio da legalidade que preside nosso direito processual, a licitude de uma prova não depende somente da previsão legal e da obediência às formalidades devidas para a sua obtenção, como também sua honestidade processual, princípios que impedem se fale em sua validade se gerada por outra prova, esta considerada ilícita. A origem espúria contamina a prova aparentemente perfeita, retirando sua validade em razão do desprezo aos princípios da legalidade e da honestidade processual.”[51]

Denominada como Derivative Evidence Doctrine, criada pela jurisprudência norte-americana, conheceu-se com mais prestígio por Fruits of The Poisonous Tree, isto é, frutos da árvore venenosa, no Brasil.

Acontece que a prova ilícita por derivação nada mais é do que aquela prova, inserida no conjunto probatório, que, em si mesma, é lícita, entretanto, somente tomou-se conhecimento desta por intermédio de elementos ou informações adquiridas de uma prova ilicitamente obtida.

Para Brito, Fabretti e Ferreira Lima:

“[…] ao não se admitir a prova ilícita, obviamente não se pode admitir toda prova que derive da prova ilícita. Essa correta construção deriva dos ordenamentos comparados a partir da construção do Estado de Direito. O objeto da lei é principalmente o de evitar que os órgãos oficiais encarregados da investigação do delito violem as garantias fundamentais do cidadão, o que se convencionou chamar de exclusionary rule (regra de exclusão). Para desestimular a violação da lei, toda prova conseguida com essa premissa seria desconsiderada e excluída do processo. Porém, percebeu-se que a partir de determinada prova obtida ilicitamente, outras poderiam ser coletadas de forma lícita. Assim, em complemento à exclusionary rule, foi elaborada a doutrina conhecida como the fruits of the poisonous tree (frutos da árvore envenenada), pela qual todas as provas derivadas da prova ilícita também seriam consideradas ilícitas.”[52]

Insta dizer que nos parece razoável o posicionamento jurisprudencial e doutrinário que reconhece a transmissão e comunicabilidade da ilicitude, desde de o momento da obtenção, às provas derivadas, julgando-as inutilizáveis na esfera do processo. Desprezadas, portanto, para a formação do livre convencimento do julgador.

No entanto, há ressaltar que, na própria formulação da doutrina norte-americana do fruits of poisonous tree, o impedimento da prova ilícita por derivação não é absoluta. Nessa esteira, perfaz-se cabível a prova ilícita por derivação quando há quebra do nexo causal entre a origem da prova decorrente da ilícita, de modo que não se estabelece uma conexão entre uma e outra, como causa e efeito; ou, também, nos casos em que, inevitavelmente, lograria-se encontrar a prova derivada, no curso normal da investigação.

Pontua-se, assim, duas exceções para análise: independent source e inevitable discovery.

6.1Contexto histórico da teoria fruits of the poisonous tree

Com origem nos Estados Unidos, o precedente primário é o caso Silverthone Lumber & Co v. United States, de 1920. A expressão fruits of the poisonous tree foi utilizada pelo Ministro Frankfurter, da Suprema Corte dos Estados Unidos, em 1937, no caso Nardone v. United States.

Explica-nos Madeira Dezem que:

“[…] no primeiro caso, a Suprema Corte considerou inválida uma intimação que tinha sido expedida com base numa informação obtida por meio de uma busca ilegal. A acusação não poderia usar no processo a prova obtida diretamente da busca ilegal, nem a prova obtida indiretamente por meio de intimação baseada nessa busca”[53].

6.2Teoria da fonte independente

 A teoria em tela retrata e reforça a legitimidade e licitude da investigação que vem sendo desenvolvida. Pois bem, havendo duas fontes que objetivam auferir a prova, certo que uma é lícita e outra ilícita, há considerar admissível a obtenção da prova, desvinculando-a de contaminação por derivação.

O caso Murray v.United States, de 1988, foi a primeira aplicação da teoria da fonte independente. Neste caso, policiais suspeitavam de uma atividade de tráfico de drogas e, ilegalmente, entraram na casa onde, a priori, o comércio proscrito era realizado. Posteriormente, o mandado judicial de busca e apreensão foi requerido, fundamentado apenas nos indícios de materialidade, sem mencionar que já haviam invadido a residência.

De posse do mandado, houve a legítima invasão e, por conseguinte, a apreensão das drogas. A Suprema Corte Americana entendeu que a prova não era ilícita por derivação, uma vez que o mandado de busca e apreensão seria obtido de qualquer forma, tão somente com os indícios iniciais da investigação. Portanto, essa fonte era independente e pré-constituída em relação à primeira entrada ilegal.

Salienta Guilherme Nucci:

“Durante uma investigação ou ao longo da instrução criminal, provas são buscadas em diversas fontes, por inúmeros métodos. Vários agentes do Estado, assim como as partes e seus procuradores podem sair em campo para procurar os meios de provas mais interessantes. Dessa complexidade de ações e gestões, torna-se viável a coincidência e a convergência de trilhas. Por isso, uma prova pode ser encontrada por duas ou mais pessoas envolvidas na busca, quase ao mesmo tempo, cada qual por método e com instrumento diferenciados.”[54]

 Essa exceção está expressamente prevista no art. 157, § 2º, do Código de Processo Penal. Podemos entender que a finalidade do legislador é evitar interpretações duvidosas, ao passo de zelar pela forma de colheita de provas no sistema, evitando-se, assim, a perda de provas relevantes porque, de alguma forma, tiveram contato com provas obtidas por meios ilícitos.

Entretanto, para Brito, Fabretti e Ferreira Lima, não há reconhecer a teoria da fonte independente como escusa de admissibilidade da prova ilícita por derivação. Vejamos:

“Já no segundo caso – obtenção por fonte independente –, parece-nos igualmente impossível fazer tal juízo após a obtenção da prova. Em primeiro lugar, porque a prova já foi obtida por meio ilícito, e não mais interessa se poderia ou não ter sido obtida de outra forma. Utilizá-la será utilizar prova ilícita. E em segundo lugar, após se descobrir o que já aconteceu no espaço e no tempo, é possível se imaginar inúmeras situações para se fazer ou não fazer alguma coisa. […]

É evidente que depois de descobrir onde se encontra tal prova será possível se imaginar inúmeras formas de, “seguindo-se o trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, obter-se a mesma prova”. Não há razão lógica ou jurídica para se trabalhar com a imaginação diante da realidade processual e da previsão constitucional.”[55]

Malgrado as posições doutrinárias divergentes, bem como os diversos posiocionamentos jurisprudenciais da atualidade, a aplicação da teoria da fonte independente no Direito pátrio depende, sobretudo, de uma escorreita investigação em curso, de modo a escorar o fundamento “a prova seria eventual e inevitavelmente obtida”. Tal concomitância é imprescindível para vislumbrar a teoria em comento.

Acontece que, na prática, há um despreparo muito grande das autoridades policiais para efetuarem suas “descobertas” de maneira autônoma e independente. Isto é, face ao retrospecto de abusos e afrontas às garantias individuais em prestígio da formação da prova a qualquer custo, a suscetibilidade de aplicação da teoria da fonte independente não traz sossego para a maior parte dos juristas.

Frise-se o que bem ponderou Guilherme Madeira Dezem:

“Embora a teoria seja razoável, entendemos que se mostra temerária sua adoção no sistema brasileiro. Isto porque a experiência democrática brasileira ainda é recente e não pode se comparar com a experiência norte-americana.

Imagine-se, por exemplo, a situação do Caso Murray acima citado no Direito brasileiro e, caso adotada a mesma solução, os eventuais abusos policiais que poderiam ser cometidos. Pensamos que há necessidade, primeiramente, de formação firme de cultura jurídica constitucional para, então, pensar na aplicação desta teoria.”[56]

Destarte, a teoria desenvolvida constitui um grande avanço no que toca às provas derivadas das obtidas por meios ilícitos, porém o fato de ser imprescindível analisar a sua incidência caso a caso, torna-a perigosa, a ponto de desvirtuar o seu real sentido e, até mesmo, quando há conveniência ou não de a prova integrar o processo.

6.2.1Exceção da descoberta inevitável

Conhecida também por exceção da fonte hipotética independente, esta teoria em alusão foi utilizada, criando-se precedente histórico, no caso Nix v. Williams, no ano de 1984, com o fito de validar uma prova que, inevitavelmente, seria obtida para desvendar o caso.

À época dos fatos, o acusado teria matado uma criança e escondido o corpo, sem deixar vestígios. Todavia, realizou-se um mutirão com cerca de 200 voluntários, divididos em zonas de atuação, para lograrem localizar o corpo. Concomitantemente, a polícia local descobriu, através de uma confissão ilegalmente produzida, o local onde o corpo estava ocultado, tendo-se, posteriormente, encontrado o corpo no local indicado pelo acusado.

Embora ilegalmente produzida, depreende-se que, sob a ótica da sistemática adota pela polícia, os voluntários certamente encontrariam, em determinado momento, o cadáver. Sendo assim, a prova foi tida como válida, uma vez que seria fatalmente obtida.

 Realmente, a redação do § 2º reflete a intenção do legislador de positivar no sistema a exceção da descoberta inevitável e não a da teoria da fonte independente, uma vez que a definição contida no § 2º reflete a da descoberta inevitável: “considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova”.

Para tanto, diferentemente da fonte independente, a qual deve-se mostrar, de maneira concreta, os meios prova concomitantemente exequíveis, a exceção da descoberta inevitável é aplicável a partir de um exercício mental, puramente hipotético, levando-se em consideração as particularidades do caso e, sobretudo, da investigação que vem sendo realizada.

Pois bem, o § 1º relata exceção da teoria da fonte independente; o § 2º relata a exceção da descoberta inevitável.

Consoante o entendimento do Supremo Tribunal Federal, já admitiu-se a aplicação da exceção da descoberta inevitável nos casos de prisão em flagrante e de busca e apreensão pessoal. Vejamos:

“HABEAS CORPUS. NULIDADES: (1) INÉPCIA DA DENÚNCIA; (2) ILICITUDE DA PROVA PRODUZIDA DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL; VIOLAÇÃO DE REGISTROS TELEFÔNICOS DO CORRÉU, EXECUTOR DO CRIME, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL; (3) ILICITUDE DA PROVA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS DE CONVERSAS DOS ACUSADOS COM ADVOGADOS, PORQUANTO ESSAS GRAVAÇÕES OFENDERIAM O DISPOSTO NO ART. 7º, II, DA LEI 8.906/96, QUE GARANTE O SIGILO DESSAS CONVERSAS. VÍCIOS NÃO CARACTERIZADOS. ORDEM DENEGADA. 1. Inépcia da denúncia. Improcedência. Preenchimento dos requisitos do art. 41 do CPP. A denúncia narra, de forma pormenorizada, os fatos e as circunstâncias. Pretensas omissões – nomes completos de outras vítimas, relacionadas a fatos que não constituem objeto da imputação –- não importam em prejuízo à defesa. 2. Ilicitude da prova produzida durante o inquérito policial – violação de registros telefônicos de corréu, executor do crime, sem autorização judicial. 2.1 Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem realizado a análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos. Não ocorrência. 2.2 Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados. 2.3 Art. 6º do CPP: dever da autoridade policial de proceder à coleta do material comprobatório da prática da infração penal. Ao proceder à pesquisa na agenda eletrônica dos aparelhos devidamente apreendidos, meio material indireto de prova, a autoridade policial, cumprindo o seu mister, buscou, unicamente, colher elementos de informação hábeis a esclarecer a autoria e a materialidade do delito (dessa análise logrou encontrar ligações entre o executor do homicídio e o ora paciente). Verificação que permitiu a orientação inicial da linha investigatória a ser adotada, bem como possibilitou concluir que os aparelhos seriam relevantes para a investigação. 2.4 À guisa de mera argumentação, mesmo que se pudesse reputar a prova produzida como ilícita e as demais, ilícitas por derivação, nos termos da teoria dos frutos da árvore venenosa (fruit of the poisonous tree), é certo que, ainda assim, melhor sorte não assistiria à defesa. É que, na hipótese, não há que se falar em prova ilícita por derivação. Nos termos da teoria da descoberta inevitável, construída pela Suprema Corte norte-americana no caso Nix x Williams (1984), o curso normal das investigações conduziria a elementos informativos que vinculariam os pacientes ao fato investigado. Bases desse entendimento que parecem ter encontrado guarida no ordenamento jurídico pátrio com o advento da Lei 11.690/2008, que deu nova redação ao art. 157 do CPP, em especial o seu § 2º. 3. Ilicitude da prova das interceptações telefônicas de conversas dos acusados com advogados, ao argumento de que essas gravações ofenderiam o disposto no art. 7º, II, da Lei n. 8.906/96, que garante o sigilo dessas conversas. 3.1 Nos termos do art. 7º, II, da Lei 8.906/94, o Estatuto da Advocacia garante ao advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. 3.2 Na hipótese, o magistrado de primeiro grau, por reputar necessária a realização da prova, determinou, de forma fundamentada, a interceptação telefônica direcionada às pessoas investigadas, não tendo, em momento algum, ordenado a devassa das linhas telefônicas dos advogados dos pacientes. Mitigação que pode, eventualmente, burlar a proteção jurídica. 3.3 Sucede que, no curso da execução da medida, os diálogos travados entre o paciente e o advogado do corréu acabaram, de maneira automática, interceptados, aliás, como qualquer outra conversa direcionada ao ramal do paciente. Inexistência, no caso, de relação jurídica cliente-advogado. 3.4 Não cabe aos policiais executores da medida proceder a uma espécie de filtragem das escutas interceptadas. A impossibilidade desse filtro atua, inclusive, como verdadeira garantia ao cidadão, porquanto retira da esfera de arbítrio da polícia escolher o que é ou não conveniente ser interceptado e gravado. Valoração, e eventual exclusão, que cabe ao magistrado a quem a prova é dirigida. 4. Ordem denegada.”[57]

Neste precedente, os policiais, na posse do celular do indivíduo preso em flagrante por homicídio, verificaram o histórico de chamadas e constataram uma chamada do marido da vítima, configurando-se, assim, o mandante do crime.

Importante ressaltar as palavras de Guilherme Madeira Dezem, no que toca à vulnerabilidade das garantias inerentes ao sistema, quando se vislumbra a aplicação da exceção:

“Embora sua aplicação seja muito interessante, no sentido de tentar atingir-se o difícil equilíbrio entre o binômio eficácia-garantismo, o fato é que a má aplicação deste instituto pode destruir todo o sistema de garantias previsto na Constituição Federal e nos tratados internacionais que o Brasil se obrigou a cumprir. Enfim, a jurisprudência deverá indicar balizas seguras para as excepcionais hipóteses em que se admitirá o uso desta exceção.”[58]

Sendo assim, não há admitir que um caminho desconexo da investigação obediente ao texto constitucional e, principalmente, às garantias do sistema de colheita probatória, seja considerado como fonte independente, à título de exceção contida no Código de Processo Penal.

Quando se constata uma ilegalidade, por mínima e pífia que seja, não perfaz plausível a sua entrada no processo, já que origem ilícita estende-se às demais descobertas subsequentes, não deixando outra saída para as provas obtidas senão sua desconsideração.

 A julgar incompreensível a exceção em comento, De Brito, Fabretti e Ferreira Lima nos ensina:

“Podemos facilmente identificar a falácia lógica nesses casos, pois a alegação de que “a prova seria obtida de qualquer forma” não pode ser aceita, já que pelo corte temporal jamais se poderá dizer o que aconteceria ou não até o encontro da evidência. Mesmo com a proximidade do encontro da prova, havia a imprevisibilidade dos acontecimentos futuros, e assim, qualquer um deles poderia impedir o encontro”.[59]

7. Procedimento para apurar a ilicitude da prova

Haja vista a prova ilícita ser desprezada no processo, desatrelando-se do conjunto probatório formado nos autos através do desentranhamento, como ordena o art. 157, caput, do Código de Processo Penal, o incidente a ser instaurado é o de ilicitude de prova.

O incidente de ilicitude de prova, malgrado não estar expressamente previsto, pode-se valer, à título de fundamentação legal, por analogia, dos arts. 145 e seguintes, do Código de Processo Penal, que disciplinam o incidente de falsidade.

Respeitando-se o prazo de três dias para que as partes juntem as provas pertinentes, o magistrado também poderá determinar eventuais diligências que achar imprescindíveis para o esclarecimento da (i)licitude da prova, certo que a decisão é declaratória, passível de apelação, com fulcro no art. 593, inciso II, do Código de Processo Penal.

Natural e compreensível que o magistrado não pode decidir o processo principal (pelo desentranhamento ou não), visto que o incidente está pendente, sob pena de nulidade. Esta nulidade pode ser arguida por desconsideração de prova importante ou por consideração de prova ilícita.

Sob o aspecto de outra solução possível, Nucci aduz:

“Em casos graves, se o juiz pretender sentenciar o feito sem a finalização do incidente de ilicitude de prova, pode a parte prejudicada ingressar com habeas corpus ou mandado de segurança, conforme se trate do acusado ou do órgão acusatório. Há um direito líquido e certo a um processo justo, livre de provas maculadas. Como julgar um feito onde não se finalizou a discussão acerca da ilicitude de importante prova apresentada?”[60]

A despeito da aceitabilidade do incidente de ilicitude de prova no dia a dia forense, muitos acreditam ser uma via desnecessária, bastando, portanto, que, nos autos principais, seja possível discutir-se o tema nos autos principais, possibilitando-se a apresentação de provas, o que pode, dependendo da dimensão dos autos, conturbar a instrução probatória.

Complementando a possível discussão da prova nos autos principais, o autor supracitado assevera:

“De outra sorte, decidida a questão pelo juiz, não caberia recurso algum, pois não se trataria de procedimento autônomo. A prova ilícita poderia ficar nos autos e, em apelação, a parte interessada questionaria ao Tribunal, novamente, o seu caráter. Considerada ilícita, a instrução seria anulada para que outra decisão fosse proferida. Sob outro prisma, se fosse determinado o seu desentranhamento pelo juiz, nos autos principais, inexistindo recurso específico, como se atingiria a tal preclusão mencionada no art. 157, § 3º? Eventualmente, poder-se-ia argumentar que o projeto de alteração do capítulo das provas deveria ter sido acompanhado pelo projeto que alteraria os recursos, logo, caberia, nesse caso, o agravo. Mas essa situação não aconteceu. Inexiste agravo para decisões interlocutórias na esfera criminal. Por isso, mais uma vez, o único caminho que nos soa viável, processualmente, é a instauração do incidente de ilicitude da prova.”[61]

8. Conclusão

A formação de um conjunto probatório escorreito e legal está ligada à própria função do processo como instrumento, certo que a máxima caracterização do devido processo legal, em consonância com todos os preceitos do Estado Democrático de Direito, é a inibição de quaisquer tipos de arbitraridades que possam privar ou restringir direito fundamental ao jurisdicionando.

Conclui-se que a prova judicializada é um componente de extrema relevância no processo, haja vista que integra um conjunto probatório destinado a amparar a decisão final do julgador, ou seja, é o meio que justificará o fim.

Face à importância da prova para o processo, a regra é que a sua obtenção seja lícita e legal. A Constituição Federal prevê a vedação das provas obtidas por meios ilícitos por duas razões: proteger o cidadão e proteger o próprio o exercício da jurisdição.

Refletindo acerca do contexto histórico em que a Constituição foi promulgada, realmente, os direitos humanos e fundamentais tinham de estar expressamente previstos, pois à época da ditadura militar houve completo desrespeito às principais garantias dos cidadãos (torturas, violações de domicílios, interceptações e quebra de informações sigilosas e particulares).

Como discorrido no presente trabalho monográfico, conclui-se que não há direito fundamental absoluto e irrestringível, visto que, a despeito da previsão constitucional da inutilização da prova obtida por meio ilícito, o Código de Processo Penal excepciona a regra do caput do artigo 157 quando ocorre a quebra do nexo de causalidade, bem como quando se apura que a prova seria inevitavelmente descoberta.

De toda sorte, para se vislumbrar a (in)admissão de uma prova relacionada direta ou indiretamente com o meio empregado ilícito, a ponderação do magistrado consiste em exercer o princípio da proporcionalidade, ao aferir o conflito de direitos fundamentais e/ou garantias constitucionais, sobretudo, a gravidade e extraordinariedade da situação, decidindo, portanto, qual deverá preponderar e prevalecer em sacrifício do outro.

Para tanto, conclui-se imperioso o juízo de razoabilidade do magistrado estar sensível, principalmente, ao valor das normas constitucionais e sua relevância dentro do ordenamento jurídico, uma vez que o fito principal é a preservação da harmonia do ordenamento e a busca pelo sucesso da prestação jurisdicional (justiça). Por exemplo, não se deve admitir uma confissão sob tortura para lograr provar a autoria de uma simples contravenção penal. Isto afigura-se desrazoado e ilógico, pois precisa-se relutar a banalização da incidência deste princípio.

No que toca à possibilidade jurídica de utilização da prova ilícita pro reo, há concluir que, dependendo da robustez do conjunto probatório coligido nos autos, o juiz pode admitir a prova ilícita capaz de comprovar, inequivocamente, a inocência do réu, visto ser a única forma disponível de não condenar um inocente.

Insta concluir também que, na prática forense, a repercussão da prova no processo pode ser irrelevante e, ao mesmo tempo, para o magistrado, relevantíssima, pois, desde que o juiz não fundamente a sua decisão na prova ilícita, encontra-se muita dificuldade em reformar a sentença nos tribunais sob a tese de prova ilícita. Acontece que o magistrado pode ter sido sim influenciado pelo conteúdo daquela prova, entretanto, se não mencioná-la na sentença, encara-se a prova ilícita como irrelevante, o que não há compreender.

Em verdade, a doutrina trata muito sobre a impropriedade técnica da redação do dispositivo legal que abarca as exceções da quebra do nexo de causalidade e da fonte independente, a saber, artigo 157, § § 1º e 2º, do Código de Processo Penal. Conclui-se que o legislador não precisava excepcionar a regra pela quebra do nexo de causalidade, uma vez que é bem óbvio que se não relação da prova derivada com a “originária”ilícita, ela é lícita. Portanto, sequer derivada pode ser considerada, pois não há o que a vincule com a obtenção ilícita de uma prova estranha a ela.

Também conclui-se que o conceito de fonte independente constante no § 2º do artigo supra é atécnico, sendo que, na verdade, ele conceitua a exceção da descoberta inevitável, incidindo em erro, portanto. Insta ponderar, também, que a previsibilidade de prova não é pertinente ao processo penal, haja vista o espírito garantista do diploma, bem como sua incompatibilidade com o princípio constitucional da presunção de inocência.

O trabalho monográfico também versa sobre a (in)evitável interferência e influência da prova ilícita, ainda que desentranhada do processo, sobre o juiz da causa. Ao analisar o projeto de lei, o Presidente da República vetou o que seria o § 4º do artigo 157, sob o embasamento jurídico de que a substituição do juiz contaminado ensejaria prejuízo à celeridade processual, sendo esta última de maior relevância. De fato, a maioria da doutrina não discorda da plausibilidade das razões do veto, já que a medida não prestigia nenhum pouco a celeridade processual. Todavia, mais importante do que uma prestação jurisdicional célere, é uma prestação jurisdicional isenta e justa.

Entende-se que o veto presidencial foi bem fundamentado, entretanto, a substituição do juíz contaminado se coaduna com o escopo da prestação jurisdicional, em observância, sobretudo, às demais garantias constitucionais que abarcam a imparcialidade do julgador. Pois bem, não basta estar subjetivamente imparcial, deve-se demonstrar a ausência de motivos que podem afetar o seu exercício com isenção.

Referências
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SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Habeas Corpus nº 91.867, Relator Min. Gilmar Mendes. Julgado em 24/04/2012. Publicado em 20.09.2012
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Habeas Corpus 95.009-4. Relator Min. Eros Grau. Julgado em 06/11/2008. Publicado em 18/12/2008
DEZEM, Guilherme Madeira – Curso de processo penal. São Paulo, Editora RT. 2015.
 
Notas:
[1] Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Presbiteriana Mackenzie como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Professor Orientador Evandro Fabiani Capano

[2] Fernandes, Antonio Scarance – Processo Penal Constitucional, 2007 – 5. ed. São Paulo, pg. 35

[3] Aranha, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2006. Pág. 08

[4] Avolio, Luiz Francisco Torquato. Provas Ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. – 6. Ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, Pag.43/44

[5] Badaró, Gustavo Henrique. Processo Penal – 3 ed. – São Paulo, 2015, pg. 377

[6] Avolio, Luiz Francisco Torquato. Provas Ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. – 6. Ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, Pag. 37.

[7] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 559

[8] Badaró, Gustavo Henrique. Processo Penal – 3 ed. – São Paulo, 2015, pg. 381

[9] Barros, Marco Antonio de. A busca da verdade real no processo penal – 4. ed. – p. 170

[10] De Brito, Alexis; Fabretti, Humberto; Lima, Marco Antônio. Processo Penal Brasileiro. 2º edição, pg. 35/36

[11] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 568

[12] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 31ª ed., 2015, p. 61.

[13] JÚNIOR, Américo Bedê & Gustavo Senna. Princípios do Processo Penal: Entre o garantismo e a efetividade da sanção. Editora Revista dos Tribunais. P. 133.

[14] Badaró, Gustavo Henrique. Processo Penal – 3 ed. – São Paulo, 2015, pg. 51-52

[15] Fernandes, Antonio Scarance – Processo Penal Constitucional, 2007 – 5. ed. São Paulo, pg. 60/61.

[16] Avolio, Luiz Francisco Torquato. Provas Ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. – 3. Ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, Pag. 67

[17] Grinover, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal – 12. ed. – São Paulo, 2011, pg. 129

[18] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 611/612

[19] Grinover, Ada Pellegrini. As nulidades no processo penal – 12. ed. – São Paulo, 2011, pg. 129.

[20] STF, HC 95.009-4/SP, Pleno. Rel. Min. Eros Grau, j. 06/11/2008, m.v., itens 34 e 35 do voto.

[21] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 562.

[22] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 562

[23] Badaró, Gustavo Henrique. Processo Penal – 3 ed. – São Paulo, 2015 – Editora RT, São Paulo

[24] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 565.

[25] Barros, Marco Antonio de. A busca da verdade real no processo penal – 4. ed. – p. 169

[26] Silva, César Mariano da – Provas ilícitas…, 2010 – 6. ed. São Paulo, pg. 56

[27] Grinover, Ada Pellegrini – Provas ilícitas, intercepções… – 1. ed. – Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013, p. 120.

[28] Grinover, Ada Pellegrini – Provas ilícitas, intercepções… – 1. ed. – Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013, p. 121

[29] Aranha, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2006. Pág. 276

[30] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 723

[31] Avolio, Luiz Francisco Torquato. Provas Ilícitas: interceptações telefônicas, ambientais e gravações clandestinas. – 3. Ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

[32] Grinover, Ada Pellegrini – Provas ilícitas, intercepções… – 1. ed. – Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013, p. 246

[33] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 606

[34] Grinover, Ada Pellegrini – Provas ilícitas, intercepções… – 1. ed. – Brasília, DF: Gazeta Jurídica, 2013, p. 249

[35] Badaró, Gustavo Henrique. Processo Penal – 3 ed. – São Paulo, 2015, pg. 403

[36] Grinover, Magalhães Filho e Scarance Fernandes. As nulidades no processo penal – 12. ed. – São Paulo, 2011, pg. 138

[37] De Brito, Alexis; Fabretti, Humberto; Lima, Marco Antônio. Processo Penal Brasileiro. 2º edição, pg. 185

[38] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 610

[39] Badaró, Gustavo Henrique. Processo Penal – 3 ed. – São Paulo, 2015, pg. 404

[40] Badaró, Gustavo Henrique. Processo Penal – 3 ed. – São Paulo, 2015, pg. 405

[41] Aranha, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2006. Pág. 63

[42] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 610-611

[43] Fernandes, Antonio Scarance – Processo Penal Constitucional, 2007 – 5. ed. São Paulo, pg. 98/99

[44] De Brito, Alexis; Fabretti, Humberto; Lima, Marco Antônio. Processo Penal Brasileiro. 2º edição, editora Atlas – São paulo
CINTRA, Antônio Carlos de Araújo, GRINOVER, Ada Pellegrini, DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 31ª ed., 2015

[45] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 620

[46] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 620/621

[47] Lopes Jr., Aury. Direito Processual Penal – 11. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2014, p. 612

[48] Nucci, Guilherme de Souza. Provas no processo penal. 4.ed. Rio de Janeiro:Forense, 2015, pg. 51

[49] Silva, César Mariano da – Provas ilícitas…, 2010 – 6. ed. São Paulo, pg. 18

[50] Dezem, Guilherme Madeira – Curso de processo penal, 2015. São Paulo, pg. 434

[51] Aranha, Adalberto José Q. T. de Camargo. Da prova no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2006. Pág. 68

[52] De Brito, Alexis; Fabretti, Humberto; Lima, Marco Antônio. Processo Penal Brasileiro. 2º edição, pg. 187

[53] Dezem, Guilherme Madeira – Curso de processo penal, 2015. São Paulo, pg. 435

[54] Nucci, Guilherme de Souza – Provas no processo penal – 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, pg. 54

[55] De Brito, Alexis; Fabretti, Humberto; Lima, Marco Antônio. Processo Penal Brasileiro. 2º edição, pg. 188

[56] Dezem, Guilherme Madeira – Curso de processo penal, 2015. São Paulo, pg. 437

[57] SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Segunda Turma, Relator Min. Gilmar Mendes. Habeas Corpus nº 91867. Julgado em 24/04/2012. DJE n 185.. Divulgado em 19/09/2012. Publicado em 20.09.2012.

[58] Dezem, Guilherme Madeira – Curso de processo penal, 2015. São Paulo, pg. 439

[59] De Brito, Alexis; Fabretti, Humberto; Lima, Marco Antônio. Processo Penal Brasileiro. 2º edição, pg. 189

[60] Nucci, Guilherme de Souza – Provas no processo penal – 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, pg. 55

[61] Nucci, Guilherme de Souza – Provas no processo penal – 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, pg. 55/56


Informações Sobre o Autor

Joao Marcos Vilela Leite

Acadêmico de Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie


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